Onda de violência se espalha por cidades de SC
Na lista de crimes, estão ônibus incendiados, apedrejados e tiros contra presídios. Por outro lado, a polícia deteve 23 pessoas
Da Redação
Publicado em 14 de novembro de 2012 às 21h05.
São Paulo - A segunda noite de atentados em Santa Catarina foi ainda mais violenta que a primeira. Da madrugada de terça (13) para quarta-feira, os criminosos realizaram ataques em Navegantes, Criciúma, Florianópolis, Itajaí e Blumenau. Na lista de crimes, estão ônibus incendiados, apedrejados e tiros contra presídios. Por outro lado, a polícia deteve 23 pessoas.
De acordo com o delegado-geral de Polícia Civil, Aldo Pinheiro, os depoimentos colhidos com os detidos reforçam o eixo de trabalho das investigações até aqui."Uma parte dos atentados ocorre por ação de organizações nos presídios e outra parte é de vândalos ou oportunistas que se aproveitam da situação para confrontar o Estado", disse.
O governador de Santa Catarina Raimundo Colombo (PSD) falou pela primeira vez sobre a crise. Colombo fez coro às autoridades policiais e entende que parte dos crimes pode ser motivada pelo recrudescimento do Estado nas cadeias. "No ano passado tivemos mais de 500 fugas e 11 mortes. Em 2012, foram 125 fugas e apenas duas mortes. Estamos preparados e trabalhando para dar toda a segurança à população", declarou.
Colombo também disse que o governo estadual manteve contatos com o Ministério da Justiça. Segundo o governador, o ministério se colocou à disposição para ajudar os catarinenses. "Mas não temos a necessidade. Nossa polícia tem como controlar a situação", garantiu.
Diante da onda de violência que assola Santa Catarina, o Ministério Público do Estado montou um grupo de trabalho para atuar na inteligência de combate ao crime. A ideia é agir em conjunto com as Polícias Civil e Militar e outros órgãos de segurança para apontar de onde partiu a ordem para os atentados, quem comanda as ações e, com base nessas informações, montar uma estratégia para coibir novos ataques.
O procurador-geral de Justiça, Lio Marcos Marin, acredita que até o início da próxima semana as investigações terão resultados significativos. "Por enquanto, há muita especulação e poucas afirmações. Os fatos são muito recentes. Precisamos de mais alguns dias para dar a resposta precisa à sociedade", disse Marin.
Marin não acredita que os atentados possam ter origem em alguma facção criminosa aos moldes do Primeiro Comando da Capital (PCC) de São Paulo, que atue nos presídios catarinenses. Na opinião dele, o que existe em Santa Catarina são pequenos grupos, com um certo grau de organização, que se beneficiam do vazamento de informação para fora do sistema prisional. "Ao nosso ver, não ocorre uma organização nas dimensões em que se imagina ou que é noticiado", opinou.
Linhas de investigação
As investigações do Ministério Público seguem na linha de que a violência dos últimos dias é uma retaliação dos presos. Na primeira hipótese, seria uma reação ao corte de regalias nas prisões, desagradando aos detentos. Na segunda hipótese, os atentados seriam uma resposta a maus-tratos e torturas supostamente impostas por agentes prisionais. "Nada disso foi comprovado, mas as investigações já começaram", disse.
Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) catarinense, Paulo Roberto de Borba, a crise instalada na segurança pública do Estado expõe a necessidade de uma revisão completa no modelo de segurança adotado até hoje. "Quando ouvimos de um ministro da Justiça, que ele preferia morrer a ser preso, é porque algo está muito errado", disse, em referência a fala do ministro José Eduardo Cardozo a empresários.
Borba ressalta que o momento de violência aguda ocorre também em outras regiões do País e não é um fato isolado de Santa Catarina. "A segurança pública é uma abordagem estadual e nacional, precisa ser feita de maneira integrada. No momento atual, temos que ter calma para resolver a crise. Depois, precisamos repensar toda a segurança pública", resumiu.
Os ataques, até agora, não feriram ninguém da população. Os comerciantes da capital seguem o ritmo normal de trabalho e não sofreram qualquer ameaça ou imposição de toque de recolher por parte dos criminosos.
Segundo Marcos Arzua, diretor executivo da Federação do Comércios de Santa Catarina (Fecomércio-SC), o movimento nas lojas continua igual, o volume de vendas segue dentro do esperado para esta época do ano e nenhum impacto foi sentido no dia a dia das lojas. "Nós acreditamos que o episódio dos atentados seja um caso esporádico. Não é o tipo de crime que costuma ocorrer em Santa Catarina. Acreditamos que as medidas públicas vão surtir efeito rapidamente e tudo voltará ao normal" afirmou.
Arzua ressalta que não há uma orientação direta aos comerciantes para mudarem o comportamento por causa dos atentados, no entanto afirma que se os empresários perceberem qualquer manifestação de violência "devem prezar pela segurança deles próprios, dos empregados, dos clientes e do estabelecimento".
A única autoridade policial até agora a reconhecer a existência de uma facção criminosa nos presídios catarinenses é o delegado Renato Hendges, presidente da Associação dos Delegados de Polícia (Adepol) em Santa Catarina e com atuação na Polícia Civil há mais de quatro décadas. Para ele, a origem da crise tem como nascedouro as condições do sistema prisional. "Negar que não existe essa organização é uma hipocrisia. São cinco ou seis líderes, bandidos perigosos que comandam a organização. Essa organização tem um comando verticalizado e ações criminosas em vários níveis", disse.
No entanto, faz questão de frisar que as ações em Santa Catarina não têm ligação alguma com os ataques do PCC em São Paulo. "Aqui é uma reação ao tratamento nas prisões. Eles resolveram fazer um rebelião externa. Não tem nada a ver com o PCC", garante.
Hendges ainda afirma que o modo das autoridades lidarem com essa organização é uma das origens da série de atentados. "Quando a organização ainda era um embrião, as autoridades tiraram o líder de uma unidade e o colocaram em prisões de Criciúma, Joinville, Chapecó, Blumenau e Itajaí. O resultado foi que esse criminoso construiu uma rede de relacionamentos muito forte", acusa.
O delegado acredita que é necessário uma mudança profunda no sistema prisional. Hoje, segundo ele, são 10,5 mil vagas para 17 mil presos, além de outros 10 mil mandatos de busca ainda não realizados pela polícia. "Um dia estoura", ressaltou.
Segundo ele, as primeiras medidas para ordenar a situação são simples. Instalar nos presídio o parlatório (divisão de vidro com interfone), bloqueadores de celular e detector de metal em cada prisão. "Cedo ou tarde esses atentados vão parar, mas e aí? A estrutura continuará a mesma. É preciso mudar o sistema e instituir o regime diferenciado", conclui.
São Paulo - A segunda noite de atentados em Santa Catarina foi ainda mais violenta que a primeira. Da madrugada de terça (13) para quarta-feira, os criminosos realizaram ataques em Navegantes, Criciúma, Florianópolis, Itajaí e Blumenau. Na lista de crimes, estão ônibus incendiados, apedrejados e tiros contra presídios. Por outro lado, a polícia deteve 23 pessoas.
De acordo com o delegado-geral de Polícia Civil, Aldo Pinheiro, os depoimentos colhidos com os detidos reforçam o eixo de trabalho das investigações até aqui."Uma parte dos atentados ocorre por ação de organizações nos presídios e outra parte é de vândalos ou oportunistas que se aproveitam da situação para confrontar o Estado", disse.
O governador de Santa Catarina Raimundo Colombo (PSD) falou pela primeira vez sobre a crise. Colombo fez coro às autoridades policiais e entende que parte dos crimes pode ser motivada pelo recrudescimento do Estado nas cadeias. "No ano passado tivemos mais de 500 fugas e 11 mortes. Em 2012, foram 125 fugas e apenas duas mortes. Estamos preparados e trabalhando para dar toda a segurança à população", declarou.
Colombo também disse que o governo estadual manteve contatos com o Ministério da Justiça. Segundo o governador, o ministério se colocou à disposição para ajudar os catarinenses. "Mas não temos a necessidade. Nossa polícia tem como controlar a situação", garantiu.
Diante da onda de violência que assola Santa Catarina, o Ministério Público do Estado montou um grupo de trabalho para atuar na inteligência de combate ao crime. A ideia é agir em conjunto com as Polícias Civil e Militar e outros órgãos de segurança para apontar de onde partiu a ordem para os atentados, quem comanda as ações e, com base nessas informações, montar uma estratégia para coibir novos ataques.
O procurador-geral de Justiça, Lio Marcos Marin, acredita que até o início da próxima semana as investigações terão resultados significativos. "Por enquanto, há muita especulação e poucas afirmações. Os fatos são muito recentes. Precisamos de mais alguns dias para dar a resposta precisa à sociedade", disse Marin.
Marin não acredita que os atentados possam ter origem em alguma facção criminosa aos moldes do Primeiro Comando da Capital (PCC) de São Paulo, que atue nos presídios catarinenses. Na opinião dele, o que existe em Santa Catarina são pequenos grupos, com um certo grau de organização, que se beneficiam do vazamento de informação para fora do sistema prisional. "Ao nosso ver, não ocorre uma organização nas dimensões em que se imagina ou que é noticiado", opinou.
Linhas de investigação
As investigações do Ministério Público seguem na linha de que a violência dos últimos dias é uma retaliação dos presos. Na primeira hipótese, seria uma reação ao corte de regalias nas prisões, desagradando aos detentos. Na segunda hipótese, os atentados seriam uma resposta a maus-tratos e torturas supostamente impostas por agentes prisionais. "Nada disso foi comprovado, mas as investigações já começaram", disse.
Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) catarinense, Paulo Roberto de Borba, a crise instalada na segurança pública do Estado expõe a necessidade de uma revisão completa no modelo de segurança adotado até hoje. "Quando ouvimos de um ministro da Justiça, que ele preferia morrer a ser preso, é porque algo está muito errado", disse, em referência a fala do ministro José Eduardo Cardozo a empresários.
Borba ressalta que o momento de violência aguda ocorre também em outras regiões do País e não é um fato isolado de Santa Catarina. "A segurança pública é uma abordagem estadual e nacional, precisa ser feita de maneira integrada. No momento atual, temos que ter calma para resolver a crise. Depois, precisamos repensar toda a segurança pública", resumiu.
Os ataques, até agora, não feriram ninguém da população. Os comerciantes da capital seguem o ritmo normal de trabalho e não sofreram qualquer ameaça ou imposição de toque de recolher por parte dos criminosos.
Segundo Marcos Arzua, diretor executivo da Federação do Comércios de Santa Catarina (Fecomércio-SC), o movimento nas lojas continua igual, o volume de vendas segue dentro do esperado para esta época do ano e nenhum impacto foi sentido no dia a dia das lojas. "Nós acreditamos que o episódio dos atentados seja um caso esporádico. Não é o tipo de crime que costuma ocorrer em Santa Catarina. Acreditamos que as medidas públicas vão surtir efeito rapidamente e tudo voltará ao normal" afirmou.
Arzua ressalta que não há uma orientação direta aos comerciantes para mudarem o comportamento por causa dos atentados, no entanto afirma que se os empresários perceberem qualquer manifestação de violência "devem prezar pela segurança deles próprios, dos empregados, dos clientes e do estabelecimento".
A única autoridade policial até agora a reconhecer a existência de uma facção criminosa nos presídios catarinenses é o delegado Renato Hendges, presidente da Associação dos Delegados de Polícia (Adepol) em Santa Catarina e com atuação na Polícia Civil há mais de quatro décadas. Para ele, a origem da crise tem como nascedouro as condições do sistema prisional. "Negar que não existe essa organização é uma hipocrisia. São cinco ou seis líderes, bandidos perigosos que comandam a organização. Essa organização tem um comando verticalizado e ações criminosas em vários níveis", disse.
No entanto, faz questão de frisar que as ações em Santa Catarina não têm ligação alguma com os ataques do PCC em São Paulo. "Aqui é uma reação ao tratamento nas prisões. Eles resolveram fazer um rebelião externa. Não tem nada a ver com o PCC", garante.
Hendges ainda afirma que o modo das autoridades lidarem com essa organização é uma das origens da série de atentados. "Quando a organização ainda era um embrião, as autoridades tiraram o líder de uma unidade e o colocaram em prisões de Criciúma, Joinville, Chapecó, Blumenau e Itajaí. O resultado foi que esse criminoso construiu uma rede de relacionamentos muito forte", acusa.
O delegado acredita que é necessário uma mudança profunda no sistema prisional. Hoje, segundo ele, são 10,5 mil vagas para 17 mil presos, além de outros 10 mil mandatos de busca ainda não realizados pela polícia. "Um dia estoura", ressaltou.
Segundo ele, as primeiras medidas para ordenar a situação são simples. Instalar nos presídio o parlatório (divisão de vidro com interfone), bloqueadores de celular e detector de metal em cada prisão. "Cedo ou tarde esses atentados vão parar, mas e aí? A estrutura continuará a mesma. É preciso mudar o sistema e instituir o regime diferenciado", conclui.