Plano golpista no Planalto previa armas de guerra
Grupo não descartou usar envenenamento para matar alvos, que incluiam o presidente Lula, o vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, do STF
Agência de notícias
Publicado em 20 de novembro de 2024 às 09h20.
O plano de integrantes das Forças Especiais do Exército para matar o presidente Lula, o vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi classificado por investigadores da Polícia Federal (PF) como um “verdadeiro planejamento com características terroristas”.
O esquema, batizado de “Punhal Verde e Amarelo”, detalha o uso de tropas, veículos e armamentos que seriam empregados para executar as ações, a rotina de Moraes em Brasília, o que incluía itinerários e horários, e possíveis “danos colaterais” que resultariam da ação — segundo o documento, “passíveis e aceitáveis”.
As informações constam em relatório da PF, que foi base para a operação deflagrada ontem, na qual foram presos quatro militares e um policial federal envolvidos na formulação do plano. O esquema previa o uso de um arsenal bélico com granadas, metralhadoras e pistolas de uso militar no dia 15 de dezembro de 2022, data prevista para a execução do plano, que acabou abortado.
De acordo com a investigação da PF, o documento de três páginas com o planejamento da ação foi impresso dentro do Palácio do Planalto em 6 de dezembro de 2022, durante a gestão Bolsonaro, pelo general da reserva Mário Fernandes, então número dois da Secretaria-Geral da Presidência e um dos presos ontem. Os registros do Planalto obtidos pela PF revelaram que a impressão foi feita pelo usuário “mariof”, que seria Mário Fernandes, no gabinete da Secretaria-Geral. As defesas de Fernandes e Bolsonaro não se manifestaram.
Danos colaterais
O documento, que descreve “um planejamento de sequestro ou homicídio do ministro Alexandre de Moraes”, foi encontrado em mensagens recuperadas do celular de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e que negociou um acordo de delação premiada para esclarecer a trama golpista.
Na primeira página do arquivo, os golpistas listam diligências para identificar o aparato de segurança pessoal do ministro, “compreendendo os equipamentos de segurança, armamentos, veículos blindados, os itinerários e horários”.
Depois, são detalhadas informações, segundo a PF, sobre os seguranças de Moraes e o poder de fogo que eles detinham. A investigação aponta que fica claro, já nessa página, que o grupo estava disposto a executar Moraes, seus seguranças e contavam até com a morte dos próprios membros do plano golpista para cumprir a missão — o que eles classificaram como “danos colaterais passíveis e aceitáveis”.
O segundo tópico do documento lista medidas práticas que deveriam ser tomadas pelo grupo para executar o plano. Ele se referem a armamentos “individuais e coletivos” que deveriam ser usados na ação militar, munições não rastreáveis e o uso de seis telefones celulares “descartáveis”. Além de pistolas, metralhadora e 12 granadas, o plano previa o uso lança-rojão. Segundo a PF, a lista descreve “armamentos de guerra comumente utilizados por grupos de combate”.
Na terceira e última página do plano Punhal Verde e Amarelo, os militares golpistas afirmam que a execução do plano era “viável”, mas “com significativas restrições para uma execução imediata”. Eles alertam para a importância de se escolher o melhor método para a execução de crime, se por tiro ou envenenamento.
“Ainda são necessárias avaliações quanto aos locais viáveis, condições para execução (tiro a curta, média ou longa distância, emprego de munição e/ou artefato explosivo), possibilidades de reforço (Polícia Federal) e proteção do alvo, bem com a intervenção de outras Forças de Segurança”, ressalta o documento.
O grupo não descarta usar “elemento químico e/ou biológico, o envenenamento do alvo, preferencialmente durante um Evento Oficial Público”, diz o texto.
A menção aos assassinatos de Lula, Alckmin e de um aliado não identificado, a quem eles dão os apelidos de Jeca, Joca e Juca, respectivamente, diz a PF, é feita no trecho final do documento. O texto diz que matar Lula “abalaria toda a chapa vencedora” e a colocaria “sob a tutela principal do PSDB”, sigla da qual Alckmin fez parte até se filiar ao PSB para disputar as eleições.
O grupo enfatiza que Lula tem estado de saúde vulnerável e vai a hospital com frequência e aponta: “Envenenamento ou uso de química/remédio que lhe cause um colapso orgânico”. Quanto ao vice, o documento ressalta que “considerando a inviabilidade do 01 eleito, por questão saúde, a sua neutralização extinguiria a Chapa vencedora”.Já o alvo Juca, chamado pelo grupo como “Iminência Parda (sic) do 01” foi apontado pelos investigadores ouvidos pela colunista Bela Megale, do GLOBO, como sendo Flávio Dino, hoje ministro do STF. Na época ele era senador eleito pelo Maranhão e viria a ser ministro da Justiça de Lula.
Para embasar a operação de ontem, a PF reuniu mensagens, dados de geolocalização, documentos, fotos, áudios e imagens de câmeras de segurança. O material foi recolhido a partir de informações de operadoras de telefonia e de informações armazenadas no aparelho celular de Mauro Cid. Parte do conteúdo havia sido deletada por ele, mas foi recuperada por meio de um software israelense.
Aplicativo secreto
A PF também reuniu mensagens de um grupo criado pelos militares na plataforma Signal, um aplicativo de troca de mensagens de texto com criptografia avançada, que faz chamadas de voz e vídeo, e as mensagens se autodestroem tanto no remetente quanto no destinatário. O grupo se chamava “Copa 2022”, e os participantes usavam números de outras pessoas para despistar.
A troca de mensagens e o monitoramento dos celulares a partir da localização das antenas de celular mostram que o grupo se reuniu no Parque da Cidade, em Brasília, no dia em que o suposto plano contra Moraes seria posto em prática. Na noite de 15 de dezembro, as mensagens no Signal informam que eles estão no estacionamento do parque — um dos militares diz que está na “posição”.
Não há nas mensagens a definição do motivo, mas o grupo desistiu do ataque naquela noite, e um dos militares determina que eles abortem a missão. Uma moto que seria usada no plano foi abandonada, e um dos integrantes caminhou para uma área distante do parque para pegar um táxi, o que a PF vê como uma tentativa de não deixar rastros.