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Por que o Brasil não investe em ferrovias? E por que deveria investir

O país só teria a ganhar aumentando a malha ferroviária: menos poluição, frete mais barato, menos acidentes. Por que os investimentos não deslancham?

Vagões de um trem são visto na ferrovia Transnordestina, próximo da cidade de Salgueiro, no estado de Pernambuco (Ueslei Marcelino/Reuters/Reuters)

Vagões de um trem são visto na ferrovia Transnordestina, próximo da cidade de Salgueiro, no estado de Pernambuco (Ueslei Marcelino/Reuters/Reuters)

Luiza Calegari

Luiza Calegari

Publicado em 8 de maio de 2018 às 06h30.

Última atualização em 25 de maio de 2018 às 13h37.

Brasília – Um transporte mais rápido, mais barato e menos poluente poderia impulsionar a infraestrutura brasileira e reduzir os gargalos logísticos do Brasil.  Então, por que as ferrovias, que na teoria trariam tais benefícios, não “decolam” no país?

Para especialistas do setor, que participaram da sétima edição do Congresso Brasil nos Trilhos, há alguns fatores travando esse desenvolvimento.

O principal deles é que falta continuidade nos projetos de planejamento logístico do país. Como a construção de novas ferrovias é um projeto de longo prazo, esse plano acaba sendo prejudicado pelas trocas de governo no Brasil – que normalmente significam o abandono de projetos antigos em nome de renovação da agenda.

Outro problema, segundo Raymond Atkins, ex-conselheiro do Surface Transportation Board, nos Estados Unidos, é que o prazo das concessões ferroviárias no Brasil, que hoje dura 30 anos, é muito curto.

“O planejamento de uma ferrovia é de longo prazo, estamos falando em 60, 70 anos. É absurdo ter que renegociar com o governo nesse prazo que vocês têm. Vocês precisam se perguntar se o modelo de ferrovia funciona assim mesmo”.

Por outro lado, representantes do mercado se mostraram otimistas quanto à possibilidade de renovar antecipadamente as concessões que venceriam em 2028. O processo de renovação tem muitas etapas, mas a secretaria especial do governo do Programa de Parcerias e Investimentos (PPI) montou uma força-tarefa junto com as empresas e junto com o Tribunal de Contas da União (TCU) para que as decisões saiam até o final do ano.

Tanto Julio Fontana Neto, Guilherme Mello, Marcello Spinelli, que são presidentes, respectivamente, da Rumo, da MRS e da VLI, quanto Giane Zimmer, diretora de operações centro-oeste da Vale, e Marcello Barreto Marques, diretor comercial da Ferrovia Transnordestina, disseram acreditar que a renovação antecipada desses contratos vai destravar investimentos importantes no setor.

Esse impulso pode ser relevante, mas não será suficiente para resolver a crise logística do país, segundo Venilton Tadini, presidente-executivo da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). Ele lembra que, apesar do esforço e das boas intenções, o país está há 30 anos sem nenhum tipo de planejamento estratégico.

“Fazer PPP [parceria público-privada] e concessão não ‘cura mau olhado e traz a pessoa amada de volta’ porque a malha ferroviária precisa se integrar aos outros setores econômicos. A participação do Estado é fundamental, e por mais que as pessoas digam que estamos saindo da recessão, nós não estamos”, afirmou.

“A PEC do teto foi a medida mais cruel que poderia ter sido tomada agora porque trava o investimento. Em plena recessão, o país tem gargalo de infraestrutura. Precisamos crescer acima da demanda, e sem investimento [do setor público], esse entusiasmo pode ser um voo de galinha”, analisou Tadini.

O que o país ganharia com mais ferrovias

Uma rede ferroviária ampla e interligada beneficiaria todo o processo produtivo e o escoamento das exportações brasileiras. “É custo Brasil na veia”, resumiu o secretário de projetos da secretaria do PPI no governo, Tarcísio de Freitas.

Um estudo do professor da EAESP/FGV, Gesner Oliveira, e do diretor do Ipea, Fabiano Pompermayer, mostrou que as ferrovias representam apenas 15% da estrutura de transportes no Brasil, um percentual considerado baixo.

A predominância do transporte rodoviário (que representam 65% do total) atrapalha o trânsito nos grandes centros, é mais poluente, deixa as empresas mais suscetíveis a roubos de carga, custa mais e leva a mais acidentes.

Um vagão graneleiro comporta, em média, 100 toneladas* de grãos, enquanto um caminhão bi-trem transporta apenas 36 toneladas, segundo o comparativo dos especialistas. Mesmo assim, o país tem mais de 300 mil quilômetros de rodovias, e pouco menos de 30 mil quilômetros em ferrovias.

Com a substituição gradual do transporte agrícola pelo sistema ferroviário, a economia estimada seria de 30%, devido a maior capacidade dos trens. Outro problema, no entanto, é que a grande maioria (22 mil quilômetros de um total de 29 mil) das ferrovias brasileiras foi construída com bitola métrica, um método considerado ultrapassado e menos seguro.

A substituição também acarretaria em uma economia de 15,8 milhões de reais ao ano em gastos com acidentes de trânsito (já que com menos caminhões circulando, o número de acidentes diminuiria).

Além disso, na situação atual, o transporte rodoviário é responsável por 95% das emissões de gás carbônico (CO2), enquanto o ferroviário representa apenas 5%.

Veja um resumo dos benefícios das ferrovias sobre as rodovias, segundo os especialistas que falaram no Congresso Brasil nos Trilhos:

  • Redução de conflitos urbanos (menos atropelamentos e menos congestionamentos dentro das cidades);
  • Redução de acidentes;
  • Aumento da capacidade de transporte (já que os vagões comportam mais carga que os caminhões);
  • Redução do custo de transporte ferroviário em relação ao atual, devido à maior eficiência operacional propiciada pelos investimentos;
  • Redução da emissão de poluentes devido à migração de cargas da rodovia para a ferrovia.
  • * O texto informava, incorretamente, que um vagão graneleiro comporta 100 mil toneladas. Trata-se, na verdade, de 100 toneladas. A matéria foi corrigida em 14/05/2018.
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