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O último embate entre acusação e defesa no impeachment

As declarações finais dos advogados foram feitas no penúltimo dia de julgamento do impeachment no Senado

Acusação e defesa fazem discurso emotivo e citam Deus (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 30 de agosto de 2016 às 15h32.

Última atualização em 13 de setembro de 2016 às 14h09.

SÃO PAULO – O último dia de discurso da acusação e da defesa no processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff ( PT ) foi marcado por um tom menos técnico, mas mais político e emocional de ambos os lados. A advogada Janaína Paschoal atribuiu a composição do processo a “Deus”, em resposta à fala da presidente Dilma de que Eduardo Cunha teria articulado a abertura do impeachment. “É intrigante que a defesa tenha criado um discurso de que o nosso processo seria um golpe porque foi iniciado pelo presidente da Câmara e que seria, portanto, ilegítimo, um desvio de finalidade”, afirmou Janaína. “Não fosse a decisão do presidente da Câmara, a defesa não teria nenhum argumento a sustentar aqui” Ela afirmou que o pedido envolve mais do que os decretos e “questões contábeis” e que os senadores têm o direito de usar outros temas na denúncia. A advogada defendeu ainda que delações premiadas feitas após o pedido de impeachment sejam consideradas no processo. No fim de seu depoimento, Janaína chorou ao pedir desculpas ao sofrimento que causou a Dilma e citar os netos da presidente afastada: “Eu peço que ela um dia entenda que eu fiz isso pensando também nos netos dela”, afirmou. O jurista Miguel Reale Jr. , companheiro de Janaína na equipe de acusação, defendeu que o impeachment seria a punição adequada para quem perdeu a confiança da sociedade. Para ele, o Brasil sofreu, além de um descontrole das finanças públicas, um “aparelhamento de Estado baseado no favoritismo”. “O que houve de mais negativo que o ‘lulopetismo’ deixa como herança na história brasileira é a legitimação da esperteza malandra e é isso que o País não aguenta mais”, afirmou. Reale Jr. afirmou que o crime de responsabilidade de Dilma foi ter usado os bancos públicos para financiar o Tesouro, e não pagar agricultores, e que a presidente mostrou saber detalhes dos pagamentos. E também disse que os decretos de crédito suplementar devem ser compatíveis com a meta e rigor – e não a que irá vigorar. Na réplica, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) criticou o choro de Janaína. “Não estamos aqui para fazer uma encenação”. E disse que a acusação não teria feito um discurso técnico, mas político. “Lamentável a qualidade técnica e jurídica dos advogados”, afirmou.  A senadora petista também defendeu Dilma, dizendo que as pedaladas não são operações de crédito registradas e que o processo do impeachment é um conluio. Em um discurso inflamado, advogado de defesa de Dilma Rousseff, José Eduardo Cardoso , afirmou que o impeachment será uma “pena de morte política” a uma “pessoa digna”. Já com um tom de quem trabalha com o cenário de condenação, Cardozo pediu a Deus que, se Dilma for condenada, o país peça desculpas a ela. "Se ela não estiver viva, que peçam desculpa a sua filha e netos.” Cardozo voltou a dizer que o processo de impeachment é um golpe e pediu que os senadores aceitem a proposta de um plebiscito para novas eleições. Além disso, defendeu que a presidente afastada sempre foi uma pessoa honesta e pediu que não sejam feitos ataques à dignidade dela. “Me dói, não como advogado, mas como ser humano. Não é justo falar o que falaram aqui de Dilma Rousseff. Querem condenar, condenem, mas não enxovalhem a honra de uma mulher digna”, afirmou.  Depois de apresentar o seu último discurso de defesa, o ex-ministro da Justiça chorou ao comentar o discurso dos advogados de acusação. “Eu não condeno alguém dizendo que vou resolver o futuro dos netos. Não posso fazer isso. Isso não se faz. Mas cada um é dono da sua razão”, afirmou aos jornalistas.  Veja a íntegra dos discursos dos três.
  • 2. Janaína Paschoal atribuiu a "Deus" a composição do processo

    2 /5(Foto/Agência Senado)

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    "Muito obrigada, Exmo Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal e também deste julgamento, ministro Ricardo Lewandowski, de quem eu tive a honra de ser aluna logo no primeiro ano da faculdade de Direito. Cumprimento o Presidente da Casa, cumprimento todos os Senadores presentes, agradecendo esse período de convívio e os ensinamentos. Cumprimento primeiramente o Dr. Hélio Bicudo e agradeço-lhe pela confiança depositada e pelos ensinamentos desse período. Cumprimento meu sempre Professor Miguel Reale Júnior, Dr. João Bergmann, Dr. Eduardo Neme, que estão conosco nessa jornada. Gostaria de recordar que, diferentemente do que foi dito aqui ontem, este processo é do povo. Este processo é não só dos movimentos sociais que nos apoiaram, inclusive assinaram a exordial, mas este processo é de cada um dos brasileiros que individualmente se manifestou por esse período e deu força para que nós pudéssemos e conseguíssemos chegar até aqui. Eu agradeço a todos esses brasileiros, na pessoa da Srª Maria Lúcia Bicudo, filha do Dr. Hélio Bicudo, sem a qual eu não teria conseguido enfrentar tudo que eu precisei enfrentar para tentar ajudar meu País. Eu reitero o que já disse perante a Câmara e o que disse também na comissão neste Senado: ao trazer este pleito de afastamento da Senhora Presidente da República para o Congresso Nacional, eu estou renovando a confiança que tenho nesta Casa, eu estou reforçando a importância que o Poder Legislativo tem para a República. E eu prefiro falar em República a utilizar o termo democracia. Não porque a democracia não seja importante – obviamente que é –, mas porque o termo democracia muitas vezes é interpretado de formas diferentes; república não. Res publica: aquilo que é de todos, aquilo que é do povo. Então, ao trazer este pleito a V. Exªs, eu estou reforçando esses valores. Um processo de impeachment é triste. Não é fácil solicitar o afastamento de um Presidente da República. No entanto, há um lado muito positivo, porque o impeachment é um remédio constitucional ao qual nós precisamos recorrer quando a situação se revela especialmente grave. E foi o que aconteceu. Pior do que os traumas de um processo como este é continuar fingindo que nada está acontecendo. Um povo corajoso enfrenta suas dificuldades. Já precisamos recorrer a este remédio, estamos recorrendo a ele, e espero que não precisemos jamais voltar a lançar mão dele, mas, se necessário for, assim o faremos. Quando ocorre um crime comum por parte do Presidente da República, a competência é do Supremo Tribunal Federal. Quando ocorre um crime de responsabilidade, ou vários crimes de responsabilidade, a competência é do Senado Federal. Então estou aqui reiterando o entendimento de que V. Exªs não só têm esta competência, mas têm total liberdade e têm a última palavra para falar sobre os fatos objetos deste feito. Quando eu comecei a pensar em propor este pedido de afastamento, eu sofri mais do que sofreria em outras situações pelo fato de a Presidente da República ser mulher. Eu sei bem como é difícil para as mulheres alçarem determinadas posições de poder. Então, muito me doeu o fato de constatar que seria justamente eu a pessoa a solicitar o afastamento da primeira mulher Presidente da República em nosso País. Muito refleti e conclui que ninguém pode ser perseguido por ser mulher; entretanto, ninguém pode ser protegido por ser mulher. Fosse a Presidente da República um homem, eu pediria o impedimento. Não seria justo que eu assim não procedesse pelo simples fato de ela ser mulher. Quero recordar que, diferentemente do que foi dito aqui muitas vezes, esta acusação não sofreu, pelo menos da nossa parte, mudanças. Se V. Exªs resgatarem a entrevista que eu dei ao Roda Viva, vão se recordar que, desde lá, eu falo em fraude eleitoral. Eu não mudei a minha acusação e eu não mudei o discurso. Todavia, a denúncia foi alterada. Então, isso é importante que seja resgatado. A denúncia que nós oferecemos – como eu já expliquei inúmeras vezes – tinha três pilares: a omissão da Senhora Presidente diante do escândalo do petrolão, que atingiu pessoas muito próximas a ela e a parte do partido ao qual ela pertence; as pedaladas fiscais, que são os empréstimos vedados que foram tomados ao arrepio do ordenamento jurídico brasileiro e, pior, não contabilizados, a fim de dar uma sensação de segurança, porque já se sabia que não havia; e os decretos que foram editados em desconformidade com a meta de superávit primário vigente, levando-se em consideração uma meta proposta que ainda não havia sido aprovada. A nossa denúncia tinha três pilares, a nossa denúncia alcançava fatos entre 2013 e 2015. Nós ofertamos essa denúncia e apresentamos ao Presidente da Câmara dos deputados porque, constitucionalmente, o Presidente da Câmara dos deputados é a autoridade competente. Ontem eu fiquei surpresa com a acusação de que teria havido um complô entre os Denunciantes, o Presidente da Câmara dos deputados e partidos de oposição. Chegou-se ao absurdo de dizer que o Presidente da Câmara dos deputados teria – se eu entendi – redigido a exordial ou ditado a exordial. Eu fiquei pensando: teria sentido o Presidente da Câmara ter preparado uma exordial que, no minuto seguinte, ele simplesmente retaliaria? Como eu expliquei a V. Exªs, a nossa denúncia tinha três pilares: petrolão, pedaladas, decretos – 2013 a 2015. Se essa denúncia tivesse sido feita sob a orientação do Presidente da Câmara, teria sentido que ele rejeitasse parte significativa da acusação? O Sr. Eduardo Cunha afastou tudo o que dizia respeito ao petrolão; o Sr. Eduardo Cunha afastou tudo o que dizia respeito aos fatos anteriores a 2015, mas interpretou aquela primeira decisão como sendo suficiente para afastar tudo o que dizia respeito ao BNDES, inclusive no ano de 2015 – e V. Exªs bem sabem da gravidade do que aconteceu no BNDES. A título de exemplo, eu cito um ofício que consta dos autos, muito embora a defesa tenha solicitado para que fosse retirado – e não o foi. Trata-se de um ofício, datado de 13 de junho de 2016, informando que, entre 2014 e 2015, a Petrobras recebeu do programa PSI do BNDES R$400 milhões. A Braskem, entre 2014 e 2015, recebeu do BNDES, programa PSI, por meio das pedaladas fiscais, R$350 milhões. É curioso que essas mesmas empresas estejam no centro do escândalo do mensalão, com várias investigações. O dinheiro público saiu por meio das pedaladas, alimentou empresas grandes, inclusive a estatal, que, pelo outro lado, estava sendo sangrada. Todos os levantamentos feitos mostram que os valores das pedaladas que foram destinados aos programas para as pessoas carentes não chegam a 2%. Então, a argumentação, que vem sendo aqui utilizada aqui, no sentido de que haveria uma espécie de inexigibilidade de conduta diversa por parte da Senhora Presidente não procede. As pedaladas favoreceram, precipuamente, grandes e médias empresas; favoreceram os ricos. Esse discurso que vem sendo adotado é completamente falacioso. Mas vejam V. Exªs: como poderia o Presidente da Câmara ter nos orientado a fazer essa exordial para, no ato seguinte, cortá-la completamente? É intrigante que a defesa tenha criado um discurso de que o nosso processo seria um golpe porque foi iniciado pelo Presidente da Câmara e que seria, portanto, ilegítimo, um desvio de finalidade. Essa coisa de que ele ditou a peça é inovação, mas a história do desvio de finalidade vem sendo repetida ao longo do tempo. Por outro lado, não fosse a decisão do Presidente da Câmara, a defesa não teria nenhum argumento a sustentar aqui perante V. Exªs, porque, por um lado, eles entendem que o Presidente da Câmara não tem legitimidade, que foi desvio de finalidade; por outro, àquela decisão primeira, que, para mim, é uma decisão a titulo precário – e eu já vou explicar o porquê –, eles se apegam com unhas e dentes. "É a decisão mais importante dos autos". "Foi a decisão que deu o tom, que circunscreveu". Ora, ou bem o homem tem legitimidade, ou bem o homem não tem legitimidade. O que não dá para compreender é que, a um só tempo, o homem seja a expressão do golpe e o limite da legalidade, porque é isso que está acontecendo. Quero recordar a V. Exªs que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento que decidiu qual seria o rito aqui a ser seguido para o nosso processo, disse o seguinte – e eu vou utilizar as palavras da Corte e não estou, com isso, fazendo juízo de valor: "Não é possível que a Câmara Baixa cerceie a Câmara Alta". Quando o Supremo disse isso, estava dizendo que a votação na Câmara não significava o recebimento da denúncia. Apenas o Senado poderia receber a denúncia. Ou seja, a decisão do Plenário da Câmara, de dois terços, não vinculava o Senado Federal.
    Eu pergunto a V. Exªs: qual é a lógica de dizer que a primeira decisão de admissão do Sr. Presidente da Câmara vincula V. Exªs? Não tem logica; não tem respaldo jurídico. A defesa, de maneira muito inteligente, está se baseando numa teoria segundo a qual o ilícito seria único, tanto no âmbito penal como no âmbito administrativo. Por essa teoria, em quais processos administrativos sancionadores, todos os princípios do Direito Penal material seriam aplicados a esse feito; também todos os formais seriam aplicados. Se V. Exªs prestarem atenção, verão que o tempo inteiro a defesa fala na tipicidade, na tipicidade estrita, na circunscrição do julgamento à denúncia... Na verdade, não à denúncia, porque a nossa denúncia foi muito ampla, mas àquela decisão precária do Presidente da Câmara. E o que se está tentando fazer? Fazer crer que essa teoria de que o administrativo sancionador, de que os processos são únicos e de que todas as regras devem ser aplicadas da mesma maneira, seria uma teoria absoluta, uma teoria aplicada nos nossos tribunais, mas isso não é verdade. Eu respeito os adeptos de tal teoria; porém, o próprio Prof. Geraldo Prado, que veio aqui prestar depoimento na condição de testemunha, reconheceu que, embora ele seja partidário dessa teoria, ela é minoritária, como são minoritárias as garantias extras que foram concedidas à Senhora Presidente da República. Eu não estou fazendo queixas aqui; eu só quero que isso seja reconhecido para que V. Exªs tenham a consciência tranquila ao darem o seu veredito e para que o povo brasileiro tenha a consciência tranquila de que nada – nada – fora do que é legal e do que é legítimo, porque não baste ser legal, esta sendo feito nesta oportunidade. Nesse sentido, eu reitero a convicção de que nós deveríamos seguir os ensinamentos do falecido ministro Paulo Brossard quando diz que o Senado é soberano. O Senado é tão soberano que tem o direito e o dever de analisar a denúncia na íntegra e, inclusive, levar em consideração fatos posteriores. E tenho sido coerente com essa convicção desde o primeiro minuto. A meu ver, sempre foi possível e necessário, e adequado trazer para esse processo todas as delações: a delação de Delcídio, a delação de Cerveró, a delação de Mônica Moura e outras tantas. Quando a defesa solicitou o anexo das gravações, a nossa posição foi: "que venham as gravações, mas que venham todas", porque a defesa tem esse costume de só querer trazer o que lhes interesse e, muitas vezes, recortam as provas no pedacinho que lhes interessa. Quem venham as gravações, venha inclusive aquela que diz que, se o Marcelo Odebrecht fizer a colaboração premiada, funcionará como uma flecha no peito da Presidente Dilma Rousseff. A nossa denúncia tratava até do envio de R$50 bilhões para países de transparência suspeita e de democracia suspeita, sem finalidade precisa e sob sigilo. Isso também foi afastado. Pois bem; pode o colega levantar e dizer: "Janaína, isso tudo está fora do processo". Isso tudo pode estar fora do processo por uma decisão do deputado Eduardo Cunha, mas isso é a nossa realidade, e, Senadores da República não podem votar fora da nossa realidade. É necessário que o mundo saiba que nós não estamos tratando aqui de questões contábeis. Por isso, eu perguntei para um dos professores – acho que para o próprio Prof. Prado –: "Professor, o que foi dito para os colegas professores estrangeiros para eles se convencerem de que foi golpe? O que foi dito a eles? Foi dito que a Presidente está sendo afastada com base em três decretos? Foi dito que ela sendo afastada por causa de um probleminha de contabilidade?" Se foi isso que foi dito, é razoável que eles estejam pensando que é um golpe. Ou foi dito que nós, povo brasileiro, fomos vítimas de uma fraude? Ou foi dito que nós, povo brasileiro, fomos enganados? Percebem? Eu não tenho como chegar aqui e me curvar às vontades totalitárias da defesa, que, a todo momento, tentam circunscrever a nossa fala, o nosso pensar, como o partido que se diz dos trabalhadores procurou fazer com os cidadãos brasileiros, mas não conseguiu e não conseguirá.
    As questões que são apontadas aqui como questões contábeis, na verdade, constituem uma grande fraude. Essa grande fraude foi, de maneira muito preciosa, apontada pelo Procurador Ivan Marx, Procurador do Ministério Público Federal. Curiosamente, a defesa trouxe o parecer desse Procurador e leu um único parágrafo, o parágrafo que diz que o Procurador entendia que os empréstimos tomados, que as relações mantidas com os bancos públicos não constituiriam operação de crédito, sem mostrar que o Procurador falou claramente que ele estava trabalhando com a ideia da tipicidade penal, que é uma tipicidade diferenciada, é uma tipicidade que requer mais. A área penal, até por envolver a liberdade do ser humano, é mais garantista, e é assim que tem que ser. A parte em que o Procurador da República escreveu que houve fraude, que as pedaladas foram feitas com o fim de não mostrar, na contabilidade do Governo, que o dinheiro dos bancos públicos estava sendo utilizado para que a população tivesse a sensação de que a nossa poupança era real, de que a poupança existia, essa parte eles não dizem, essa parte eles não leem, a parte em que o Procurador da República escreveu "foi feito um falseamento". Eles criaram um prazo de 24 meses no BNDES e sequer cumpriram esse prazo. Com relação ao Banco Safra, esse tiveram a desfaçatez de dizer que não havia prazo. O ex-ministro Nelson Barbosa esteve aqui. Quando eu perguntei a ele: "Ministro, nós estamos discutindo 5 dias, 30 dias, 15 dias? Ministro, qual é o prazo para V. Exª?" O que foi que ele respondeu? "O prazo não existe. Depende da disponibilidade do Tesouro." Se depende da disponibilidade do Tesouro, é o seguinte: paga quando quiser. Eu pergunto: um banco privado se submeteria a isso? Foi demonstrado aqui que não. A Bancada que defende a Senhora Presidente solicitou a reabertura dos trabalhos da comissão de Impeachment aqui no Senado. Com que fundamento? Com o fundamento de que a oitiva do Procurador Ivan Marx era essencial para a justiça da causa. Quando V. Exªs foram chamados a votar a pronúncia, aqui no plenário, quantas questões de ordem foram levantadas para dizer que o Procurador Ivan Marx teria que ser chamado? Quantas questões de ordem? Pois bem. Houve a pronúncia; nós apresentamos o libelo; abriu-se o prazo da contrariedade ao libelo. A defesa teve a oportunidade de arrolar seis pessoas. Pergunto: onde estava o nome do Procurador Ivan Marx? Eles solicitaram tanto que o feito fosse reaberto, que a instrução fosse reaberta para ouvir Ivan Marx. Quando se abre a possibilidade, Ivan Marx não aparece no rol! Aparecem pareceristas, aparecem os advogados, aparecem economistas que não leram os autos do processo do TCU, aparece uma testemunha que, no curso do processo, foi nomeada para um cargo público. Em qualquer outra situação, isso seria tido como um fato grave. E, quando as pessoas envolvidas foram questionadas acerca dessa nomeação, a reação foi de absoluta naturalidade. É isto que o PT está fazendo com o nosso País: diante do que é inadmissível, eles agem com tamanha naturalidade, que até nós, cidadãos comuns, acabamos nos acostumando com o ilícito. Ivan Marx não foi chamado porque Ivan Marx não poderia desdizer o que escreveu. E ele escreveu que o País foi vítima de uma fraude. Ele escreveu que se está diante de improbidade administrativa. E V. Exªs bem sabem que o equivalente da improbidade administrativa para os demais agentes públicos, quando se trata da Presidente da República, é o crime de responsabilidade. Há decisão do Supremo Tribunal Federal nesse sentido. Quando a acusação desmistificou a tese de que o parecer do Procurador Ivan Marx seria favorável à defesa, qual foi o argumento da defesa? É brincadeira... Eles viraram e disseram assim: "Não, mas saiu uma nota do procurador dizendo que é 2014". "Saiu uma nota do procurador dizendo que ele não falou da Presidente." Espere aí! Até aquele momento, quando eles se apegavam ao parecer como se fosse o descobrimento de outro país, aí, podia? Aí, não havia vedação temporal. No momento em que nós mostramos a fraude – não só a fraude de que fomos vítimas, mas a fraude de que o processo estava sendo vítima, na medida em que só se lia um parágrafo –, aí, há a limitação temporal. Aí, vão lembrar da manifestação do deputado Eduardo Cunha, o mesmo que teria dado um golpe. Eles alegam todo o tempo que foram vítimas de vários conluios: conluio de Eduardo Cunha com os partidos de oposição com os denunciantes; depois, surgiu um conluio do procurador do TCU com o auditor do TCU; depois, chegaram a sugerir que eu teria me encontrado com uma das testemunhas, sendo que eu não aceitei nem me hospedar no hotel em que as testemunhas estavam hospedadas para não ter nenhum risco de passar no mesmo corredor. O único... Eu acho que, se houver alguém fazendo algum tipo de composição nesse processo, é Deus. Foi Deus que fez com que várias pessoas, ao mesmo tempo, cada uma na sua competência, percebessem o que estava acontecendo com o nosso País e conferiu a essas pessoas coragem para se levantarem e fazerem alguma coisa a respeito. Eu vou conversar com V. Exªs um pouquinho sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal. É claro que V. Exªs sabem, mas a população brasileira precisa saber, porque eu não quero que ninguém deste povo tenha isso de dúvida a respeito da legitimidade do que está acontecendo aqui. Eu quero o povo brasileiro com o coração tranquilo – isso é importante para mim, não adianta ganhar. Eu quero que o povo sinta que isso aqui é necessário. Pois bem. Por que se criou a Lei de Responsabilidade Fiscal? E aqui eu faço um registro de justiça com relação à nossa assistente técnica, Drª Selene Peres, que foi uma das mães – digamos assim – desta lei. Esta lei foi criada em virtude do que ocorreu na década de 90 com os bancos públicos em vários Estados da Federação. Muitos governadores de diversas legendas usavam os bancos públicos como se fossem próprios; utilizavam o dinheiro dos bancos para pagarem as próprias dívidas, quebrando os bancos, prejudicando os correntistas e, de certa forma, iludindo, porque se imaginava que havia uma quantidade de recursos quando, na verdade, não havia. Vejam, senhores, como isto é importante: a Lei de Responsabilidade Fiscal nasce por isso e para coibir essa situação. Quando poderíamos imaginar que 16 anos depois do advento da lei, o Governo Federal faria pior – faria pior –, por muito mais tempo e na casa dos bilhões? Quando poderíamos imaginar? Mas o fato de eles não respeitarem a responsabilidade fiscal é coerente, porque o Partido da Senhora Presidente votou contra a Lei de Responsabilidade Fiscal, como votou contra a Constituição Federal. Por isso é que eles entendem que esse processo não tem sentido. Eles foram contra a Constituição! Nosso processo está lastreado na Constituição! Eles foram contra a Lei de Responsabilidade Fiscal! Nosso processo está lastreado na Lei de Responsabilidade Fiscal. É compreensível. É quase coerente dentro da sua incoerência de sempre. A Lei de Responsabilidade Fiscal previu, expressamente, que as afrontas ao seu teor seriam coibidas por meio de vários diplomas: o Código Penal, a Lei de Improbidade e, expressamente, a Lei nº 1.079/50, que é a lei que trata do impeachment. Para atualizar essa lei, foi editada uma outra lei no mesmo ano da Lei de Responsabilidade Fiscal, ou seja, uma lei que a complementou, que é a Lei nº 10.028, do ano 2000. Isso é muito importante, Exªs. Esta Lei nº 10.028 alterou justamente a parte dos crimes na Lei nº 1.078/50. Os dispositivos que hoje estão sendo atribuídos à Senhora Presidente da República foram incorporados ao nosso ordenamento no ano 2000. Isso significa que são absolutamente falaciosos os argumentos de que nós estamos aplicando à Presidente da República uma lei ultrapassada, uma lei velha, uma lei arcaica. A Lei nº 1.078/50 foi completamente alterada, preparada, modernizada pelo advento da Lei de Responsabilidade Fiscal. Esta Lei de Responsabilidade Fiscal, que diz que qualquer valor dela que seja ferido enseja o impeachment, no seu art. 36, proíbe que os entes da Federação e também dos Estados usem o seu poder para tomar empréstimos dos bancos públicos. Essa proibição é clara, e, no art. 36, existe a palavra abuso do controle. Controle, aquelas instituições acima das quais existe o controle, isso é importante que seja dito, porque a defesa, como não tem argumentação para fazer frente ao que estamos falando, tem se apegado a essa história de que não seria operação de crédito. Mas o que é uma operação de crédito na essência? É você utilizar o dinheiro de outrem. E foi isso o que aconteceu, entendeu? E foi isso o que aconteceu, incidiu os juros. Eles dizem: mas não havia contrato escrito, não havia acordo de vontades. O próprio assistente técnico escreveu: olha, faltou contrato. Quando o questionei na comissão: doutor, o que o senhor acha que foi diferente a situação dos Estados para a situação agora que estamos enfrentando? Ah! Drª Janaina, lá, havia contrato escrito, aqui, não. Mas o senhor, então, está equiparando contrato com instrumento de contrato? Qualquer aluno iniciante do direito sabe que o instituto do contrato não se confunde com o instrumento do contrato. Então, com todo respeito, a única diferença entre a situação que nós estamos vivenciando hoje e a situação que nós vivenciamos, quando a lei foi criada, é que os valores são muito maiores, a audácia foi muito maior, e a fraude foi significativa, porque lá, justamente porque havia contrato, havia a contabilização, aqui, não. O expediente aqui adotado, como bem apontou o Procurador Ivan Marques, não foi adotado para financiamento propriamente dito do Governo, foi para financiamento, mas foi para criar a sensação de que nós teríamos dinheiro para dar continuidade aos programas que foram alardeados no ano eleitoral, como sendo aqueles que cresceriam indefinidamente. Muitas foram as testemunhas que confirmaram que, no ano de 2014, programas sociais como o Fies foram inflados: 2013, tinha um montante, 2014, subiu significativamente, 2015, caiu. O que foi esse movimento? Esse movimento foi resultado da fraude. Onde é que está a fraude? A fraude tem dois lados: primeiro, eles pagaram o que era do seu dever com o dinheiro dos bancos públicos, Caixa, BNDES, Banco do Brasil, não escrituraram esses débitos como despesas, ao mesmo tempo, não escrituraram como receita, ao mesmo tempo, não cortaram as despesas. Então, eles criaram uma ilusão. Aqui eu tenho as minhas despesas, não aparecem os débitos com os bancos públicos, então, eu não sou uma pessoa que sou adimplente. Aqui, eu tenho as minhas receitas, não se fizeram os cortes necessários em 2014. Quando eu cruzo isso aqui, o que eu tenho? Superávit, eu tenho uma poupança boa. Em um ano eleitoral, os especialistas olhavam essa poupança, a Presidente subia no palanque e dizia: eu vou aumentar Minha Casa Minha Vida, eu vou aumentar Bolsa Família, eu vou aumentar Fies. Os especialistas, inocentemente, olhavam e diziam: é verdade, ela tem dinheiro para isso. Porém estava tudo maquiado. Todas as testemunhas de defesa reconheceram que o ano de 2015 foi o ano em que houve cortes nunca antes havidos neste País. A defesa apresenta isso como se fosse um ponto positivo. Não é. O corte de quase 80 bilhões, que ocorreu em 2015, é a prova de que eles não fizeram cortes que já eram sabidamente necessários em 2014. E por que não fizeram? Porque, se fizessem, a fraude não daria certo; porque, se não fizessem, não teriam como ter inflado os programas que estavam alardeando como sendo possíveis de ter continuidade. Por isso eles não fizeram os cortes. V. Exªs vão se recordar, quando o ministro Nelson Barbosa esteve aqui, já no plenário, ele disse que, graças aos cortes de 2015, 2016 não foi um ano tão difícil. Aí eu perguntei para ele: "Excelência, utilizando esse mesmo raciocínio, se tivesse havido cortes em 2014, 2015 não teria sido um ano tão difícil? Ele falou: "É, com certeza." O ministro reconheceu. Foram ouvidas várias testemunhas de defesa, Dr. Cláudio, Dr. Orlando, Drª Iara, dentre outros, e todos reconheceram que os cortes em 2015 foram muito diferenciados dos de 2014. A título de exemplo, eu recordo a V. Exªs que, no Ministério da Educação, em 2014, o corte foi da ordem de menos de 1,5 bilhão e, em 2015, foi de quase 12 bilhões! As pessoas acreditaram que iam continuar no Fies, no Prouni, no Ciência sem Fronteiras, não só porque a Presidente mentiu, mas porque os balanços mentiam, as estatísticas mentiam. A fraude foi completa, Excelências. A fraude foi na fala e a fraude foi documental. Quem ouvia a fala e olhava o documento dizia: ela está falando a verdade. Eu pergunto a V. Exªs: isso é ou não é um estelionato eleitoral? Eu entendo que sim. Para fazer frente à ilação de que teria havido um conluio entre o procurador do Ministério Público de Contas e o auditor, eu gostaria de recordar que a própria testemunha do BC, se não me engano, o Dr. Marcel, esteve aqui e relatou que toda essa fraude começou a ser desvencilhada quando, em uma auditoria convencional do BC, fizeram uma visita à Caixa Econômica Federal. Os próprios auditores do BC perceberam, Excelências, que tinha alguma coisa estranha, porque a Caixa contabilizava os créditos, mas o Tesouro e o Banco Central não. Quando eles começaram a analisar essa situação estranha foi que foram constatar que isso não acontecia apenas na Caixa Econômica Federal, mas acontecia no BNDES, acontecia no Banco do Brasil, que é o objeto deste feito. Isso é importante que fique bem claro, porque senão parece que foi tudo no Tribunal de Contas. Então, foi o conluio do Cunha, dos denunciantes, dentro do Tribunal de Contas. Também o auditor do BC? Está todo mundo? Ah, e também os movimentos sociais que vieram ontem aqui estão em um conluio macabro. Todo mundo está contra? É o eterno discurso da perseguição? Isso é importante que seja dito. Mas vamos além. Quando o Tribunal de Contas da União mandou que os débitos fossem contabilizados, possibilitando, inclusive, que fossem parcelados, eles decidiram pagar na íntegra. Eles apresentam esse argumento como se fosse favorável a eles, mas não é! Eles decidiram pagar na íntegra, porque não adiantava mais lançar mão das pedaladas, porque a preocupação deles é na maquiagem! Na medida em que o TCU falou "contabilize", "regularize", paga-se na íntegra. Para que vou continuar pagando juros? Por quê? Paga-se na íntegra! Isso é muito importante que fique claro. Excelências, não sou eu que estou dizendo isso. Isso está escrito no parecer do assistente técnico da defesa, página 85, se V. Exªs quiserem conferir. É uma nota técnica do Tesouro Nacional, citada pelo próprio assistente técnico da defesa. Eles querem desmerecer as testemunhas que a acusação arrolou, e digo a V. Exªs que não foi só a acusação que arrolou testemunhas. O juízo também chamou. O juízo chamou o Dr. Thiago Alves e o Dr. Albernaz. Estes foram categóricos, no sentido de que os bancos públicos foram instrumentalizados, que, no ano de 2015, essa instrumentalização chegou à casa de 58 bilhões, sendo 15 bilhões apenas no Banco Safra. Gostaria de chamar a atenção para um fato que a defesa sempre se esquece. Com relação às contas de 2015, quem fez o relatório não foi  Dr. Júlio Marcelo – por quem nutro uma grande admiração e agradeço o trabalho sério dele, porque, sem ele, eu não teria feito o meu trabalho sério. Quem fez o relatório de 2015 foi o Dr. Paulo Bugarin, Procurador Geral do Tribunal de Contas. Estará ele também em conluio? O Dr. Otávio Ladeira, se não me falha a memória, que foi trazido pela defesa, confirmou que, desde 2013, os técnicos do Tesouro Nacional estão tentando reverter essa situação fraudulenta, que nos levou ao caos. Em dezembro de 2013, esses técnicos, de boa vontade, organizaram uma reunião com o Chefe do Tesouro Nacional, Sr. Arno Augustin – que era, sim, muito próximo, se encontrava, sim, diariamente com a Presidente da República – e expuseram a ele e também a Marcus Aucélio, que era o segundo homem do Tesouro, que, se continuasse daquela forma, haveria várias implicações jurídicas. Não só haveria várias implicações jurídicas. Seríamos rebaixados nas agências internacionais. Eles avisaram isso em dezembro de 2013! Foi a crise dos Estados Unidos que nos trouxe até aqui? Todas as testemunhas perguntadas a esse respeito confirmam essa reunião. Ela se baseou numa nota técnica, preparada com 97 páginas. A jornalista, se não me engano, Leandra Peres, que noticiou essa reunião e todo o problema que houve no Tesouro à época, recebeu até um prêmio pela reportagem investigativa que fez. A jornalista também foi comprada? No que concerne aos decretos, eles insistem que a meta é anual. A meta de superávit primário é anual, porém a Lei de Responsabilidade Fiscal, no seu art. 9º e em vários outros dispositivos, exige que o acompanhamento da meta seja feito bimestralmente, porque de que adianta ter uma meta anual que só vai ser olhada no final do ano? É necessário, pela seriedade da responsabilidade fiscal, que esse acompanhamento seja frequente. E o próprio ex-ministro Nelson Barbosa reconheceu que existe uma junta orçamentária, formada pelo ministro da Fazenda, ministro do Planejamento e ministro da Casa Civil, que se encontra bimestralmente com a Presidente da República para apresentar a ela a evolução do acompanhamento da meta. É falacioso o argumento de que o TCU teria mudado de posicionamento. Primeiro, ainda que isso tivesse ocorrido, uma eventual decisão do TCU não afastaria a Constituição Federal, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a legislação orçamentária vigente para o ano, a LOA. Mas isso não aconteceu. De maneira muito ardilosa, como sempre, a defesa pega um acórdão do TCU, de 2009, que trata de decretos de contingenciamento, que não fala expressamente da abertura de créditos suplementares e diz que houve uma mudança de posição e que nós estaríamos pretendendo aplicar retroativamente uma norma que não existia. As normas todas existiam. Sequer a orientação foi alterada. Isso foi confirmado, inclusive, pelo próprio Prof. Lodi, ao final do seu depoimento aqui, quando eu perguntei: professor, o acórdão fala expressamente? E ele disse: "Fala de decretos de contingenciamento". Vejam V. Exªs que eu estou fazendo questão de me basear nas testemunhas deles! E com relação à perícia? O episódio da perícia, ao lado desse parecer do Procurador, me deixa atônita, porque a perícia foi toda a favor da acusação, toda. A perícia confirmou os empréstimos, confirmou que são operação de crédito, confirmou que não foram contabilizados...
    A perícia confirmou que os decretos foram editados em desconformidade com a meta vigente, levando em consideração a meta proposta, como muitos funcionários fazem aqui, trabalhando como se fosse uma medida provisória. A medida, no que tange à autoria, disse que, no que concerne aos decretos, havia lá a assinatura da Presidente. O único ponto acerca da perícia que eles entendem que é favorável, que eles poderiam sair por aí alardeando, é quando eles dizem: "Não houve achados que demonstrem a participação da Presidente nas pedaladas." Ora, as pedaladas foram uma fraude. O que se queria? Um e-mail da Presidente, um ofício dizendo: não contabilizem? Não obstante a perícia tenha corroborado a acusação, o tempo inteiro eles sustentam que a perícia foi favorável a eles. Excelências, eles mentem tão bem, eles são tão competentes no marketing que a gente acredita! Até as pessoas que estão do meu lado falam: "Poxa, Doutora, que pena que a perícia não foi favorável!" E eu, às vezes, mostro o papel. Mas eles são tão convincentes! Excelências, a prova de que a perícia foi favorável à acusação é muito simples: nós não fizemos nenhum questionamento aos peritos, eles fizeram setenta – setenta pedidos de esclarecimento. Quem pede 70 esclarecimentos para aquilo que lhe é favorável? A nossa assistente técnica fez um laudo perfeito, como uma mulher que conhece muito da matéria, corroborando as conclusões dos peritos. O assistente técnico deles, aliás, acho que foram dois, tentou demolir o laudo pericial. Essa perícia lhes foi favorável? Eu não compreendo. Com relação ao dolo, além de todos os alertas da imprensa, do MPU, do TCU, dos técnicos do Tesouro, o ministro Adams admitiu na comissão que em 2014 ele, numa atitude preventiva, já sabedor de que essa situação estava posta, aconselhou o ministro Mantega, Tombini e Arno a pagarem as pedaladas. Numa atitude muito hábil, o Advogado disse: "Não, não, não. Esse conselho veio quando o TCU mandou pagar". E eu falei: não, não, Doutor, porque quando o TCU mandou pagar, em 2015, Mantega já não estava mais lá". Dr. Adams foi categórico. Ele aconselhou Mantega. Desde 2014, os ministros que fazem reuniões bimestrais com a Presidente, a junta orçamentária foi aconselhada pelo então AGU a pagar o débito com os bancos públicos. E eles mentem. Além de esses avisos todos evidenciarem o dolo e a autoria da Senhora Presidente, eu gostaria de lembrar que foram muitos os órgãos públicos envolvidos para que essa fraude desse certo. Desse certo para eles, não para nós. Para nós deu muito errado. Excelências, foram envolvidos o Banco Central, o Tesouro Nacional, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, o BNDES, a SOF do Ministério do Planejamento. Eu indago a V. Exªs: quem é a autoridade que está acima de todos eles? Quem coordenou tudo isso? A Presidente é inocente? Eu tenho ouvido reiteradamente que a Presidente é uma pessoa honesta. Eu louvo a educação da Presidente ontem, nesta Casa, eu louvo o fato de ela ter vindo a esta Casa. Entendo que foi respeito para com V. Exªs, muito embora tenha desrespeitado anteriormente. E estamos aqui também por causa disso. Porém não me parece honesto dizer para um povo que existe dinheiro para continuar com programas que para esse povo são essenciais quando já se sabe que eles não existem; não é honesto juntar um parecer e ler apenas um parágrafo; não é honesto dizer que uma perícia que é absolutamente contrária lhe é favorável; não é honesto vir aqui e não responder a nenhuma das indagações, por mais claras e objetivas que fossem; não é honesto agraciar uma testemunha no curso do processo com um cargo público; não é honesto acusar uma colega sem checar. Mas tudo isso, Excelências... Não é honesto acusar uma pessoa de ter sido paga quando se sabe que ela não foi. Tudo isso foi muito bom para que o povo brasileiro percebesse como é o modo PT de ser. O modo PT de ser é esse, é a enganação, é o PT que não pede desculpas, é o PT que nega os fatos, nega a realidade. Quando entrei neste processo, eu pensei: meu Deus, eu sou uma defensora, não é? Eu vou fazer uma grande acusação. Não é simples. Os senhores não pensem que eu fico feliz acusando. Não fico. Porém eu me coloco neste processo como uma defensora do Brasil. Nós precisávamos fazer alguma coisa. Na semana passada, eu recuperei os autos do processo do ex-Presidente Collor. E havia muitos diálogos no sentido de que "estamos inaugurando uma nova era, agora o Brasil vai mudar". Gostaria de pedir a V. Exªs que tivessem em mente que eu sofri muito para chegar até aqui hoje. As pessoas do nosso povo estão sofrendo muito com as consequências dessa grande fraude. Acima do problema monetário, do problema de desvios, de corrupção, do que nós carecemos é de transparência. É significativo que a Lei de Responsabilidade Fiscal trate da transparência. Nós precisamos de transparência fiscal, mas nós também precisamos de transparência humana. Nós não aguentamos mais a política do marketing. Nós queremos líderes que olhem nos nossos olhos. Eu entrei nessa história sem ser chamada porque eu entendi que era necessário para defender o meu País. Eu quero sair daqui e voltar para o anonimato, à tranquilidade do anonimato. Eu peço a Deus e a V. Exªs que compreendam a magnitude deste momento e o tanto que esse povo está precisando de seriedade e transparência. Eu digo a V. Exªs – e estou finalizando – que eu não quero precisar tomar uma medida como essa novamente. Mas, se for necessário, eu tomo. Então, eu conto com V. Exªs para que nós possamos garantir um Brasil melhor, um Brasil mais limpo e mais translúcido para as nossas crianças. Muito embora eu esteja convicta de que eu estou certa e de que eu estou fazendo certo, mesmo quando eu estou certa, eu reconheço que as minhas atitudes podem gerar sofrimento para as pessoas. E mesmo estando certa, eu peço desculpas. Eu finalizo pedindo desculpas para a Senhora Presidente da República não por ter feito o que era devido, porque eu não podia me omitir diante de tudo isso. Eu peço desculpas porque eu sei que a situação que ela está vivendo não é fácil. Eu peço desculpas porque eu sei que, muito embora esse não fosse o meu objetivo, eu lhe causei sofrimento. E eu peço que ela um dia entenda que eu fiz isso pensando também nos netos dela. Eu agradeço."
  • 3. "Estamos prestes a mudar de mentalidade", diz Miguel Reale Júnior

    3 /5(Jefferson Rudy/Agência Senado)

  • "Ilustres Senadores, ilustre Advogado de defesa, ilustres colegas da minha bancada: ilustre Dr. João Serra, Eduardo Dória, queridíssima colega Janaína Pascoal. Ontem, ouvimos a Senhora Presidente da República. Posso lhes dizer que saí chocado deste Plenário, a impressão que tive é que a Presidente da República está de costas para a Nação! Porque atribuiu a existência deste processo a uma trama urdida por Eduardo Cunha, a uma trama urdida por um Dr. Know sem se aperceber que esse processo das ruas, que esse processo nasceu da Avenida Paulista; que esse processo nasceu da Avenida Nossa Senhora de Copacabana; da Avenida Atlântica; que nasceu de Boa Viagem; que nasceu da Praça da Liberdade e do Parcão de Porto Alegre; que este processo nasce levado por Hélio Bicudo e Janaína Paschoal, depois os movimentos de rua e através das redes sociais se mobilizarem no sentido da aplicação num processo de responsabilidade à Presidente da República por fatos não só relativos à responsabilidade fiscal, mas outros muito graves que foram cortados da petição inicial exatamente por Eduardo Cunha. Quero, Srs. Senadores, lhes dizer que, neste momento, nós não estamos prestes a mudar apenas de Governo, nós estamos prestes a mudar de mentalidade, este é o momento de mudança de mentalidade, porque o que é que ocorreu neste País e o descontrole das finanças públicas é apenas um dos aspectos reveladores, o que aconteceu neste País foi o aparelhamento do Estado, foi ocupação de toda a Administração Pública, não baseada no mérito, não baseada no trabalho, não baseada no aprendizado, não baseada na labuta diária, mas baseada no favoritismo, baseada na sinecura, baseada na difusão de o que importa é ser malandro, o que houve de mais negativo que o "lulopetismo" deixa como herança na história brasileira é a legitimação da esperteza malandra e é isso que o País não aguenta mais, é isso que o País não quer mais, o que o País não quer mais é que o sucesso que a prosperidade não seja furto da pertinácia, da persistência, do trabalho e nós temos, agora, diante de nós dois exemplos magníficos a demonstrar um outro Brasil. Este Brasil que é o Brasil alegre, que é o Brasil do sorriso, que é o Brasil do gingado, que é o Brasil do samba no pé, é também o Brasil da seriedade, é também o Brasil da persistência, é o Brasil da labuta, que é o Brasil que demonstra que pessoas que saem de situações de conflito, de situações de dificuldades econômicas, saem dela para o pódio, como aconteceu nas Olimpíadas Sr. Presidente, nós estamos dando uma demonstração imensa de democracia ao mundo. Lembre-se, nós estamos há nove meses ou mais tempo vivendo um processo de impeachment sem que tenha sofrido um risco o processo democrático neste País, sem que uma pessoa sequer tenha tido uma limitação nos seus direitos políticos e individuais. É um longo processo e doloroso processo de afastamento de uma Presidente da República que tem apoio parlamentar e que tem base social, e, no entanto, não houve um risco sequer nas instituições democráticas ou nos direitos individuais de quem quer que seja. Isso demonstra o quê? Maturidade política. Isso demonstra o quê? Um Congresso Nacional que tem persistência, que tem labuta, que tem dedicação integral. Isso é um outro lado do Brasil. É um Brasil que quer se demonstrar ao lado da simpatia, ao lado da improvisação há um outro Brasil que está aparecendo, é o Brasil da persistência, é o Brasil da labuta, é o Brasil que vence pelo mérito e não vence pela improvisação, não vence pela vanglória de não se ler livro nenhum, mas que vence pela capacidade de estudo, de trabalho, da capacidade que teve a Câmara dos Deputados, e, depois, a Comissão Processante em ouvir quarenta testemunhas, com seu Presidente, o Senador Raimundo Lira, conduzindo com imparcialidade, o Senador Anastasia produzindo um relatório, permitido amplo exercício de direito de defesa. O que é isso? É é maturidade, é maturidade da nossa democracia. Isso demonstra o quê? Demonstra, contrariamente ao que foi dito aqui, que este Senado tem estatura moral para realizar este julgamento. Este Senado Federal tem estatura moral para realizar este julgamento, e tem estatura moral para realizar também um veredito de condenação. Este Senado Federal honra Rui Barbosa. Este Senado Federal honra este País, e honra este País não só porque foi respeitado o devido processo legal, mas honra este País porque vai tomar uma decisão condenatória com base na verificação exata da configuração típica de fatos que estão sendo atribuídos à Senhora Presidente da República. Não é apenas um formalismo e um respeito ao devido processo legal, mas é a verificação exata da ocorrência efetiva de fatos delituosos graves, são graves. Dizem: "Não há crime de responsabilidade". Como não há crime de responsabilidade? Há crime de responsabilidade, há autoria e há dolo. Há, sim. Há crime de responsabilidade a cadáver e a mau cheiro de cadáver e onde são crimes responsabilidade. Há cadáver e há mal cheiro desse cadáver. E onde está o crime de responsabilidade? O crime de responsabilidade está, inicialmente, em se ter utilizado os bancos oficiais para financiar o Tesouro. E por que se fazia o financiamento do Tesouro por via dos bancos oficiais? Se fazia o financiamento do Tesouro por via dos bancos oficiais porque se estava, em contrapartida, realizando uma política irresponsável das nossas finanças através de desonerações indevidas, através de gastos públicos extraordinários, através da ocupação da administração pública pelos seus apaniguados, através do desvio do dinheiro público da destruição das nossas estatais, do desfazimento de todas as nossas estatais como a Eletrobrás e a Petrobras e o desvio do dinheiro público foi uma mão cheia para irrigar as contas do partido, daqueles que eram os governantes. Enquanto se destruía a riqueza da Nação, era necessário encontrar meios para financiar, ocultamente, o Tesouro que estava esvaziado, e aonde iriam encontrar formas de financiar a Nação? Nos bancos públicos que eram controlados pela União. E o que é mais grave, ocultava-se a contabilidade das dívidas públicas, as dívidas existentes com os bancos públicos e gerava-se um resultado primário falso, enganando-se os agentes financeiros, enganando-se a Nação e mostrava-se, então, na propaganda eleitoral que a comida não estaria na mesa do brasileiro se a candidata contrária fosse a vencedora. Mas o que é que aconteceu? O que aconteceu é que vencedora a candidata que apresentou essa falsidade na sua campanha eleitoral, aí sim que a comida desapareceu da mesa do brasileiro, aí é que está o cadáver e está o mal cheiro. Quer maior prova da existência desse crime? Então, estava lá, as dívidas cresceram de 2014 a dezembro de 2015 de forma vertiginosa. Basta ver os gráficos, o gráfico é vertiginoso, o gráfico é vertiginoso. Houve em 2015 não só a contração de novos empréstimos, novas operações de crédito com o Banco do Brasil, com o BNDES, mas o não pagamento das operações de créditos anteriores e termina 2015 como 60 bilhões de dívidas. E como é que se paga esse 60 bilhões de dívidas no fim de dezembro de 2015? Com uma medida provisória que desvincula as receitas financeiras dos royalties do petróleo e que se desvinculam, as receitas dos royalties do petróleo que estão destinadas a quê? À educação e à saúde, para pagar as pedaladas, Sr. Presidente. Para pagar as pedaladas tira-se o dinheiro da .... Fala-se tanto em questão social e desvincula-se o dinheiro dos royalties do petróleo destinados à saúde e à educação para pagar as pedaladas em dezembro 2015, mas todo o correr de 2015 continuavam as pedaladas, rolavam as pedaladas.
    E dizer que não é operação de crédito? Querem dizer... é operação de crédito porque lá está dito, está dito na Lei de Responsabilidade Fiscal, que é uma lei de precaução, é uma lei de cuidado, que não se deve realizar operação de crédito com instituição financeira que é controlada pela União e é um crime formal, que se consuma no momento em que se realiza a operação de crédito, não é necessário qualquer apuração pelo Tribunal de Contas ou qualquer apuração mesmo por esta Casa, o fato se consumou e está consumado. E na hora em que se consumou essa operação de crédito, na hora em que se consuma essa operação de crédito o fato está absolutamente configurado, mas, apesar disso, essa configuração, mesmo em 2015, foi constatado no Tribunal de Contas no voto preliminar do Ministro José Múcio Monteiro. Então está juntado aos autos o voto preliminar do Ministro José Múcio Monteiro, reconhecendo que houve uma operação de crédito.
    E é operação de crédito, até porque se diz "operação de crédito ou operações semelhadas", e isso significa uma interpretação extensiva, absolutamente admitida em Direito. É uma operação de crédito, até porque com relação só ao Banco o Brasil, pagaram-se, em dezembro de 2015, mais de 10 bilhões, sendo que desses 10 bilhões, 1 bilhão de juros. Então existe um empréstimo, "não pago a conta, você paga por mim."
    E fica a Srª Presidente da República a dizer: "É a operação safra, é para beneficiar o agricultor." Ninguém é contra beneficiar o agricultor. O problema não está aí. O problema... Ninguém está querendo que não haja, pelo Banco do Brasil, o financiamento do agricultor. O que não se quer é que o Tesouro seja financiado pelo Banco do Brasil. O Banco do Brasil financia o agricultor, e esse juro beneficiado tem que ser pago pelo Banco do Brasil. Mas o Banco do Brasil deixa rolar. Aí é que está a operação de crédito. A operação de crédito é entre o Banco do Brasil e o Tesouro, não tem nada a ver com o beneficiário final da operação, que é o agricultor. E como é que fica a relação entre o Banco do Brasil e o... Pois é, quero saber. O Banco do Brasil fica esperando que o Tesouro pague, e o Tesouro não paga. E o Tesouro não vem pagando. Não vem pagando. Isso é operação de crédito. E dizer que não? Agora, perguntei à Srª Presidente da República: a senhora tinha encontros com o Secretário do Tesouro? Porque com o Secretário do Tesouro anterior, até 2014, é fato notório. Porque foi ele que inventou a contabilidade criativa, o Dr. Arno Augustin. Pergunta: a senhora tinha relações, de encontros e discussões com o Sr. Saintive e com o Ministro da Fazenda, por meio de uma junta governativa? Ela não respondeu. Ela fez de conta que não ouviu a minha pergunta ontem. E não podia realmente ouvir a pergunta, porque não tem resposta. Porque tenho aqui – e o próprio Ministro da Fazenda reconheceu, depondo, que fazia reuniões com a Srª Presidente da República. Fazia reuniões com a Srª Presidente da República, e a Srª Presidente da República – estão aqui várias notícias que estão juntadas aos autos. Inclusive no domingo, domingo, dia 5 de maio de 2015, convocou uma reunião com o Ministro da Fazenda, o Ministro do Planejamento e o Secretário do Tesouro Saintive, em 2015, dia 5 de maio, para discutir questões relativas nos bancos públicos e aos decretos. Ela seguia pari passu o que acontecia, exatamente a Presidente da República, que tem como responsabilidade dirigir a alta gestão da Administração Pública brasileira. E ela demonstrou ontem que estava a par do decreto isso, decreto aquilo... Por mais que ela tenha querido se colocar como alguém que não tinha nada a ver com isso, ela demonstrou que tinha meandros e conhecimento desses pequenos detalhes. Imaginem se não conhecia o gigantesco problema de uma dívida do Tesouro no valor de 60 bilhões. Que o Plano Safra, só o Plano Safra dizia respeito a 10 bilhões. O BNDES, em 2015, que é o ano a que se refere, 20 bilhões. Agia com dolo, com conhecimento. E por que isso? Porque era necessário fazer isso para continuar gastando do outro lado. E os decretos? Perguntei a Sua Excelência ontem: como é que justifica que, no dia 22, mande a esta Casa um projeto de lei solicitando uma redução da meta fiscal de 58 bilhões para 5 bilhões, mas que, cinco dias depois, baixe um decreto, em desrespeito à competência exclusiva desta Casa, de créditos suplementares para viabilizar gastos de 1,7 bilhão? E diga: é compatível esse gasto de crédito suplementar de 1,7 bilhão. Por quê? Porque há um superávit, há um resultado primário de 58 bilhões – 58 bilhões que, cinco dias antes, ela tinha dito que não era possível cumprir. Pedi: me justifique como diz uma coisa hoje e, cinco dias depois, diz outra. Para justificar o quê? Para justificar, se sobrepor a esta Casa, porque precisava os dois momentos estão ligados uns aos outros: a pedalada, de um lado, e a suplementação e os decretos que suplementam. E, depois, vem dizer: não, mas o suplemento interessa. Não houve resultado final. Digo e repito: a Lei de Responsabilidade Fiscal é uma lei de precaução. Por isso que a Constituição estabelece que existem controles bimestrais e quadrimestrais. Esta Casa um grande papel do Congresso. Nas democracias contemporâneas é um papel de fiscalização do orçamento, que é um papel de fiscalização da sociedade. E o que importa é que, no momento, a lei orçamentária anual permite, sim, que sejam baixados decretos suplementares desde que compatíveis com a meta de resultado fiscal. Está dito isso no art. 4º: excepcional a decretação de créditos suplementares, mas desde que seja aquela vigente e não aquela que, eventualmente, vai ocorrer no final do ano, porque, se fosse assim, não precisa de orçamento, se fosse assim, não precisa de controles bimestrais, se fosse assim, não precisa de controles bimensais, se fosse assim, não precisa de uma Lei de Responsabilidade Fiscal e nem de precaução. Deixa correr. Vamos ver lá na frente o que vai acontecer. É isso que a Defesa diz. A Defesa reconhece sabe o quê? Irresponsabilidade larga e admitida. Vamos deixar correr. Vamos ver lá na frente. Se der, deu. Nem o projeto de lei tinha sido aprovado, mas já estavam lançando decretos suplementares à conta de uma lei que não estava sendo aprovada. E não precisava aprovar mesmo. Para que aprovar uma lei quando eu posso baixar decretos suplementares em desrespeito ao Congresso? Para quê? Ora, Congresso. Ora, Senado Federal. Tanto faz, Congresso. Eu não preciso do Congresso. Eu legislo por medida provisória. Eu legislo ditatorialmente, dando força de lei a decretos isoladamente, emitidos por mim, Presidente da República. É assim. Essa crise gravíssima de ordem econômica merece, justifica que essa pena seja aplicada. Não haverá nenhuma injustiça. Portanto, posso dizer aos Srs. Senadores: tenham a consciência tranquila, a consciência pacificamente tranquila. Seguiram não só o devido processo legal, seguiram a Justiça não só no procedimento, mas seguem a Justiça também substancial e material ao aplicar a pena de afastamento da Presidente da República e a inabilitação para o exercício de cargos públicos, de forma absolutamente equânime, justa, proporcional – absolutamente equânime – para o malefício que foi causado à vida brasileira. E mais: quero lhes dizer tranquilamente que estarão respondendo também à sociedade brasileira. A sociedade brasileira não foi às ruas por nenhuma vingança política, por nenhuma vingança partidária. Ela foi às ruas por perceber que havia o desmando; ela foi por perceber que havia o descaso; ela foi por perceber que se tinha estabelecido a esperteza malandra como um valor presente na vida brasileira. Nós queremos, agora, sim, um Brasil alegre, mas um Brasil sério. Em nome dessa seriedade ao lado da alegria é que esta Casa, com estatura moral e de cabeça erguida, vai estabelecer, sim, a punição da Presidente da República e afastá-la definitivamente da vida pública."
  • 4. Eduardo Cardozo diz que impeachment é uma "pena de morte política"

    4 /5(Geraldo Magela/Agência Senado)

    "Exmo Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal, Prof. Ricardo Lewandowski, a quem saúdo pela magnífica condução dos trabalhos, pela imparcialidade, pelo descortino permanente ao exercício da sua atividade jurisdicional; Exmo Sr. Presidente do Senado Federal, nobre Senador Renan Calheiros, pessoa que manteve com a Defesa da Presidente e com ela própria uma relação sempre institucional, cordial e respeitosa, a quem agradecemos e saudamos; Exmos Srs. Acusadores, Dr. Hélio Bicudo, com quem convivi tantos anos, quando fomos Secretários, juntos, na equipe de governo da então Prefeita Luiza Erundina, Prof. Miguel Reale Júnior, a quem saúdo, e Drª Janaina Paschoal, a quem também cumprimento; Srªs Senadoras e Srs. Senadores; cidadãos brasileiros, cidadãs brasileiras, cidadãos e cidadãs de todo o mundo que nos assistem neste momento, não é a primeira vez que Dilma Vana Rousseff senta no banco dos réus. Na época da ditadura militar, Dilma Vana Rousseff sentou no banco dos réus por três vezes, nas auditorias militares de São Paulo, de Minas e do Rio. Qual era a acusação que era dirigida àquela jovem, quase menina? Lutar contra a democracia... lutar a favor da democracia, perdão, e contra a ditadura, lutar pela construção de uma sociedade mais justa, mais fraterna. Lutar: essa era a acusação que contra ela se dirigia. Perguntarão os senhores: "Mas era essa a acusação formal?" Não, não era essa a acusação formal. A acusação formal eram pretextos, pretextos que estavam lá na Lei de Segurança Nacional, que estavam em vários dispositivos, e dos quais talvez nem ela própria se lembre e nem a sua própria advogada se lembre, porque eram irrelevantes. A acusação real contra Dilma Rousseff era que ela lutava pela democracia. Essa era a acusação. Aliás, se me permitirem a sinceridade e a franqueza, para aqueles que acompanharam os processos daquele período – e alguns dos senhores que estão aqui presentes sofreram esses processos –, aquelas acusações eram colocadas não pelos fatos em si, mas se falava do conjunto da obra. Era pelo conjunto da obra que os militantes políticos eram presos, assassinados e torturados. Era pelo conjunto da obra que se puniam a dedo as pessoas que queriam punir, porque precisavam matar a obra. Dilma Rousseff passou três anos presa, teve seus direitos políticos suspensos, foi brutalmente torturada, foi atingida na sua dignidade de ser humano, e é possível que, naquele momento, alguns dos seus acusadores, tomados de uma crise de sentimentalismo, tenham lhe dito: menina, nós estamos te prendendo e te torturando pelo bem do País. Nós estamos pensando nos seus filhos, nos seus netos. Estamos aniquilando com a sua vida, mas estamos pensando em você, menina. Estamos te destruindo e te arrasando, mas estamos pensando no seu bem. Às vezes, acontece assim com os acusadores. Subitamente têm uma crise de consciência, mas não conseguem com ela eliminar a injustiça do seu golpe. Podem pretender construir uma situação, uma sensação de humanidade, mas não conseguem objetivamente. Hoje, Dilma Vana Rousseff senta novamente no banco dos réus, após a Constituição de 1988, após a construção democrática, após termos afirmado o Estado de direito. Ela hoje não é mais uma menina, é mãe e avó. Ela hoje é uma mulher que foi eleita Presidente da República Federativa do Brasil por mais de 54 milhões de votos, a primeira mulher eleita Presidente da República do Brasil. E do que ela é acusada? Hoje nós sabemos, mas talvez daqui a algum tempo ninguém mais se lembre das acusações que são dirigidas a Dilma Rousseff, como se não se lembram hoje das acusações que eram dirigidas contra ela. O que dirão? Ela foi acusada, porque ousou ganhar uma eleição, afrontando interesses daqueles que queriam mudar o rumo do País. Ela foi condenada, porque ousou não impedir que investigações contra a corrupção no Brasil não tivessem continuidade. Os pretextos ficarão nos autos, no pó, no pó do tempo, como ficaram hoje e ficam hoje as acusações formais que foram dirigidas contra Dilma Rousseff no passado. No seu corpo, ficaram as marcas da tortura; na sua alma, ficou a marca da indignidade, mas os pretextos se foram, como os pretextos também irão se ela for condenada. Talvez hoje, Sr. Presidente, poucas pessoas no Brasil sabem dizer quais são as reais acusações contra Dilma Rousseff. São tão técnicas, tão sofisticadas, tão confusas, que a maior parte da população brasileira não saberá dizer exatamente qual é a acusação. Afasta-se ou se quer afastar uma Presidente da República, sem que o povo que a elegeu minimamente entenda o crime hediondo que ela teria praticado. Exatamente, por isso, Sr, Presidente, quero resgatar um pouco os fatos. Resgato os fatos para a compreensão deste processo. Resgato os fatos para que a história registre o que aconteceu. Se alguém tiver dúvida dos fatos verdadeiros, que vá aos jornais, que vá à imprensa, que vá aos Anais da Câmara executados, que leia as defesas. Este processo, Srªs e Srs. Senadores, começa no minuto seguinte em que Dilma Rousseff ganha as eleições presidenciais. É exatamente no minuto seguinte! Uma eleição dura, uma eleição renhida, uma eleição disputada, uma eleição quente, em que talvez os dois lados da disputa tenham agredido mais do que deviam e violentado mais do que deviam os seus adversários, mas uma eleição legítima, em que houve vencedor, ou uma vencedora, e derrotados. Mas foi no minuto seguinte em que se anunciou o resultado eleitoral que começou o ataque. Primeiro, diziam que o povo vota mal. Vejam os resultados dos mapas eleitorais: é do pessoal que foi comprado pela Bolsa Família! Depois, como esse argumento pegava mal, era politicamente incorreto, nobre Senador Cássio Cunha Lima, mudou-se e falou-se: "Não. Foi uma fraude! Foi uma fraude! Vamos pegar as máquinas eleitorais!Elas forjaram os votos!" Aí pediram uma auditoria nas máquinas eleitorais. Não provaram nada. "Então, agora, vamos impugnar as contas!" Impugnaram. Tramita o processo. Ainda hoje há uma investigação, como há uma investigação em relação ao candidato derrotado no segundo turno. Foi aí, então, que, diante da inconsistência, da impossibilidade de deslegitimar a eleição, iniciou-se a caça ao fato do impeachment. Procura-se um fato. Começou-se a procurar fato do impeachment a todo momento, a todo instante. Achem um fato. Achem um pretexto. Além de terem dificuldade de achar um pretexto, havia um problema: naquele período pós-eleitoral, a oposição, sozinha, não tinha força para promover nada. Ocorre que, passados alguns dias do resultado eleitoral, S. Exª o Procurador-Geral da República divulga a primeira lista de pessoas que estavam submetidas a investigação por força de delações premiadas. Aqui não quero prejulgar nem condenar ninguém, mas foi esse fato que agitou o mundo político brasileiro e se começou a cobrar insistentemente da Senhora Presidente da República que parasse com aquilo. Se continuassem aquelas investigações, haveria uma sangria da classe política brasileira. E a Senhora Presidente da República sempre determinou a seus subordinados que agissem se houvesse abusos, mas jamais dissessem quem deve e quem não deve ser investigado. Isso descontentou muita gente. A postura republicana da Senhora Presidente da República trouxe problemas no mundo político, e a encarnação desse primeiro problema tem nome e sobrenome: chama-se Eduardo Cunha. Eduardo Cunha é eleito Presidente da Câmara contra a posição da Senhora Presidente da República e do Planalto, e apoiado pela oposição. Não acham isso? Leiam os jornais. Vejam quem apoiou Eduardo Cunha para ser eleito Presidente da Câmara, e por que foi apoiado. Eu tenho certeza de que os senhores da oposição já conheciam – porque no mundo político tudo se sabe – quem era Eduardo Cunha, mas o apoiaram porque sabiam que, naquele homem, poderiam fazer uma junção de interesses para desestabilizar o governo. É só essa a razão que fez – acredito eu e espero que seja assim – com que pessoas que reputo de altíssima índole e capacidade moral tenham apoiado publicamente S. Exª, Eduardo Cunha. Eduardo Cunha, contra a posição de Dilma Rousseff, assume a Presidência da Câmara e imediatamente inicia o processo de desestabilização do governo. E os recados são dados pela imprensa, não falam das alcovas. O recado era: "Parem com a Lava Jato. Demita o seu Ministro da Justiça e o seu Diretor-Geral da Polícia Federal, porque, senão, esse governo será desestabilizado." Dilma Rousseff, como sempre, se recusou e encarou Eduardo Cunha da mesma forma com que encarou os seus algozes, quando tinha pouca idade, no momento em que foi julgada. E disse: "Não! Não aceito ameaça! Não aceito desafios! Enfrente-me!" E ele, então, tornou-se o vértice de dois grandes agrupamentos: os ressentidos com a derrota de 2014 e os que queriam parar a Lava Jato. A soma dessas forças políticas, claramente materializadas na Câmara, tiveram Eduardo Cunha como vértice, e o governo perde a maioria. É a partir daí que o governo começa a amargar os seus piores dias. Era necessário, sim, tomar medidas que, a nosso ver, decorriam da crise internacional, medidas que efetivamente decorriam de um conjunto de situações por que vários países do mundo passavam. Poder-se-á discutir se o governo acertou, errou, desenvolveu uma política anticíclica maior, mais elevada, mais aguda do que devia. Essa é uma discussão de economistas, mas eu lhes garanto que o governo fez o possível para acertar, dentro da mais absoluta boa-fé, dentro daquilo que vários economistas entendiam que era o caminho correto e oportuno. Mas, em 2015, por força de situações já explicadas pela Senhora Presidente da República no dia de ontem, exigia-se que questões fossem aprovadas pelo Congresso Nacional. O Presidente Eduardo Cunha paralisou a Câmara e teve o apoio dos derrotados de 2014. Paralisou a Câmara e ameaçava permanentemente. Até que se chega ao clímax: o Sr. Procurador-Geral da República determina uma busca e apreensão na própria casa do Presidente da Câmara. Ele, imediatamente, rompe com o governo e fala: "Daqui para a frente, eu sou oposição." Abre-se contra ele um processo na Comissão de Ética da Câmara dos Deputados, e ele manda o ultimato: "Ou a Bancada do Partido dos Trabalhadores [aquela que foi execrada há pouco, na outra tribuna] vota para encerrar o processo de Eduardo Cunha ou eu abro o impeachment." Lembrem-se, senhores, de que nunca foi dito pela Senhora Presidente da República que Eduardo Cunha redigiu a exordial. Não. Mas vamos ver os fatos. Os denunciantes tinham entrado primeiro com uma Denúncia que só dizia respeito a 2014. Era a primeira Denúncia.
    Até os tijolos do Supremo Tribunal Federal sabem que o artigo que trata, na Constituição, do impeachment – o art. 86, § 4º, da Constituição – é claro ao dizer que um Presidente da República não pode ser responsabilizado por atos anteriores ao seu mandato. Naquela acusação, havia Pasadena, por exemplo, já arquivada pela Procuradoria-Geral da República. Mas, a Senhora Presidenta da República era ministra. Era óbvio que aquilo não configurava, em hipótese nenhuma, crime de responsabilidade, nem poderia configurar. Repito, até os tijolos do Supremo Tribunal Federal sabem disso. Eduardo Cunha sabia, bem assessorado. Ele sabia que, para ameaçar seriamente o governo, ele precisava de uma denúncia que tivesse qualquer coisa de 2015, para que a Defesa da Senhora Presidente da República não derrubasse na Justiça uma denúncia completamente fora daquilo que a Constituição admite. Vamos aos jornais. Curiosamente, setores da oposição e o Presidente Eduardo Cunha começam a se reunir, e ele diz: "Não, vou esperar um pouquinho de tempo, um pouco de tempo para analisar se aceito ou não. Parece que os denunciantes querem fazer um aditamento." Os denunciantes fazem um aditamento, mas depois optam, por alguma razão, em retirar o pedido original e apresentar um novo. O novo era idêntico ao anterior, só tinha uma diferença: duas denúncias de 2015. Esse foi o tempo que Eduardo Cunha deu para que fosse apresentado um novo pedido. A imprensa documenta, é só ler. Foi assim que aconteceu. Era evidente que houve um diálogo para que ele apresentasse, para que os denunciantes apresentassem fatos de 2015. No ato da entrega, os mesmos Parlamentares que dialogavam com Eduardo Cunha se documentam com pessoas dos ditos movimentos, justamente para dizer: essa é a nova Denúncia, idêntica à anterior, só que com fatos de 2015.
    Eduardo Cunha, então, diz: "Se não houver votos do PT para arquivarem o meu processo, eu abro o impeachment." No momento em que sai a nota do Partido dos Trabalhadores dizendo que aquele Partido, tratado como indigno aqui, não apoiaria Eduardo Cunha, ele não se faz de rogado e não espera. É imediato. Ele vai a público e diz que está aberto o impeachment da Presidente da República, justamente naqueles dois fatos novos – vejam a coincidência – que foram incluídos pela Denúncia, e os relativos à 2015.
    E o despacho de Eduardo Cunha fica para a história porque é fantástico. Leiam, por favor, Srs. Senadores, o despacho de Eduardo Cunha. Ele chega a dizer, curiosamente, no despacho de 2014, que ele não poderia aceitar as pedaladas de 2014, porque aquilo não havia sido apreciado pelo Congresso Nacional, apesar de rejeitado pelos Tribunais de Contas. Está dito isso. Porém, mudam algumas linhas, e ele diz: "Os de 2015 eu posso aceitar." Os de 2015 até agora não foram julgados pelo Tribunal de Contas. Como se explica isso? É que o despacho vinha sendo feito pela assessoria numa linha que era para rejeitar. E subitamente ele fala: "Mudem." Só que esqueceram de mudar as linhas anteriores.
    Então, no despacho, tenho ele, para 2014, dizendo que não poderia aceitar as pedaladas, porque efetivamente o Tribunal havia julgado, mas o Congresso Nacional não. Mas aceita a de 2015, onde sequer o Tribunal tinha se manifestado.
    Querem os senhores uma maior prova de desvio de poder e de conluio entre as forças políticas que queriam destruir Dilma Rousseff e Eduardo Cunha? Se não querem ver hoje, a história verá.
    Inicia-se o processo de impeachment. Setores da mídia usam uma estratégia que hoje já fica conhecida dos cientistas políticos. Hoje destituições de presidente – permitam-me dizer com toda a sinceridade e franqueza e eu o faço com base em estudo de cientistas políticos renomados, estrangeiros –, hoje, ... não se fazem mais com tanques ou com armas. O que é um golpe? Golpe é uma destituição ilegítima de um presidente da República, pouco importando a forma ou o modus pelo qual ele é feito. Iniciou-se esse processo. Não se podia chamar tanques e armas. Criaram-se pretextos jurídicos, pretextos jurídicos, da mesma forma que a ditadura militar condenou Dilma Rousseff quando era jovem. Pretextos, pretextos que talvez ninguém se lembre daqui a algum tempo, pretextos que hoje a população não sabe dizer quais são, pretextos! Mas pretextos que justificavam o conjunto da obra, o mesmo conjunto da obra que havia sido invocado pelos acusadores de Dilma Rousseff em relação àqueles que lutavam pela defesa da democracia e que lutavam pelo fim da ditadura militar. Os fatos prosseguem, as coisas se alimentam. A posteriori surgem provas irretorquíveis de que líderes políticos dialogavam dizendo que era indispensável que Dilma Rousseff saísse do poder para acabar com a sangria da classe política brasileira. Esses áudios mostram que lideranças que, inclusive, tinham dúvidas na própria posição quanto ao impeachment, teriam sido convencidas a se somarem todos nesse processo. Isso é público, isso é notório.
    Hoje, então, senhoras e senhores, após esses fatos, nós chegamos a este julgamento. Esses fatos alimentam o julgamento que aqui temos e que os acusadores de Dilma Rousseff vão à tribuna e parece que colocam o seu partido no banco dos réus, colocam o conjunto da obra e se prendem muito pouco na análise da real acusação que efetivamente contra ela é dirigida. E por que o fazem assim? Porque são pretextos, Srs. Senadores, são pretextos, pretextos irrelevantes, pretextos que são utilizados retoricamente, porque apenas se quer afastar uma mulher que incomoda, que incomodou as elites, que incomodou ao ganhar a eleição, que incomodou ao permitir que a Lava Jato fosse obstada, uma mulher que incomoda, uma mulher. Aliás, me permitam dizer, com toda a franqueza e com toda a sinceridade, vejo aqui, no plenário do Senado, ex-ministros da Senhora Presidente Dilma Rousseff – alguns que permanecem leais a ela, outros que acham que devem migrar para outro caminho, e eu falo como ex-ministro dela –, algum dos senhores algum dia recebeu alguma proposta, alguma determinação, alguma orientação de Dilma Rousseff para que infringisse a lei, para que desrespeitasse a Constituição ou para que desviasse dinheiro público? Permitam-me responder pelos senhores – não! E sabem por quê? Porque ela não faz isso.
    Se há uma pessoa que é absolutamente correta e íntegra no sistema no político brasileiro corrompido às medulas é Dilma Rousseff. Ela nunca tolerou, nunca, nem um ato de corrupção, nem um ato de desvio ou a suspeita – me desmintam os Srs. Ministros se eu falo aqui inverdade – nunca, aliás, bastava Dilma Rousseff cheirar algum equívoco e ela ligava e ia, como lembra a Ministra Gleisi Hoffmann, na jugular dos seus Ministros. E sempre disse: "não aceito isso, não façam isso senão vão se ver comigo". "Ah, mas ela é autoritária. Ah, mas ela é muito dura".
    Mulheres quando são corretas, íntegras e sabem enfrentar situações da vida como essa são duras. Mulheres quando se equiparam nas suas disputas aos homens são autoritárias. É difícil – imagino eu – que sempre atuei ao lado, que sempre foi comandado por mulheres na minha vida não perceber o quanto vocês são discriminadas e é impossível não perceber como Dilma Rousseff foi profundamente discriminada por ser mulher. Me permitam, como homem, dizer isso. Se há mulheres que não percebem isso, um homem percebe. Talvez porque tenha ficado ao lado dela, talvez porque tenha visto a maneira com que as pessoas quereriam, se fossem um homem, o que ela faz: "olha que energia, hein?" Não, de Dilma Rousseff não era energia, era totalitarismo e falta de diálogo. Por quê? Porque era mulher. E ela era absolutamente enérgica como sempre foi dentro de qualquer situação, qualquer que pudesse implicar em desrespeito à lei, em desrespeito à moral e, por isso, me dói como ex-Ministro, me dói ouvir dizer situações que ouvi aqui desta tribuna. Não me dói como Advogado, me dói como ser humano.
    Não é justo, não é justo falar o que falaram aqui de Dilma Rousseff. Querem condenar, condenem! Mas não enxovalhem a honra de uma mulher digna. Ela é digna! Invoco os Srs. Parlamentares, Senadores, ex-Ministros, todos, para que digam se algum dia receberam alguma proposta imoral de Dilma Rousseff. Podem acusá-la de ter se equivocado porque todos nós nos equivocamos, podem acusar de ter cometido erros e todos nós erramos, mas por favor, para justificar uma situação como essa, não atinjam a honra de uma mulher digna. E muitos fizeram isso, criaram situações, disseram que ela tomava remédios para tentar desqualificá-la como mulher, afirmaram verdadeiras barbaridades, mas nunca, Senador Cássio Cunha Lima, demonstraram que essa mulher enriqueceu, que enviou dinheiro para seus filhos, que fez qualquer coisa que não fosse estritamente dentro da ética. Portanto, é absolutamente indigno esse assassinato de reputação que se faz aqui nesse processo. Indigno para todos aqueles que conhecem Dilma Rousseff, indigno para todos os Srs. Parlamentares que conviveram com ela. Não se faz isso! Não se pode fazer isso! É injusto!
    Qual é o objeto? Eu me permito dizer os pretextos desta acusação? São dois os pretextos. Pretextos que são atos jurídicos baixados por todos os outros governos anteriores. Todos os outros governos fizeram. Não me digam que não fizeram. É só ver. Fernando Henrique Cardoso baixou decretos idênticos a esse; Lula baixou. Aquilo que chamam de atrasos das subvenções aconteceu em todos os governos. E aí vão se criando pretextos para se justificar. Pretextos. Pretextos incompreensíveis ao cidadão, mas que vamos desmistificar.
    O objeto deste processo são três decretos de abertura de crédito suplementar e atrasos nas operações de crédito do Plano Safra. Muito aqui se tem falado da maquiagem: "Houve maquiagem nas contas". Por favor, sejamos corretos. A Câmara dos Deputados analisou essa questão da maquiagem, e o parecer do então Deputado Jovair Arantes arquivou essa denúncia. Por quê? Porque disse que não era da alçada da Presidente da República. Vejam, me permitam ler como testemunho da verdade. Relatório de Jovair Arantes: A omissão de passivos da dívida líquida do setor público é matéria estranha à esfera de atuação da Presidente da República, restringindo-se às competências do Bacen. Deputado Jovair Arantes, pessoa próxima de Eduardo Cunha. Cotejados esses fatos e considerações, a análise quanto a indício de autoria sobre o ponto específico da omissão de passivos aponta para a inviabilidade de eventual processo de responsabilidade da Presidente da República. E aí conclui: Assim, a análise efetuada neste parecer é pela inviabilidade de eventual processo de responsabilização direta da Presidente da República.
    Ou seja, a Câmara dos Deputados não autorizou o Senado a acusá-la disso. E o Senador Anastasia trata dessa questão no seu relatório, indo além do seu objeto. E a acusação hoje se refere a isso, fazendo, inclusive, referências ao parecer do Dr. Ivan Marx. De fato, o parecer tem dois segmentos, Senador Ferraço: um segmento que fala das operações de crédito e outro que fala deste. Por que não peguei e não li as outras linhas do parecer, que tratam disso? Porque não é o objeto. Mas poderia tê-las lido. E por que poderia? Porque é o próprio Ivan Marx quem solta uma nota, dizendo: "Eu não investiguei a Presidenta da República nesse caso, apenas estou falando de improbidade de inferiores a ela". "E ainda não está claro quem é", diz ele. Essa é a nota. Por favor, essa é a nota. É tão pobre a acusação de provas, que se tem que pegar aquelas que existem a nosso favor, para distorcê-las. É só ler a nota de Ivan Marx. É só ler o relatório da Câmara. Quem tem que distorcer provas é porque não tem provas a seu favor. Essa é uma verdade da vida forense permanente. Pois bem, e qual é a acusação relativa aos decretos? Senhores, orçamentos, orçamentos são leis importantes, que devem ser respeitadas, mas que são autorizações de gastos. Um orçamento autoriza gastos. A Constituição autoriza expressamente a possibilidade de que leis autorizem decretos que façam suplementação de crédito. Em princípio, é proibido, mas a Constituição autoriza. Permitam-me ler o art. 167, inciso V, da Constituição: "A abertura de crédito suplementar ou especial sem prévia autorização legislativa e sem indicação dos recursos correspondentes" é proibida – sem prévia autorização legislativa. É por isso que a Lei Orçamentária, a cada ano, normalmente no art. 4º, autoriza a abertura de créditos, excepcionalmente, em certos casos. E o que prevê o art. 4º? Que é perfeitamente possível que sejam baixados esses decretos, se houver a compatibilização com a meta fiscal. Note-se: não o limite. Há uma diferença entre compatibilizar e limite. Limite é aquilo que eu não posso ultrapassar; compatibilizar é aquilo que admite compatibilização. E assim, então, sempre se entendeu, desde o início da Lei de Responsabilidade Fiscal, no ano 2000. Entende-se que os decretos podem ser baixados, se eu fizer a compatibilização com a meta. De que forma? Através de decretos de contingenciamento. Que estão previstos onde? No art. 9º da Lei de Responsabilidade Fiscal. Por quê? Porque, como o contingenciamento limita o gasto, a autorização de acréscimo do gasto não tem efeito fiscal. E a meta fiscal é o quê? Fiscal. É simples. Exatamente para viabilizar tudo isso, foi feito um procedimento técnico, adotado há mais de uma década, adotado por pareceres técnicos que examinam se há compatibilidade ou não. Isso chega como um despacho burocrático para a Senhora Presidenta da República, com os pareceres dizendo: "Olha, esse decreto não afeta a meta." Isso está aprovado nos autos. A própria perícia... E disse a nobre Acusação: "Não, a perícia foi a nosso favor." Mas, veja, basta uma resposta para acabar com o crime, e essa era uma delas. A perícia diz claramente: "A Presidenta não foi avisada de que efetivamente havia uma ofensa à meta. Ao contrário. Ela foi avisa de que não feriria." Bem, acabou o dolo. Mas, aí, senhores e senhoras, havia um problema. Subitamente se constrói uma tese. Onde? No Tribunal de Contas da União. Por quem? Pelo Procurador aqui tido como suspeito pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal. Suspeito por quê? Porque era um militante, porque atuava nas redes sociais, chamando atos contra Dilma Rousseff. Esse era o homem isento, o jurista que criou a tese. Criou a tese, perdão, não sozinho, mas com um auditor, um auditor que aqui veio e confessa: "Eu ajudei o Dr. Júlio Marcelo a fazer a representação." Até aí nenhum problema. Só que, depois, contra as regras do Tribunal de Contas da União, essa representação foi mandada para quem? Para ele, para o auditor. Vejam os senhores: um auditor e um membro do Ministério Público. O auditor ajuda a fazer a representação, e o Dr. Júlio Marcelo, um militante político, um suspeito, fala com o Relator. E para quem vai a representação? Para o mesmo auditor, fora das regras do Tribunal de Contas da União. Como é que chama isso? Depois é a Defesa que faz ardis. Como é que chama isso? Constrói-se, então, a tese. Mas o que é mais impressionante e impactante, Srs. Senadores, é que a tese vem sendo construída ao longo do tempo. O Dr. Júlio Marcelo, que disse: "Basta ler a lei, basta ler a lei, que fica evidente", muda de opinião. Primeiro, ele diz que o excesso de arrecadação poderia ser utilizado como fonte. Se a Presidência tivesse utilizado só o excesso de arrecadação, não haveria problema, porque só superávit primário era problema. Perdão. Superávit primário, não; o superávit, o superávit financeiro. Muito bem. Passam três meses e Júlio Marcelo já disse que o excesso de arrecadação não pode mais. Se Dilma Rousseff tivesse lido o parecer de Júlio Marcelo, logo no dia seguinte em que ele tinha dito, poderia ter baixado um decreto, com base no superávit financeiro, e seria condenada depois por... Júlio Marcelo! Vejam como é tranquila essa tese. E, depois, isso evolui. E Júlio Marcelo já muda de novo de opinião, vindo construir a ideia – adotada no relatório do Senador Anastasia – da meta orçamentária. Meta orçamentária! Não basta apenas e tão somente não gastar; é necessário que, formalmente, o Orçamento esteja adequado no momento. Isso é impossível! Todos os especialistas em ciência das finanças dizem que é impossível. Por que é impossível? Porque a própria Constituição manda incluir créditos que não estão no Orçamento, no art. 167, §2º; os créditos feitos no último quadrimestre. Então, como se pode ter a ideia de que o Orçamento nasça incompatível com a meta? Que meta orçamentária é essa em que o Orçamento nasce já incompatível com a meta? E os restos a pagar, que não estão no Orçamento, entram onde? É evidente que essa tese não tem pé nem cabeça, com todas as vênias de quem pensa o contrário. Mas tinham que criar isso, porque a perícia demonstrou que todos os decretos somados não gastaram um níquel sequer! Tinham que criar, tinham que condenar! O pretexto, quando está errado na origem, vai se transfigurando para justificar mais tarde, de qualquer forma, a condenação que se deseja. Muito bem. Ah, então, é meramente formal? É. Nós vamos afastar uma Presidente da República por uma tese, que não existia, de que há uma ofensa formal ao Orçamento? É isso que se está ouvindo? É isso. Uma tese construída a posteriori, por um procurador suspeito e por um auditor mais suspeito ainda, com a devida vênia, de uma meta que foi construída no mundo das ideias e que não implicou gasto nenhum. Que desequilíbrio isso trouxe para o País para afastarmos uma Presidente da República? É pretexto. "Ah, mas é doloso, hein! É doloso! Ela queria descumprir, mesmo com a Constituição." Meu Deus! Os pareceres que estavam colocados diziam que ela na feriria a meta. E, aí, o Relator Anastasia dá a solução: "Querem ver como há o dolo? Cinco dias antes de ela baixar o decreto, ela mandou o projeto de lei que reduzia as metas". Ora, meu Deus! Se o parecer que ela tinha dizia que não feria a meta, que diabos implica que ela reconheça qualquer coisa do decreto, mandando projeto de lei, se sabia que as metas estavam desrespeitadas? Qual é o nexo lógico? Nenhum. Ela mandou o projeto de lei porque as receitas estavam caindo, e ela sabia que a meta não poderia ser atingida – como, aliás, sempre recomendou o Tribunal de Contas da União; como fez Fernando Henrique Cardoso, mas por medida provisória, porque na época podia; como fez Lula, em 2009. Ela mandou um projeto de lei que não tinha nada a ver com o decreto, porque, pela visão dominante e pelos pareceres que ela recebeu, não tinha nada a ver com a meta. Como o envio do projeto mostra o dolo da Presidente da República? "Ah, porque ela sabia que a meta não ia ser atingida." Mas os pareceres diziam que os decretos não atingiriam! A concepção dominante dizia que não atingiria. Como se extrai uma conclusão dessa? Nem na Santa Inquisição fariam algo igual. Porque, na Santa Inquisição, ficavam procurando trejeitos de bruxos e de feiticeiros para condenar. Está claro que tentavam criar os novos, mas, nesse caso, pelo menos os inquisidores tomavam o cuidado de associar A com B: dessa premissa, temos a outra e, depois, temos a conclusão. Aqui, nem isso. O dolo da Presidente da República está provado pelo projeto lei que ela mandou cinco dias antes de baixar os decretos. O projeto de lei propunha a redução da meta, e o parecer que ela recebia dizia que o decreto não afetava a meta. Onde é que está o dolo? É um absurdo, senhores; é um verdadeiro absurdo! E, diria: mais do que um absurdo; é um escândalo. E um escândalo que o mundo inteiro observa, um escândalo que levou o jornal The Guardiam a falar ontem o que falou; o Le Monde, a baixar o editorial que baixou, dizendo que isso ou é golpe ou é farsa. O mundo inteiro percebe isso, basta olhar esses fatos e esses argumentos. Não bastasse tudo isso, a meta não foi ferida. Sabem por que, senhores? Porque a meta é anual. E ontem... Eu ouvi agora há pouco a própria acusação falar: "A meta é anual." Anual tem só um sentido: anual. Não tem outro. Por mais que eu me esforce, eu não consigo ver outro sentido para a palavra anual que não seja: anual. Meta anual é o quê? Meta a que se chega quando? No final do ano. Já me esforcei para entender como não é, mas é a única compreensão que este modesto advogado tem. Dizem: "Mas a lei fala que tem que ter relatórios de acompanhamento." Relatórios do quê? Acompanhamento. Acompanhar é o quê? É acompanhar. Não tem outro sentido. E por que se acompanha? Para ver se a meta será atingida, porque, se não for, têm-se duas alternativas: ou se baixa um contingenciamento ou se explica para o Congresso Nacional que a receita caiu e eu tenho que mudar a meta. É isso. É tão simples! Basta ler a lei. É claríssimo! É claro! É irretorquível! Mas, não; criou-se a ideia de que a meta anual tem que ser vista a cada dois meses. Como? Meta anual vista a cada dois meses? É. Quem bolou isso? O Dr. Júlio Marcelo, nosso auditor: "A meta anual tem que ser vista a cada dois meses, hein?" Ah, é? "É." É o mesmo, Senador Aécio Neves, que se eu dissesse o seguinte: eu tenho o compromisso de, até o final do ano, emagrecer 12kg. A cada dois meses vou verificar quantos quilos eu emagreci. E após seis meses eu percebi que emagreci 4kg. Eu descumpri a meta? Não, porque ela é anual. Eu vou ter que comer menos nos outros seis meses. Ou, então, se eu perceber que tenho um problema de saúde e não vou atingir isso em 12 meses, eu vou ao médico e falo: "Doutor, me permita alterar; eu vou morrer!" E o médico falou que eu não posso. Neste caso, quem era o médico? O Congresso Nacional. Quando se percebeu que não se podia atingir a meta porque a receita havia caído, o que se fez? Mandou-se um projeto. Por quê? Porque, se contingenciasse mais, como disse a Senhora Presidente da República, quebrava o Governo, parava tudo: programas sociais, Ministérios, Polícia Federal, tudo. Será que era isso que eles queriam? A verdade é que meta anual é anual; acompanhamento é acompanhamento; fora isso, é pretexto.
    E mais: o projeto de lei foi mandado, os Srs. Senadores aprovaram, não houve descumprimento de meta. Os decretos não gastaram, a meta não foi descumprida. E mesmo que tivesse acontecido ad argumentandum tantum, como a Presidente da República argumentou ontem, haveria convalidação do período passado. A convalidação, senhores, por favor, está na legislação federal que trata dos procedimentos administrativos. Não há um autor hoje que não fale que existe convalidação – e o Prof. Anastasia é mais sapiente em Direito Administrativo do que eu. Todos reconhecem a convalidação e, não fossem os autores, a lei reconhece. De onde se tira isso? Alguém tem alguma dúvida de que isso é um pretexto? Mas vamos à segunda acusação. Vamos à segunda acusação. Vamos à acusação das operações de crédito. Nunca, em tempo algum, na história do Direito brasileiro, desde a entrada em vigor da Lei de Responsabilidade Fiscal, algum jurista ou rábula disse que era operação de crédito a figura da subvenção. Por quê? Porque operação de crédito é algo que ocorre com contrato. Sabem o que é um contrato? Algo que exige um acordo de vontades. Se têm alguma dúvida de definição vão à Lei nº 8.666, que no art. 2º, parágrafo único, define o que é contrato. Contrato é qualquer vínculo que decorra de acordo de vontades, independentemente da denominação utilizada. É o que diz a lei.
    Muito bem. E aí tem razão a Acusação. O acordo de vontades pode ter instrumento ou não ter instrumento, pode ser verbal ou não ser verbal, mas é acordo de vontades. É isso que se diz que não tem. Como é que não tem contrato? É que não tem acordo de vontade nenhum no Plano Safra, porque a lei que disciplina o Plano Safra é a lei que diz como funciona. E mais, mesmo que eu entendesse que houvesse um contrato extraído da lei entre o Banco do Brasil e a União, o atraso no pagamento não vira contrato. Vocês já viram atraso de pagamento virar novo contrato? Eu nunca vi. Eu atraso um pagamento... Ah, virou um novo contrato. É o mesmo contrato atrasado. Se o empregador atrasa o pagamento do empregado, isso não é um novo contrato. É o atraso do primeiro. É o que aconteceu. É um atraso. Criou-se que esse atraso de pagamento é uma operação de crédito. Sabem por quê? Quem criou? Dr. Júlio Marcelo, nosso amigo auditor, para dizerem que isso é vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal, para proibirem isso não para o futuro, mas para o passado! Para o passado. Aliás, Presidente Renan, as duas acusações contra a Presidenta são voltadas para o passado. A Drª Janaina disse há pouco: "Não, o Tribunal de Contas nunca apreciou, nunca apreciou isso!" Por quê? Porque foi dito aqui pelo Dr. Nelson Machado, Nelson Barbosa, perdão, que nas contas de 2009 havia uma tabela que analisava os créditos. E a Drª Janaina há pouco disse: "Não! Eram créditos de contingenciamento". Eu falei: será que eu li errado? E fui pegar. Está aqui. Está aqui, senhores. Aquilo que a Acusação acaba de dizer que era uma tabela de decretos suplementares está aqui. Permitam-me ler: "Abertura de créditos adicionais 2008/2009". Créditos adicionais! É a Defesa quem mente? Ou seja, o Tribunal de Contas analisou em 2009, e todos os anos ele faz isso com a mesma tabela de créditos adicionais. Ele bota essa tabela para quê? Para enfeitar a página? Para que seja uma decoração, Senador Viana? Não. É porque isso foi analisado. E se foi analisado e não viu irregularidade é porque aprovou. E se aprovou é por quê? Porque estava certo, a seu ver. Se em 2015 entendeu que não estava mais certo, o que aconteceu? Mudança de opinião. Há alguma dúvida nisso? Não. Mas não se pode dizer que ele mudou de opinião, porque aí mostrar a retroatividade é a prova do arbítrio. Ou seja, mudou-se de opinião por obra do Procurador suspeito, do auditor. E aí, ao se mudar de opinião se quer atacar o passado quando nunca ninguém disse isso, nunca ninguém escreveu isso, nenhum técnico da administração disse isso. Nada. É impressionante, senhores. E mais, disse que a Presidenta da República é culpada. Qual é o ato da Presidenta da República? A Acusação, Senador Ferraço, joga duplo. Não existe isso na história do direito, jogar duplo em Direito Penal ou em crime de responsabilidade. Não existe. Porque se afirma que o acusador tem que ter certeza do que faz. Ele não pode dizer: se não é isso, é aquilo. Mas aqui se diz. Na denúncia, se fala: olha, é ato comissivo, ou seja, é um ato. Por quê? Porque a Presidenta se reunia com Arno Augustin. E hoje o acusador disse: não, se reunia com outro também. Mas, meu Deus, alguém pegou a ata dessa reunião para ver se discutiam o Plano Safra? Alguém provou isso nos autos? Não. Se deduz que de reuniões da Presidenta da República com o Sr. Arno Augustin, que não estava nem mais em 2014 no governo, e depois com o Dr. Saintive, que ninguém sabe dizer exatamente o que foi tratado, que era nisso que ela dava as ordens. Nem na Inquisição! Na Inquisição, claro, tentavam extrair a verdade por tortura, mas pelo menos diziam o que tinha acontecido. Aqui, não, é uma reunião que ninguém sabe quando foi, do que se tratou, e dela se tira a ilação que a Presidenta mandou atrasar pagamentos. Atrasar pagamentos? Perfeito. Qual é o prazo? Não tem. Como? Não tem. Não tem prazo? Não, não tem prazo. Atrasou pagamento, é culpada, e não tem prazo. Não tem. E qual é o prazo? Esse era um problema que se tinha. Aí o Dr. Anastasia, meu querido amigo, fez a grande criação da história do direito mais recente. E por isso eu tomei a liberdade de chamar de prazo anastasiano, porque, repito, sempre que se faz uma criação, o nome do criador tem que ficar estampado efetivamente naquilo que se cria, como o canto gregoriano, o canto ambrosiano, o prazo anastasiano. Nunca foi discutido antes, não existia para as partes, ninguém falava, ninguém dizia absolutamente nada, mas o Senador Anastasia, tomado pela paixão partidária fala: "Eu tenho que criar um prazo, porque, senão, como é que eu digo que tem atraso? Como eu falo que tem atraso se não tem prazo?" Aí ele cria. Pega o Código Civil que, como disse o Prof. Lodi, não se aplica ao caso, pega um decreto da Presidente que ela baixou depois da decisão do Tribunal de Contas mandando ordenar e fala: sabe esse prazo? Esse é o prazo. Então, era esse o prazo que eu tenho que calcular, retroativamente, quando deveriam ter pago. Eu nunca vi. Olha, a minha dissertação de mestrado é a retroatividade da lei. Nunca imaginei que eu ia ver tanta retroatividade na minha vida como eu vejo nesse processo. Eu nunca vi. É retroatividade do prazo, retroatividade da decisão do Tribunal de Contas, tudo para o passado. Isso não existe. Com a devida vênia, Senador Anastasia, criar um prazo para aplicar para trás? Se é um contrato – e não é –, mas se é, as partes estipulam um prazo. E não alguém cria a posteriori para aplicar. E aí o Senador Anastasia se viu numa dificuldade terrível, porque, mesmo dentro do prazo dele, o atraso da Presidenta da República de 2015 era de quatro meses. Quatro meses. Derrubar uma Presidente da República por quatro meses de atraso. Aí, brilhante como é, o Senador Anastasia teve que criar mais uma saída. Introduziu uma nova acusação, que não estava no documento recebido pela Câmara, dizendo que a Presidente da República, no dia 1º de janeiro, de 2015, tinha que ter pago tudo que estava em aberto, desde 2008, desde aquilo que não era do governo dela, dia 1º de janeiro, no ato da posse. Era assim, assinar a posse e assinar o ato de pagamento. Porque, se não fez, cometeu crime de responsabilidade. Os presidentes anteriores não cometeram? Ninguém cometeu? Ah, mas devia ter percebido! Devia? Por que o Congresso Nacional não denunciou isso? Será que todos os Parlamentares dormiram? Será que todos os Deputados dormiram? Senadores dormiram? Tribunal de Contas dormiu um sono esplêndido? Por quê? Porque a tese não existia, a tese foi criada pelo Dr. Júlio Marcelo e pelo nobre auditor que aqui esteve e que o ajudou a fazer. Encantou os conselheiros do Tribunal de Contas, encantou a todos, e pune-se retroativamente uma Senhora Presidente da República pelo encantamento de uma nova tese. Encantamento ou arbítrio? Encantamento ou pretexto? Encantamento por uma nova tese ou uma clara tentativa de afastar, com ruptura institucional e constitucional, uma Presidente da República legitimamente eleita? Estou batendo demais aqui, está caindo tudo. Obrigado, Jorge. Ora, Srs. e Srªs Senadoras, como não há ato da Presidente, criou-se uma nova alternativa: o duplo. "Ah! Ela se omitiu. Ela se omitiu. A Presidente da República se omitiu" Mas se omitiu quando, se ela não tinha o dever de gestão? "Ela se omitiu, porque ela tem que governar, e ela governa, a Constituição diz que ela governa, ela dirige a Administração, então, tudo que acontece na Administração é culpa dela". Não existe isso no mundo do direito, Srs. Senadores, Srªs Senadoras. Eu trago à colação um grande jurista, um dos melhores penalistas brasileiros, Prof. Miguel Reale Júnior, que, no seu livro de direito penal, ensina aos seus alunos, claramente, que o crime omissivo existe quando há um dever específico descumprido.Ele ensina isso e quero seguir aqui suas lições. Não há possibilidade de omissão quando alguém não tem o dever específico, não existe a responsabilidade objetiva, nesse caso, posta no plano penal. É um absurdo! E, como disse outra vez da tribuna deste Senado: cuidado, senhores que foram governadores, que foram prefeitos, que serão prefeitos, que serão governadores, porque, daqui para frente, ao abrir-se a porta para essa tese, qualquer ordenadorzinho de despesa – e não estou desmerecendo, é apenas para dar simbologia hierárquica –, qualquer ordenador de despesa em plano inferior, ao praticar qualquer ato numa licitação, Senador Cristovam, levará a imputação maior para a perda do cargo e do mandato de uma pessoa legitimamente eleita. O que é isso? É o que se quer para o nosso País? Essa é a segurança jurídica que o Senador Anastasia fala numa obra que recentemente li, em que ele falava que a segurança jurídica é uma das peças estruturantes e basilares do nosso sistema? É assim que se constrói a segurança e ambiência jurídica para negócios, para estabilidade democrática num País como o nosso? É assim? Por isso, senhores, não há ato da Presidente da República, nem omissivo nem comissivo; não há dolo, não há má-fé, porque nunca foi feito nada a respeito disso. Todas as decisões de Tribunal de Contas da União foram retroativamente aplicadas, nesse caso, seja para os decretos, seja para a pedaladas. Todas as testemunhas ouvidas. Todas, sem exceção – não importa em que órgão trabalhavam, se trabalhavam na Secretaria de Orçamento, se trabalhavam na Casa Civil, se trabalhavam no Tesouro, se trabalhavam –, disseram: "Nenhum desses dois casos eram compreendidos diferente" Isso surgiu depois. E todos disseram que se assustaram quando o Tribunal de Contas, em 2015, levantou esse ponto. Nunca. Eu desafiei, inclusive, os Peritos na Comissão: digam-me um autor que aponte esta tese. Não apontaram. Digam-me um jurista que dê essa interpretação para Lei de Responsabilidade Fiscal. Não souberam dizer. Essa tese é construída dentro do Tribunal de Contas da União pelo procurador suspeito, pelo auditor que o ajudou, referendada e tem contra si a opinião de todos – os maiores especialistas do País, os maiores juristas do País e todos os técnicos da Administração, de todos! E é com base nela, Senador Renan, que se quer condenar uma Presidente da República legitimamente eleita. Bem, se os senhores querem, pelo menos reconheçam que há uma dupla interpretação. O Senador Júlio... Senador, perdão. O Procurador Júlio Marcelo se recusou muito a dizer que havia uma dupla interpretação, porque, se ele dissesse isso, ele saberia que nós cairíamos no in dubio pro reo. A Acusação diz: "Não, in dubio pro reo não se aplica a interpretações, aplica-se a fatos." De fato, há autores que dizem isso, não vamos negar – há autores que dizem isso. Mas, se não querem aplicar o in dubio pro reo para a interpretação, interpretem em relação aos fatos. Onde está o dolo da Presidente da República? As pessoas não têm dúvida de que ela agiu dolosamente diante de tudo isso que foi exposto? In dubio pro reo. As pessoas não têm dúvida em relação aos atos dela? In dubio pro reo. Apliquem o in dubio pro reo para os fatos, e ela estará absolvida.
    O in dubio pro societate, ou seja, o in dubio para a sociedade era na pronúncia. Agora, é, na dúvida, pro reo, e quem não fizer isso estará descumprindo um princípio de direito e humanitário que foi superado no final do século XVIII. Na Idade Média, na dúvida, se acusava e se condenava. Depois, já no século XIX, não. Absolvia-se. Mas mesmo a dificuldade de se aplicar o in dubio pro reo para interpretações, parece-me um verdadeiro absurdo, talvez seja garantista demais, democrata demais, respeitado do Estado de direito demais, porque, se há dúvida quanto ao direito aplicável, eu puno? Mormente quando a posição condenatória é dada por um órgão e todos demais, os juristas dizem o oposto, eu puno? É correto, é correto, diante de uma situação em que as pessoas disputam juridicamente algo, eu condenar alguém por uma tese que nunca foi defendida antes? Senhores, são clamorosamente improcedentes as acusações, são pretextos; pretextos semelhantes àqueles que levaram que Dilma Vana Rousseff a ser condenada nas auditorias militares. Passado algum tempo, ninguém lembrará mais deles, porque são insustentáveis. Talvez o próprio Tribunal de Contas, diante da situação absurda que está gerando com as interpretações tenha que mudar, tenha que flexibilizar, porque, se ele não flexibilizar, ele mata todos os governos que se seguirem, e aí então a história documentará algo perverso: uma Presidente da República sendo condenada por uma tese episódica; criada para ela; em razão dela, e para condená-la. É isso que queremos no Brasil? E por que são tão improcedentes as acusações? Por quê? Pelo desvio de poder. Voltamos ao início da nossa história. O desvio de poder foi construído a partir da decisão de Eduardo Cunha abrindo este processo. Precisavam se encontrar pretextos; dialogaram com a oposição; pegaram a primeira coisa que tinham em 2015 e enfiaram tanto enfiaram sem estudo que três decretos não geravam despesa e foram obrigados a reconhecer isso, foram obrigados a reconhecer que três decretos não estavam adequados. Não tinham estudado nada, pegaram pretextos, enfiaram em uma denúncia, para ter justificativa da abertura de um processo em que estavam somados juntos os insatisfeitos com 2014 e os que queriam o fim da Operação Lava Jato. E, aí, a tese teve que ser remodelada, porque, a cada dia, tinha dificuldades. Primeiro, dizia o Dr. Júlio Marcelo que o excesso de arrecadação podia baixar, depois, não podia, depois, é a meta orçamentária, prazo, não tinha, vamos criar um prazo, vamos criar situações. Tudo isso foi sendo montado na perspectiva condenatória da forma mais perversa e hedionda que se pode imaginar. O desvio de poder fica patente. E, aí, Sr. Presidente, eu marcho já para a conclusão, dizendo o seguinte: é correta, é justa uma punição neste caso? Alguém dirá, e eu tenho lido isso nos jornais: olha, a gente sabe que não é bem esses dois fatos, é o conjunto da obra. Como disse a Senhora Presidente da República, conjunto da obra se aprecia nas eleições, conjunto da obra é o povo que decide, porque a vontade popular é soberana. Se os senhores querem que se julgue o conjunto da obra, aceitem a proposta da Senhora Presidente da República de convocar plebiscito agora, é lá que se julga o conjunto da obra, porque, no presidencialismo, não se condena alguém sem prova e por fatos desses, no presidencialismo, não se condena alguém sem crime de responsabilidade, sem ato grave, sem ilícito, sem dolo, com perspectivas retroativas, não se faz isso. E alguém poderá me dizer: não, no fundo, veja, é só a perda do mandato, eu não estou atingindo Dilma. Não? É uma pena de morte política, é uma execração que se faz a uma pessoa digna. Poderão os senhores dormir com as suas consciências tranquilas daqui para a frente, se apertarem o botão sim.
    Já houve um autor que disse que a pior tortura que um ser humano tem é condenar um inocente, se essa pessoa tem dignidade, porque, ao fazê-lo, aquilo o acompanhará pelo resto das suas vidas e, quando olharem no espelho, saberão que puniram uma inocente por pretextos, por questões absolutamente não fundamentadas. Concluo, até mesmo antes do prazo, Sr. Presidente, dando um testemunho aos senhores. Uma das coisas que mais me emocionou ao longo do período em que fui Ministro de Estado da Justiça e fui aquele que mais tempo ficou na democracia exercendo este cargo, foram mais de cinco anos, perdi por uma semana para o Ministro que, na época da ditadura, havia ficado mais que eu, mas uma coisa que mais me emocionava, Sr. Presidente, era dar cumprimento à Lei da Anistia. Pela Lei da Anistia, Senador Renan, e V. Eª que foi Ministro da Justiça sabe disso, quando se faz um julgamento dizendo que alguém foi injustiçado pelo Estado brasileiro e é anistiado, o Ministro da Justiça, perante seus familiares, pede desculpa, em nome do povo brasileiro, por aquilo que aquela pessoa sofreu. Isso me deixava muito tocado, especialmente porque não peguei os tempos duros da ditadura, por uma questão de idade, peguei o seu final, mas vi pessoas sendo presas, violentadas, injustiçadas. O que mais me doía é quando eu tinha que pedir desculpas e a pessoa já tinha morrido, quando eu tinha que fazer uma homenagem post-mortem e via a injustiça pesando no ombro de filhos e netos em que eu pedia desculpas para efeito moral, mas a dita pessoa já tinha se ido, mas a vida da pessoa já tinha se perdido. Peço a Deus que algum dia, se Dilma Rousseff for condenada, um novo Ministro da Justiça tenha dignidade de pedir desculpas a ela. Se ela estiver viva, se faça de corpo presente; se estiver morta, à sua filha e a seus netos. Que se peça desculpas a Dilma Rousseff, se ela vier a ser condenada; que a história faça justiça com ela; que a história absolva Dilma Rousseff, se V. Exªs quiserem condená-la. Mas se V. Exªs quiserem fazer justiça para evitar que, no futuro, alguém tenha que pedir desculpas, como eu pedi àqueles que sofreram violência do Estado, julguem pela justiça, julguem pelo estado de direito, julguem pela democracia. Não aceitem que o nosso País sofra um golpe parlamentar e uma pessoa honesta, correta, íntegra tenha a pena de morte política para que, no futuro, alguém tenha que dizer: Me desculpe, Dilma Rousseff, pelo que a ditadura lhe fez e pelo que a nossa democracia também lhe fez.
    Votem, por favor, pela justiça e pela democracia. Eu não tenho mais nada a dizer. Os autos falam por mim. Muito obrigado".
  • 5. Veja, agora, um duelo de opiniões sobre o tema:

    5 /5(Divulgação / Agência Senado)

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