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Odebrecht pagava propina até para índios e membros da CUT

O executivo relatou ainda repasses a ‘Companheiro’

Odebrecht: a planilha de pagamentos entregue por Valadares à Lava Jato aponta uma série de pagamentos ao codinome ‘Tribo’. (Paulo Whitaker/Reuters)

Odebrecht: a planilha de pagamentos entregue por Valadares à Lava Jato aponta uma série de pagamentos ao codinome ‘Tribo’. (Paulo Whitaker/Reuters)

Marina Demartini

Marina Demartini

Publicado em 14 de abril de 2017 às 15h16.

Última atualização em 17 de abril de 2017 às 16h37.

O executivo Henrique Valadares, um dos delatores da Odebrecht, relatou à Operação Lava Jato que a empreiteira fez pagamentos, via caixa 2, até a índios. Sob o codinome ‘Tribo’, lideranças indígenas receberam depósitos em conta-corrente, disse Valadares. Os pagamentos estavam vinculados ao Projeto Madeira.

O delator apontou ‘parcelas de R$ 5 mil para Antenor Karitario (na conta corrente da esposa), R$ 2 mil para Orlando Karitario, R$ 2 mil para a Associação dos Povos Karitianos, e R$ 1,5 para pagamento de pequenas solicitações dos mesmos’.

“Tribo. Esse cara se tornou até meu amigo, tenho até um cocar lá em casa. O chefe da tribo lá é o Antenor Karitário”, relatou. “Pagava para ele R$ 5 mil por mês, depositado na conta da esposa. E mais R$ 2 mil para o Orlando que deve ser outro cacique lá da tribo.”

Henrique Valadares disse que ‘isso aqui era para distribuir para os índios’. “Caiu no genérico, tribo.”

A planilha de pagamentos entregue por Valadares à Lava Jato aponta uma série de pagamentos ao codinome ‘Tribo’. O trecho intitulado ‘Movimento de Saída’, indica 893,5 em 3 de janeiro de 2011. Sete dias depois, mais 4.730,37 a ‘Tribo’. Em 2 de fevereiro de 2011, ‘Tribo’ foi destinatário de três repasses: 1.202,57, 1.202,57 e 3.006,43.

Nesta planilha, os últimos pagamentos a ‘Tribo’ foram em 7 de março de 2012 (1.139,21, 1.708,82 e 2.848,03) e, em 8 de março de 2012 (847,84).

Ao Ministério Público Federal, Valadares relatou ainda pagamentos a ‘Barbudos’. O delator ligou o codinome a um representante da CUT junto ao Sindicato dos Trabalhadores da Construção Pesada em Porto Velho.

“Barbudos, esse é fácil adivinhar, eu creio. Isso é para os representantes da CUT locais. A CUT foi o primeiro sindicato a chegar lá e se estabelecer. Estavam todos de olho, não tinha nada na cidade, de repente surge lá um contingente de 25 mil homens numa obra e mais tanto na outra. Os sindicatos chegam assim, que nem abelha para conquistar espaço”, afirmou. “O pessoal da CUT costumava cobrar pedágios mensais para eles não apoiarem greves, atos de violência, esse tipo de coisa.”

O executivo relatou ainda repasses a ‘Companheiro’. De acordo com o delator, os pagamentos eram regulares a diretores de sindicato, buscando que os mesmos não insuflassem os trabalhadores a praticar atos de vandalismo e depredação na obra nas épocas de negociação coletiva, especialmente em virtude do histórico de Jirau.

Os lançamentos de R$ 5 mil correspondem aos pagamentos efetuados a Raimundo Enelcio Pereira, Altair Donizete de Oliveira e Ademilton Santos Borges. Já os valores de R$ 2,5 mil se referem aos depósitos em favor de Valdeci da Costa Braga e Francisco das Chagas Costa.

A propina total no projeto da Usina de Santo Antônio, no Rio Madeira, em Rondônia, paga pela Odebrecht e a Andrade Gutierrez, chegou a R$ 80 milhões. Apesar de ser um empreendimento encampado pelo governo do PT, a maior parte dos pagamentos foi feita a políticos do PMDB, PSDB e PP, segundo os delatores da Odebrecht.

As acusações citam o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) - condenado e preso em Curitiba -, os senadores Aécio Neves (PSDB-MG), Edison Lobão (PMDB-MA), Ivo Cassol (PP-RO), Romero Jucá (PMDB-RR) e Valdir Raupp (PMDB-RO), além de Sandro Mabel, assessor especial do presidente Michel Temer.

A usina foi o primeiro grande projeto da Odebrecht como investidora no setor de energia, em meados dos anos 2000. As pretensões da empresa na época eram de se tornar a maior geradora do País. O modelo de negócio seria o de competir agressivamente nos leilões do governo federal e fazer a obra depois, como fornecedora, onde teria sua maior margem de lucro.

Em depoimento, Henrique Valadares citou pagamentos ao codinome ‘advogado’. Segundo o delator, houve um ‘compromisso’ assumido por um executivo da empresa com o ex-governador Ivo Cassol ‘do pagamento do advogado’ que o defendia.

“É que nem o Renan, tem uma cacetada de processo nas costas. Um deles, recentemente, causou o afastamento dele”, disse. “Pagamos também, o cara não queria receber em nome da Odebrecht. Pagamento de serviço prestado, na realidade ele estava prestando serviço ao governador. Nem nós queríamos que isso acontecesse. Pagamos diretamente dessa forma.”

Valadares declarou que o pagamento ‘não foi tão expressivo’. O delator afirmou ainda que ‘nem sempre caixa 2 significa necessariamente pagamento de propina’.

“O caixa 2 pode ser usado para outras finalidades. Aqui tem uma delas. O nome de festa, evento, não sei o quê e tal. Não são propina, não é um dinheiro dado a agente público. Quando eles tinham um grande evento na obra, um desvio de um rio, fazia uma festa. Chamava a equipe toda, servia uísque, não sei o quê”, relatou.

“Eu aprendi desde cedo que quando acontecem coisas desse tipo, que envolvem bebida alcoólica e tal, não se deve lançar nota, esse registro de bebida alcoólica na contabilidade da empresa. Isso vai passar na mão de um monte de gente que não sabe o que se trata e vai dizer: ‘Tem um tal de Henrique Valadares aqui, José Bonifácio, Rogério Batista, que está cobrando uma nota milionária de bebida alcoólica. Deve ter convidado os amigos dele, Salvador inteirinha, no Carnaval, para fazer uma farra’.”

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