Lula e Marisa: a ex-primeira dama visitou o triplex junto com Lula e o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro em fevereiro de 2014, aponta a Lava Jato (Ricardo Stuckert/Instituto Lula)
Da Redação
Publicado em 20 de setembro de 2016 às 20h46.
São Paulo - Ao aceitar a denúncia da Lava Jato contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sua mulher Marisa Letícia e outros seis investigados, o juiz Sérgio Moro apontou que a ex-primeira-dama teria contribuído para "a aparente ocultação do real proprietário do apartamento" triplex do Edifício Solaris, no Guarujá, e que isso seria suficiente para aceitar a denúncia contra ela por lavagem de dinheiro.
O juiz da Lava Jato afirma ainda que há "dúvidas relevantes" se Marisa tinha conhecimento que os benefícios da OAS, que reformou o apartamento que foi visitado por ela, "decorriam de acertos de propina no esquema criminoso da Petrobrás".
"Lamenta o Juízo em especial a imputação realizada contra Marisa Letícia Lula da Silva, esposa do ex-presidente", anotou Moro. "Muito embora haja dúvidas relevantes quanto ao seu envolvimento doloso, especificamente se sabia que os benefícios decorriam de acertos de propina no esquema criminoso da Petrobrás, a sua participação específica nos fatos e a sua contribuição para a aparente ocultação do real proprietário do apartamento é suficiente por ora para justificar o recebimento da denúncia também contra ela e sem prejuízo de melhor reflexão no decorrer do processo."
Marisa foi a responsável por assinar o termo de adesão à cota-parte da Bancoop para os interessados em adquirir um imóvel empreendimento do edifício Solaris, que em 2009 foi transferido para a OAS.
Além disso, aponta a Lava Jato, a ex-primeira dama visitou o triplex junto com Lula e o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro em fevereiro de 2014. Após essa visita foi realizada a reforma no triplex e a compra de eletrodomésticos para o apartamento tudo custeado pela empreiteira.
A defesa de Lula e Marisa alega que o casal nunca foi proprietário do triplex, registrado em nome da OAS, e que adquiriu a cota da Bancoop em 2005, mas parou de realizar os pagamentos em 2009 com a mudança do empreendimento para a OAS.
Ainda segundo a defesa de Lula e sua mulher, após a visita do casal ao apartamento, eles teriam desistido de adquirir o imóvel e pedido o dinheiro de volta.
"Após visitar o Edifício Solaris e verificar que não tinha interesse na aquisição da unidade 164-A que lhe foi ofertada, ela (Marisa Letícia) optou, em 26 de novembro de 2015, por pedir a restituição dos valores investidos. Atualmente, o valor está sendo cobrado por D. Marisa da Bancoop e da OAS por meio de ação judicial (Autos nº 1076258-69.2016.8.26.0100, em trâmite perante a 34ª. Vara Cível da Comarca de São Paulo), em fase de citação das rés", afirmou a defesa em nota divulgada quando eles foram denunciados.
Com a transferência do empreendimento à OAS, foi dado um prazo para os cooperados decidirem se continuariam pagando para ter direito ao apartamento no edifício ou se desistiriam e pediriam o dinheiro de volta.
Para os investigadores da Lava Jato, porém, a suspensão dos pagamentos feita pelo casal quando o imóvel foi transferido para a OAS já configuraria lavagem de dinheiro.
Para Moro, no entanto, não foi identificado se o casal Lula e Marisa teria desistido do empreendimento ou se voltou a pagar para ficar com o apartamento.
"Apesar da descontinuidade dos pagamentos, também não há qualquer registro de que a OAS Empreendimentos tenha cobrado, de qualquer forma, o ex-presidente e sua esposa pelo saldo devido pelo apartamento. Também não há qualquer registro ou mesmo alegação de que o ex-Presidente e sua esposa teriam recebido de volta os valores já pagos, o que seria o usual se tivessem realizado a opção por desistir do empreendimento", segue o juiz na decisão que aceitou a denúncia nesta terça-feira, 20.
A partir de agora Lula e Marisa passam a responder as acusações como réus e poderão apresentar ao juiz da Lava Jato suas explicações sobre os imóveis.
Defesa
Os advogados de Lula, Cristiano Zanin Martins e Roberto Teixeira, afirmaram: "Diante de todo o histórico de perseguição e violação às garantias fundamentais pelo juiz de Curitiba em relação ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não causa surpresa a decisão por ele proferida nesta data (20/9/2916) determinando o processamento da denúncia protocolada pelo Ministério Público Federal em 14/9/2916.
Nem mesmo os defeitos formais da peça acusatória e a ausência de uma prova contra Lula, como amplamente reconhecido pela comunidade jurídica, impediu que o referido juiz levasse adiante o que há muito havia deixado claro que faria: impor a Lula um crime que jamais praticou.
Esse é um processo sem juiz enquanto agente desinteressado e garantidor dos direitos fundamentais. Em junho, em entrevista, o procurador da República Deltan Dallagnol reconheceu que ele e o juiz de Curitiba são "símbolos de um time", o que é inaceitável e viola não apenas a legislação processual, mas a garantia de um processo justo, garantia essa assegurada pela Constituição Federal e pelos Tratados Internacionais que o Brasil se obrigou a cumprir.
Na qualidade de advogados do ex-Presidente, apresentamos uma exceção de suspeição (5/7/2016) - ainda não julgada - e temos convicção nos seus fundamentos. Esperamos que a Justiça brasileira, através dos órgãos competentes, reconheça que o juiz de Curitiba perdeu sua imparcialidade para julgar Lula, após ter praticado diversos atos que violaram as garantias fundamentais do ex-Presidente."
Já o advogado de defesa de Paulo Okamotto, Fernando Augusto Fernandes, ressalta que "não há corrupção ou vantagem ilícita no pagamento para conservação de um acervo de ex-presidente porque é considerado como 'patrimônio cultural brasileiro de interesse público' pela Lei 8394/91", e não há lavagem de dinheiro porque nem Lula, nem Okamotto, nem o Instituto se beneficiaram. Fernando Henrique Cardoso teve o acervo pago por empresas privadas beneficiadas com diminuição de impostos por incentivo cultural". A defesa afirma que Okamotto, presidente do Instituto Lula, não recebeu o que foi pago para a Granero, "o valor foi pago para a empresa, que mantinha o acervo em depósito. Portanto, a denúncia sem provas, sem justa causa, não poderia ser recebida e o processo também não pode ser uma farsa com o único objetivo de condenar publicamente inocentes", conclui Fernandes. A defesa vai recorrer da decisão.
Por meio de sua assessoria, a empreiteira OAS informou que não comentaria o assunto.