Presidente Jair Bolsonaro (Isac Nóbrega/PR/Divulgação)
André Martins
Publicado em 26 de novembro de 2020 às 16h00.
Última atualização em 26 de novembro de 2020 às 18h07.
O impacto de uma segunda onda da pandemia, agora sem o auxílio emergencial turbinado de R$ 600, o desgaste natural do governo, um cenário internacional adverso e o desafio da recuperação da economia demonstram que, para obter sucesso no governo, o presidente Jair Bolsonaro precisa construir uma grande e real good news para atravessar 2021 e chegar forte junto ao eleitorado na disputa pela reeleição em 2022.
Não serão as fake news correndo por listas de WhatsApp a razão central do eleitor para escolher alguém para comandar o país daqui a dois anos. Para Bolsonaro, o conjunto da obra terá peso. A eleição municipal apresenta alguns indicadores nesse sentido: foram favorecidos os gestores que entregaram resultados, antes e durante a pandemia de coronavírus. A experiência política e o trabalho com a máquina pública, quando bem feitos, estão sendo valorizados na urna.
Depois de passar o primeiro ano se acomodando ao governo, Bolsonaro teve o desafio de enfrentar a pandemia da Covid-19. O governo fez muito em várias áreas, mas no setor mais sensível não conseguiu se aproximar da população. A saúde ficou sendo um flanco aberto pela falta de empatia e pela escolha do presidente de privilegiar a economia, esta sim uma área onde o dinheiro jorrou para as classes baixas e para os empresários. O resultado é uma queda muito menor no Produto Interno Bruto (PIB) do que se previa. Mas o déficit, que estava estimado na casa dos R$ 100 bilhões, pode superar R$ 900 bilhões no fim deste ano. É conta para o contribuinte pagar por muitos anos…
Se a economia foi o colchão de ar que amorteceu o PIB e até funcionou para jogar a popularidade presidencial para o alto, agora se torna o grande desafio. Um desafio real: retomada sustentável do crescimento. Há inflação nas gôndolas de alimentação dos mercados. Há o risco fiscal. Há também o temor de setores produtivos com as limitações que a continuidade da pandemia pode causar, principalmente, nos serviços, até agora o setor mais afetado pelo isolamento. Há uma sucessão pouco clara no comando do Congresso Nacional, com direito a ameaças de jogadas de irresponsabilidade constitucional do próximo STF. E há o fator humano, sempre ele…
Os adversários e inimigos desse governo estão a espreitar, ameaçam unir suas desuniões mas, por enquanto, sequer se sentam à mesma mesa. Esse é um governo que tem inimigos, note-se. Mas também há aliados e colaboradores, alguns deles armados, com uma pontaria certeira para atirar no… próprio pé, ou no pé presidencial.
Dono de uma metralhadora verbal de fazer inveja à Lurdinha de Tenório Cavalvanti, o ministro da Economia Paulo Guedes apontou sua mira para o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Para alívio do mercado, era bala de festim… mas causa estranheza enorme só o fato do cano ter se voltando para o responsável pela política monetária, que havia declarado uma platitude de anestesiar narrador de partida de xadrez.
Sabe-se da pressão sobre o ex-posto Ipiranga, que estatizado passou a servir combustível da antiga petrossauro. Os desafios impostos são manter o teto de gastos, conseguir aprovar reformas estruturantes (administrativa, tributária, PEC Emergencial etc.), e encontrar receita para fazer girar o turbo de algum programa social que faça sorrir o homem de chinelos que mora no Palácio da Alvorada. Melhor deixar as privatizações fora dessa lista, porque não se sabe ainda como andam as negociações da Câmara dos Deputados sobre o tema. Dependendo dos acordos para eleger o próprio presidente, algumas podem ficar para as calendas de 2023…
Toda a lista de Guedes terá peso sobre a popularidade de Bolsonaro. As reformas melhoram os índices na Faria Lima. O programa social no sertão nordestino. Conciliar os dois e encontrar um mínimo denominador comum exigirá cálculo matemático e político. Se o governo conseguir, produzirá uma boa notícia. Real news, good news.
Note-se que, a partir do próximo ano, mesmo que as oposições não estejam à mesma mesa conversando, poderão marcar encontros no painel do plenário da Câmara dos Deputados e do Senado Federal para derrotar o Planalto. A campanha para 2022 começa a entrar cada vez mais no radar e nas contas de perdas e ganhos dos partidos. Certa colaboração e boa vontade tendem a diminuir entre os parlamentares, cuja permanência na arena política também passa a ser prioridade depois de superada a metade do mandato. Ou eles ganham no jogo de se associar às boas notícias, ou vão criar outras narrativas para se buscar a sorte em outra freguesia. E não haverá fake news que os segure, nem as balas de festim da metralhadora de Guedes.
* Analista Político da FSB
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