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O meio ambiente na corda bamba entre Bolsonaro e Haddad

Temas ambientais não receberam atenção nos debates à altura de sua importância estratégica para o presente e futuro do país. Agora, é esperar para ver

Devastação na Amazônia (Reuters/Reuters)

Devastação na Amazônia (Reuters/Reuters)

Vanessa Barbosa

Vanessa Barbosa

Publicado em 27 de outubro de 2018 às 06h47.

Última atualização em 27 de outubro de 2018 às 06h47.

São Paulo - Mudança climática, uso da terra, saneamento, conservação da biodiversidade e gestão dos recursos naturais são temas críticos para o planejamento e desenvolvimento de um país, afinal, afetam negócios, economia e a própria saúde nacional. Apesar disso, as pautas que integram a agenda ambiental não receberam atenção nos debates presidenciais das eleições de 2018 à altura de sua importância estratégica para o presente e futuro do Brasil.

Na reta final do segundo turno, o tema ganhou um pouco mais de projeção, puxado por uma série de declarações do candidato do PSL, Jair Bolsonaro, que deixaram cientistas e ambientalistas em polvorosa, como a intenção de retirar o Brasil do maior acordo de combate às mudanças climáticas do mundo e a proposta de unificar sob uma mesma pasta o combalido (mas crucial) Ministério do Meio Ambiente e o poderoso Ministério da Agricultura.

Ninguém sabe o que virá pela frente, mas o certo é que o desfecho das eleições de 2018 pode ser mais importante para a política ambiental e energética do país do que qualquer outro por um longo tempo. Uma conta preocupante que acena para as potenciais consequências ambientais do resultado das urnas neste domingo (29) é a estimativa de que o desmatamento na Amazôna pode triplicar sob o governo de Bolsonaro, considerando que o ex-militar, uma vez eleito, leve a cabo suas promessas.

Segundo o estudo, feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão que monitora o desmatamento no bioma, um cenário em que o Ministério do Meio Ambiente seja subordinado ao Ministério da Agricultura, que as atividades de fiscalização do Ibama sejam reduzidas, que terras indígenas sejam abertas para a mineração, e que o Brasil saia do Acordo de Paris – situações sinalizadas nos últimos meses por Bolsonaro e equipe - poderiam fazer o desmatamento subir 268%, saltando dos atuais 6,9 mil km² (relativos a 2017) para 25,6 mil km² por ano a partir de 2020.

A incerteza sobre os impactos regulatórios e judiciários de tais mudanças na política ambiental brasileira preocupa tanto grupos de ambientalistas como entidades ligadas ao agronegócio, duas forças que normalmente aparecem em lados opostos. Em carta aberta aos candidatos à presidência, a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura reafirma o importante compromisso que o país tem com o mundo para assegurar a segurança alimentar, hídrica e climática da humanidade.

"A agricultura brasileira depende de condições climáticas, como chuva, umidade e temperatura. Essas condições só podem ser asseguradas pela conservação das florestas. As áreas protegidas, por exemplo, sejam elas unidades de conservação, terras indígenas ou territórios quilombolas, ajudam a preservar os serviços ecossistêmicos prestados pelas florestas e fundamentais para o agronegócio, como a água, a redução de erosão, a atenuação de extremos climáticos, os polinizadores e o habitat necessário aos controladores de pragas e doenças", diz o texto.

O documento, que defende a necessidade de diálogo entre o setor ambiental e o agrícola, é assinado por 180 entidades, entre elas gigantes do agronegócio como Amaggi, Cargill, Fibria e ONGs como o Imazon, WWF e Ipam. Em coro, as entidades se declaram contrárias à saída do Brasil do acordo climático de Paris (que prevê a limitação do aumento da temperatura global abaixo de 2º ou 1,5 graus Celsius) e dizem que isso pode prejudicar a reputação das empresas e produtores brasileiros tendo em vista as demandas crescentes por mais sustentabilidade no comércio internacional de produtos agropecuários.

Outras 31 redes e organizações da sociedade civil, entre elas as ONGs SOS Mata Atlântica, Greenpeace e Observatório do Clima, também divulgaram um manifesto criticando propostas que vêm sendo feitas pelo candidato do PSL. “Meio ambiente é coisa séria. Diz respeito à nossa qualidade de vida e ao mundo que deixaremos para nossos filhos, seja qual for a nossa forma de pensar, agir e lutar. A sua proteção constitui direito fundamental de toda a sociedade brasileira, configurando-se como pauta apartidária. O próximo Presidente da República tem o dever de reconhecer e se comprometer com a proteção das conquistas ambientais da sociedade”, alerta o documento.

A candidatura do presidenciável do PT, Fernando Haddad, dialoga melhor com a perspectiva ambiental e fala na “transição ecológica para a nova sociedade do século 21”. De acordo com o programa do petista, seu eventual governo buscaria uma economia de baixo carbono, investiria na agroecologia e garantiria "práticas e inovações verdes” para impulsionar o crescimento inclusivo, desenvolvimento nacional e bem-estar da população.

Em seu programa, Haddad diz, ainda, que pretende zerar a taxa de desmatamento da Amazônia até 2022, limitando a expansão da fronteira agropecuária - maior motor de perda floresta atualmente, inclusive no Cerrado, bioma essencial para manutenção do equilíbrio hídrico no país. 

Apesar de pintar um quadro mais otimista para o meio ambiente, o programa petista ainda precisaria ser aprimorado  para dar conta das complexidades dos desafios dessa seara  entre eles, e talvez mais crítico, destaca-se a falta de verba pública. O governo Temer, por exemplo, contingenciou o orçamento dos últimos dois anos do Ibama e congelou contratações para repor funcionários que se aposentam ou simplesmente se afastam do órgão. Em dois, anos, foi preciso fechar metade dos 140 escritórios espalhados pelo país por falta de recursos. Por melhor que sejam as intenções, sem dinheiro não dá para fazer muita coisa. 

Um dos caminhos para driblar a contenção de recursos, segundo proposta do candidato do PT, é, de um lado, realizar uma reforma fiscal verde, com um aumento progressivo no custo da poluição e um prêmio pela inovação de baixo carbono, e, do outro, lançar mão de uma isenção à investimentos “verdes” (isenção de IPI, dedução de impostos embutidos em bens de capital e recuperação imediata de ICMS e PIS / COFINS), reduzindo o custo tributário do investimento verde em 46,5%.

Intenções não faltam, é verdade, mas rareiam metas mensuráveis de médio e longo prazo que dimensionem o potencial impacto das propostas para o meio ambiente, seja para o bem ou para o mal. O desafio da agenda ambiental é muito maior do que fizeram parecer os debates entre os presenciáveis sobre o tema (inexpressivos no primeiro turno e inexistentes no segundo) e as promessas eleitoreiras. É o meio ambiente, como sempre, na corda bamba das disputas políticas do país.

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