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Edson Vismona: Tributação seletiva

A aprovação do texto base da reforma tributária irá gerar muitas expectativas e pontos a serem regulamentados

Com a aprovação, surgem novas dúvidas (GettyImages/Getty Images)
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Publicado em 18 de julho de 2023 às 12h00.

Por Edson Vismona*

Ano da graça de 2023, a Câmara Federal aprova o texto base da reforma tributária , de há muito aguardada e necessária, em consecutivos e imediatos dois turnos, definindo profundas mudanças no sistema tributário nacional.

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Com a aprovação, foi ressaltado o consenso: racionalização do sistema tributário; simplificação; não cumulatividade; incidência no destino, com benefícios à população de baixa renda e que não haverá o aumento da carga tributária.

O resultado imediato é a geração de muitas expectativas, com inúmeros pontos importantes que ainda deverão ser regulamentados e com um largo prazo para a extinção do modelo vigente, a segurança jurídica é uma meta que ainda levará tempo para ser conquistada. Com esse panorama, caberá ao Senado Federal aperfeiçoar o texto final.

Mas, além do consenso, temos que definir os detalhes que são fundamentais, alguns exemplos: a fixação da alíquota padrão e, portanto, qual será o custo para os contribuintes; a estruturação do Conselho Federativo; como será a compensação e a distribuição de fundos para estados e municípios; quais setores produtivos serão beneficiados na cesta básica; as inúmeras exceções que terão alíquota reduzida ou zerada e a identificação dos setores que serão afetados pelo imposto seletivo.

Nesse último tópico, é importante o alerta: os cigarros e bebidas alcoólicas estão sendo mencionados para a seletividade, mas deve ser ressaltado que são os mais atacados pelo mercado ilegal, pois, já sendo altamente taxados, quem não paga nada, ignorando qualquer imposto, tem uma margem elevada de lucro atraindo o contrabando e a falsificação que financiam as organizações criminosas e as milícias.

Assim, caso sejam, pela seletividade, eventualmente majorados os impostos hoje incidentes, a ilegalidade será diretamente favorecida, uma vez que seus preços serão ainda mais competitivos em comparação com a indústria e comércio que arcam com todos os impostos.

Pelo levantamento anual realizado pelo Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade - FNCP, no ano passado, somente esses setores tiveram perdas para o mercado ilegal de R$ 83 bilhões com uma igualmente bilionária perda de arrecadação pelo erário.

Também foi lançada a ideia que os combustíveis fósseis poderiam ser inseridos nesse rol da seletividade e, igualmente, teremos o incentivo da ilegalidade, via sonegação, fraudes de qualidade e quantidade já existentes. O setor de combustíveis, por esse mesmo levantamento do FNCP, perdeu R$ 29 bilhões no ano passado para a ilegalidade. Portanto, além do incremento da evasão fiscal, também temos que salientar o efeito inflacionário que será causado por eventual aumento via imposto seletivo com impacto nos preços finais aos consumidores.

Em verdade, a lógica do imposto seletivo é, via impostos elevados , conter o consumo. Está provado que essa meta para os produtos mencionados - já altamente onerados e que sofrem com a ilegalidade - não será alcançada, o que irá ocorrer será o aumento de consumo de produtos ilegais, elevando a sonegação. Há anos, após a última elevação da carga tributária de cigarros ocorrida em 2015, o ilegal passou de 30% para 57% do mercado em 2019, e fizemos o alerta: O imposto cresce, o crime agradece. Vale ressaltar que a Organização Mundial da Saúde aponta que o eventual aumento de impostos deve considerar a ameaça representada pelo estímulo da inserção do ilegal no mercado. Com o desequilíbrio tributário o contrabando é imediatamente beneficiado.

Essa atenção deve ser considerada, a seletividade não pode significar aumento da carga tributária hoje incidente. A trava proposta na reforma tributária aprovada, que impede o aumento da carga tributária vigente, deve ser validada.

Importante que na discussão para a regulamentação final sejam considerados esses aspectos que merecem toda a consideração, pois o risco de incentivar a ilegalidade e a criminalidade são concretos. Aliás, eméritos tributaristas têm alertado para muitas outras questões relevantes e, longe de serem considerados inimigos da pátria, deveriam ser escutados, pois a reforma tributária é extremamente importante para o destino econômico e social no nosso país, merecendo o aprofundamento e a contribuição ampla de toda sociedade, avaliando as possíveis discordâncias.

Esse temor concreto do aumento da participação do mercado ilegal invoca a premência de ser aprovado o Projeto de Lei do Senado Federal, 164/22, que enfrenta a prática do denominado devedor contumaz, que se estrutura para, dolosamente, não pagar impostos, este também será incentivado caso haja o aumento de impostos, especialmente para os setores de tabaco e combustíveis.

Uma demonstração da necessidade de se avaliar profundamente as consequências de medidas tributárias foi a adoção da seletividade inversa, para aumentar o consumo, no caso, do produto importado, com a edição da portaria do Ministério da Fazenda oficializando a isenção de impostos de importação, via e – commerce, com valor menor que US$ 50,00, em total prejuízo da indústria nacional. Esta inovação brasileira é incompreensível, afronta a necessária isonomia, prejudicando os varejistas, a indústria em favor do importador.

A seletividade em ambas as situações irá diminuir o consumo de produtos legais e produzidos internamente e aumentará a participação, de um lado do contrabando e, de outro, do importado, ocasionando a perda da arrecadação e o desequilíbrio concorrencial.

Essas constatações demonstram que todo o arcabouço tributário é muito sensível e requer uma avaliação apurada, detalhada, cuidadosa, preservando a equidade, pois o que pode parecer ser adequado, pode revelar um efeito totalmente contrário, um grande erro, causando efeitos deletérios, afastando qualquer benefício, afetando a produtividade e a arrecadação.

*Edson Vismona é advogado, presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial - ETCO e do Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade; Foi secretário da justiça e defesa da cidadania do Estado de São Paulo.

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