Executivo olha para pilha de papéis: menos inspiração e mais transpiração (Thinkstock/Dieter Meyrl)
Camila Pati
Publicado em 9 de junho de 2016 às 15h13.
São Paulo – “O ano de 2016 tem sido especialmente tenso para as lideranças das empresas com atuação no Brasil”, escreve Daniel Motta, presidente da consultoria BMI, no relatório da pesquisa anual C-Suite que traz os resultados de seis meses de entrevistas com mais de 100 executivos de algumas das principais grandes e médias empresas do Brasil.
Neste contexto de crise, o estudo revela quais são os principais desafios e impactos levados em consideração na maneira como presidentes, VPs, diretores e gerentes tomam suas decisões de negócios e como organizam suas agendas de trabalho. A pesquisa indica também que dia a dia e anseios andam em desarmonia.
Estes são os maiores impactos na hora de decidir sobre os negócios:
Transparência na comunicação
As grandes operações da Polícia Federal de combate à corrupção e o maior controle do governo em relação ao cumprimento das obrigações fiscais das empresas lançam luz para um tradicional calcanhar de Aquiles do mundo corporativo: a comunicação.
“O desconforto causado pelas operações da PF trouxe como consequência a busca por mais transparência e estão todos preocupados com isso”, diz Motta. Segundo a pesquisa, 95% das empresas têm ações específicas de comunicação.
Conflito entre curto e longo prazo
O estudo indica a força do conflito entre curto e longo prazo e mostra que 78% das empresas precisam administrar esse problema, procurando o equilíbrio. Os executivos, explica Motta, enfrentam, com a crise, pressão maior dos acionistas, conselheiros e investidores para que o foco fique nos resultados imediatos.
“O que temos visto são executivos relatando que precisam entregar resultados de curto prazo para ter credibilidade perante conselho de administração e, aí sim, tratar de ações para longo prazo”, diz Motta.
Busca de significado e propósito
Grande parte das organizações já percebeu a importância de significado e propósito na vida dos profissionais e, por isso, comunicação e engajamento são desafios prioritários, segundo os executivos consultados.
“A busca de propósito tem sido um contra movimento importante para segurar o engajamento”, diz Motta. A pesquisa indica que 85% das empresas estimulam essa procura e a principal maneira é atraindo funcionários que tenham valores e propósitos parecidos com os da organização.
Experiência para os clientes
Esse também é um item que ganhou impacto na tomada de decisão dos líderes das empresas consultadas. Segundo o levantamento, 70% das empresas posicionam-se para melhorar as experiências de seus clientes.
Estudar, entender as suas necessidades e reforçar canais de relacionamento são as ações preponderantes nesse sentido. “É interessante notar como a preocupação com a jornada de cliente entra agora no jargão dos presidentes de empresa como alavanca de diferenciação diante da padronização generalizada de qualidade de serviço e tecnologia de produto”, diz Motta.
A agenda dos líderes (na prática)
Tendo em vista os quatro principais desafios identificados pelos líderes, como tem sido organizada a agenda de trabalho? É aí que se vê a dissonância entre o que eles querem fazer e o que estão, de fato, conseguindo.
A pesquisa mostra que a maioria dos executivos quer ser admirada, vista como exemplo para os funcionários. Eles também querem estar próximos da equipe e atuar de forma colaborativa e ainda desejam ser mentores catalisadores das mudanças. Mas, na prática sobra bem pouco tempo para isso.
O estudo divide a atuação dos executivos em liderança em execução (aquela que garante os resultados financeiros para a organização) e em pactuação (voltada para inspiração e engajamento das pessoas).
As ações ligadas à execução estão tomando muito mais tempo e respondem por 67,1% da agenda, enquanto atividades ligadas a promoção de engajamento, inspiração e fortalecimento de vínculos ficam com 32,5%.
O foco no curto prazo tem sido predominante diante de pressões crescentes dos acionistas para entrega de resultados. E isso impõe atenção demasiada na liderança tática, maquinista e feudal, com a mobilização como contraponto visualizando mais o longo prazo, diz o presidente da BMI.
“A distribuição de tempo entre a execução e a pactuação confirma que a aspiração dos executivos não se realiza hoje”, diz Daniel Motta. De acordo com ele, essa gestão mais imediatista é vista como necessária no contexto atual adverso.
Os diferentes papéis exercidos e o peso de cada um deles na agenda explicitam isso. Confira:
1. Papeis de execução
Tático:
Durante 22,5% do tempo, os líderes tomam decisões tempestivas e centralizadas e comandam, com pulso firme, planos de ação. Não há espaço para articulação política nesse papel. “A pressão por resultados é tão grande que presidentes, VPs e diretores estão atuando na linha de frente”, diz Motta.
Maquinista:
O papel de maquinista, ou seja, de tomar para si o protagonismo, determinar rumo, impor ritmo e velocidade aos processos toma 13,4% do tempo dos líderes. Mais um sinal do cenário atual de tensão, segundo Motta. “A liderança está preferindo sentar na locomotiva e conduzir o processo”, diz o presidente da BMI.
Feudal:
O estilo feudal de liderar é, segundo Motta, mais um expediente que tem sido utilizado para garantir os resultados de curto prazo tão cobrados por acionistas e conselheiros. O momento tem obrigado líderes a exercer seu poder por meio do aumento das equipes e do orçamento ainda que isso traga mais carga de tensão e desconfiança.
Tarefeiro:
Mais de 10% da agenda dos líderes (11,1%) está tomada com execução de processos e atividades. Como consequência, esses executivos mantêm a curva de desempenho atrelada ao seu envolvimento direto.
Conquistador:
Mais um papel diretamente relacionado ao curto prazo. A atuação conquistadora tem como objetivo definir ritmo de conquista de espaço com foco central na superação das metas de desempenho e, segundo a pesquisa, é exercida pelos líderes durante 6,7% do tempo.
2. Papeis de pactuação
Mobilizador:
É o papel mais frequente ligado à motivação e inspiração da equipe, um importante contraponto ao excesso de ações relacionadas à execução. A pesquisa indica que 14,6% da agenda é reservada para mobilizar pessoas para a busca da melhor forma de trabalho em conjunto, tendo em vista metas ambiciosas que mantenham a tensão criativa dentro da empresa.
Embaixador:
Propostas de desenvolvimento de longo prazo com metas compartilhadas respondem por 6,7% da agenda dos líderes, segundo o levantamento. Esse papel de “embaixador” é relacionado à promoção de um vínculo longevo de confiança.
Facilitador:
Apesar de a pesquisa indicar que 31% dos executivos entendem que ser um mentor e agente catalisador de mudanças é a forma mais adequada de despertar o melhor dos indivíduos e das equipes, o papel de facilitador é exercido só durante 5,6% do tempo.
Isso significa que uma pequena parcela da agenda é, de fato, dedicada para estimular nas equipes a busca por alternativas, facilitar a tomada de decisão, delegar responsabilidades e monitorar o desempenho. Em vez de delegar, fica claro que os líderes estão colocando a mão na massa e tomando para si a execução das tarefas.
Colaborativo:
Mais uma prova de que, na prática, os executivos não têm tempo para atuarem no que consideram, de fato, importante para um líder. Exercer influência colaborando em uma agenda transparente e demonstrar seu impacto na empresa a partir das relações e conexões são ações que tomam somente 3,4% do tempo.
Orquestrador:
É o papel de liderança que recebe a menor dedicação, confessaram os executivos entrevistados pela BMI. Eles passam somente 2,2% do tempo buscando o máximo potencial de cada pessoa e, assim, dar mais autonomia às equipes para atuar com desempenho coletivo e meritocracia individual.