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Profissionais preferem home office e horário flexível a salário mais alto

Em levantamento, o home office e o trabalho flexível aparecem como prioridade para todos os grupos de idade

 (Caiaimage/Agnieszka Olek/Getty Images)

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EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 18 de outubro de 2020 às 16h54.

Na hora de escolher um novo emprego, é claro que o salário importa. Mas, no planejamento da carreira dos sonhos, profissionais olham além dos números.

Ao lado da remuneração, na lista de desejos aparecem benefícios como trabalho flexível e possibilidade de home office, ambiente saudável, propósito da empresa, compromisso socioambiental e com a diversidade, além de valorização da equipe e possibilidade clara de desenvolvimento.

Uma pesquisa feita pela Revelo, startup de recrutamento, a pedido do Estadão, perguntou a 378 profissionais o que faz uma empresa ser considerada ‘dos sonhos’.

Entre as respostas - cada um podia escolher até duas opções -, 69% apontaram o horário flexível e o home office; 36% disseram olhar para salário acima da média do mercado; 36%, o compromisso com diversidade, sustentabilidade e outros propósitos; 18%, a participação nos lucros; e 15%, os bônus por performance.

Apesar da crise na economia e no mercado de trabalho, as empresas buscam oferecer benefícios extras para os funcionários porque se deram conta que aumentou a disputa por talentos que possam fazer a diferença em um mercado cada vez mais competitivo. Além disso, os profissionais mais jovens - e os de maior potencial - têm um comportamento diferente das gerações anteriores.

Estão mais preocupados com a qualidade de vida e em encontrar um propósito para seu trabalho. Eles não vestem a camisa da empresa apenas pelo salário, mas por se identificar com os valores da companhia. Na pandemia, essa mudança de comportamento ficou mais evidente, como mostra a pesquisa da Revelo.

No levantamento, o home office e o trabalho flexível aparecem como prioridade para todos os grupos de idade, com maiores índices entre quem tem de 18 a 23 anos (41%) e de 35 a 40 anos (37%). Já o salário foi citado como item importante principalmente nas faixas de 24 a 29 anos e de 35 a 40 anos, mas com índice de 20%, em ambos os casos.

O compromisso com diversidade, sustentabilidade e outros propósitos da marca são mais importantes para os mais jovens, entre 18 e 29 anos.

“Com um novo sistema híbrido, com a junção do modelo de trabalho online e do offline, é muito importante entender quais são os benefícios almejados pelos profissionais que vão operar neste novo modelo nas empresas”, destaca Patrícia Carvalho, diretora de marketing da Revelo. “Assim, líderes e departamentos de Recursos Humanos podem adaptar os benefícios e aumentar a atratividade para os candidatos, pois o mercado está disputando profissionais.”

Empresas se empenham para oferecer benefícios competitivos (que incluem até auxílio para fertilização ou adoção de criança), para apontar tendências e reter os melhores talentos, além de construir uma boa imagem de empregadora.

Para Amanda Aragão, líder da área de recrutamento e seleção da consultoria Mais Diversidade, três pontos têm aparecido entre as preferências dos candidatos na hora de escolher um novo emprego, principalmente para os mais jovens: a possibilidade de desenvolver múltiplas carreiras, o senso de pertencimento e o propósito.

Ainda é um peso muito grande escolher uma carreira na adolescência e fazer aquela mesma coisa para o resto da vida. Por isso, diz a especialista, muitos jovens têm optado por empresas que incentivam a mobilidade entre áreas. Já o senso de pertencimento vem alinhado a um ambiente que proporciona segurança psicológica. Isso ocorre quando o funcionário entende que ele é bem-vindo na empresa. “A pessoa poder assumir riscos, não se sentir desamparada nem exposta e poder ser ela mesma. O profissional se sente seguro ao falar sua visão em uma reunião mesmo que ela seja oposta à da maioria.”

De acordo com Amanda, a preocupação com o propósito significa entender como o profissional irá investir o tempo dele e como isso contribuirá para a sociedade. As empresas de vanguarda têm dado exemplos de que salário e propósito não andam em direções opostas. “As pessoas estão menos dispostas a investir o tempo delas somente para o resultado financeiro.”

Para construir a sua carreira, Samantha Almeida, de 39 anos, conta que aprendeu muito cedo a definir prioridades. “Eu entendi os meus ‘inegociáveis’, o que eu faço e o que eu não faço. Seja o que for, eu vou empregar as minhas habilidades e preciso garantir os meus ‘inegociáveis’. A partir dessa definição vem a adaptação. Eu sempre faço essa conta: prefiro lugares onde eu possa usar a minha perspectiva de mundo, de vida, e as minhas experiências para construir uma terceira coisa.”

Há dois meses, ela ocupa o cargo de diretora do Twitter Next Brasil, área estratégica da marca dedicada ao desenvolvimento de campanhas e formatos publicitários para anunciantes. O que pode ser curioso considerando que ela começou a carreira - ou as várias carreiras, com ela mesma diz - com uma graduação em Design de Moda. “Eu já fiz tanta coisa nessa vida. Às vezes, as pessoas me perguntam ‘mas como você foi parar no Twitter?’ Eu falo ‘não sei, é uma boa pergunta’.”

Samantha foi se guiando pelos pontos dos quais não abria mão e entendendo onde poderia ser útil. “Nunca me prendi a cadeiras. Eu fiz movimentos horizontais, até retrocessos. Mas eu não teria a bagagem que tenho. Eu me preparo para o mundo: o que o mundo vai precisar versus quais as minhas habilidades e como posso disponibilizá-las profissionalmente.”

Ao longo dos anos, ela foi da moda para a publicidade, das marcas de moda para as marcas de beleza, delas para agência de comunicação, focou no digital e chegou ao Twitter. Hoje, inegociável para ela é o que chama de “trabalhar em empresas que trabalham para pessoas”.

“Eu não vou para um lugar para onde eu não possa trazer a perspectiva da base, da comunidade, onde eu não possa levantar a mão na sala e falar ‘galera, a maioria da população não é assim’ ‘será que isso faz sentido para as mulheres?’”, conta.

Prioridades. O ambiente da empresa e o volume de trabalho também são inegociáveis mesmo para quem está começando a carreira, como a advogada Marina Onetto, de 23 anos. Recém-formada, ela trocou um escritório de porte médio por um menor e que foi criado há poucos meses.

“É uma gestão jovem, o que ajuda a fazer com que o ambiente de trabalho seja bom e o respeito pelo colaborador seja grande. Isso me motivou, além do escritório ser muito perto de casa”, conta. Mas o principal incentivo ao emprego, conta ela, é a possibilidade de ajudar a construir uma nova empresa.

“É muito positivo você poder fazer parte de um negócio desde o começo, ajudar a fazer acontecer. Se tudo der certo, eu estou lá desde o começo, participei disso. Fazer parte da construção do negócio valoriza um profissional”, explica. “A questão salarial é muito importante. São Paulo é uma cidade cara, mas eu percebi que um ambiente de trabalho agradável pesa mais. Gosto de pensar que vale a pena procurar um ambiente em que eu tenha um equilíbrio legal entre vida pessoal e profissional, principalmente no home office. Eu não funciono se eu tiver que ficar 24 horas por dia dedicada ao trabalho.”

Entender a cultura da empresa e ter o chamado “match” ou “fit” cultural pesou para a publicitária Isabela Guimarães, de 28 anos que trabalha há dois anos e meio na Electrolux na Suécia. “Eu acredito muito na cultura da empresa, eu considero muito o ambiente, se é workaholic ou não - se for, não é para mim. A minha carreira não é uma trajetória muito linear.”

Match. A estudante de Ciências da Computação Manuela Bernardino, de 20 anos, conheceu a empresa dos sonhos há mais de dois anos, num evento para profissionais negros na IBM. “Fiquei chocada com o tamanho da empresa e muito feliz quando vi mulheres negras falando no evento. Naquele momento, eu decidi que era ali que eu queria ficar. Saí de lá e pesquisei mais sobre a empresa.”

Ela se candidatou para uma vaga de jovem aprendiz e não foi selecionada. Quis desistir, mas uma mentora a encorajou a estudar mais e tentar de novo. “A entrevista em si não foi difícil, acho que foi mais o meu brilho no olho de querer entrar para a empresa. Mas a preparação me ajudou muito.”

Há dois anos na corporação, Manuela já realizou vários sonhos: foi para os Estados Unidos a trabalho, com tudo pago pela IBM, e há um mês se tornou estagiária de desenvolvimento. A próxima meta é se tornar gerente até os 26 anos, trabalhando com tecnologia focada em diversidade e inclusão.

Manuela diz que a valorização profissional é um dos itens que a fizeram seguir escolhendo a IBM como a empresa dos sonhos. “Você tem um valor para a empresa independentemente do seu cargo. A gente tem de ter apoio, ainda mais quando somos jovens, porque muitas vezes estamos perdidos, sem saber o que e como fazer. O respeito também é fundamental. No home office, quase todo dia recebo mensagem perguntando se preciso de algo, se minha família está bem.”

O que as empresas buscam no mercado

“As empresas estão saindo do lugar do ‘eu estou aqui parado esperando os candidatos virem até mim’”, afirma Amanda Aragão, líder da área de recrutamento da consultoria Mais Diversidade. Ela explica que as empresas têm priorizado, principalmente no público jovem, as soft skills, ou competências comportamentais, em detrimento da experiência. “Não buscam mais o super homem ou mulher maravilha, mas querem entender a maneira como você se coloca: se não sabe responder a uma pergunta, como você vai atrás da resposta.”

Para ela, há uma tendência de as empresas substituírem os testes técnicos por testes situacionais para entender se o candidato se encaixa na cultura da empresa. “Estamos chegando à conclusão óbvia de que o técnico eu ensino, mas eu não mudo os valores das pessoas de uma hora para outra”, diz Amanda.

Com mais de 5 mil colaboradores, a fintech Stone privilegia o match cultural em suas contratações, principalmente no programa Recruta Stone. “Focamos no fit porque a nossa premissa é: se uma pessoa com inteligência é motivada e íntegra, ela aprende o que for necessário”, explica Livia Kuga, responsável pela área de talentos.

Em fevereiro deste ano, a Stone contratou o estudante de Engenharia de Produção Victor Souza, de 22 anos, para uma vaga de backoffice. No primeiro emprego, ele conta que durante o processo seletivo foi possível perceber que os testes giravam em torno do fit cultural.

“Cada etapa é uma versão reduzida de situações que você pode vir a enfrentar na empresa. É, de fato, um processo que vai te preparando para situações reais do dia a dia. O fit cultural nada mais é do que ver se o seu jeito combina com o jeito da empresa de fazer as coisas.”

Mas como as empresas conseguem entender isso? No caso da Stone, o processo começa com um teste que mede preferências, criado pela startup Mindsight. “No teste, a pessoa é obrigada a priorizar, escolher e ranquear. Com isso, mapeamos a pessoa para entender o que ela valoriza no trabalho. São 33 atributos, como foco em metas, estabilidade, ser socialmente responsável, remuneração variável e ser recompensado pela entrega”, destaca o CEO da Mindsight, Thaylan Toth.

“Quando as empresas nos procuram geralmente é porque as pessoas que elas estão contratando não estão performando como elas queriam ou estão pedindo demissão muito rápido.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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