Fábrica da Alstom em Hanover, na Alemanha: as empresas que realizam o serviço são Alstom, Siemens, Bombardier, Tejofran, Temoinsa, Iesa, MPE e Trans Sistemas (Fabrizio Bensch/Reuters)
Da Redação
Publicado em 4 de fevereiro de 2014 às 13h55.
São Paulo - O promotor estadual Marcelo Milani, responsável por parte dos inquéritos civis do cartel em São Paulo, deu prazo de 90 dias para que as empresas contratadas para reformar 98 trens das linhas 1 (Azul) e 3 (Vermelha) do Metrô paguem pelos prejuízos que ele sustenta ter havido nos respectivos contratos.
Milani afirma que, caso isso não ocorra no prazo, ele irá ajuizar uma ação por improbidade administrativa e pedir a dissolução das empresas.
Os contratos foram suspensos por 90 dias pelo Metrô na sexta-feira passada, dia 31, após recomendação de Milani. "Num primeiro momento, se eu considerar o contrato total, tenho uma estimativa de que esse contrato causou prejuízo de R$ 800 milhões", disse ele.
Esse sobrepreço inclui os dez contratos referentes à reforma, que foram assinados entre 2008 e 2009 e que, no total, chegam a R$ 2,5 bilhões, em valores atualizados. As empresas que realizam o serviço são Alstom, Siemens, Bombardier, Tejofran, Temoinsa, Iesa, MPE e Trans Sistemas.
Todas elas foram denunciadas pela Siemens como tendo praticado cartel em outros dois contratos do Metrô e três da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).
Em carta por ele produzida e encartada no inquérito federal que apura a formação de cartel no sistema metroferroviário - hoje em poder do Supremo Tribunal Federal -, o ex-diretor da Siemens Everton Rheinheimer afirma que houve formação de cartel também nestes contratos da reforma que ainda estão em vigor. A Siemens denunciou ao Cade a presença de cartel só em contratos encerrados.
O Tribunal de Contas do Estado, que ainda não terminou de analisar os contratos em questão, em sua única avaliação até o momento afirmou que "não se verificou grande competitividade" na concorrência. Quatro consórcios se apresentaram e cada um ficou com um dos quatro lotes da reforma.
Trem-fantasma
Nesta segunda-feira, 3, Milani afirmou que o valor que as empresas terão de pagar ainda será calculado. Segundo ele, apesar da estimativa de R$ 800 milhões de sobrepreço, o MP ainda precisa avaliar quanto cada empresa recebeu efetivamente pelos serviços, que ainda não foram concluídos.
Embora os contratos estejam quase no fim do prazo, de 68 meses, 46 dos 98 trens foram entregues, 10 estão com as empresas, e 42 circulam sem terem sido reformados.
Segundo o promotor, se as empresas pagarem pelos prejuízos, não serão objeto de ação, apenas de ajustamento de conduta, e os contratos poderão ser reativados. O promotor afirma que o Metrô pagou mais caro pela reforma do que pagaria para comprar trens novos.
Milani também afirmou que o secretário dos Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernandes, lhe disse, sobre um dos 10 contratos, o de controle dos trens: "Isso foi dito pelo próprio secretário. Esse contrato é tão prejudicial ao Metrô que ele cunhou a expressão de trem fantasma. Os trens desaparecem no controle do Metrô".
Defesa
A Alstom disse que não se manifestaria por não ter sido notificada. Procurada, a Siemens não se pronunciou. A Bombardier disse não ter sido notificada oficialmente mas declarou estar "à disposição para prestar os esclarecimentos que forem necessários".
Os responsáveis por Tejofran, Temoinsa, Iesa, MPE e Trans Sistemas não foram localizados pelo Estado.
O Metrô declarou que, "embora não tenha constatado indícios de irregularidades nestes contratos, reiterou à promotoria sua disposição em colaborar com as investigações e exigir o ressarcimento de eventuais prejuízos aos cofres públicos".
A companhia disse que "o custo unitário de cada composição modernizada saiu em torno de 60% de um trem novo, o que justificou a opção pela reforma". Em 2008, quando os serviços foram licitados, um trem novo custava R$ 28 milhões e um trem modernizado, R$ 17 milhões.
Outras frentes. Os inquéritos civis do cartel de trens, como o que investiga a reforma dos três do Metrô, são apenas uma das frentes de apuração do caso.
Há um inquérito criminal que cita políticos tramitando no Supremo Tribunal Federal.
Também há uma denúncia criminal que aponta crimes em contratos de energia da Alstom com o governo paulista - o conteúdo da denúncia foi revelado pelo Estado no domingo.
Também há um acordo de leniência firmado pela Siemens com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) no qual a multinacional admite a existência do cartel. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.