Dilma se empenha para evitar um fiasco em 2014
Presidente está dedicando as últimas semanas de 2013 à tentativa de restaurar entre os líderes empresariais a destroçada credibilidade de seu governo
Da Redação
Publicado em 22 de novembro de 2013 às 20h53.
Brasília - Visto do modernista e envidraçado Palácio do Planalto, 2014 parece um campo minado.
A economia, já cambaleante, provavelmente vai desacelerar ainda mais. Um rebaixamento da classificação de crédito do Brasil parece possível, e até provável. A Copa do Mundo, que o Brasil vai sediar em junho e julho, pode acabar revelando a bilhões de telespectadores a má qualidade do planejamento do governo e os gargalos no transporte que há muitos anos frustram os investidores.
Para agravar ainda mais a situação, a presidente Dilma Rousseff disputará a reeleição em outubro --ou seja, se alguma dessas coisas derem terrivelmente errado, ela poderá perder o cargo.
Dilma está dedicando as últimas semanas de 2013 à tentativa de restaurar entre os líderes empresariais a destroçada credibilidade de seu governo e a manter os gastos orçamentários sob controle, e assim garantir que o ano que vem não se transforme no seu pior --ou último-- no cargo.
Nenhuma das medidas corresponde a uma mudança fundamental na política. Uma dúzia de autoridades do alto escalão entrevistadas pela Reuters na semana passada descreveram um governo que está preocupado com a deterioração da reputação do Brasil nos mercados financeiros, mas consideram que o pessimismo é exagerado e, portanto, não estão convencidas da necessidade de uma grande reformulação.
Em vez disso, Dilma está se concentrando mais em "pôr a casa em ordem", nas palavras de uma autoridade, antes de a campanha eleitoral de 2014 começar para valer e o Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, passar a frear seu estímulo monetário, uma iniciativa que provavelmente vai provocar instabilidade em mercados emergentes, como o Brasil.
Nos últimos dias, a presidente: fechou um acordo para impedir que o Congresso aprove leis que impliquem em gastos; reverteu uma decisão que iria permitir a cidades e Estados gastar mais; e supervisionou pessoalmente um leilão de aeroportos para o setor privado, que ela espera vá ajudar a evitar o caos nas viagens durante a Copa do Mundo.
O retoque também se estendeu à própria Dilma: depois de visivelmente ganhar peso em seus quase três anos no cargo, a avó de 65 anos agora está de dieta.
Ela também usou o Twitter pela primeira vez desde que está na Presidência. Isso é parte de uma investida mais ampla na mídia social visando não só a eleição, mas dar a Dilma uma linha direta com os brasileiros, para o caso de se repetirem os massivos protestos de rua que abalaram o país em junho.
Pontual como na Igreja
Muitos investidores vêm debochando das recentes atitudes dela, dizendo que equivalem a uma nova embalagem superficial de um governo que interferiu demais na economia e destruiu boa parte da credibilidade que o Brasil acumulou na última década, quando era um dos mercados emergentes de crescimento mais rápido no mundo.
Mas as autoridades apontam para sua taxa de aprovação, em ascensão, um índice de desemprego que permanece próximo do recorde de baixa --e a abordagem de Dilma de colocar a mão na massa-- como sinais de que o ano que vem não será tão ruim como alguns pensam.
"Ela está fazendo a gente trabalhar, isso é verdade", disse o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, que está ajudando a supervisionar os preparativos para a Copa do Mundo, incluindo novos estádios e reformas de aeroportos. "A mensagem é clara: 2014 é quando teremos de entregar resultados."
Diante da pergunta sobre se está preocupado com uma pane na logística na Copa do Mundo, para a qual se prevê 300 mil visitantes de todo o mundo, Aldo comparou a situação com a tentativa de organizar um casamento --no qual, inevitavelmente, disse ele, há algum tipo de percalço.
"Em todos em que já estive a noiva sempre aparece atrasada", disse Rebelo. "E mesmo assim o casamento seguiu adiante de todo o jeito, todas as vezes."
"Acho que vamos estar bem", acrescentou.
Essa confiança é típica de Brasília nos últimos anos, alarmando alguns investidores que temem que o governo ainda esteja celebrando as conquistas da década passada e não encarando a sério os problemas atuais.
A economia do Brasil cresceu tórridos 7,5 por cento em 2010, ano em que Dilma foi eleita, mas desacelerou fortemente depois que ela assumiu o cargo. Economistas preveem crescimento de 2,5 por cento este ano e 2,1 por cento em 2014.
Mesmo quando se considera a situação fiscal --talvez o flanco mais vulnerável para o qual se encaminha o Brasil no ano que vem--, o tom de algumas autoridades permanece desafiador.
O governo não tem cumprido sua meta fiscal para este ano, com um superávit orçamentário primário de 1,58 por cento do Produto Interno Bruto nos 12 meses até setembro, o que faz com que sua meta de 2,3 por cento para todo o ano de 2013 seja muito difícil de alcançar.
Um destacado analista da Standard and Poor's disse no mês passado à Reuters que o governo precisa mostrar maior rigor fiscal para evitar o risco de rebaixamento da nota da dívida, o que colocaria o Brasil no nível mais baixo de classificação de grau de investimento. Em junho, a S&P reduziu sua perspectiva de crédito para o Brasil, o que significa que pode cortar a nota brasileira nos próximos dois anos.
Um rebaixamento faria o governo e as corporações, por sua vez, tomarem dinheiro emprestado a um custo mais elevado, e afetaria ainda mais o crescimento econômico.
Ao ser perguntada sobre essa ameaça iminente, a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, exibiu uma planilha mostrando que os gastos do Brasil em áreas-chave, como salários dos funcionários públicos, na realidade caíram em termos de participação no PIB ao longo da última década.
Pelos padrões mundiais, as finanças do Brasil ainda estão boas, disse ela. "O mercado financeiro talvez esteja querendo uma resposta muito maior do Brasil do que de outros países", disse ela, com uma pitada de frustração.
Avanço em várias frentes
Há, na realidade, algum motivo para confiança.
O governo, pelo menos até o momento, neutralizou três problemas que pareciam muito ameaçadores cinco meses atrás: inflação, taxa de câmbio e uma fervente agitação popular.
A inflação caiu de 6,7 por cento nos 12 meses até junho para um índice mais administrável, de 5,84 por cento, no acumulado até outubro. Investidores creditam o fato À abordagem mais dura que a esperada do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, que iniciou um ciclo de alta nas taxas de juros iniciado em abril, embora a queda inesperada, de uma vez só, nas tarifas de transporte público em cidades brasileiras também tenha desempenhado papel importante.
O real se estabilizou em torno de 2,30 por dólar, desafiando prognósticos feitos meses antes de que se enfraqueceria até 2,80 ou mais.
A popularidade de Dilma, que afundou durante os protestos, se recuperou quase totalmente. Cerca de 75 por cento dos brasileiros descrevem o seu governo como "ótimo", "bom" ou "regular".
Embora continue havendo manifestações em cidades como o Rio de janeiro, elas normalmente envolvem apenas algumas centenas de pessoas --nada parecido com o milhão que foi para as ruas em apenas uma noite de junho.
Uma pesquisa divulgada esta semana mostrou que Dilma se encaminha para a reeleição, com margem de 30 pontos porcentuais acima do rival mais próximo.
Apesar de sua reputação, em muitos segmentos, de ser uma esquerdista da velha escola, Dilma, uma tecnocrata de carreira, promoveu muitas reformas amigáveis ao setor privado, como as concessões de aeroportos, e ela realizou uma nova rodada de negociações com líderes empresariais brasileiros.
"Ela não é uma pessoa que vá deixar a ideologia interferir", disse o ministro-chefe da Secretaria de Aviação Civil, Moreira Franco. "Ela está determinada a fazer o que for necessário para tornar 2014 um sucesso."
Brasília - Visto do modernista e envidraçado Palácio do Planalto, 2014 parece um campo minado.
A economia, já cambaleante, provavelmente vai desacelerar ainda mais. Um rebaixamento da classificação de crédito do Brasil parece possível, e até provável. A Copa do Mundo, que o Brasil vai sediar em junho e julho, pode acabar revelando a bilhões de telespectadores a má qualidade do planejamento do governo e os gargalos no transporte que há muitos anos frustram os investidores.
Para agravar ainda mais a situação, a presidente Dilma Rousseff disputará a reeleição em outubro --ou seja, se alguma dessas coisas derem terrivelmente errado, ela poderá perder o cargo.
Dilma está dedicando as últimas semanas de 2013 à tentativa de restaurar entre os líderes empresariais a destroçada credibilidade de seu governo e a manter os gastos orçamentários sob controle, e assim garantir que o ano que vem não se transforme no seu pior --ou último-- no cargo.
Nenhuma das medidas corresponde a uma mudança fundamental na política. Uma dúzia de autoridades do alto escalão entrevistadas pela Reuters na semana passada descreveram um governo que está preocupado com a deterioração da reputação do Brasil nos mercados financeiros, mas consideram que o pessimismo é exagerado e, portanto, não estão convencidas da necessidade de uma grande reformulação.
Em vez disso, Dilma está se concentrando mais em "pôr a casa em ordem", nas palavras de uma autoridade, antes de a campanha eleitoral de 2014 começar para valer e o Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, passar a frear seu estímulo monetário, uma iniciativa que provavelmente vai provocar instabilidade em mercados emergentes, como o Brasil.
Nos últimos dias, a presidente: fechou um acordo para impedir que o Congresso aprove leis que impliquem em gastos; reverteu uma decisão que iria permitir a cidades e Estados gastar mais; e supervisionou pessoalmente um leilão de aeroportos para o setor privado, que ela espera vá ajudar a evitar o caos nas viagens durante a Copa do Mundo.
O retoque também se estendeu à própria Dilma: depois de visivelmente ganhar peso em seus quase três anos no cargo, a avó de 65 anos agora está de dieta.
Ela também usou o Twitter pela primeira vez desde que está na Presidência. Isso é parte de uma investida mais ampla na mídia social visando não só a eleição, mas dar a Dilma uma linha direta com os brasileiros, para o caso de se repetirem os massivos protestos de rua que abalaram o país em junho.
Pontual como na Igreja
Muitos investidores vêm debochando das recentes atitudes dela, dizendo que equivalem a uma nova embalagem superficial de um governo que interferiu demais na economia e destruiu boa parte da credibilidade que o Brasil acumulou na última década, quando era um dos mercados emergentes de crescimento mais rápido no mundo.
Mas as autoridades apontam para sua taxa de aprovação, em ascensão, um índice de desemprego que permanece próximo do recorde de baixa --e a abordagem de Dilma de colocar a mão na massa-- como sinais de que o ano que vem não será tão ruim como alguns pensam.
"Ela está fazendo a gente trabalhar, isso é verdade", disse o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, que está ajudando a supervisionar os preparativos para a Copa do Mundo, incluindo novos estádios e reformas de aeroportos. "A mensagem é clara: 2014 é quando teremos de entregar resultados."
Diante da pergunta sobre se está preocupado com uma pane na logística na Copa do Mundo, para a qual se prevê 300 mil visitantes de todo o mundo, Aldo comparou a situação com a tentativa de organizar um casamento --no qual, inevitavelmente, disse ele, há algum tipo de percalço.
"Em todos em que já estive a noiva sempre aparece atrasada", disse Rebelo. "E mesmo assim o casamento seguiu adiante de todo o jeito, todas as vezes."
"Acho que vamos estar bem", acrescentou.
Essa confiança é típica de Brasília nos últimos anos, alarmando alguns investidores que temem que o governo ainda esteja celebrando as conquistas da década passada e não encarando a sério os problemas atuais.
A economia do Brasil cresceu tórridos 7,5 por cento em 2010, ano em que Dilma foi eleita, mas desacelerou fortemente depois que ela assumiu o cargo. Economistas preveem crescimento de 2,5 por cento este ano e 2,1 por cento em 2014.
Mesmo quando se considera a situação fiscal --talvez o flanco mais vulnerável para o qual se encaminha o Brasil no ano que vem--, o tom de algumas autoridades permanece desafiador.
O governo não tem cumprido sua meta fiscal para este ano, com um superávit orçamentário primário de 1,58 por cento do Produto Interno Bruto nos 12 meses até setembro, o que faz com que sua meta de 2,3 por cento para todo o ano de 2013 seja muito difícil de alcançar.
Um destacado analista da Standard and Poor's disse no mês passado à Reuters que o governo precisa mostrar maior rigor fiscal para evitar o risco de rebaixamento da nota da dívida, o que colocaria o Brasil no nível mais baixo de classificação de grau de investimento. Em junho, a S&P reduziu sua perspectiva de crédito para o Brasil, o que significa que pode cortar a nota brasileira nos próximos dois anos.
Um rebaixamento faria o governo e as corporações, por sua vez, tomarem dinheiro emprestado a um custo mais elevado, e afetaria ainda mais o crescimento econômico.
Ao ser perguntada sobre essa ameaça iminente, a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, exibiu uma planilha mostrando que os gastos do Brasil em áreas-chave, como salários dos funcionários públicos, na realidade caíram em termos de participação no PIB ao longo da última década.
Pelos padrões mundiais, as finanças do Brasil ainda estão boas, disse ela. "O mercado financeiro talvez esteja querendo uma resposta muito maior do Brasil do que de outros países", disse ela, com uma pitada de frustração.
Avanço em várias frentes
Há, na realidade, algum motivo para confiança.
O governo, pelo menos até o momento, neutralizou três problemas que pareciam muito ameaçadores cinco meses atrás: inflação, taxa de câmbio e uma fervente agitação popular.
A inflação caiu de 6,7 por cento nos 12 meses até junho para um índice mais administrável, de 5,84 por cento, no acumulado até outubro. Investidores creditam o fato À abordagem mais dura que a esperada do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, que iniciou um ciclo de alta nas taxas de juros iniciado em abril, embora a queda inesperada, de uma vez só, nas tarifas de transporte público em cidades brasileiras também tenha desempenhado papel importante.
O real se estabilizou em torno de 2,30 por dólar, desafiando prognósticos feitos meses antes de que se enfraqueceria até 2,80 ou mais.
A popularidade de Dilma, que afundou durante os protestos, se recuperou quase totalmente. Cerca de 75 por cento dos brasileiros descrevem o seu governo como "ótimo", "bom" ou "regular".
Embora continue havendo manifestações em cidades como o Rio de janeiro, elas normalmente envolvem apenas algumas centenas de pessoas --nada parecido com o milhão que foi para as ruas em apenas uma noite de junho.
Uma pesquisa divulgada esta semana mostrou que Dilma se encaminha para a reeleição, com margem de 30 pontos porcentuais acima do rival mais próximo.
Apesar de sua reputação, em muitos segmentos, de ser uma esquerdista da velha escola, Dilma, uma tecnocrata de carreira, promoveu muitas reformas amigáveis ao setor privado, como as concessões de aeroportos, e ela realizou uma nova rodada de negociações com líderes empresariais brasileiros.
"Ela não é uma pessoa que vá deixar a ideologia interferir", disse o ministro-chefe da Secretaria de Aviação Civil, Moreira Franco. "Ela está determinada a fazer o que for necessário para tornar 2014 um sucesso."