Acorda, Pedrinho: 7 de setembro 1822 foi Independência para quem
Um país independente precisa ter a totalidade de seu povo também independente e sendo tratado com dignidade, igualdade e equidade
Bússola
Publicado em 7 de setembro de 2022 às 16h15.
Por Jaime Almeida*
Não resta dúvida que foi importante deixar de ser colônia explorada e de ter nossas riquezas saqueadas. Colônia explorada por quem disse ter descoberto o que não estava perdido, já que os povos originários já estavam vivendo aqui fazia muito. E afinal de contas, 200 anos atrás houve a independência de quem? Da pequena fatia da população que vivia os privilégios à custa da exploração dos indígenas que perderam os direitos sobre sua independência e liberdade quando da chegada dos navegadores portugueses por aqui?
Independência de quem crescia seus negócios às custas do trabalho das pessoas negras escravizadas? Como celebrar a data em que supostamente foi dado o grito de independência apenas para alguns, enquanto outros muitos seguiram acorrentados e gritando pela dor dos tantos abusos que sofriam?
Isso não parece, nem de longe, em nada com tradução de independência. Parece mais com a primeira aplicação do tal “jeitinho brasileiro”, que um grupo deu para construir poder independente de sua própria política exploradora, que perdura até os dias atuais.
Ainda hoje, temos milhões de pessoas brasileiras que padecem para ter alimento na mesa para suas famílias. Quantos não fervem ossos com restos de carne retirados de lixões para garantir a sopa com o mínimo de proteína que permite que um corpo humano possa subsistir? O dia do feriado poderia ser de reflexão sobre como incluir e dar acesso aos milhões de pessoas que ainda aguardam para serem incluídas na Independência do Brasil.
Que independência se comemora em tempos em que as mulheres que somam mais da metade da população brasileira, ainda são violentadas nas mais diferentes formas e intensidades, vítimas diárias do feminicídio?
Que Independência podemos comemorar em tempos em que pessoas negras, também maioria da população nacional, não têm representatividade nas empresas e, consequentemente, em nenhum espaço de privilégio financeiro ou poder? Podemos falar de ter o que celebrar se as pessoas brasileiras ainda não são independentes nem ao menos para viver sua afetividade lgbtqiap+? O que dizer da independência que não têm as pessoas com deficiências? É preciso acessibilidade e adaptação nos espaços públicos, nas empresas para se viver dignamente.
Em 1822 a expectativa de vida das pessoas era de 25 anos de idade. Hoje a população que chegou aos 50 anos tem pela frente a expectativa de, pelo menos, mais um terço de vida. Mas para as pessoas nessa faixa etária que perdem o emprego, elas passam a ter sua independência ameaçada ao passo que não há mais portas abertas nas empresas. Daí para frente, nem em 7 de setembro, tampouco em qualquer dia do ano, elas encontram espaço para seguirem ativas e produtivamente trabalhando.
Acorda, Pedrinho! Apesar de carregar a pompa do nome de “Dom Pedro”, hoje não terá o campeonato como dito na música do momento. E nem venha para dançar conosco, porque seu grito não foi de garganta forte, pareceu mais um grito que não ecoou o suficiente para trazer independência para toda a nação.
7 de setembro de 1822: temos inclusão para, realmente, comemorar essa data? Importante lembrar que somente em 1888 começou a abolição da escravidão, que não terminou até hoje.
Não dá para acreditar que foi só a partir de 1932 que as mulheres brasileiras começaram a ter direito ao voto. E às vésperas de período eleitoral em nosso país, em pleno 2022, vamos esperar para o espaço que as mulheres - em especial a mulher negra, terão na próxima formação de ministérios, de secretarias estaduais, independente de quem sejam os novos governantes.
Um país independente precisa ter a totalidade de seu povo também independente e sendo tratado com dignidade, igualdade e equidade. 7 de setembro de 1822 foi dia da Independência sem Diversidade.
*Jaime Almeida é sócio e diretor de Diversidade e Inclusão da Fesa Group
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