MPF diz que Delcídio mentiu e quer cortar benefícios da delação
A Procuradoria da República afirma que o o ex-senador do PT mentiu sobre fatos que levaram à abertura de ação penal contra sete pessoas
Estadão Conteúdo
Publicado em 1 de setembro de 2017 às 17h01.
São Paulo - Em alegações finais enviadas à Justiça nesta sexta-feira, 1, o Ministério Público Federal, no Distrito Federal, pediu que o ex-senador Delcídio Amaral (ex-PT-MS) perca os benefícios assegurados no acordo de colaboração premiada .
A Procuradoria da República afirma que o ex-parlamentar mentiu sobre fatos que levaram à abertura de ação penal contra sete pessoas.
Se o pedido for aceito, em caso de condenação, o ex-senador poderá ter de cumprir integralmente as penas pelos crimes de obstrução à Justiça e patrocínio infiel.
Também ficará sujeito a responder por falsa imputação de crime. No mesmo documento, o procurador da República Ivan Cláudio Marx também pede que, após a sentença, a Procuradoria-Geral da República seja informada para que analise a possibilidade de perda geral dos benefícios por parte de Delcídio.
A manifestação integra o processo decorrente das investigações que apuraram a tentativa de compra do silêncio do ex-diretor da área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró.
No mesmo documento, o Ministério Público Federal manifestou pelas absolvições do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do banqueiro André Esteves, por concluir que não há provas de que eles participaram do esquema criminoso.
Na avaliação do MPF, além de Delcídio, devem ser condenados o advogado Edson de Siqueira Ribeiro Filho e os demais denunciados: Maurício Barros Bumlai, José Costa Barros Bumlai e Diogo Ferreira Rodriguez. No caso de Diogo, benefícios decorrentes da colaboração devem ser mantidos.
Na manifestação, o procurador reconstitui a forma como, segundo as provas dos autos, ocorreu o fato que gerou a denúncia: o pagamento de R$ 250 mil para que Cerveró não firmasse acordo de colaboração premiada com o MPF ou que, em o fazendo, protegesse Delcídio Amaral.
A narrativa foi construída a partir das provas reunidas durante a instrução processual, bem como de informações extraídas dos depoimentos de testemunhas e do interrogatório dos próprios denunciados.
Para o procurador, ao contrário do que afirmou Delcídio Amaral - tanto na colaboração quanto no depoimento dado à Justiça -, o pretendido silêncio de Cerveró, que à época cumpria prisão preventiva, não foi encomendado ou interessava a Lula, mas sim ao próprio senador.
De acordo com a peça do MPF, as provas coletadas mostraram que o então senador tinha motivos para tentar evitar que Nestor Cerveró firmasse o acordo de colaboração premiada.
O principal deles era impedir a revelação de que ele (Delcídio) recebeu R$ 4 milhões da construtora UTC, como propina e que o dinheiro foi usado em caixa dois em sua campanha ao governo do Estado do Mato Grosso.
Para tanto, e por orientação de Edson, nos primeiros anexos entregues ao MPF Nestor Cerveró informara falsamente que os valores foram destinados à campanha presidencial de Lula naquele ano de 2006. Conforme o MPF, "Delcídio estava agindo apenas em interesse próprio.
E Cerveró estava sonegando informações no que se refere a Delcídio, e não sobre Lula, a quem inclusive imputava fatos falsos, no intuito de proteger Delcídio".
Em sua versão, Delcídio afirmou que todo o dinheiro foi dado por José Carlos Bumlai, por intermédio do filho, Maurício Bumlai, e que ele apenas encaminhou a entrega das cinco parcelas de R$ 50 mil ao ex-diretor da Petrobras a pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A afirmação é contestada e desmentida em vários depoimentos colhidos durante a instrução processual. José Carlos e Maurício - ambos denunciados - confessaram ter entregue R$ 100 mil a interlocutores de Delcídio, sustentando que tratava-se de "empréstimo" a este.
Além disso, uma testemunha afirmou ter feito empréstimo pessoal ao senador dos recursos utilizados para o pagamento da quarta parcela.
Para o MPF, Delcídio também mentiu sobre a quinta entrega de valores, ao afirmar que teria sido feita por Diogo Rodriguez com recursos da família Bumlai. A entrega foi feita pelo próprio Delcídio. Já a origem do dinheiro não foi comprovada.
Na manifestação, o procurador sustenta que a versão de Maurício Bumlai e de Carlos Bumlai não merece credibilidade, considerando que o empréstimo se deu sem perspectiva de devolução - verdadeira doação - e com o conhecimento de que Delcídio pretendia usar os recursos para pagar pelo silêncio de Cerveró.
Além disso, durante a instrução processual ficou provado que a família Bumlai foi responsável pelos valores destinados às três primeiras entregas, totalizando R$ 150 mil. Por isso, o MPF defende a condenação de pai e filho.
Na tentativa de convencer a Justiça de que não agiu em interesse próprio, Delcídio sustentou ainda que "não lhe adiantava mais segurar a delação do Cerveró no que se referia e ele", porque as informações dos supostos crimes já eram conhecidas por constar do acordo de colaboração premiada de outro investigado na Lava Jato, Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano. A afirmação é rebatida pelo MPF, que destaca o fato de o referido acordo só ter sido firmado quatro meses após as investidas de Delcídio para que Cerveró permanecesse em silêncio. Para o MPF, ainda que a colaboração de Fernando Baiano já existisse e fosse pública, esse fato não tiraria de Delcídio o interesse em evitar o acordo de Cerveró, uma vez que "a corroboração de Nestor Cerveró elevaria ainda mais, portanto, o valor probatório da colaboração premiada de Fernando Antônio Falcão Soares".
A ação penal está em tramitação desde dezembro de 2015. Na época, como Delcídio era senador, a ação penal foi proposta pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo Tribunal Federal.
Inicialmente, quatro pessoas foram denunciadas. No entanto, em abril de 2016, após acordo de colaboração do então senador, houve uma ratificação, com o acréscimo de mais três envolvidos.
Com a cassação do mandato do parlamentar a ação foi enviada à 10ª Vara Federal, em Brasília, onde o caso será julgado.