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Marco regulatório das ferrovias deve ser votado em breve, diz relator

Relator do projeto, senador Jean Paul Prates, afirmou que o novo marco regulatório das ferrovias foi amplamente discutido com o governo e setores envolvidos e está pronto para ser apreciado pelo Plenário

Proposta permitirá novos investimentos no transporte ferroviário brasileiro (Delfim Martins/Exame)

Proposta permitirá novos investimentos no transporte ferroviário brasileiro (Delfim Martins/Exame)

Isabela Rovaroto

Isabela Rovaroto

Publicado em 18 de fevereiro de 2021 às 10h03.

O novo marco regulatório das ferrovias, que busca organizar as regras do setor e permitir novos formatos para a atração de investimentos privados para esse modal de transporte, foi listado como uma das 35 propostas legislativas prioritárias para o Executivo, no início do ano legislativo. O relator do projeto  (PLS 261/2018) no Senado, senador Jean Paul Prates (PT-RN), estima que ele será votado em breve.

— Acredito que o novo marco das ferrovias deva ser votado rapidamente e, possivelmente, logo agora, no início do ano. O tema foi amplamente discutido com o governo e com os setores envolvidos e está pronto para ser apreciado pelo Plenário. Tenho certeza de que os senadores estão preparados para aprovar a proposta, que permitirá novos investimentos e uma maior concorrência no transporte ferroviário brasileiro, disse o senador nesta terça-feira (9) à Agência Senado.

A principal mudança do texto, proposto pelo senador José Serra (PSDB-SP), é a criação do regime de autorização para o mercado ferroviário. As ferrovias, hoje de domínio público, só podem ser operadas por um parceiro privado em regimes de concessão ou permissão, via licitação, para construção e exploração de trechos.

Com o novo regime, o poder público (União, estados e municípios) não precisará fazer um processo licitatório para decidir quem vai operar um trecho ferroviário. O investidor interessado pode procurar o governo com um projeto para a explorar uma nova linha férrea. A União apenas analisa e autoriza o projeto, a exemplo do que já ocorre hoje nos terminais privados dos portos.

Os contratos devem ter duração de 25 a 99 anos, podendo ser prorrogados por períodos iguais e sucessivos. A expectativa é que o investidor privado privilegie os pequenos trechos.

“Ao autorizarmos a exploração de ferrovias, estamos, de fato, reconhecendo que há um grande espaço para que essa modalidade de transporte possa operar com benefício da liberdade de empreender, em que os investidores têm maior latitude para aplicar e gerir seus recursos, mas que, em contrapartida, os obriga a assumir todos os investimentos e todos os riscos do negócio”, justifica o senador em seu relatório.

O interessado em ter autorização para exploração econômica de novas ferrovias, ou novos pátios, pode requerer isso diretamente ao órgão regulador a qualquer tempo. O requerimento deve explicitar o percurso total e áreas adjacentes, assim como o detalhamento da configuração logística, e aspectos ambientais e urbanísticos relevantes.

Jean Paul Prates modificou e ampliou o projeto original de José Serra, após promover audiências públicas, ouvir atores do setor e o próprio Ministério da Infraestrutura.

“O projeto dá segurança e incentivos ao investimento público e privado em novas ferrovias e na revitalização da malha que esteja abandonada ou inoperante. Conciliamos sugestões de operadores, do governo e de usuários. É uma ‘caixa de ferramentas’ para o Estado brasileiro, que lhe garante planejamento e atração para o investimento em ferrovias”, comemorou o senador no ano passado, quando finalizou seu relatório.

Valorização

Na autorização de ferrovias urbanas, o projeto aposta na valorização imobiliária advinda do empreendimento, que pode se tornar uma importante fonte de receita para o negócio. O texto replica experiências bem-sucedidas em outros países.

A ideia é que, para o investimento, sejam criadas empresas de serviços ferroviários e de desenvolvimento urbano. Os donos dos imóveis necessários para o empreendimento poderão se tornar sócios dos projetos, medida que, segundo Jean Paul, reduz os custos de suas fases iniciais e possibilita aos proprietários ganhos advindos com a valorização imobiliária decorrente da implantação da ferrovia.

Também há a previsão de pagamento de tributo decorrente da valorização das áreas próximas às ferrovias.

“Outra inovação que advém do projeto original é a possibilidade de o poder público instituir contribuição de melhoria decorrente da implantação da ferrovia. Essa receita será arrecadada junto aos moradores de imóveis lindeiros [contíguos] ao projeto e comporá as fontes de financiamento do empreendimento, de forma a reduzir os custos de implantação e, consequentemente, os preços que virão a ser cobrados dos usuários”, explica o senador.

O texto ainda prevê, no caso das ferrovias urbanas, a possibilidade de estados e municípios permitirem a exploração de imóveis ao lado da ferrovia para diversificar a fonte de receita da operação. Por exemplo: uma área de estacionamento, de hotel ou de restaurante que ficaria acoplada à ferrovia e poderia ser usada para aumentar a receita da empresa, em vez de aumentar a tarifa do usuário.

O senador destaca ainda a criação de uma agência autorreguladora para o modal, com a missão de regular a operação e dirimir conflitos. Esta autorregulação será exercida pelos titulares das administrações ferroviárias, junto a usuários, embarcadores e a indústria, para que operadores das ferrovias definam, entre si, questões como o trânsito de cargas e passageiros — preservando para a União as tarefas de regulamentação, outorga do serviço, controle e fiscalização da atividade, inclusive com o poder punitivo, em caso de descumprimento de determinações técnicas, operacionais, ambientais, econômicas e concorrenciais.

Trechos ociosos

O governo também poderá fazer um chamamento para saber se há investidores interessados em explorar trechos ferroviários que estão ociosos por mais de três anos. A intenção é reavivar ferrovias abandonadas ou subutilizadas. Elas são consideradas ociosas quando há bens reversíveis (como imóveis do governo) não explorados, ou quando metas de desempenho definidas em contrato com o regulador ferroviário são descumpridas.

Havendo interessado na exploração dos trechos ferroviários ociosos, deve ser providenciada a cisão desses trechos da atual operadora ferroviária em favor da nova autorização. Isso não isenta a antiga operadora de pagar eventuais ressarcimentos, conforme o contrato de concessão ou de permissão.

— A partir da aprovação deste projeto, vamos ter maior segurança para investidores e usuários, graças à segurança regulatória que ele promove. Vamos também permitir o resgate de estruturas que, até então, encontravam-se ociosas e que devem alavancar os negócios neste setor. Creio que teremos poucos pontos polêmicos, mas que deverão ser facilmente resolvidos em Plenário — avalia o relator.

Assimetria

Em seu relatório, Jean Paul busca estender à outorga por concessão as inovações propostas ao modelo de autorização. Ele reduz a assimetria concorrencial entre as duas modalidades, diminuindo a carga regulatória da concessão, “pois apenas burocratizavam e retiravam a competitividade”. As regras são comuns às duas modalidades no licenciamento de trens para transporte de passageiro. A autorregulação e as receitas imobiliárias também poderão ser agregadas ao modelo de concessão.

O texto diz que compete à União fiscalizar e penalizar as operadoras ferroviárias quanto a questões técnicas, operacionais, ambientais, econômicas e concorrenciais. Mas também destaca que o transporte ferroviário em regime privado segue os princípios da livre concorrência, da liberdade de preços e da livre iniciativa de empreender.

Como o transporte ferroviário em regime privado terá garantida a liberdade de preços, caberá aos órgãos de defesa da concorrência reprimir infrações à ordem econômica.

Já o transporte ferroviário em regime de direito público poderá ser executado diretamente por União, estados e municípios ou indiretamente, por meio de concessão ou permissão. A execução direta pela União somente ocorrerá quando for necessário garantir a segurança e a soberania nacionais, ou em casos de relevante interesse coletivo.

O contrato de concessão ou permissão para as ferrovias exploradas em regime público deve explicitar as obrigações de investimentos para aumento da capacidade instalada ao longo do período de contrato, visando reduzir o nível de saturação do trecho ferroviário, assegurado o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato. Assim como os limites da garantia de capacidade de transporte a terceiros, por meio do contrato de acesso à infraestrutura ferroviária, assegurada a remuneração pela capacidade contratada.

Preços

O relatório  reforça que, embora os preços cobrados no regime de autorização não sejam previamente estipulados pelo regulador, as autorizatárias sujeitam-se ao controle dos órgãos de defesa do consumidor, que têm autoridade para coibir a cobrança de preços abusivos.

“A autorização passa a ter prazo determinado, de 25 a 99 anos, proposto pelo requerente da autorização, pois é quem tem capacidade e conhecimento para avaliar o período necessário para amortizar os investimentos que se propõe a realizar. Também porque é a quem cabe assumir os riscos e avaliar a viabilidade do negócio. Acreditamos que o estabelecimento do prazo contratual permite melhor avaliação do negócio e traz mais segurança jurídica para o investidor”, argumenta o senador.

Além da extinção contratual (com o fim do prazo estipulado), o marco mantém outras possibilidades de extinção dos contratos. Casos de negligência, imperícia ou abandono, descumprimento reiterado dos compromissos assumidos, ou até mesmo em virtude de excepcional relevância pública, poderão levar à extinção dos contratos.

O projeto diz que a criação de gratuidades ou descontos em ferrovias autorizadas só pode ser feita por meio de lei que preveja recursos orçamentários específicos para seu custeio. Essa limitação não afeta o direito da própria operadora de dar gratuidades ou descontos, segundo sua conveniência.

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