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Conheça Eduardo Cunha, a grande pedra no sapato da Dilma

Ele é um aliado visto por petistas como oposicionista. Já cansou de impedir votações na Câmara de temas caros ao Planalto. Agora, com a guerra declarada, Dilma quer isolá-lo


	Eduardo Cunha: "Essa visão do PMDB como um partido meramente fisiológico tem muito de fantasia. Dá ao governo o falso argumento de que está, ao não respeitar a base aliada, apenas agindo eticamente"
 (Renato Araújo/ABr)

Eduardo Cunha: "Essa visão do PMDB como um partido meramente fisiológico tem muito de fantasia. Dá ao governo o falso argumento de que está, ao não respeitar a base aliada, apenas agindo eticamente" (Renato Araújo/ABr)

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Da Redação

Publicado em 11 de março de 2014 às 11h03.

São Paulo – Seria preciso confirmar diretamente com a presidente Dilma Rousseff, mas se ela tivesse que apontar quem lhe tem trazido mais dor de cabeça desde que assumiu o cargo, em 2011, um dos favoritos a integrar a lista tem nome e partido: Eduardo Cunha, líder do PMDB na Câmara.

O que já foi uma amizade forçada, daquelas em que o contato é restrito ao mínimo - só para apagar incêndios - descambou agora para a separação total, aparentemente: para as duas reuniões que fez hoje com os caciques do PMDB, Dilma não convidou o líder.

Eunício Oliveira, que tem um cargo correlato ao de Cunha – manda na bancada do Senado – foi.

A estratégia do Planalto não é segredo para ninguém: não se trata mais de negociar com o deputado. A meta agora é isolá-lo e refazer as pazes com o resto do partido.

A iniciativa, claro, não passou despercebida por Cunha, que logo reagiu no Twitter.

Em seu terceiro mandato, o carioca evangélico e graduado em economia é daqueles líderes que sai aplaudido pelos colegas quando consegue peitar e convencer o Planalto a recuar em pontos antes tidos como inegociáveis.

Foi assim, por exemplo, na MP dos Portos. Em 2013, o governo viu que, se não cedesse, não conseguiria o quórum necessário para aprovar o projeto, tido como essencial para modernizar o setor.

Cunha tinha questões pontuais das quais não abria mão. Diante das sessões que não arregimentavam a quantidade suficiente de parlamentares – só Cunha, vale lembrar, comanda hoje uma bancada de 75 deputados (que flutua um pouco de acordo com as nomeações e licenças) – o governo topou chamá-lo para conversar.

Acabou cedendo em alguns pontos.

A MP dos Portos é apenas um exemplo de como o político é um tipo de aliado que não tem sido raro na coalizão do governo Dilma: aquele que traz dificuldades.

Se o governo até agora não conseguiu votar o Marco Civil da Internet - um projeto prioritário para a presidente, diante dos atritos políticos com a espionagem norte-americana no ano passado – em boa parte as dificuldades se devem à sua ferrenha oposição.

Ele, aliás, é tido como um exímio conhecedor do Regimento da Casa, sempre disposto a usá-lo a seu favor.

No curto perfil escrito em seu site, é destacado também sua capacidade de transitar na Câmara. “Como articulador político, Eduardo Cunha circula em todas as comissões", destaca o texto.

O problema
Na semana antes do carnaval, tendo Cunha como um de seus líderes, foi anunciada a criação de um blocão, com mais de 200 congressistas, pensado inicialmente para canalizar a insatisfação perante a agenda imposta pelo governo.

"Não é blocão. É uma aliança informal. Não sou líder de nada. É uma aliança em torno de pautas, vamos nos reunir toda semana e decidir temas que nos unem", disse ele então.

O fato é que, agora que a guerra está mais pública que nunca, boa parte do PMDB da Câmara se sente mais confortável para dizer que a aliança com Dilma em 2014 deveria ser, como disse Cunha na semana passada, “repensada”.


O problema é que Cunha agora não é apenas símbolo de parlamentares descontentes, mas de uma sigla cujas bravatas parecem ter atingido um patamar interpretado como perigoso.

Segundo levantamento do Estadão, um terço dos deputados do partido querem romper com Dilma.

O PMDB do Rio, por exemplo, declarou que está com Aécio Neves. Lá, a relação é mais tensa, já que o PT terá candidato próprio para governador em vez de apoiar o sucessor de Sérgio Cabral, Luiz Fernando Pezão.

São vários os focos de problemas, principalmente na Câmara: o partido não só acredita que tem pouco espaço – cinco ministérios, contra 17 do PT - como também se diz cansado de não participar em nada das decisões do governo. Há focos de insatisfação ainda na liberação de emendas parlamentares.

Não ajuda em nada o fato do PT lançar ou apoiar candidatos em vários estados, principalmente o Ceará, que não os peemedebistas. Para esses insatisfeitos, o Partido dos Trabalhadores que se tornar hegemônico.

A ameaça é de antecipar a convenção nacional do partido para que os diretórios regionais se sintam livres para se coligar com quem quiserem.

Fisiológico
Se o PMDB é acusado de ter um apetite insaciável por cargos – a palavra fisiológico é a que se aplica, comumente, ao partido – Cunha tem sua dose de participação.

São várias as notícias de indicações de segundo escalão, notadamente no setor elétrico, que vêm acompanhadas da observação da participação do parlamentar.

E ele parece levar isso a sério. Relator do projeto que prorrogaria a CPMF em 2007, ele só adequou o projeto aos gostos do governo depois que o ex-prefeito do Rio, Luiz Paulo Conde, foi indicado à presidência de Furnas, subsidiária da Eletrobras.

Apesar deste passado, a crise agora chegou a tal ponto que o PMDB da Câmara diz que não quer indicar mais ninguém. Em entrevista à revista Época desta semana, ele retaliou a pecha de fisiológico do partido.

“Essa visão do PMDB como um partido meramente fisiológico, que vive mendigando cargos, tem muito de fantasia. É uma fantasia maniqueísta, que dá ao governo o falso argumento de que está, ao não respeitar a base aliada, apenas agindo eticamente, como arauto da moral, resistindo aos maus da política. Balela. Serve para justificar a incompetência do Planalto no diálogo com os parlamentares que deveriam, afinal, integrar um governo de coalizão”, afirmou.

Justiça

Cunha – como boa parte de seus colegas, é preciso ser justo - é alvo de investigações no Supremo Tribunal Federal.

Em uma ação penal em curso, ele é acusado de ter entregue documentos falsos para comprovar a inocência em um processo que corria no Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) referentes à época em que comandava a Companhia Estadual de Habitação do estado.

Denúncias contra ele, mesmo que não tenham gerado investigações no Supremo, também surgiram aos montes nos últimos 15 anos.

De qualquer forma, os próximos capítulos da novela Eduardo Cunha e PMDB X Dilma Rousseff estão ainda para serem vistos. A reunião de hoje – sem Cunha  foi inconclusiva. Analistas, contudo, consideram improvável que o partido embarque fora do poder.

Mas o líder do partido na Câmara, que não se cansa de alimentar seu Twitter, já convidou os deputados do PMDB para uma reunião amanhã.

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