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O que a busca de Bolsonaro por um partido diz sobre as eleições de 2022

O presidente tem até março de 2022 para se filiar a um partido, caso queira concorrer às eleições, e, com a popularidade em queda, tem cada vez menos poder de barganha para negociar a filiação

Bolsonaro está em negociações avançadas com o PL de Valdemar Costa Neto, mas mantém conversas com o PP do ministro Ciro Nogueira (Andressa Anholete/Getty Images)

Bolsonaro está em negociações avançadas com o PL de Valdemar Costa Neto, mas mantém conversas com o PP do ministro Ciro Nogueira (Andressa Anholete/Getty Images)

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Alessandra Azevedo

Publicado em 23 de novembro de 2021 às 06h00.

Última atualização em 23 de novembro de 2021 às 06h54.

A procura do presidente Jair Bolsonaro por um partido, depois de dois anos sem legenda e a 10 meses das eleições de 2022, ajuda a entender o desenho que se forma para o pleito do ano que vem. Se, em 2018, o atual chefe do Executivo se colocava como a opção contra “tudo que está aí”, agora ele abraça o Centrão e se apoia na força da caneta presidencial para viabilizar uma campanha robusta.

Os partidos se preocupam em garantir bancadas fortes na Câmara e no Senado, de forma que nenhum governo possa ignorá-los na hora de tentar aprovar projetos. Muito além de uma aposta na vitória de Bolsonaro, a aproximação dessas legendas com o presidente é uma estratégia para conseguir emplacar candidatos e ocupar o máximo de cadeiras possível a partir de 2023.

Os partidos acreditam que ter uma liderança de projeção nacional deve atrair votos e resultar em mais influência nas decisões políticas. E, mais do que isso, estão de olho em ampliar o dinheiro do fundo eleitoral. O cálculo para divisão dessas verbas leva em consideração o número de deputados de cada partido (veja abaixo).

Legendas interessadas na filiação do presidente acreditam que Bolsonaro ainda é um puxador de votos em alguns grupos afinal, a aprovação dele oscila entre 20% e 25%. Pesquisa EXAME/IDEIA divulgada em 22 de outubro mostra que 23% dos brasileiros acham o trabalho do presidente ótimo ou bom, enquanto 53% avaliam a gestão como ruim ou péssima. 

Além disso, com a caneta na mão, Bolsonaro tem recursos disponíveis para oferecer. Não necessariamente orçamentários, mas ligações em ministérios e cargos, por exemplo, ressalta a doutora em ciência política Carolina Botelho, pesquisadora da Universidade Mackenzie. “Quem está no Planalto tem poder que outros candidatos não têm”, enfatiza. 

O cenário, entretanto, é bem diferente das últimas eleições, diz Botelho. O que aconteceu com o PSL em 2018 não deve se repetir, pelo menos no mesmo nível, em 2022. Naquele ano, não só o candidato à Presidência da sigla venceu, como a bancada na Câmara saltou de um deputado eleito, em 2014, para 52. 

Depois de se unir a Bolsonaro, o PSL se tornou a segunda maior bancada na Casa, atrás apenas do PT, que elegeu 56 deputados. Mas, dessa vez, o presidente não tem o mesmo potencial de inflar uma legenda, avaliam especialistas. “A situação depois de quatro anos de mandato é outra”, diz o cientista político André César, da Hold Consultoria. 

Além de receber críticas pela gestão, principalmente em relação à economia, Bolsonaro não pode mais se colocar como o “outsider” contra a “política tradicional”, como fez três anos atrás. Antes, ele era um candidato desconhecido de boa parte das pessoas e surfou na onda conservadora, antipolítica e antipetista. 

Agora, em vez de se segurar em promessas de campanha, Bolsonaro será julgado pelo que fez durante o mandato, o que inclui a gestão da pandemia de covid-19 e as políticas econômicas. “Ele não é mais visto como um ‘fenômeno’, é um político do Centrão. Bolsonaro deixou de ser novidade e vai ter que enfrentar muitos ataques”, afirma César.

Prós e contras

O partido que filiar o presidente terá vantagens, como maior visibilidade para a legenda e mais doações de pessoas físicas. Mas também desvantagens, já que a campanha presidencial tende a ser cara, ressalta a cientista política Daniela Campello, professora da Ebape/FGV e pesquisadora residente no Wilson Center, em Washington. “Não me parece óbvio que o saldo seja positivo para a legenda que abrigá-lo”, aponta.

Bolsonaro, na avaliação de Campello, está "correndo contra o relógio" e precisa de uma legenda mais do que qualquer legenda precisa dele. O presidente tem até março de 2022 para se filiar a um partido, caso queira concorrer às eleições, e, com a popularidade em queda, tem cada vez menos poder de barganha para negociar a filiação, avalia a especialista.

Para o presidente, é importante estar em uma sigla capaz de garantir uma campanha muito bem estruturada para lidar com várias adversidades. Está claro que a estratégia não será a mesma de 2018. Em 2022, ele precisará estar em um partido grande, com recursos para bancar a candidatura e capilaridade para conseguir votos na ponta.

Bolsonaro terá necessidade de uma estrutura partidária forte para fazer frente aos adversários e aos ataques que deve receber, principalmente os relacionados à economia, assunto que tem potencial de derrubar a popularidade dele. Inflação e desemprego são dois fatores que pesam em qualquer tentativa de reeleição.

“Como o país está pior do que quando ele entrou, do ponto de vista econômico, a estrutura partidária nesse momento e os recursos vão fazer muita diferença na campanha”, diz o cientista político Marco Antonio Teixeira, da Fundação Getulio Vargas (FGV). A política de rede social não deve funcionar tão bem, já que ele será cobrado pelo que entregou nos quatro anos de mandato. 

Adversários

Em 2022, o presidente também terá que lidar com fatores que não estavam presentes nas últimas eleições, como as candidaturas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não de uma segunda opção, como foi Fernando Haddad (PT) em 2018 e do ex-juiz e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro (Podemos). 

Enquanto o petista desponta como favorito nas pesquisas e é o maior nome “anti-Bolsonaro” no país, Moro se coloca como opção para o eleitorado conservador, de extrema-direita e liberal, perfil que pode roubar votos do presidente. Lula é um adversário de peso e com recall. E Moro assusta Bolsonaro, porque pega o espaço de outsider antipetista contra a corrupção”, diz César. 

É natural que Bolsonaro esteja preocupado com os rivais. A mais recente pesquisa EXAME/IDEIA, divulgada em 12 de novembro, mostra que Lula ampliou a vantagem em relação a ele nas intenções de voto do segundo turno. Se as eleições fossem hoje, o petista teria 48% e o candidato à reeleição, 31%. Em julho, a distância entre os dois era de 12 pontos percentuais.

Mesmo com algumas resistências políticas, Moro também é um candidato que não pode ser ignorado. A pesquisa mostra, na simulação de primeiro turno estimulada (quando os nomes são apresentados previamente), que Ciro Gomes (PDT) aparece com 7% das intenções de voto, e o ex-juiz, com 5%. Lula tem 35% e Bolsonaro, 25%.

A situação partidária de Moro é bem diferente da de Bolsonaro e Lula. Ele se filiou a um partido não muito grande, o Podemos, que tem uma bancada pequena na Câmara, apesar de mais forte no Senado são 11 deputados e nove senadores. O ex-juiz não tem tanta abertura no mundo político, depois da Operação Lava Jato, e não foi disputado por partidos. 

No caso de Moro, o Podemos ganha projeção e doação de campanha, enquanto ele, como candidato, pode ficar em uma legenda menor, porque atrai atenção sozinho. Como tem uma rejeição grande entre políticos, não teria como estar em um partido maior, mas acrescenta muito ao Podemos. “É uma estratégia relativamente parecida com a de Bolsonaro em 2018, mas não naquela proporção”, diz Campello.

Estratégia

Nesse cenário, Bolsonaro passou a priorizar conversas com partidos grandes, mesmo sabendo que eles já têm lideranças muito fortes. Depois de ter cogitado se filiar a legendas menores, como Patriota e Avante, que têm seis e oito deputados, respectivamente, a atenção está voltada principalmente ao PL, que tem 43, e ao PP, com bancada de 42 deputados.

Bolsonaro não conseguirá ser “dono” de nenhum deles. Quem dita as regras, no PL, é Valdemar Costa Neto, presidente do partido, com quem as negociações estão mais avançadas. O PP também tem nomes importantes consolidados, como Ciro Nogueira, atual ministro da Casa Civil e presidente da legenda, e o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL). 

O problema é que o presidente, embora saiba que precisa de uma legenda robusta para a campanha, não quer abrir mão do apoio de diretórios regionais. Ele quer garantia de que o partido estará com ele também nos palanques estaduais. Esse nível de fidelidade é praticamente impossível de se exigir de um partido, principalmente do Centrão, diz Teixeira, da FGV.

Pesa, para Bolsonaro, a tendência de que alguns diretórios do PL não só não garantam apoio aos candidatos dele, mas apoiem nomes com quem ele já se indispôs. Para Teixeira, o presidente busca um partido “para chamar de seu” e se esquece que, no Brasil, “o que ele pede não existe em partidos maiores”, que é alinhar as alianças nacionais com os estados.

Foi esse o motivo do desentendimento entre Bolsonaro e Valdemar Costa Neto, presidente do PL, na semana passada, poucos dias depois de o presidente ter anunciado que estava 99,9% fechado com o partido. Bolsonaro não estava satisfeito com o arranjo feito em São Paulo, onde o PL pretende apoiar a candidatura de Rodrigo Garcia (PSDB) ao governo. 

Para o presidente, é inadmissível que o partido apoie o mesmo nome que o atual governador, João Doria (PSDB), grande adversário dele. Além disso, Bolsonaro ainda trabalha com a possibilidade de lançar o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, como candidato ao governo de São Paulo.

Uma das opções para resolver o impasse poderia ser a filiação de Garcia ao PL, o que tem mais chance de acontecer se Doria perder as prévias do PSDB. Esse é um dos motivos pelos quais Bolsonaro espera o resultado da votação entre os tucanos para decidir sobre a filiação ao PL.

"A gente não vai aceitar em São Paulo o PL apoiar alguém do PSDB”, disse o presidente, em viagem a Dubai no último dia 14. Ele também se preocupa com a possibilidade de que, no Nordeste, o partido acabe fazendo alianças com a esquerda. Em alguns casos, como no Piauí, a legenda pode se unir ao PT.

Na última quarta-feira, 17, Costa Neto se reuniu com representantes dos diretórios estaduais. Na saída, dirigentes do PL afirmaram que ficou decidido que ele, presidente do partido, terá “carta branca” para negociar a filiação de Bolsonaro. O objetivo é sinalizar que a sigla está pacificada para receber o presidente.

"O Partido Liberal está pronto e alinhado para receber o presidente da República, Jair Bolsonaro, em todos os estados", divulgou o PL, em nota, após a reunião. Valdemar Costa Neto "tem carta branca para conduzir e decidir sobre a sucessão presidencial e a filiação", diz o documento.

Não significa que Bolsonaro terá liberdade para mudar posicionamentos nos estados. Com 27 diretórios pelo país, é inevitável que haja alianças regionais, algumas até já avançadas, que podem destoar da decisão do diretório nacional, mesmo que haja promessas de fidelidade.

“Para um partido abrir mão de alianças consolidadas em estados, precisa ter uma segurança eleitoral muito forte, e Bolsonaro está longe de oferecer isso. A popularidade dele deve se manter como está e pode até cair”, diz Teixeira. Com a baixa popularidade, “os partidos não estão dispostos a tudo para recebê-lo”, acrescenta Campello.  

Pós-eleição

Ou seja, se priorizar fatores como recursos e tempo de televisão, Bolsonaro terá estrutura para a campanha, mas não terá a palavra final dentro de qualquer legenda que escolher. E, mesmo que acerte a filiação com o PL, o movimento de recuo anterior aumenta o grau de insegurança em relação ao comportamento do presidente.

Para Cesar, da Hold, a relação entre Bolsonaro e o PL, se for confirmada a filiação, tende a ser tumultuada, o que já ficou claro nas primeiras trocas de farpas entre ele e Costa Neto. O presidente não tem histórico de ser fiel aos partidos e já esteve em oito legendas desde que entrou na política. Ainda assim, no momento, é um jogo que interessa aos dois. 

Por enquanto, os partidos estão de olho em quem acrescenta à campanha e pode ter o efeito de aumentar a bancada no Congresso. Mas, depois das eleições, tudo pode mudar. Quem assumir o Palácio do Planalto precisará, necessariamente, compor com partidos, e as legendas do Centrão sabem bem disso. 

“No momento, o que dita o tom é a perspectiva de poder. É bom estar com o presidente em ano eleitoral, porque ele tem a caneta na mão. Mas, se Bolsonaro não vencer a eleição, o partido que ele escolher vai se aproximar do vencedor”, diz César.

A relação do presidente com o Centrão, independentemente da legenda que o abrigar, é frágil e pode ruir até antes de 2023. "O compromisso desses partidos é com o próximo governo, não com quem é o presidente", observa Botelho. Ela lembra que o PL, por exemplo, esteve na base do governo Lula.

"Não há dúvidas de que, no último segundo, esses partidos mais fisiológicos podem pular fora da candidatura de Bolsonaro, se ela não decolar. Eles vão se beneficiar enquanto conseguem. Mas, se ele perder, nenhum se segura", avalia a cientista política.

Fundo eleitoral

Pela legislação eleitoral, 48% dos recursos do fundo são divididos entre as legendas de forma proporcional ao número de representantes que cada uma tem na Câmara. Outros 35% são distribuídos com base no percentual de votos válidos obtidos pelas siglas que tenham pelo menos um representante na Casa. 

Por fim, 15% dependem da proporção do número de representantes no Senado e 2% são divididos igualmente entre todos os partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O valor do fundo em 2022 é estimado em 2,1 bilhões de reais na proposta orçamentária enviada pelo governo, mas pode mudar no Congresso.

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