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Em meio à crise do governo Bolsonaro, esquerda não consegue fazer oposição

Especialistas comentam como prisão de Lula, escândalos de corrupção e liderança de Gleisi Hoffmann abalam o Partido dos Trabalhadores

PT: Legenda conta com 56 assentos na Câmara dos Deputados (Mario Tama/Getty Images)

PT: Legenda conta com 56 assentos na Câmara dos Deputados (Mario Tama/Getty Images)

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AFP

Publicado em 19 de fevereiro de 2019 às 13h01.

A esquerda governou o Brasil por 13 anos e travou um duelo digno no segundo turno das eleições presidenciais, vencidas por Jair Bolsonaro (PSL), mas o Partido dos Trabalhadores (PT), de Lula e Dilma, não consegue hoje encarnar a oposição ao presidente de extrema direita.

Jair Bolsonaro deve conseguir aprovar grande parte de suas reformas radicais, com o apoio de blocos heterogêneos de partidos da extrema direita à centro-esquerda.

O PT, com Lula na prisão, vários dirigentes confrontados com denúncias de corrupção e conflitos internos, parece incapaz de virar a página, além de estar atormentado pela crise na Venezuela e abalado politicamente com a onda ultraconservadora que varreu o país.

A esquerda está "desorganizada", o Brasil está privado "dos benefícios de uma oposição" e essa "é uma boa notícia para Bolsonaro, que se livra de ataques coordenados em um confuso início de governo", avaliou em artigo recente o jornal Folha de S. Paulo.

A exoneração de Gustavo Bebianno, ministro da Secretaria-geral da Presidência, acusado de mentir por Carlos Bolsonaro, um dos filhos do presidente; as suspeitas de irregularidades financeiras que rondam seu outro filho, o senador Flávio Bolsonaro; as declarações dissonantes de seu vice, o general Hamilton Mourão; a sequência de gafes de seus ministros: o primeiro mês e meio de mandato de Jair Bolsonaro foi caótico.

Mas longe de se aproveitar desta situação, "a oposição está em uma situação muito ruim neste momento", explica Sylvio Costa, fundador do Congresso em Foco, site especializado no Legislativo. "A esquerda está muito frágil agora", emendou.

O PT de Lula permanece como o partido com maior representatividade na Câmara dos Deputados, com 56 assentos, e seu candidato, Fernando Haddad, obteve 45% dos votos nas presidenciais de outubro.

Mas "não é mais o partido hegemônico da esquerda", explica Lucio Renno, professor associado do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília. O partido "perdeu muito de sua possibilidade de liderar a oposição" a Bolsonaro.

Órfão de Lula

O PT está assombrado por vários problemas. Para começar, a corrupção: uma nova sentença de mais de 12 anos de prisão para Lula pela reforma no sítio em Atibaia, depois de uma pena similar pelo tríplex no Guarujá, pela qual cumpre pena desde abril, foi um novo e duro golpe para o partido. E a metade de seus senadores (três de seis) são alvo de investigações.

Há também um problema de liderança: o partido parece órfão inconsolável de Lula, de 73 anos. "Não há espaço para o aparecimento de uma nova liderança", constata Sylvio Costa.

"Onde está o Haddad?", pergunta Lucio Renno. "Ele simplesmente desapareceu", afirma, a respeito do candidato à Presidência que voltou a lecionar na USP (Universidade de São Paulo) já no dia seguinte à sua derrota nas urnas.

Perpassado por conflitos internos, o partido permanece sob o comando de Gleisi Hoffmann, uma figura controversa que ainda provoca mal-estar por ter ido assistir, em janeiro, à posse ao segundo mandato do presidente Nicolás Maduro, em Caracas.

Por fim, o PT parece carecer de agenda política sobre Bolsonaro. Na nova legislatura, está limitado sobretudo a jogar com a obstrução para fazer prolongar os debates. Em meio à cacofonia, acolheu o projeto de endurecimento da legislação contra a criminalidade do ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro.

Nestas condições, seus antigos aliados romperam com o PT para formar um bloco parlamentar sem o partido, em torno do PDT de Ciro Gomes e do PCdoB.

Com meia dúzia de outros partidos, entre os quais formações de direita, o grupo reivindica 105 deputados e o lugar de segunda força na Câmara, atrás dos bolsonaristas e seus 305 assentos, mas à frente dos 97 deputados do bloco de esquerda em torno do PT, do PSOL, do PSB e da Rede Sustentabilidade.

Este novo bloco "se apresenta como uma nova força, uma força mais moderada, que às vezes vota com o governo" Bolsonaro, explica Sylvio Costa.

Campo de incertezas

"Haverá uma competição entre partidos da esquerda sobre quem irá assumir o lugar de liderança da oposição", prevê Lucio Renno. Mas "a luta da oposição" a Jair Bolsonaro "carecerá de coerência. Vai depender das questões" que serão submetidas ao Congresso, afirmou.

Os projetos econômicos do governo, como a importante reforma previdenciária, poderão, portanto, obter o apoio de partidos de oposição, que se oporão posteriormente a iniciativas relacionadas a questões mais controversas da sociedade (educação, aborto, minorias sexuais, indígenas).

De qualquer forma, "se pode antecipar um mandato bolsonaro cheio de incertezas e instabilidade", conclui o cientista político.

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