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VOZES: O que faremos com as mulheres não eleitas?

A derrota eleitoral não é responsabilidade individual e da equipe, mas de um contexto político ainda muito desfavorável para candidaturas femininas

O pós-eleição é a hora de avaliar erros e acertos, dividindo responsabilidades com o partido (Ueslei Marcelino/Reuters)
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Bússola

Publicado em 11 de outubro de 2022 às 19h30.

O primeiro turno das eleições se encerrou e, com ele, diversas candidatas se viram numa linha de chegada que não gostariam: a perda na disputa. E aí, tem muita gente falando sobre a nova configuração do Congresso Nacional, a nova bancada feminina, as eleitas para as Assembléias Estaduais etc… porém, tão importante quanto tudo isso é: o que faremos com aquelas mulheres que não foram eleitas? Quem está acolhendo essas mulheres? Certificando-se de que estão bem?

As mulheres eleitas terão os próximos meses do ano para planejar seus mandatos e, claro, iniciar um preparo psicológico para os desafios que virão. Afinal, sabemos que os custos de ser uma mulher com uma carreira pública são muito maiores. A vida privada dessas mulheres, seus corpos, suas características físicas e comportamentais, serão literalmente dissecadas pela opinião pública nos próximos anos de trabalho. É necessária muita resiliência para ver mais “manchetes” sobre a sua vida pessoal do que sobre o seu trabalho duro. Precisamos cuidar dessas mulheres eleitas e ajudá-las a mostrar o que realmente importa ao debate público: a atuação política de seus mandatos.

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Porém, seus mandatos ainda vão começar e tem um outro grupo de mulheres que merece muito a nossa atenção agora: as mulheres que não se elegeram.

Muitas vitórias eleitorais só chegam após algumas tentativas não vitoriosas. Os casos de mulheres eleitas “de primeira” – ou seja, numa primeira candidatura – costumam ser exceção e costumam combinar dois fatores: forte apoio político de grandes figuras partidárias e/ou altos valores de financiamento para a campanha. Portanto, gostaria de falar com você, mulher que se candidatou, não venceu, mas também não teve recursos suficientes para fazer a campanha ser competitiva, ou orientações práticas sobre como fazer uma campanha eleitoral, ou um apoio político explícito e consistente de figuras partidárias populares na sua cidade/estado.

A primeira coisa que gostaria de falar é: fique tranquila, pois você fez o melhor que pôde num cenário que estava desfavorável para sua candidatura. A segunda coisa é: sua candidatura não foi em vão, ela foi importante e sua presença na política ainda é importante. Nós ainda precisamos de você.

Para trazermos mais mulheres para a política não basta apenas fazer campanhas na internet com frases do tipo “lugar de mulher é onde ela quiser”, é necessário encarar de frente os desafios para isso: a viabilização real das candidaturas com financiamento e apoio político apropriados. O que vemos, na realidade, é um esforço ainda muito tímido dos partidos em investirem nas candidaturas de mulheres. Além de uma conivência do Poder Legislativo e Judiciário em relação ao descumprimento das regras eleitorais que visam ampliar a participação das mulheres na política.

Em abril de 2022, o Congresso Nacional promulgou uma PEC que anistiou os partidos que não tinham cumprido com a cota de 30% de candidaturas de mulheres ou que não destinaram recursos suficientes para essas candidaturas nas últimas eleições. Em maio, o TSE autorizou que os recursos provenientes para investimento na participação de mulheres - que não foram utilizados pelos partidos - pudessem ser remanejados para as eleições deste ano.

O que ouço, muitas vezes, é o seguinte argumento: “leva tempo para o partido conseguir formar lideranças femininas competitivas”. Sim, leva tempo. A primeira lei de cotas é de quando, mesmo? 1997! Ou seja, há mais de 25 anos estamos falando para os partidos que é necessário investir em candidaturas de mulheres. Desde 2009, eles são obrigados a lançar um percentual mínimo de candidaturas femininas. Desde 2019, eles são obrigados a repassar 30% do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para as mulheres. Estamos em 2022, e eles seguem anistiados por não cumprirem uma coisa, nem outra.

Portanto, volto a falar com as mulheres que não foram eleitas este ano: se a sua campanha não recebeu a atenção e o apoio devido, é tempo de começar a refletir sobre o que chegou e o que faltou, tanto do seu partido, quanto das principais lideranças políticas dele. A derrota eleitoral não é uma responsabilidade exclusivamente sua e de sua equipe. Estamos imersas em um contexto político que ainda é muito desfavorável para candidaturas femininas.

Avalie sua campanha, seus erros e acertos, mas divida essa responsabilidade com seu partido. Pois não é “de hoje” que os partidos sabem que precisam se mexer e investir de verdade em candidaturas de mulheres. Do nosso lado, da sociedade civil organizada, seguiremos cobrando o cumprimento das leis e a ampliação de direitos! A democracia só é concreta quando houver diversidade nos espaços de poder.

*Letícia Medeiros é cofundadora da ONG Elas No Poder

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