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O que muda com a Nova Raposo Tavares — e por que parte dos moradores é contra o projeto

Projeto prevê investimentos de R$ 9,07 bilhões e será parte do Programa de Parcerias de Investimentos do governo do estado de São Paulo

Raposo Tavares: entenda o projeto de privatização da rodovia (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Raposo Tavares: entenda o projeto de privatização da rodovia (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Luiza Vilela
Luiza Vilela

Repórter de POP

Publicado em 1 de maio de 2024 às 09h12.

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Na lista das estradas mais perigosas de São Paulo e com maior trânsito da Região Metropolitana do estado, a rodovia Raposo Tavares, que liga as cidades de Cotia e Vargem Grande Paulista à capital, está na agenda de privatizações do governo de Tarcísio de Freitas. A iniciativa faz parte de um planejamento de concessão de 125 quilômetros de rodovias à iniciativa privada, das quais um trecho da Raposo faz parte.

Intitulado como "Nova Raposo", o projeto prevê investimentos de R$ 9 bilhões e será parte do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do governo do estado. A parte que liga a rodovia Castello Branco à cidade de São Roque (SP-053), assim como o trecho municipal da ligação Cotia-Embu das Artes, também fazem parte da concessão. A previsão é que as obras sejam concluídas em 2033.

"A Nova Raposo é o resultado de um programa muito bem sucedido de concessão de estradas em São Paulo. A rodovia Raposo Tavares tem um trecho muito representativo, que já passou por muitos projetos sem 'sair do papel' porque ela inclusive ultrapassa os limites de São Paulo, o que torna sua concessão mais delicada", diz Isadora Cohen, ex-secretária-executiva de Transportes Metropolitanos do Estado de São Paulo e atualmente sócia da ICO Consultoria. 

Nova Raposo Tavares, segundo projeto elaborado pelo governo de São Paulo - Crédito: Reprodução (Reprodução/Reprodução)

O que vai mudar na Nova Raposo Tavares?

A ideia é que, com a privatização da Raposo Tavares, o trecho que liga Cotia e São Paulo tenha até seis pórticos para cobrança de pedágio automática — no modelo conhecido como free flow. Hoje, não há cobranças na região. A previsão é que os novos equipamentos sejam instalados em 2026, mas sua cobrança só começará a valer após o fim das obras.

O projeto total de concessão prevê a duplicação de mais de 36 quilômetros de rodovias, bem como a implementação de 28 quilômetros de faixas adicionais, 48 quilômetros de marginais, 24 novos dispositivos viários, 38 passarelas e 73 pontos de ônibus. Nos trechos urbanos, também há previsão de construção de túneis e viadutos.

Os seis novos postos de pedágio, previstos para ficar entre os quilômetros 11,8 e o 39,1 da Raposo Tavares, também serão automáticos, sem cabines, com pagamento da tarifa pelo sistema free flow. O valor será calculado pelo trecho percorrido.

As vias que estão atualmente sob concessão da ViaOeste (SP-280 - Castello Branco; SP-270 - Raposo Tavares; SP-075 - Senador José Ermírio de Moraes (Castelinho) e SPI-091/270 - Dr. Celso Charuri) terão seus atuais pedágios convertidos em pórticos, segundo os planos do governo. A mudança, diz a gestão paulista, pode reduzir a tarifa em até 20%.

"Acredito mesmo que isso pode mudar o trânsito da região, porque são muitos os benefícios dessa obra. Mas é um processo que demora, leva anos até que o projeto de concessão comece as obras. Mas vai gerar benefícios, inclusive de novos empregos e renda. A ideia é ter uma rodovia que é mais comparável com aquilo que a gente vê nas outras rodovias da cidade, que hoje a Raposo não tem", acrescenta Cohen.

A proposta é conceder trechos de vias operadas hoje pela concessionária ViaOeste, controlada pela CCR, e incluir rodovias sob a gestão do Departamento de Estradas de Rodagem (DER), como o trecho inicial da Raposo até Cotia, e a SP-029, que interliga a Raposo e a Castello Branco, passando por Cotia e Itapevi.

A Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp), responsável pelo desenvolvimento do projeto, diz que o plano está em fase de testes e que os estudos para a área podem sofrer ajustes. A agência realizou duas audiências públicas sobre o projeto (veja aqui e aqui).

“Os recursos serão aplicados também em melhorias em dispositivos de acesso e retorno, entre outras obras de infraestrutura viária, além de serviços como atendimento por equipes de socorro mecânico, guincho, primeiros socorros e monitoramento das rodovias por sistemas de câmeras”, informou a Secretaria de Parcerias em Investimentos do Estado de São Paulo.

A Nova Raposa Tavares desagrada muitos moradores de Cotia e região

A concessão da estrada está atualmente dentro do processo de consulta pública. Depois, será confeccionado um edital, que levará a um leilão e assinatura posterior do contrato para o vencedor. A estimativa é que tudo esteja completo até o último trimestre deste ano.

Em audiência pública na Câmara municipal de Vargem Grande Paulista, a prefeitura local reivindicou a criação de novas passagens elevadas na rodovia na região central do município. Em Cotia, a câmara local aprovou um pedido de realização de consulta pública. Até o momento, não há informação de se essa sessão será realizada — o que vem gerando críticas de moradores e urbanistas.

Até aqui, 80 entidades — que vão desde associações de bairros, empresas locais e coletivos de ambientalistas — se manifestaram contra o projeto e pedem a reabertura das consultas públicas.

Eles reclamam da cobrança tarifária dos pedágios, que vão aumentar o custo de vida da região, dos trechos que adentram áreas residenciais, e do impacto ambiental nas áreas preservadas de mata atlântica. Os primeiros três quilômetros da rodovia são bairros exclusivamente residenciais, conforme Plano Diretor e Lei de Zoneamento de São Paulo, alegam.

Em meados de abril, a deputada Marina Helou (Rede) protocolou representação no Ministério Público de São Paulo (MP-SP) em que pede a paralisação do projeto, citando ser uma demanda dos moradores. O governo do estado alega que o projeto ficou mais de 30 dias em consulta pública e teve duas audiências presenciais divulgadas nos canais oficiais. 

A pesquisadora Raquel Rolnik, urbanista, professora da Universidade de São Paulo (USP) e autora de diversos livros sobre mobilidade urbana, foi uma das que se colocou contra a Nova Raposo Tavares.

Segundo Rolnik, a Raposo Tavares tem características de uma via urbana e com uma grande população moradora, e por isso deveria receber faixas exclusivas de ônibus, por exemplo, em vez de ser considerada uma via interestadual.

Vai melhorar o trânsito da região?

Para Isadora Cohen, o projeto vai beneficiar as cidades da região metropolitana de São Paulo. E sendo feito pela iniciativa privada, há maiores chances de que a Nova Raposo Tavares seja melhor fiscalizada.

"Fazer uma concessão é justamente um mecanismo que permite manter a propriedade da rodovia com o estado, de certa forma. Ele fica responsável por fiscalizar por monitorar, ele tem uma agência reguladora (Artesp) que aplica a penalidades. É uma forma de assegurar que a estrada vai ficar melhor, na minha opinião", diz ela à EXAME.

Cohen destaca, no entanto, que embora estado de São Paulo tenha feito uma comunicação eficaz, diante das audiências públicas que ficam acessíveis em canais oficiais e seguros, ter uma divulgação melhor desses materiais pode fazer com que o diálogo com os moradores.

"Difundir as audiências públicas é muito importante também, a mensagem precisa ser propagada. Nas audiências e em outros locais, dar a voz a representantes mais organizados dessa população, que vai ser impactada muitas vezes, também auxilia no processo de compreensão", comenta ela.

Na segunda-feira, 22 de abril, Tarcísio tentou apaziguar a situação. "É óbvio que tem essa reação, que tem esse desconforto. É compreensível, mas eu tenho certeza que isso é mitigado a partir do momento que o projeto está bem estruturado e esse investimento se materializa. Aí a gente vai fazer a diferença", disse a jornalistas em coletiva de imprensa.

Em nota, o governo de São Paulo declarou que não haverá custo adicional aos moradores de Cotia e região com a instalação dos pedágios. As vias marginais que atendem ao tráfego dos municípios não serão tarifadas. O custo virá somente dos quilômetros percorridos nas vias expressas.

Ele ressaltou, ainda, que o projeto passará por uma série de mudanças até que seja aprovado.

"Nenhum projeto sai do jeito que entrou. É aquele negócio: quando você faz, quando você está querendo fazer, tem a reação. Quando o investimento começa a se materializar, o pessoal diz: ‘puxa, isso vai fazer diferença’. Imagina quando, em 2025, as marginais da [rodovia] Castelo Branco as pontes sobre a [Marginal do Rio] Tietê estiverem prontas e a gente estiver beneficiando quem vem de Barueri, quem vem de Itapevi... É uma diferença muito grande”, afirmou.

Por que a Raposo Tavares importa?

A estrada está entre as mais importantes do estado, em especial pelo gargalo de trânsito que faz nos horários de pico. São mais de 118 mil veículos que transitam na rodovia todos os dias, única alternativa para o tráfego entre Cotia e a capital paulista.

Além do trânsito, o trecho também está longe de ser seguro: a Raposo Tavares ficou em terceiro lugar no ranking de acidentes com mortes em 2023, segundo informações do Infosiga, do governo estadual. A média foi de 96 acidentes fatais no ano, atrás da Dutra (112) e da Anhanguera (140) — ambas com maior tráfego de veículos.

Como funciona o pedágio free flow?

Free Flow funciona como um facilitador para motoristas que necessitam transitar por áreas pedagiadas. O mecanismo funciona a partir de tags terceirizadas e leitura das placas dos veículos, como fazem os radares.

Dessa forma, a cobrança é enviada após a passagem do veículo, feita diretamente pelo método de pagamento escolhido pelo condutor com a sua tag. Para quem não possui esse serviço, o débito precisa ser acertado em até 15 dias depois da passagem. 

"A tecnologia free flow está muito bem alinhada com as boas práticas nacionais e internacionais. Promove uma cobrança mais justa do pedágio, porque torna possível fazer espaçamentos menores, e o valor vem alinhado com a distância percorrida. Os editais mais recentes estão adotando esse modelo e é uma boa coisa, porque favorece uma justiça tarifária", explica Isadora Cohen

Projetos que não saem do papel

Os projetos de mudança na rodovia são discutidos há mais de 20 anos, e já envolveram promessas que vão desde a duplicação das vias até a construção de um monotrilho que ligaria São Paulo e Cotia.

Em 2010, o governo chegou a cogitar a construção de uma linha de Veículo Leve sobre Trilhos (VLT). Nenhum dos planejamentos chegou a sair do papel.

Em 2022, o governo de São Paulo anunciou que está fazendo estudos na região para a extensão de uma linha de metrô até a região de Cotia. O projeto seria uma extensão da Linha 22-Marrom do Metrô, que teria 19 estações ao longo da rodovia para chegada até a cidade da região metropolitana. Ela estaria ligada à estação Sumaré (Linha 2-Verde). A demanda é de cerca de 650 mil passageiros ao dia.

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