Perícia identifica 39 mortos de massacre de Manaus
O IML tem enfrentado problemas de comunicação e apoio às famílias das vítimas
Estadão Conteúdo
Publicado em 4 de janeiro de 2017 às 09h26.
Manaus - O Instituto Médico-Legal (IML) de Manaus identificou 36 vítimas do massacre no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj) e três presos mortos na unidade de Puraquequara. Dez corpos já foram liberados, dos quais quatro foram retirados pelas famílias para sepultamento.
As informações foram dadas pelo Departamento de Polícia Técnico-científica. De acordo com o diretor, Jefferson Mendes, 30 dos 39 identificados até o momento sofreram decapitação; ele informou ainda que os procedimentos de identificação mais complicados deverão ser das vítimas que foram carbonizadas durante a rebelião.
"Nossos peritos são preparados para atuar nesse tipo de ação. Mesmo assim é algo chocante, porque nunca viram a forma como se apresentam os corpos agora", disse.
No total, 38 peritos se revezam no serviço de necropsia e liberação dos cadáveres. Mendes disse não ter encontrado até o momento marcas de tiros nas vítimas. Imagens gravadas pelos próprios detentos rivais, no momento do ataque, mostram um grupo portando armas de fogo.
O que ajuda a explicar a demora no trabalho, contaram os peritos, é que nenhuma vítima foi poupada de perder alguma parte do corpo. Os relativamente menos afetados perderam um membro; os mais, foram esquartejados, com os órgãos retirados e acabaram carbonizados. Na cidade, as imagens sangrentas se espalharam pelos celulares com rapidez e dominaram as conversas cotidianas.
Segundo o diretor, o primeiro passo tomado pela perícia foi a tentativa de identificação por impressão digital, tendo seguido para arcada dentária. Nas vítimas carbonizadas, ele não descartou o uso de exames de DNA para conseguir liberar o corpo. Essa etapa pode durar de quatro dias a um mês, dependendo da qualidade do material coletado, explicou.
Compõem a lista de corpos liberados pelo IML os detentos Magaiwer Vieira Rodrigues, Artur Gomes Peres Junior, Rajean Encarnação Medeiros, Dheik da Silva Castro, Francisco Pereira Pessoa Filho, Rafael Moreira da Silva e Errailson Ramos de Miranda.
Família
Depois de enfrentarem problemas de comunicação e apoio a famílias das vítimas, o IML liberou na noite de terça-feira, 3, duas salas em sua sede para organizar o fornecimento de informações, além de ter instalado tendas do lado de fora da unidade.
Durante a manhã e a tarde, familiares reclamaram do tratamento recebido, porque tiveram de se comunicar da calçada com a equipe por uma grade. Muitos desistiram de buscar informações.
E os problemas não se limitaram ao IML. Quarenta e oito horas depois de iniciada a rebelião, a lista de mortos ainda não havia sido divulgada. A 22 quilômetros dali, o Estado acompanhou a doméstica Leila Silva, de 40 anos, quando batia com força na porta verde que mostrava em letras garrafais a identificação do maior presídio do Estado do Amazonas: o Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), com mais de 1,2 mil detentos.
Era ao menos a décima vez que um funcionário vestindo a farda da empresa Umanizarre, terceirizada que presta serviço na unidade, abria uma portinhola da qual não se permitia ver mais do que os olhos e a boca.
Resmungando, foi ele quem pegou o bilhete escrito por Leila com o nome completo de Paulo Henrique. Ela queria saber se o marido estava vivo, e entregou o pedaço de papel.
Ao menos oito pessoas foram ao local e fizeram o mesmo procedimento em busca de informações de familiares e amigos em um intervalo menor que duas horas, na manhã de terça-feira, 3. A movimentação de viaturas e de carros oficiais era intensa.
Ainda na porta do Compaj, o comerciário Nilton Lemos, de 57 anos, esboçava um sorriso enquanto falava ao telefone e repetia: "Graças a Deus". Descobria que o sobrinho estava vivo. Colada à portinhola verde, a doméstica Leila Silva também atribuía a uma intercessão divina a sobrevida do marido.
Mutirão
A Defensoria Pública do Amazonas informou na terça-feira, 3, que deverá colocar em operação nesta semana uma central de atendimento a familiares dos presos mortos na rebelião, além de ter defendido uma força-tarefa com o Ministério Público para atendimentos nos presídios. Isso ocorreria com objetivo de acelerar a análise de processos de execução penal.
Foi proposta, ainda, ao ministro Alexandre de Moraes, a formalização de convênio entre a Defensoria o Ministério da Justiça para instalação de núcleo especializado em execução penal, com recursos do Fundo Penitenciário Nacional, com capacidade para prestar assistência a toda população carcerária do Amazonas, "medida que só será possível se vier acompanhada das nomeações de novos defensores públicos", destacou o órgão.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.