Propina de empresas de ônibus acontecem desde a década de 90, diz delator
De acordo com o doleiro Álvaro Novis, o esquema de corrupção era abastecido pelo recolhimento de dinheiro na garagem de empresas de ônibus no Rio
Agência Brasil
Publicado em 23 de agosto de 2018 às 17h21.
Última atualização em 23 de agosto de 2018 às 17h22.
O doleiro Álvaro Novis, colaborador em um acordo com o Ministério Público Federal, declarou hoje (23) ao juiz federal Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, que o esquema de pagamentos ilícitos a partir de dinheiro recolhido de empresas de ônibus, que teria beneficiado, entre outras pessoas, os deputados estaduais Paulo Melo e Jorge Picciani, funcionava desde a década de 1990. Segundo ele, o total de pagamentos a todos os beneficiados pode chegar a R$ 1 bilhão até meados dos anos 2010, "em uma conta aproximada".
Novis depôs como testemunha no processo e contou que fez pagamentos ilícitos aos deputados estaduais do MDB em nome da Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor) e da construtora Odebrecht. Segundo ele, os parlamentares chegaram a receber mais de uma vez por mês por meio do esquema.
O doleiro explicou que o esquema era abastecido pelo recolhimento de dinheiro na garagem de empresas de ônibus, por meio de empresas transportadoras de valores. Esse dinheiro era trocado para notas maiores e, segundo Novis, os pagamentos se davam conforme orientação do empresário José Carlos Lavouras, ex-presidente do conselho de administração da federação. A partir das indicações do empresário, Novis pedia que os funcionários de sua corretora, a Hoya, disponibilizassem os pagamentos, que podiam ser feitos por eles mesmos ou pela transportadora de valores.
A Agência Brasil entrou em contato com a defesa de Picciani, que afirmou que se manifesta apenas através dos autos do processo. Já a defesa de Paulo Melo reafirmou que "se trata de uma mentira de um delator sem qualquer prova de corroboração".
Os dois deputados foram presos na operação Cadeia Velha, que apura o pagamento de propinas aos parlamentares para o favorecimento de interesses privados.
Motivo
O doleiro afirmou em seu depoimento de hoje que não tinha conhecimento do motivo dos pagamentos e que os parlamentares recebiam o dinheiro através de representantes, em endereços no centro do Rio de Janeiro e na zona sul. "Se o motivo (dos pagamentos) fosse legal, não precisariam de mim", disse o doleiro.
A operação do esquema da Fetranspor permitiu que o doleiro identificasse os pagamentos feitos aos parlamentares no esquema da Odebrecht, em que, segundo Novis, eram usados codinomes e senhas para impedir a identificação dos beneficiados. Esse sistema, alega ele, fez com que desconhecesse 95% das pessoas que recebiam o dinheiro da construtora no Rio de Janeiro e em São Paulo. As planilhas com os pagamentos, chamadas de Carioquinha e Paulistinha, foram entregues à Justiça.
Outra pessoa ouvida hoje foi o réu e colaborador Edimar Dantas, que trabalhava na corretora de Novis. Dantas disse que Paulo Mello chegou a solicitar mais de R$ 1 milhão em um mês, e que o pagamento de valores desse patamar se dava em parcelas.
Edimar Dantas detalhou parte das informações prestadas por Novis e disse que os pagamentos eram sempre efetuados em espécie, e que foi preciso estabelecer um limite de R$ 500 mil para cada pagamento por motivo de segurança. Dantas disse que o dinheiro que havia sido disponibilizado para os parlamentares pela Fetranspor e pela Odebrecht era entregue conforme eles solicitavam, e que os pedidos não eram feitos todos os meses.