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Serraglio: não contem comigo

O ex-ministro da Justiça, Osmar Serraglio, causou problemas para o governo até na hora de deixar o cargo

OSMAR SERRAGLIO: o peemedebista voltará à Câmara após recusar o convite de Michel Temer para assumir o Ministério da Transparência / Ana Araújo/VEJA
GK

Gian Kojikovski

Publicado em 30 de maio de 2017 às 15h50.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h08.

Não foram poucos os problemas em torno de Osmar Serraglio (PMDB-PR) nos três meses em que ele permaneceu como ministro da Justiça. Para completar o ciclo, ao ser comunicado de sua demissão, em uma troca de cargos com o ministro da Transparência, Torquato Jardim, Serraglio decidiu criar mais um. Recusou, nesta terça-feira, a oferta para assumir o ministério deixado por Jardim e passou mais um atestado público de que o governo está com os ânimos à flor da pele.

Ao recusar o novo ministério, Serraglio, que é deputado federal, retorna para a Câmara, e com isso, por ora, retira o foro privilegiado de Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), o suplente que foi pego pela Polícia Federal correndo com uma mala com 500.000 reais em propina. Loures era assessor especial da presidência da República e um dos homens mais próximos de Michel Temer dentro do Planalto. Assim, Loures passará a ser investigado pela primeira instância e fica mais próximo da prisão, que já havia sido pedida pela Procuradoria-Geral da República, mas negada pelo Supremo Tribunal Federal. Prender um deputado, afinal, só em casos flagrantes.

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Isso não quer dizer que o inquérito que Loures responde no Supremo será enviado para a primeira instância. Isso só aconteceria se a corte decidisse desmembrá-lo, já que o presidente também é investigado. Se a intenção do governo for manter Loures com foro – e livrá-lo de um julgamento mais rápido –, ainda existem diversas alternativas. Qualquer indicação de um deputado da coligação peemedebista do Paraná a outro cargo reabre uma vaga para Loures na Câmara. De acordo com a revista VEJA, o ex-assessor de Temer estaria negociando delação premiada, e isso só deve ser acelerado se ele realmente sair da jurisprudência do Supremo.

Serraglio já era conhecido como o ministro mais isolado do governo, algo que contrastava com o peso de sua pasta, ainda mais em tempos de Lava-Jato. Ao ministério da Justiça cabe comandar, por exemplo, a Polícia Federal, que fez as ações controladas que filmaram o suplente do ministro, o deputado Loures, com a fatídica mala com 500.000 reais de um executivo da JBS. Foi o próprio presidente Michel Temer quem dissepara Joesley Batista, do J&F, procurar Loures para tratar de qualquer assunto. Não era de se esperar – pelo menos em tese – que Serraglio tivesse ingerência sobre a PF a ponto de parar operações, mas o governo e seus aliados ficaram irritados ao ter sido pegos em completa surpresa. Em um áudio que já ficou famoso, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), entre palavrões impublicáveis, defendeu sua troca por alguém forte para “mexer” na Polícia Federal.

Outra prova do isolamento de Serraglio é o fato de ele não ter sido chamado para as reuniões pessoais que decidiram o futuro de Temer, no gabinete presidencial, após o vazamento da delação da J&F. Mais do que isso, no dia 24, dos protestos que pararam Brasília, quando o presidente decidiu colocar o exército na rua, o ministro da Justiça sequer estava na sala. Ajudaram Temer na decisão Sérgio Etchegoyen, de Segurança Institucional, e Raul Jungmann, da Defesa.

Nem mesmo deputados estavam prestigiando o ministro. No evento que marcou um ano de Temer na presidência, enquanto outros ministros eram cercados por parlamentares em uma sala reservada no Planalto, Serraglio ficou sentado, sem conversar com ninguém – na política, um grande sinal de desprestígio.

Ainda assim, por que, se perguntam os aliados, o governo foi arrumar este novo problema num momento tão delicado? A recusa a um novo ministério por parte de Serraglio cria uma situação de incerteza que era desnecessária. A ação precipitada do governo – o ex-ministro ficou sabendo da demissão por meio da ligação de um jornal e foi informado oficialmente pelo líder do PMDB na Câmara, deputado Baleia Rossi, e não pelo seu então chefe, o presidente Michel Temer – pesou para que Serraglio recusasse a outra pasta. E o fez com requintes de crueldade: tinha um almoço agendado com Temer para hoje, mas preferiu avisar antes, por intermediários, que estava fora.

A recusa também embute um cálculo político. Saindo agora, Serraglio pode manter o discurso de que foi chutado por ser apoiador da Lava-Jato. Seu sucessor, Torquato Jardim, já sinalizou que pode mexer na cúpula da PF e já fez diversas críticas à operação. No limite, o governo Temer pode durar apenas uma semana se a chapa Dilma-Temer for cassada pelo Tribunal Superior Eleitoral no próximo dia 6.

Destino entrelaçado

O agora ex-ministro acumulava o desgaste de ter sido citado em um dos grampos da operação Carne Fraca, que desbaratou em março um esquema de propinas para driblar a fiscalização em frigoríficos. Num dos áudios gravados, Serraglio chama de “grande chefe” o ex-superintendente regional do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) no Paraná, Daniel Gonçalves Filho, preso na operação. Temer já havia confessado a ministros próximos, ainda no começo de maio, que havia se arrependido da escolha que fizera.

O deputado paranaense foi parar no ministério por acaso. Foi apontado depois de sucessivas tentativas frustradas de encontrar um titular para o cargo após a indicação de Alexandre de Moraes para o Supremo Tribunal Federal, feita em fevereiro. Carlos Velloso, ex-ministro do STF, havia recusado a proposta. A bancada do PMBD na Câmara estava descontente com a escolha do tucano Antônio Imbassahy para a secretaria de Governo, responsável pela articulação do Palácio com o Legislativo. Assim, um histórico deputado do PMDB foi a alternativa política para não causar mais descontentamentos naquele momento. Serraglio é deputado federal desde 1998.

O dia em que ele foi empossado, sete de março, foi o mesmo em que Temer recebeu Joesley Batista no Palácio do Jaburu, às 22h30, em um encontro que acabou gravado e serviu de base para a delação do empresário. Esse também foi o dia que Rocha Loures, citado na conversa e então assessor especial do presidente, assumiu sua vaga na Câmara dos Deputados. O dia 30 de maio, a data prevista de sua volta à Câmara, também pode ser o ponto inicial para outros desenrolares, principalmente no futuro de Loures e de Temer. Serraglio pode até não entrar para a história por sua envergadura política, mas suas indas e vindas estão sacudindo o governo.

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