Governos preparam contratos de PPPs para enfrentar eventos climáticos extremos
Eventos climáticos nos últimos anos passaram a ser mais frequentes e intensos, causando destruição e prejuízos para a população
Redação Exame
Publicado em 24 de novembro de 2024 às 07h01.
Última atualização em 26 de novembro de 2024 às 12h49.
Opinião: André Paiva*, Fábio Tieppo** e Maurício Palugan***
Temporais no Rio Grande do Sul, seca no Amazonas, queimadas no Centro-Oeste e vendavais em São Paulo – embora tais eventos climáticos já tenham sido verificados anteriormente, nos últimos anos passaram a ser mais frequentes e intensos, causando destruição e prejuízos para a população.
A fim de se preparar para esse cenário, diversos entes governamentais já estão planejando projetos que considerem a chamada "resiliência climática", incorporando mecanismos para que grandes projetos de infraestrutura sejam menos afetados por eventos extremos ou estejam preparados para lidar com seus efeitos.
Existem soluções de infraestrutura para lidar especificamente com eventos climáticos, como PPPs de drenagem urbana para enfrentar enchentes ou de abastecimento de água para períodos de seca. A intensidade e frequência dos eventos, no entanto, tem levado ao desenvolvimento de mecanismos para preparar contratos de infraestrutura de longo prazo para essas situações.
O governo de São Paulo incluiu no contrato da concessão da Rota Sorocabana, licitada em outubro de 2024, uma seção específica para tratar de eventos climáticos extremos. O grande diferencial é uma abordagem rigorosa direcionada à prevenção desses fenômenos.
O referido contrato prevê a realização de estudos periódicos de monitoramento de riscos climáticos e a adoção de medidas preventivas de curto, médio e longo prazo.
Assim, caso seja identificada a necessidade de alguma obra preventiva adicional não prevista originalmente, a concessionária deverá executá-la e o contrato será reequilibrado para incluir tais investimentos.
Como nos check-ups médicos, a prevenção tem um custo. Estudos técnicos de engenharia costumam ser caros, e tais valores serão incorporados na estrutura financeira da concessão. Porém, assim como na saúde, costuma valer a regra de que é melhor prevenir do que remediar.
Mesmo que sejam realizados estudos preventivos, existe a possibilidade de que eventos extraordinários com consequências imprevisíveis ocorram.
Nestes casos, o contrato prevê mecanismos que garantam maior segurança e agilidade para o privado, permitindo que a agência reguladora: (i) não aplique penalidades; (ii) suspenda a apuração dos indicadores de desempenho; e (iii) dispense a aprovação de projetos de engenharia para obras necessárias à restauração do tráfego e da segurança dos usuários.
Tais mecanismos garantem segurança para o ente privado e seus acionistas, uma vez que estabelecem uma garantia contratual de que medidas urgentes poderão ser tomadas sem correr o risco de arcar com todo o prejuízo e possíveis sanções posteriores.
No estado do Rio Grande do Sul, cujas concessões enfrentaram uma onda de destruição devido às chuvas no começo do ano, embora não houvesse uma previsão contratual, o diálogo estabelecido entre o governo e os entes privados foi fundamental para garantir que as obras urgentes pudessem ser realizadas a fim de permitir a normalização dos serviços.
Tendo em vista a burocracia e os entraves inerentes a grandes projetos de concessão, a segurança jurídica é fundamental para atrair investidores e viabilizar novos projetos. A tendência é de que contratos com modelos que prevejam riscos climáticos sejam reproduzidos também em outros entes federativos.
O governo do Mato Grosso incluiu em sua regulamentação uma cláusula que prevê a chamada "matriz de risco dinâmica", com o objetivo de monitorar e realocar os riscos ao longo do contrato. Assim, como consequência da alteração de probabilidades e riscos, o contrato deverá ser reequilibrado.
Sob o ponto de vista social, parece improvável e politicamente custoso que os usuários aceitem um aumento de tarifa para lidar com a mudança na probabilidade de ocorrência de um evento.
Em outubro, fortes chuvas deixaram milhões de paulistanos sem energia. Sem entrar no mérito de responsáveis, quanto um usuário estaria disposto a pagar a mais na conta a fim de ter uma menor probabilidade de ficar sem luz?
No Brasil, é notadamente reconhecida a baixa frequência de exames preventivos de saúde frente ao ideal, seja pelos custos dos exames ou simplesmente por não ser prioridade para as pessoas. Será que a população estará disposta a desembolsar mais para ter um serviço mais resiliente? Em termos estatísticos, a conta é vantajosa, mas, na esfera privada, muitas pessoas costumam assumir riscos cuja mitigação é custosa.
*André Paiva é consultor da Tendências Consultoria. Economista graduado pela FECAP, com mestrado em Economia Aplicada pela USP. Possui MBA em Gestão Financeira e Econômica de Tributos pela FGV.
**Fábio Tieppo é consultor da Tendências Consultoria. Mestre em Economia pela USP. Graduado em Engenharia de Produção pela USP e em Direito pelo Mackenzie, com pós-graduação em Administração pela FGV.
***Maurício Palugan é consultor da Tendências Consultoria. Bacharel em Ciências Econômicas pela FGV.