Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 09h33.
São Paulo é o lugar onde o Brasil acontece primeiro. É a cidade onde o dinheiro circula mais rápido, as oportunidades de consumo se multiplicam, a vanguarda do mercado de trabalho toma forma -- e os profissionais ganham perspectiva. Numa ponta, exibe uma atividade industrial, que, embora tenha perdido algum fôlego, ainda representa um pedaço generoso da contribuição do estado ao PIB brasileiro. Na outra, alavanca o efervescente mercado nacional dos serviços sofisticados. Em oportunidades de emprego, há um paradoxo: as portas estão abertas tanto para o operário como para o especialista mais qualificado. É essa São Paulo, que abriga 10,4 milhões de pessoas, concentra 70% dos bancos nacionais e quase 100% dos estrangeiros, e tem mais de 200000 estabelecimentos em funcionamento, a melhor cidade brasileira para fazer carreira.
Eis o resultado da pesquisa "As 100 Melhores Cidades para Fazer Carreira", encomendada por VOCÊ s.a. à Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape), da Fundação Getulio Vargas. Pela primeira vez, o que já era percebido como unanimidade de norte a sul do país ganha ecos científicos. No topo do ranking, a confirmação de São Paulo, em dobradinha com a eterna rival Rio de Janeiro, segunda colocada. A capital paulista alcançou a marca final de 143,5 pontos (veja mais sobre a metodologia na página seguinte) -- seis a mais que a carioca, 12 em relação à mineira e 31 sobre a capital capixaba. Pela ordem, figuram entre as dez mais São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Recife, Goiânia, Niterói, Brasília e Vitória.
Algumas cidades, como Porto Alegre e Curitiba, conjugam oportunidades para quem tem boa formação com qualidade de vida diferenciada. Outras, como Recife e Belo Horizonte, perdem pontos neste último quesito, mas ganham disparado quando o assunto é tecnologia -- e integração entre os negócios e o mundo acadêmico. Brasília desponta como um centro de serviços muito bem localizado, fazendo fronteira com Goiânia, o lugar da hora para quem entende de saúde. Já as praianas Niterói e Vitória colhem benefícios que vêm do mar: a primeira destaca-se na indústria de exploração de petróleo; a segunda tira partido de seu porto e surge como celeiro adequado para quem quer crescer na área de comércio internacional. Em comum, elas têm portas abertas para profissionais que buscam desafios. "Quem está pensando em sair do eixo Rio-São Paulo, no entanto, deve analisar como a mudança vai mexer com seu planejamento de carreira, pesquisar bem o mercado local e só mudar com uma oferta na mão", recomenda Gladys Zrncevich, sócia da Korn/Ferry. "Não vale a pena mudar de mãos abanando, porque as empresas costumam preferir a mão-de-obra local."
O xis da questão
A diferença entre São Paulo e as outras capitais citadas é a escala. Essa megacidade detém um quinto da massa de salários e um quarto dos depósitos bancários à vista do Brasil. O estado de São Paulo gera um terço do PIB. Cerca de 10% desse montante é relativo à atividade econômica da capital. Estão em seus limites os mais renomados centros de excelência em pesquisa e desenvolvimento brasileiros (são 102 instituições de ensino superior, sendo quatro públicas), a sede das maiores empresas multinacionais, os melhores cursos de MBA (dos 33 pesquisados pelo Guia VOCÊ s.a. - Os Melhores MBAs no Brasil 2001, 40% estão na cidade), os melhores salários e as vagas do topo. "São Paulo concentra, no mínimo, 80% das posições para executivos", afirma Carlos Diz, headhunter da Spencer Stuart. O paulistano Julio César Felipe, de 37 anos, vice-presidente comercial da seguradora canadense Canada Life conhece essa realidade. No cargo desde agosto de 2001, ele recusou a oferta para trabalhar na matriz, no Rio de Janeiro. "Construí meu networking em São Paulo, daqui falo com o país inteiro e aumento minhas chances de negociar com o mundo -- para que mudar?" Felipe usou esse argumento e demoveu os canadenses da idéia da transferência. Hoje, usa a ponte aérea para visitar clientes, mas só tem a obrigação de aparecer no escritório carioca uma vez por semana. "Lá, eles têm o Pão de Açúcar. Aqui, eu tenho o Ibirapuera e uma grande perspectiva de crescimento."
Como uma cidade com 20% de desemprego e mais de 600 favelas pode ser a melhor para fazer carreira? Com a palavra, o especialista: "O desemprego é alto em quase todas as cidades do ranking", diz Moisés Balassiano, professor responsável pelo levantamento. "Mas ele é menos reflexo de uma economia pouco dinâmica e mais da modernização dos processos e de uma transformação na demanda ocupacional." As atividades mais representativas da capital paulista espelham essa mudança. Segundo dados da Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados), o primeiro mercado do município em termos de valor adicionado (a contribuição do setor para o PIB municipal) é, hoje, o da indústria de impressão, edição e reprodução de gravações. Ou seja, grupos de comunicação, editoras de livros e produtoras de CDs. Essa atividade emprega formalmente 64 000 pessoas e responde por um valor adicionado de 3,3 bilhões de reais. "A principal atividade da capital paulista tem a ver com informação, com a disseminação do conhecimento", diz Miguel Matteo, analista do Seade. Traduzindo: o resto do país se informa a partir de São Paulo. A segunda atividade industrial mais dinâmica na capital é a química, especialmente o ramo farmacêutico. Aparecem com fôlego, ainda, os setores de máquinas e equipamentos e vestuário e acessórios.
Círculo virtuoso
A atividade industrial na capital, como se vê, ainda é grande. "E é exatamente ela que alimenta o setor de serviços", diz Miguel Matteo. "Aliás, mais da metade da população ocupada do município trabalha aí." Isso nem de longe significa que a indústria deixou de ser um bom lugar para fazer carreira em São Paulo. "Ela gera menos emprego que no passado, mas a boa notícia para o profissional qualificado é que o nível das vagas ofertadas deu um passo à frente", diz Paula Montagner, gerente de análise e estudos especiais do Seade. Que perfil profissional tem mais chances? Segundo a Thomas International, consultoria de RH, os executivos de São Paulo são verdadeiros vendedores de idéias. São ágeis, competitivos, altamente especializados e acreditam que o resultado é conseqüência do conhecimento e dos relacionamentos. Como reflexo desse foco ajustado, quem está em São Paulo tem um salário em média 25% mais alto que o de outras capitais. O que falta, então? Vagas para o nível intermediário.
Sinônimo de competitividade, a capital paulista é palco de um saudável círculo virtuoso. As possibilidades de carreira em serviços (especialmente na alta gastronomia, na administração de shopping centers e na hotelaria) aumentam na esteira da atividade industrial. Feiras, convenções e exposições, por exemplo, crescem ao ritmo de 7% ao ano, há dez anos. Por outro lado, tal grau de complexidade atrai para o município cada vez mais empresas que precisam de serviços sofisticados como suporte. Assim como o número de migrantes que chega continua alto (mais de 1 milhão de pessoas por ano, vindas principalmente da Bahia e de Minas Gerais), o número de companhias dispostas a encarar o ritmo corrido do município também é expressivo.
Veja o exemplo da gigante Andrade Gutierrez. Em abril de 2001, a empresa transferiu suas operações para São Paulo depois de 53 anos em Belo Horizonte. "Queríamos ficar mais perto de nossos clientes, parceiros e concorrentes", diz Pedro Ricco, diretor de RH e comunicação, ele próprio um paulistano que retorna à cidade depois de 40 anos. "É uma mudança marcante e já percebemos que, embora tenhamos reduzido o quadro em 40%, a produtividade aumentou." Ana Paula Farmento de Freitas, engenheira civil, de 31 anos, foi um dos 200 profissionais convidados a migrar. Ela e o marido, também engenheiro, mudaram pensando em tirar proveito de um mercado mais dinâmico. Ana entrou como estagiária e tem dez anos de casa. Desde que chegou a São Paulo recebeu aumento de salário e promoção (saiba o que negociar na hora de uma transferência na página 76). Na capital paulista, ela também concluiu um MBA em finanças iniciado no Ibmec mineiro. "Fiquei impressionada com o nível de maturidade profissional da turma", diz. A carreira de Ana, ao que parece, vai ter vida longa na paulicéia. Agora, ela é parte ativa da cidade que gera as decisões e as informações para o resto do país.