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Esgoto industrial ilegal enche 2 Ibirapueras por dia em SP

Indústrias descartam cerca de 10 milhões de litros de efluentes com resíduos tóxicos por hora em rios e lagos da Grande São Paulo, revela estudo inédito da FGV


	Tóxico: cada litro de esgoto industrial é, em média, 6,6 vezes mais poluidor do que os residenciais
 (Stock.XCHNG)

Tóxico: cada litro de esgoto industrial é, em média, 6,6 vezes mais poluidor do que os residenciais (Stock.XCHNG)

Vanessa Barbosa

Vanessa Barbosa

Publicado em 27 de fevereiro de 2014 às 18h07.

São Paulo – O setor industrial é um dos maiores consumidores de água potável do planeta, respondendo por 20% da demanda total. A mesma proporção se aplica ao Brasil e ao seu maior polo de riqueza nacional, a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). No entanto, nem toda a água que sai das indústrias em forma de esgoto retorna limpa para o meio ambiente, como deveria acontecer.

Pelo contrário. A cada hora, as indústrias paulistas descartam cerca de dez milhões de efluentes cheios de resíduos tóxicos e sem tratamento algum nos rios e lagos dos municípios de São Paulo.

Por dia, o descarte ilegal de esgoto industrial daria para encher dois lagos do Parque Ibirapuera. Os dados são de um estudo, divulgado nesta quinta-feira (27), feito pela Grupo de Economia da Infraestrutura e Soluções Ambientais, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Em tempos de “águas magras” nos reservatórios que abastecem a região, os números alarmantes de despejo ilegal de efluentes ganham contornos ainda mais preocupantes.

Embora o volume do descarte industrial seja inferior ao total de esgotos residenciais que deixa de ser coletado e tratado pelas redes públicas, seu efeito nocivo ao meio ambiente pode ser equivalente ou até pior. Estima-se que cada litro de esgoto industrial seja, em média, 6,6 vezes mais poluidor do que os esgotos residenciais.

“É paradoxal que na Região Metropolitana de São Paulo, onde o ‘stress’ hídrico é comparável à de algumas regiões do sertão nordestino, continuemos a poluir nossos mananciais com efluentes tão perigosos", afirma Gesner Oliveira, coordenador da pesquisa e ex-presidente da Sabesp.

"Esse descarte obriga as concessionárias de saneamento a captarem água a mais de 80km da capital a custos elevadíssimos. Equacionar essa questão certamente poderia reduzir o risco de desabastecimento de água na região”, acrescenta.

Segundo dados da Cetesb, 42% das águas monitoradas em 2012 foram classificadas como péssimas, ruins ou regulares. Três pontos de captação, em particular, apresentaram situação crítica: Braço de Taquacetuba, Rio Cotia e Rio Tietê.

A população também sofre os efeitos. Os resíduos industriais podem causar contaminação por metais pesados, provocando desde efeitos leves como irritações na pele e dores de cabeça até reduções das funções neurológicas e hepáticas, rinites alérgicas e dermatoses.

De onde vem e para onde vai

O estudo da FGV levou em conta os dados de descarte de 58.373 indústrias classificadas como de transformação. A água consumida por essas instalações tem duas origens: ou é captada diretamente no manancial, com permissão dos órgãos competentes, ou vem de redes públicas de abastecimento. Cerca de 9 litros a cada 10 litros consumidos pela industria tem origem em poços artesianos.


Parte dos efluentes industriais que é gerada é tratada localmente pelas próprias indústrias. Para isso, além de todo o equipamento adequado, é necessária uma outorga junto ao Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) para que o efluente tratado seja descartado de forma adequada na natureza.

Outra parte dos efluentes industriais é transportada das indústrias por meio de caminhões para descarte direto em estações de tratamento de efluentes especialmente projetadas para esse recebimento. Para isso, a Cetesb deve emitir o Cadri, a Certificado de Aprovação para Destinação de Resíduos Industriais.

Cerca de 90% do consumo de água vem dos poços artesianos, ou seja da captação direta da indústria, e cerca de 90% dos efluentes estão sob responsabilidade de tratamento pela própria indústria.

Como mudar esse quadro

Segundo o estudo, a dificuldade no monitoramento do descarte de efluentes passa também pela dificuldade em se medir a água consumida a partir de poços artesianos.

Conforme a pesquisa, o consumo industrial total na RMSP foi estimado em 10,76 m3/s (metro cúbico por segundo), correspondente a 0,85 m3/s a partir de redes públicas de abastecimento e 9,91 m3/s de captação direta de mananciais.

Por isso, uma das propostas dos pesquisadores da FGV é de que se faça “a hidrometração de todos os poços da RMSP e sistema de monitoramento à distância, permitindo controlar o consumo de água a partir de poços artesianos e estimar e fiscalizar o descarte”.

Outra proposta é inserir nos critérios de financiamento de bancos públicos e privados declaração sobre aderência da empresa e fornecedores quanto ao descarte de seus efluentes. Além da exigência, seria fundamental a fiscalização constante do descarte de efluentes por parte dos órgãos financiadores.

O estudo defende ainda a criação de um selo de lançamento sustentável, à exemplo do selo azul e verde, criado pelo governo paulista, que certifica os municípios a partir da adoção de práticas sustentáveis.

Essa certificação serve para orientar a política de concessão de financiamentos a municípios. A ideia é que um selo voltado para o lançamento de efluentes incentive os municípios e Estados a combater o descarte ilegal de esgoto e terem seus esforços reconhecidos.

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