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Os profissionais de RH estão sobrecarregados

Ao assumir tarefas estratégicas e não se desligar do passado, executivos de recursos humanos estão sobrecarregados. Saiba como desempenhar um novo papel sem comprometer (demais) sua vida pessoal

João Marcio Ferreira, diretor de RH da GSK: além das dez horas no escritório, hoje ele gasta mais duas horas em casa para dar conta dos e-mails (André Valentim)
DR

Da Redação

Publicado em 26 de novembro de 2013 às 18h56.

Hácinco anos, Jorge Tavares de Almeida era gerente corporativo de recursos humanos do Grupo Protege, uma empresa de prestação de serviços no segmento de segurança com 21 000 funcionários em todo o Brasil. Chegava ao escritório às 6h30 e saía, no máximo, às 19 horas. Nesse meio tempo, recebia cerca de 100 e-mails e participava de uma ou outra reunião. Duas vezes por mês, viajava para uma das 45 bases operacionais da organização em 21 estados brasileiros. Hoje, apesar de ocupar o mesmo cargo e começar o trabalho no mesmo horário, não consegue sair do escritório antes das 21 horas. Começa a manhã lutando contra as pendências do dia anterior, já que o volume diário de e-mails literalmente triplicou e a quantidade de reuniões cresceu para duas extensas, de duas horas cada, por dia. Às vezes, são até três reuniões, num entra e sai sem fim. As viagens de trabalho também aumentaram, para quatro por mês. Almeida orgulha-se de participar mais dos negócios da companhia, mas não consegue tirar férias há dois anos.

A rotina do carioca João Marcio Ferreira, diretor de recursos humanos do laboratório farmacêutico GlaxoSmithKline (GSK), não é muito diferente. Ao assumir o atual cargo, em 2007, ele chegava entre 7h30 e 8 horas na empresa e procurava reservar as três primeiras horas da manhã para trabalhar no que era mais importante e estratégico, sem ser interrompido. A tarde era dedicada a reuniões e a labuta terminava às 18 horas. Hoje, ele ainda começa e encerra o expediente no mesmo horário. A diferença é que, antes, deixava o escritório, ia para a ginástica e, depois, para casa, para se dedicar à família. Agora, embora a ginástica esteja incluída na rotina, Ferreira perde de duas a duas horas e meia no lar, doce lar, tentando ler todos os e-mails que ficaram pendentes. “Não parei para contar quantos e-mails recebo por dia porque não tenho tempo, mas todo final de semana são de 200 a 250 e-mails acumulados, que consomem sete horas do meu sábado ou domingo”, diz ele. No começo deste ano, foi a primeira vez, em 11 anos na GSK, que o executivo tirou 30 dias corridos de férias.

Em comum, as histórias de Almeida e Ferreira — e de Américo Figueiredo, Gustavo Gachineiro, Mônica Paiva e provavelmente a sua — têm o fato de que o RH está cada vez mais demandado. E isso tem exigido um malabarismo na agenda e certo sacrifício na vida pessoal dos executivos. “O RH cresceu em importância e o volume de trabalho aumentou. Hoje é difícil uma decisão estratégica da organização que não passe pela área”, afirma Gachineiro, vice-presidente executivo jurídico e de RH da GVT, que, como o próprio cargo revela, acumula funções — outra tendência na vida do RH estratégico.

Américo Figueiredo, vice-presidente de RH da Nextel, por exemplo, acaba de ser nomeado para comandar também o comitê de gestão da companhia no Brasil. Na prática, o novo papel vai incluir mais quatro reuniões importantes por semana, que podem se estender pelo dia inteiro — nessas ocasiões, até o almoço é servido na mesa de reuniões por uma empresa de bufê contratada. “E que horas eu faço o resto? Chego cedo e saio tarde para dar conta”, afirma o vice-presidente, cujo dia começa às 7h30 e vai até as 22h30.

A boa notícia é que o papel do RH tende a ser cada vez mais importante na organização. A má é que a importância gera demanda, e sem um gerenciamento adequado a vida desse profissional pode se resumir a tarefas. Mas isso tem solução.

Saber identificar os chamados vilões do novo tempo do RH é o primeiro passo para tomar as rédeas da situação, segundo Christian Barbosa, presidente da Triad PS, consultoria especializada em estratégias de produtividade. E isso, revela, é o que mais tem no mundo corporativo. Uma pesquisa realizada pela sua consultoria com 30 000 entrevistados constatou que somente um terço do tempo é, de fato, gasto com tarefas importantes.

“Um dos principais ralos por onde o tempo se esvai está no excesso de reuniões”, diz Barbosa. “Não é porque o RH se tornou estratégico que ele tem de ser envolvido em tudo o que é assunto”, diz. Outro grande vilão do tempo, segundo Barbosa, é o e-mail. E, numa função mais estratégica, a caixa de mensagens é a primeira a sentir. “O RH é imã de e-mail; o profissional é copiado em tudo”, diz o consultor. Coisa com a qual Gachineiro já aprendeu a lidar: “Procuro instruir minha equipe a evitar e-mails desnecessários, prefiro não receber mensagens se elas não exigirem minha atenção naquele momento”.

Recém-chegada à diretoria de RH da Radix Engenharia e Software, Mônica Paiva identifica outro tomador de tempo: as conversas. “Atualmente, o grande desafio está em capacitar os gestores de forma que eles se sintam preparados para gerenciar pessoas”, afirma. “É por isso que o RH está sobrecarregado, metade do meu dia sou procurada por funcionários e gestores com problemas de comunicação.”

Muitas vezes, porém, o problema não está apenas no excesso de reuniões, conversas com gestores ou e-mails, mas, sim, na falta de gente mesmo. Não é raro a empresa promover o principal executivo ou estender a ele mais poderes e não aumentar sua estrutura. Dessa forma, o RH precisa se equilibrar entre o passado e o futuro, entre o estratégico e o operacional. “Tem que haver uma estrutura robusta embaixo de você”, opina, com propriedade, o vice-presidente da GVT. Há quatro anos, o RH da companhia contava com 100 pessoas — dessas, apenas três eram gerentes. Hoje são 242 pessoas, incluindo um diretor executivo e dois gerentes seniores, de um total de oito gerentes.

A culpa também é do RH

Ok que a vida mudou e a função exige mais. Mas o acúmulo de trabalho não é culpa apenas do novo papel do RH. É culpa também do profissional, que, muitas vezes, não se dá conta de que seu perfil mudou e, portanto, precisa abrir mão de algumas tarefas. Por isso é saudável que o executivo de RH dedique alguns momentos do dia ao mea culpa e faça uma autorreflexão. “Estou delegando atividades? Treinei um substituto? Estou compartilhando responsabilidades?”, questiona Ana Maria Rossi, presidente da International Stress Management (Isma BR).

Largar o osso, no jargão popular, é fundamental na administração de um novo papel. “Quem sai de cargo operacional para função estratégica costuma ficar com aquele resquício de colocar a mão na massa, pelo menos nos dois ou três primeiros anos”, comenta Barbosa. Jorge Tavares de Almeida, do Grupo Protege, não tem vergonha de se confessar culpado. “Percebi que ainda fazia muita coisa que não era estratégica. Por isso, criei dois níveis de comando abaixo de mim, estou reavaliando o que eu mesmo preciso executar e redistribuindo responsabilidades”, afirma o executivo.

João Marcio Ferreira Ferreira, da GSK, faz coro. “Em 2011 tentei fazer tudo sozinho e vi que não dava. Meu aprendizado foi constatar que o modelo do RH mudou e eu não havia mudado”, diz ele. “Este será o ano de delegar, para que eu possa me dedicar ao que realmente tem que ser feito por mim e para que, delegando, motive o subordinado que pode fazer aquilo até melhor que eu.”

É exatamente essa atitude que a nova função exige. E é também o que a organização espera do principal executivo de RH. Afinal é ele quem deve dar o exemplo para fortalecer o discurso corporativo moderno de que trabalhar é bom, mas com qualidade de vida.

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Hácinco anos, Jorge Tavares de Almeida era gerente corporativo de recursos humanos do Grupo Protege, uma empresa de prestação de serviços no segmento de segurança com 21 000 funcionários em todo o Brasil. Chegava ao escritório às 6h30 e saía, no máximo, às 19 horas. Nesse meio tempo, recebia cerca de 100 e-mails e participava de uma ou outra reunião. Duas vezes por mês, viajava para uma das 45 bases operacionais da organização em 21 estados brasileiros. Hoje, apesar de ocupar o mesmo cargo e começar o trabalho no mesmo horário, não consegue sair do escritório antes das 21 horas. Começa a manhã lutando contra as pendências do dia anterior, já que o volume diário de e-mails literalmente triplicou e a quantidade de reuniões cresceu para duas extensas, de duas horas cada, por dia. Às vezes, são até três reuniões, num entra e sai sem fim. As viagens de trabalho também aumentaram, para quatro por mês. Almeida orgulha-se de participar mais dos negócios da companhia, mas não consegue tirar férias há dois anos.

A rotina do carioca João Marcio Ferreira, diretor de recursos humanos do laboratório farmacêutico GlaxoSmithKline (GSK), não é muito diferente. Ao assumir o atual cargo, em 2007, ele chegava entre 7h30 e 8 horas na empresa e procurava reservar as três primeiras horas da manhã para trabalhar no que era mais importante e estratégico, sem ser interrompido. A tarde era dedicada a reuniões e a labuta terminava às 18 horas. Hoje, ele ainda começa e encerra o expediente no mesmo horário. A diferença é que, antes, deixava o escritório, ia para a ginástica e, depois, para casa, para se dedicar à família. Agora, embora a ginástica esteja incluída na rotina, Ferreira perde de duas a duas horas e meia no lar, doce lar, tentando ler todos os e-mails que ficaram pendentes. “Não parei para contar quantos e-mails recebo por dia porque não tenho tempo, mas todo final de semana são de 200 a 250 e-mails acumulados, que consomem sete horas do meu sábado ou domingo”, diz ele. No começo deste ano, foi a primeira vez, em 11 anos na GSK, que o executivo tirou 30 dias corridos de férias.

Em comum, as histórias de Almeida e Ferreira — e de Américo Figueiredo, Gustavo Gachineiro, Mônica Paiva e provavelmente a sua — têm o fato de que o RH está cada vez mais demandado. E isso tem exigido um malabarismo na agenda e certo sacrifício na vida pessoal dos executivos. “O RH cresceu em importância e o volume de trabalho aumentou. Hoje é difícil uma decisão estratégica da organização que não passe pela área”, afirma Gachineiro, vice-presidente executivo jurídico e de RH da GVT, que, como o próprio cargo revela, acumula funções — outra tendência na vida do RH estratégico.

Américo Figueiredo, vice-presidente de RH da Nextel, por exemplo, acaba de ser nomeado para comandar também o comitê de gestão da companhia no Brasil. Na prática, o novo papel vai incluir mais quatro reuniões importantes por semana, que podem se estender pelo dia inteiro — nessas ocasiões, até o almoço é servido na mesa de reuniões por uma empresa de bufê contratada. “E que horas eu faço o resto? Chego cedo e saio tarde para dar conta”, afirma o vice-presidente, cujo dia começa às 7h30 e vai até as 22h30.

A boa notícia é que o papel do RH tende a ser cada vez mais importante na organização. A má é que a importância gera demanda, e sem um gerenciamento adequado a vida desse profissional pode se resumir a tarefas. Mas isso tem solução.

Saber identificar os chamados vilões do novo tempo do RH é o primeiro passo para tomar as rédeas da situação, segundo Christian Barbosa, presidente da Triad PS, consultoria especializada em estratégias de produtividade. E isso, revela, é o que mais tem no mundo corporativo. Uma pesquisa realizada pela sua consultoria com 30 000 entrevistados constatou que somente um terço do tempo é, de fato, gasto com tarefas importantes.

“Um dos principais ralos por onde o tempo se esvai está no excesso de reuniões”, diz Barbosa. “Não é porque o RH se tornou estratégico que ele tem de ser envolvido em tudo o que é assunto”, diz. Outro grande vilão do tempo, segundo Barbosa, é o e-mail. E, numa função mais estratégica, a caixa de mensagens é a primeira a sentir. “O RH é imã de e-mail; o profissional é copiado em tudo”, diz o consultor. Coisa com a qual Gachineiro já aprendeu a lidar: “Procuro instruir minha equipe a evitar e-mails desnecessários, prefiro não receber mensagens se elas não exigirem minha atenção naquele momento”.

Recém-chegada à diretoria de RH da Radix Engenharia e Software, Mônica Paiva identifica outro tomador de tempo: as conversas. “Atualmente, o grande desafio está em capacitar os gestores de forma que eles se sintam preparados para gerenciar pessoas”, afirma. “É por isso que o RH está sobrecarregado, metade do meu dia sou procurada por funcionários e gestores com problemas de comunicação.”

Muitas vezes, porém, o problema não está apenas no excesso de reuniões, conversas com gestores ou e-mails, mas, sim, na falta de gente mesmo. Não é raro a empresa promover o principal executivo ou estender a ele mais poderes e não aumentar sua estrutura. Dessa forma, o RH precisa se equilibrar entre o passado e o futuro, entre o estratégico e o operacional. “Tem que haver uma estrutura robusta embaixo de você”, opina, com propriedade, o vice-presidente da GVT. Há quatro anos, o RH da companhia contava com 100 pessoas — dessas, apenas três eram gerentes. Hoje são 242 pessoas, incluindo um diretor executivo e dois gerentes seniores, de um total de oito gerentes.

A culpa também é do RH

Ok que a vida mudou e a função exige mais. Mas o acúmulo de trabalho não é culpa apenas do novo papel do RH. É culpa também do profissional, que, muitas vezes, não se dá conta de que seu perfil mudou e, portanto, precisa abrir mão de algumas tarefas. Por isso é saudável que o executivo de RH dedique alguns momentos do dia ao mea culpa e faça uma autorreflexão. “Estou delegando atividades? Treinei um substituto? Estou compartilhando responsabilidades?”, questiona Ana Maria Rossi, presidente da International Stress Management (Isma BR).

Largar o osso, no jargão popular, é fundamental na administração de um novo papel. “Quem sai de cargo operacional para função estratégica costuma ficar com aquele resquício de colocar a mão na massa, pelo menos nos dois ou três primeiros anos”, comenta Barbosa. Jorge Tavares de Almeida, do Grupo Protege, não tem vergonha de se confessar culpado. “Percebi que ainda fazia muita coisa que não era estratégica. Por isso, criei dois níveis de comando abaixo de mim, estou reavaliando o que eu mesmo preciso executar e redistribuindo responsabilidades”, afirma o executivo.

João Marcio Ferreira Ferreira, da GSK, faz coro. “Em 2011 tentei fazer tudo sozinho e vi que não dava. Meu aprendizado foi constatar que o modelo do RH mudou e eu não havia mudado”, diz ele. “Este será o ano de delegar, para que eu possa me dedicar ao que realmente tem que ser feito por mim e para que, delegando, motive o subordinado que pode fazer aquilo até melhor que eu.”

É exatamente essa atitude que a nova função exige. E é também o que a organização espera do principal executivo de RH. Afinal é ele quem deve dar o exemplo para fortalecer o discurso corporativo moderno de que trabalhar é bom, mas com qualidade de vida.

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