No voto, o magistrado mencionou a condenação de Bolsonaro por oito anos por abuso de poder político (TSE/Reprodução)
Agência de notícias
Publicado em 28 de junho de 2023 às 08h09.
O corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves, realizou nesta terça-feira a leitura do seu voto no julgamento da ação que pode tornar Jair Bolsonaro (PL) inelegível. O processo apresentado pelo PDT trata de uma reunião com embaixadores realizada em 2022 em que, sem provas, o ex-presidente atacou a lisura do processo eleitoral. No voto, o magistrado mencionou a condenação de Bolsonaro por oito anos por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação.
"Em razão da grande relevância e da performance discursiva para o discurso eleitoral e para a vida política, não é possível fechar os olhos para os efeitos antidemocráticos de discursos violentos e de mentiras que coloquem em xeque a credibilidade da Justiça Eleitoral — disse — A divulgação de notícias falsas é, em tese, capaz de vulnerar bens jurídicos eleitorais de caráter difuso, desde que sejam efetivamente graves, e assim se amoldem ao conceito de abuso", completou o ministro.
Na ação, o PDT pede que Bolsonaro seja considerado inelegível por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação. O partido afirma que o então presidente criou um ambiente propício para a “propagação de toda sorte de desordem informacional”. A legenda ressalta que, ao transmitir o discurso na TV Brasil e em redes sociais, Bolsonaro teve “expressivo alcance na difusão de informações falsas já reiteradamente desmentidas”.
Em parecer lido na última quinta-feira, a Procuradoria-Geral Eleitoral defendeu que o ex-presidente seja considerado inelegível, alegando que o discurso “atacou as instituições eleitorais” e que isso contribuiu para “inquietar ânimos pessimistas com relação à legitimidade do pleito”.
Além da própria reunião, uma das principais provas é a justamente a minuta que sugeria uma espécie de intervenção no TSE, encontrada na casa do ex-ministro Anderson Torres. O PDT considera que a minuta era a “materialização da última fase de um plano milimetricamente traçado para derrubar o Estado Democrático de Direito”.
O ministro Benedito Gonçalves iniciou seu voto explicando a inclusão no processo da “minuta golpista” apreendida na cada do ex-ministro Anderson Torres. O magistrado explicou que a medida já teve o aval da corte, em fevereiro deste ano, justamente por ter relação com o fato em apuração:
— Em 14 do 2 de 2023, o Tribunal, mais uma vez por unanimidade, confirmou que os limites da controvérsia que já estavam fixado em decisão de saneamento e organização do processo comportava o conhecimento de fatos consistentes na apreensão de minuta de decreto de estado de defesa na residência de Anderson Torres e a consequência juntada do documento novo, conforme extensa fundamentação exposta. Esses elementos têm correlação estrita a causa de pedir e a gravidade da conduta, isso porque desde a inicial o autor alega que os investigados tinham como estratégia política eleitoral induzir descrédito ao resultado do pleito de 2022 — afirmou o ministro, em um trecho da leitura de seu voto.
Na semana passada, após participar de uma reunião no gabinete do seu filho Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no Senado, Bolsonaro criticou uma possível diferença no tratamento do TSE, em relação ao julgamento da chapa de Dilma Rousseff e Michel Temer, em 2017.
" Será péssimo para a democracia se eu for julgado de forma diferente como foi a chapa Dilma-Temer em 2017 — disse o ex-presidente, na ocasião.
Ainda durante a leitura do voto, o ministro Benedito Gonçalves afirmou que está comprovado que Jair Bolsonaro foi o idealizador do encontro com embaixadores no Alvorada, em que atacou a Justiça Eleitoral e o sistema de votação. O relator lembrou que as três testemunhas de Defesa, Carlos Alberto Franco França, ex-ministro das Relações Exteriores, Flávio Augusto Viana Rocha, ex-secretário especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, e Ciro Nogueira, ex-ministro-chefe da Casa Civil, negaram participação na reunião:
"A conclusão é que o primeiro investigado foi integral e pessoalmente responsável pela concepção intelectual do evento objeto da ação.
Ao resumir a reunião de Jair Bolsonaro com os embaixadores, o ministro Benedito Gonçalves afirmou que o evento foi organizado em poucos dias e a "estrutura e serviço do Executivo foram rapidamente mobilizados para viabilizar a reunião'.Quase uma centena de convites foram disparados para chefes diplomáticos, lembrou o relator da ação.
"Os representantes assistiram por mais de uma hora uma apresentação mesclando elogios ao governo, relatos de um inquérito a ataque hacker, críticas a atuação de servidores públicos, ilações a respeitos de ministros do TSE, exaltação às Forças Armadas e defesa de proposta de voto impresso. O improvável fio condutor de todos esses tópicos foi a afirmação que houve manipulação de votos em 2018 e que era iminente o risco em 2022."
Segundo o voto de Benedito Gonçalves, a transmissão da reunião de Jair Bolsonaro com embaixadores, sobre ataques às urnas eletrônicas, garantiu vantagem eleitoral triplamente indevida à chapa.
"A transmissão da TV Brasil fez com que a mensagem se alastrasse rapidamente e produziu mais engajamento. O evento ocorreu quase um mês antes do início da propaganda eleitoral, momento no qual já era notícia a pré-candidatura do investigado, e possibilitou a projeção midiática de temas explorados na campanha."
Em seu voto, o ministro também citou e criticou a divulgação de notícias falsas por parte do ex-presidente, contrariando informações amplamente divulgadas pelo Tribunal Superior Eleitoral e assumindo um comportamento de “antagonização injustificada” com a corte.
"O primeiro investigado (Bolsonaro) violou ostensivamente deveres de presidente da República inscrito no artigo 85 da Constituição, em especial zelar pelo exercício livre dos poderes instituídos e dos direitos políticos e pela segurança interna, tendo em vista que assumiu antagonização injustificada ao TSE, buscando vitimizar-se e descacreditar a competência do corpo técnico e a lisura do comportamento de seus ministros para levar a atuação do TSE ao absoluto descrédito Internacional; e ainda despejou sobre as embaixadoras e embaixadores mentiras atrozes a respeito da governança eleitoral brasileira "— afirmou Benedito Gonçalves.
A prática de 'conspiracionismo, vitimização e falas intrusivas' foi explorada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro para difundir dúvidas sobre o processo eleitoral de 2022. Foi o que apontou o ministro Benedito Gonçalves, sobre a prática de abuso de poder político que pode tornar o antigo mandatário inelegível.
" Conspiracionismo, vitimização e pensamentos intrusivos foram fortemente explorados no discurso de 18/07/2022 para incutir a ideia de que as eleições de 2022 corriam um grande risco de serem fraudadas e que o então presidente da República, em simbiose com as forças armadas estaria levando adiante uma cruzada em nome da transparência e da democracia" — afirmou