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O futuro do RH está no big data

A tecnologia que vasculha dados digitais passa a medir o desempenho profissional e quer revolucionar os critérios de contratação


	Subterrâneo de uma central de servidores do Google nos Estados Unidos: dados dos funcionários analisados 
 (Connie Zhou/Google)

Subterrâneo de uma central de servidores do Google nos Estados Unidos: dados dos funcionários analisados  (Connie Zhou/Google)

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Da Redação

Publicado em 16 de junho de 2014 às 14h07.

Nova York - Um dos pilares do pensamento de Peter Drucker, o pai da moderna teoria da administração de empresas, sempre foi considerar o gerenciamento de um negócio uma arte, e não uma ciência exata. A gestão lida com pessoas, seus valores e suas emoções. A sensibilidade está sempre presente nas decisões que ocorrem em uma empresa.

“Gestores se baseiam em todo o conhecimento das humanidades e das ciências sociais — a psicologia e a filosofia, a economia e a história, as ciências físicas e a ética”, escreveu Drucker. Ao mesmo tempo que empresas ao redor do mundo adotavam os ensinamentos de Drucker, infinitas metodologias e ferramentas de medição e avaliação eram criadas para que as empresas tomassem decisões mais objetivas e certeiras.

No entanto, é seguro afirmar que o estômago ainda é tão importante quanto o cérebro nas decisões corporativas, principalmente quando são sobre pessoas. Basta pensar que alguns processos de seleção preveem até sete entrevistas pessoais ou que muitas empresas criam comitês de gestores para avaliar quem é promovido e quem é demitido. Até hoje, alguma emoção humana sempre foi um ingrediente indispensável. 

Agora isso poderá mudar radicalmente, se você acreditar que a tecnologia é capaz de substituir a experiência e a intuição por uma fórmula matemática que aponta com precisão os melhores candidatos a uma vaga de emprego ou os funcionários com maior potencial de crescimento.

A montanha de dados gerada e coletada na internet, conhecida pela expressão big data, promete transformar para sempre a avaliação de pessoas.

“Esse gigantesco acúmulo de informações significa que as pessoas serão compreendidas em uma nova dimensão: a soma de suas ações, interações e conexões registradas digitalmente”, diz Viktor Mayer-Schönberger, professor da Universidade de Oxford, na Inglaterra, e coautor de Big Data: a Revolution That Will Transform How We Live, Work, and Think (“Big data: uma revolução que vai transformar como vivemos, trabalhamos e pensamos”, em tradução livre, por 19 dólares na Amazon).

Viktor se refere à avalanche de informações registradas em bancos de dados a cada minuto: 2 milhões de consultas no Google, 690 000 novos posts no Facebook, 48 horas de novos vídeos no YouTube, só para ficar nos exemplos mais conhecidos.

O emprego de tecnologias que vasculham essas enormes bases de dados para obter informações sobre o desempenho profissional tem recebido o nome de people analytics, algo como análise de pessoas. Empresas como Google, Coca-Cola e General Motors já usam esse tipo de ferramenta na gestão de pessoas.

O Bank of America opera uma das maiores centrais de atendimento telefônico dos Estados Unidos. As unidades ficam espalhadas pelo país e todas empregam funcionários com o mesmo perfil, que recebem treinamentos padronizados e usam os mesmos sistemas.

Mas havia discrepâncias de desempenho entre diferentes unidades, e o Bank of America chamou uma equipe do Massachusetts Institute of Technology (MIT) para entender o porquê. O Media Lab, do MIT, havia criado um crachá inteligente, equipado com um acelerômetro (para identificar períodos de movimentação), microfones (para medir conversas) e sensores de proximidade (para registrar as interações cara a cara e os deslocamentos).

Com permissão dos funcionários, o MIT mediu o comportamento de 80 atendentes durante cerca de dois meses. Os resultados foram surpreendentes. Os empregados que conversavam mais resolviam os chamados mais rapidamente e tinham índices mais baixos de estresse, um indicador importante nesse tipo de emprego.

Com base nessas informações, o Bank of America passou a permitir que mais funcionários tivessem intervalos ao mesmo tempo, para estimular as conversas informais. O resultado, segundo o banco, foi um ganho de produtividade estimado em 15 milhões de dólares.

“A fofoca melhorou a produtividade”, diz Alexander Pentland, um dos integrantes da equipe do MIT que participou do projeto. Alexander, que fundou a empresa Sociometric Solutions, diz que os crachás inteligentes já foram usados em mais de 20 empresas, por mais de 2 500 funcionários.

De certa forma, a adoção desse tipo de software já ocorre: um novo filão da tecnologia pessoal são os sensores — como na pulseira Nike FuelBand, que mede quanto a pessoa se movimenta por dia. Toda informação coletada é exibida em gráficos na tela do computador ou do celular —, e aí cabe a cada um caminhar mais e cuidar da saúde.

O big data, que agora encontra o RH, traz esse paradoxo da era da informação: os dados estão aí, mas como usá-los? Qual é a melhor maneira de escalar a montanha de dados? As soluções ainda são incipientes.

A Evolv, empresa americana especializada em software de análise de grandes volumes de dados, foi contratada pela Xerox e descobriu que funcionários que fazem parte de uma ou mais — mas não mais de quatro — redes sociais têm menos chances de deixar o emprego e, portanto, diminuem a rotatividade.

Como a Xerox estima que o treinamento de cada funcionário possa custar até 5 000 dólares, o ganho é notável. A Xerox investigou trabalhadores em funções que não exigem criatividade. Se a montanha de dados será útil para prever o desempenho de funcionários de mais alto nível ninguém sabe ainda.

A Knack, empresa do Vale do Silício fundada em 2012, acredita que a resposta pode estar nos videogames. Com a ajuda de psicólogos, a companhia criou jogos que determinam qualidades do jogador. Em um dos games, ele trabalha num restaurante de sushi. É preciso identificar o humor dos clientes pela cara de cada um e entregar os cardápios e a comida em um ambiente cheio e caótico.

Cada instante de hesitação do jogador-garçom é computado pelo software e depois traduzido em uma série de atributos, como disposição para o risco, empatia, nervosismo, e assim por diante. “O que importa não é o placar, mas o comportamento do jogador”, diz Guy Halfteck, fundador da Knack que criou a empresa após passar por um arrastado processo de contratação e, depois de meses, não ter sido contratado.

É pouco provável que currículos e entrevistas de emprego sejam simplesmente substituídos por jogos eletrônicos. E, apesar do rastro digital que deixamos, as implicações da coleta e do uso de informações sobre a privacidade e os direitos individuais são uma questão delicada.

“O problema é que essas medições no ambiente de trabalho são como um vidro espelhado”, disse ao jornal New York Times Marc Rotenberg, diretor do Centro de Informações de Privacidade Eletrônica, organização não governamental que estuda o assunto. “Você não sabe como essas informações são utilizadas.” Usar os computadores para avaliar as pessoas é o futuro — mas saber programá-los para avaliar as coisas certas vai continuar sendo uma arte. 

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