Segundo o presidente, a contínua demarcação de reservas e parques nacionais têm por objetivo "inviabilizar" o Brasil (Adriano Machado/Reuters)
Reuters
Publicado em 27 de agosto de 2019 às 16h29.
Brasília — Em meio à crise causada pelo aumento das queimadas na Amazônia, o presidente Jair Bolsonaro recebeu os governadores dos nove Estados da Amazônia Legal para tratar das ações na região, mas transformou o encontro em uma sessão para reclamar do número que considera excessivo de reservas indígenas e florestais.
Segundo o presidente, a contínua demarcação de reservas e parques nacionais têm por objetivo "inviabilizar" o Brasil.
"Em grande parte o dinheiro vêm de fora do Brasil, e isso tem um preço: demarcação de terras indígenas, APAs, quilombolas, parques nacionais, etc. Isso leva a um destino que sabemos, a insolvência do Brasil", afirmou na reunião com os nove governadores da Amazônia Legal, na manhã desta terça-feira.
Bolsonaro respondia ao pedido dos governadores do Pará, Helder Barbalho (MDB); do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), e do Amapá, Waldez de Góes (PDT), para que os recursos do Fundo Amazônia voltassem a ser usados nos projetos programados para a região.
A decisão do governo de mexer na gestão do Fundo levou à primeira crise ambiental do governo Bolsonaro, com Alemanha e Noruega, principais financiadoras, suspendendo novos repasses.
"Não podemos rasgar dinheiro porque não é sensato na atual conjuntura", disse Dino ao defender a continuidade do Fundo. "Não podemos repelir a ação cooperada. O diálogo com outros países é imprescindível."
Ao ouvir cada um dos governadores, o presidente comentou a quantidade de reservas em cada Estado e o quanto isso comprometia da terra produtiva em cada uma dessas unidades da federação e chegou a dizer que essas medidas foram feitas para "nos inviabilizar".
"Com todo o respeito aos que me antecederam, foi uma irresponsabilidade essa política adotada no passado no tocante a isso, usando o índio como massa de manobra. Essa questão ambiental tem de ser conduzida com racionalidade, não com esta quase selvageria, como foi feita nos outros governos", afirmou.
A principal medida anunciada por Bolsonaro no encontro, que deveria tratar de ações emergenciais de reação ao aumento das queimadas no país, foi reiterar a moratória na demarcação de novas reservas ambientais e indígenas. Segundo o presidente, existem mais de 400 pedidos prontos, mas ele não assinará nenhum.
"A nossa decisão até o momento é não demarcar. Já extrapolou essa verdadeira psicose no tocante a demarcação de terras", garantiu.
Ao ser questionado sobre o tema, o governador do Pará, Helder Barbalho, lembrou que seu Estado não tem problemas com as reservas.
"Hoje temos aprovado pelo zoneamento estadual que 35% do Estado do Pará é permitido produção. Temos hoje usados 24%, teríamos ainda 11%", explicou, lembrando ainda que boa parte do Pará tem hoje pecuária extensiva. "Se formos para média de 3 cabeças de gado por hectare, sairemos para 60 milhões de cabeças. Será o maior rebanho bovino sem desmatar uma árvore."
Bolsonaro prometeu ainda que até a próxima quinta-feira o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, irá negociar com os governadores um pacote de medidas a serem enviadas ao Congresso Nacional para tratar do futuro, em uma forma de evitar que novos episódios como o aumento dos incêndios florestais registrado neste ano aconteçam novamente.
"O que precisamos é pensar daqui para frente. Daqui a dois meses as queimadas já acabaram e se nada for feito a Amazônia vai ser esquecida, até virar notícia novamente por mais algum motivo ruim", disse o governador do Amapá.
Os governadores foram unânimes em cobrar ajuda e recursos federais para fazer o zoneamento produtivo e, principalmente, a regularização fundiária das terras.
"A regularização fundiária é essencial para separar o bons dos ruins, para que se localize quem não está cumprindo as regras. Hoje todo mundo é penalizado igual", disse Antonio Denarium (PSL), governador de Roraima.
Outro ponto levantado pelos governadores foi a imagem do país no exterior e seu impacto nas exportações brasileiras. O governador Mauro Mendes (DEM), de Mato Grosso --Estado que é hoje o maior produtor de soja do país-- defendeu que a ação contra o desmatamento tem que ser constante.
"A imagem do Brasil é extremamente importante para nossa relação com nossos clientes no exterior. Hoje 60% do PIB do Mato Grosso vem de exportações", disse. "Fiquei muito preocupado quando saíram as notícias de aumento de desmatamento, das queimadas. Isso foi uma combinação muito ruim para a imagem do nosso país."
O governador do Amapá cobrou que se saia da política de confronto que, segundo ele, levou o Brasil a essa situação. "Temos que chegar a um meio termo. Temos dito isso ao presidente. Não pode de repente um discurso passar a ideia de permissibilidade", disse Waldez.
O governador do Maranhão --a quem Bolsonaro já se referiu como "o pior de todos", quando foi gravado tratando os governadores do Nordeste como "paraíbas"--, lembrou que se o Brasil se isolar, irá se expor a sanções ao agronegócio pelo não cumprimento de regras ambientais.
"Não sou daqueles que satanizam, demonizam ONGs, porque existem ONGs de imensa seriedade. Não será tocando fogo nas ONGs que vamos salvar a Amazônia. O meio termo é melhor receita, extremismo nunca é o melhor", defendeu Dino.
Apesar do discurso dos governadores --Helder Barbalho chegou a dizer que se devia parar de falar no presidente da França, Emmanuel Macron, e tratar do Brasil-- Bolsonaro voltou a criticar as ONGs e outros governos e insinuar que as queimadas são provocadas por atores de fora do país.
"Se eu demarcar agora, o fogo na floresta amazônica acaba em dois minutos. Eles querem a nossa soberania. Ninguém (no governo) quer destruir a Amazônia", defendeu.