Novo modelo da Virada Cultural não conquista público em SP
O secretário da Cultura, André Sturm, admitiu algumas falhas na nova proposta da gestão Doria para um dos maiores eventos da capital paulista
Estadão Conteúdo
Publicado em 22 de maio de 2017 às 08h47.
Última atualização em 22 de maio de 2017 às 10h13.
São Paulo - Ao responder à pergunta do jornal O Estado de S. Paulo durante a coletiva de imprensa que anunciou a Virada Cultural de 2017 , o responsável pela curadoria, o ator Hugo Possolo, se mostrou irritado ao ouvir do repórter se a organização estaria preparada para enfrentar um ano de público menor no centro, já que as atrações maiores não estariam mais presentes e os palcos seriam trocados por tablados.
"Curioso como você já está decretando que a Virada vai ter um público menor. Ninguém faz curadoria para não ter público."
Anunciada na mesma coletiva em tom de orgulho pelo presidente da SPTuris, David Barioni, como a data mais importante do calendário cultural da Cidade, ao lado da Parada LGBT, capaz de atrair mais de 4,5 milhões de pessoas no último ano, a Virada sentiu o golpe e esvaziou.
Mesmo sem a divulgação dos números oficiais, prevista para esta segunda, 22, a adesão era visivelmente mais tímida do que em anos anteriores.
Na coletiva realizada na noite de domingo, o secretário de Cultura, André Sturm, não admitiu que houve público menor e disse que vai aguardar os números oficiais. Sobre a pouca adesão no Autódromo de Interlagos, culpou a chuva.
"Se eu tivesse filho pequeno, eu não levaria para Interlagos, levaria para um cinema, um teatro ou em lugares fechados. Entre levar o filho ao shopping para comer um Bob's e assistir a um cinema e ir para o autódromo aberto, com chuva, levaria ao shopping."
Ele admitiu, porém, que algo deu errado no Anhembi, para onde deslocou os grandes shows, como o de Daniela Mercury. O público esperado, de 30 mil pessoas, acabou sendo de oito mil no sábado.
Muitos artistas que participaram do evento reclamaram da produção. "Esta é a pior organização que já vimos em 26 anos de carreira", escreveu a banda Dead Fish em suas redes sociais.
O pianista Vitor Araújo, que tocou no palco Instrumental, escreveu que não lhe foram dadas "as mínimas e mais básicas condições para realizar o show na Virada Cultural."
Mano Brown cancelou sua apresentação, marcada para o Centro Cultural Palhaço Carequinha, no Grajaú. Em sua página do Facebook, escreveu: "... Na sexta, por falta de organização interna do evento, a Virada não conseguiu entregar a estrutura mínima necessária para o show de uma banda de mais de 13 músicos. Se tudo estivesse pronto na sexta daria certo. Mesmo com a produção do artista cortando mais de 40% das exigências para o show e com todos cientes da complexidade que existia para realização do mesmo, não conseguimos evitar o cancelamento."
Um documento com rubrica do Ministério Público de São Paulo distribuído nos camarins do evento trazia uma advertência aos artistas para que não se manifestassem politicamente: "Considerando que os eventos são integralmente custeados pelo Poder Público, deve prevalecer o princípio da impessoalidade quanto a manifestações político partidárias para benefício ou em detrimento de qualquer pessoa pública."
Sturm disse que a decisão do MP não teve a ver com a Prefeitura, e que a organização da Virada apenas reproduziu e distribuiu o documento.
O som, orientado para um público menor, foi dos piores no histórico das Viradas. No palco dos musicais, houve atraso de uma hora e meia para o início da montagem de Gota D'água por causa de falhas.
E, mesmo depois dos ajustes, o espetáculo foi seriamente comprometido. Uma falha de logística impediu a apresentação dos DJs no coreto da Bolsa se Valores.
O palco, segundo os produtores da festa Talco Bells, não havia sido montado com a estrutura e os equipamentos combinados.
O tablado das Big Bands maltratou artistas renomados que ocupavam formações de, em média, 15 pessoas espremidas. O som do piano e do baixo pareciam sair de uma lata. Outro pecado foi o descaso com o espaço para a música do mundo no palco (ou seria um tablado?) chamado Refugiados e Imigrantes, na Rua Direita.
Uma formação de cubanos incendiários, o Batanga e Cia, venceu porque sua música era bem maior do que respeito que a Virada lhe destinou.
Mesmo com a orientação do Ministério Público, a politização marcou vários shows. No tributo a Tim Maia, o público pressionou o cantor Lincoln Tornado até que ele dissesse "Fora, Temer".
Pessoas empunhavam os cartazes mais vistos na Virada: "Doria mente" e "#querovotar. Diretas Já!". Artistas como as cantoras do Cabaré Queer, Filipe Catto e Fernanda Takai pediram eleições diretas e a retirada de Michel Temer. Daniela Mercury pediu por renúncia.
No intervalo do palco dos musicais, um jovem instigou a plateia do Vale do Anhangabaú regendo um 'Fora, Temer' do alto do Viaduto do Chá. André Sturm informou que vai repetir a Virada no ano que vem nos mesmos moldes.