SP estima 11 anos só para recuperar nível de aprendizagem em Matemática
Estudantes do 5.º ano da rede estadual perderam habilidades que já haviam adquirido. Hoje, um aluno de 10 anos de idade tem desempenho pior do que ele tinha aos 8
Estadão Conteúdo
Publicado em 28 de abril de 2021 às 14h45.
O governo de São Paulo estima que levará 11 anos para recuperar a aprendizagem perdida em Matemática durante a pandemia nos anos iniciais do ensino fundamental. Estudantes do 5.º ano da rede estadual perderam habilidades que já haviam adquirido. Hoje, um aluno de 10 anos de idade tem desempenho pior do que ele tinha aos 8.
Os dados foram divulgados ontem pelo secretário da Educação, Rossieli Soares, a partir de um estudo feito com alunos da rede estadual. Para especialistas, os números de São Paulo sugerem prejuízos ainda maiores em outros Estados. Em todo o País, colégios foram fechados em março de 2020 para conter a disseminação do coronavírus. Na rede estadual paulista, houve reabertura em setembro, com baixa presença de alunos.
Neste ano, as aulas presenciais voltaram em fevereiro em São Paulo e um mês depois foram suspensas. O novo retorno ocorreu há duas semanas e enfrenta resistência de professores, que temem contaminação.
Segundo o estudo, a perda de aprendizagem é maior em Matemática e mais evidente no início do ensino fundamental, com alunos mais novos. "Além de não aprender novas coisas, o aluno não consolidou o que tinha aprendido", diz Rossieli. Estudantes do 5.º e 9.º ano do ensino fundamental e do 3.º ano do ensino médio foram avaliados no início deste ano por uma prova semelhante a um teste federal, o Saeb, feito anualmente.
Os alunos do 5.º ano obtiveram nota média de 196 pontos em Matemática na avaliação de agora - em 2019, o desempenho do 5.º ano no Saeb era de 243 pontos. Para manter os mesmos índices de 2019 em Matemática, os alunos do 5.º ano teriam, portanto, de subir 46 pontos. Nas últimas edições do Saeb, porém, subiram só 4 pontos por ano, o que levou a Secretaria da Educação a estimar que seriam necessários 11 anos para a rede estadual recuperar os indicadores de aprendizagem nos anos iniciais em Matemática.
"No 5.º ano, com esse resultado de Matemática, os alunos sabem resolver problemas muito elementares de adição e subtração, não sabem multiplicação e divisão, não sabem ler um gráfico nem dados em tabela, habilidades básicas e essenciais, importantes para prosseguir", diz Lina Kátia, coordenadora do Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (Caed), ligado à Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
A avaliação para medir impactos da pandemia foi aplicada pela Secretaria da Educação em parceria com o Caed. As provas, com questões de Matemática e Língua Portuguesa, foram realizadas no início do ano. Fizeram os testes cerca de 21 mil alunos.
Em Língua Portuguesa, o 5.º ano obteve 194 pontos no teste. Em 2019, o resultado do Saeb para esta série era de 223 pontos. O nível de aprendizagem que os alunos têm hoje equivale ao que a rede estadual registrava 10 anos atrás. No 9.º ano do fundamental e no 3.º ano do médio, também há prejuízos, tanto em Português como em Matemática, mas em escala menor. Uma das hipóteses é que alunos mais velhos têm mais autonomia para estudar em casa.
O governo paulista também comparou o desempenho de alunos do 5.º ano com os resultados de uma prova estadual, o Saresp, aplicada quando os mesmos estudantes estavam no 3.º ano. Os resultados indicam que após 15 meses os alunos têm nível de proficiência apenas levemente superior em Português e menor em Matemática. Em Matemática, um estudante do 3.º ano que fez 212 pontos no Saresp hoje tem nota 196, apesar de já estar no 5.º ano. Rossieli qualificou os retrocessos na Educação como uma "catástrofe". Para ele, os estudantes podem levar as dificuldades em Matemática até o fim do médio.
Para Emily, de 10 anos, aluna de uma escola estadual na capital, não houve avanço na pandemia. No 5.º ano, ela mal sabe ler e escrever e não sabe fazer contas - só pelo celular. A menina já tinha dificuldades antes da pandemia e, com as aulas remotas, os problemas se agravaram. "Em casa não tem internet. Eles falam que vão colocar os pais em um grupo para passar atividades para fazer em casa, mas estou esperando faz tempo", diz a mãe, Fabiana Rossi, de 30 anos. Ela também diz que faltam atividades de recuperação e atendimento psicológico. A menina voltou a ter aulas presenciais, mas vai apenas uma vez por semana - a escola só pode receber 35% dos alunos.
Rossieli reforçou a necessidade de que escolas continuem abertas. Segundo a pasta, 2.261 professores atuam com recuperação e mais 10 mil docentes ainda podem ser contratados. Na rede privada paulista, também há perdas, segundo Arthur Fonseca Filho, diretor da Associação Brasileira de Escolas Particulares (Abepar), porque o ensino "exige atividade presencial".
O cenário atestado em São Paulo pode ser pior em outros Estados que ainda nem mediram o desempenho de alunos. "A Secretaria de São Paulo conseguiu estruturar uma resposta, errando, refazendo, melhorando. Se esses resultados aconteceram em São Paulo, que teve uma das melhores reações do País, o que dá para projetar para o resto do Brasil é uma situação muito mais crítica", diz Priscila Cruz, presidente executiva do movimento Todos pela Educação. Apesar da urgência de ações na área, especialistas veem omissão do Ministério da Educação em projetos para garantir a volta segura às escolas e redução das defasagens.
Segundo Priscila, a recuperação demanda investimentos em formação docente, revisão do calendário escolar e currículo, além de reformas físicas em escolas para que o retorno seja seguro. "Também é muito importante envolver os professores, em uma conversa aberta, desarmada. Colocá-los como parte da solução", diz.
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