Delfim Netto vê Selic em 1% e queda de 7% do PIB com pandemia
Para o ex-ministro, páis não tem condições de realizar investimentos públicos para amenizar os efeitos da crise
Carla Aranha
Publicado em 23 de maio de 2020 às 08h00.
Última atualização em 13 de julho de 2022 às 17h16.
Taxa Selic no piso entre 1% e 1,5% e PIB com queda na casa de 7% neste ano: essa é a previsão sobre o impacto da pandemia de coronavírus na economia brasileira do ex-ministro da Fazenda Antonio Delfim Netto.
“A demanda está caindo e há também queda da oferta global, o que vai gerar recessão profunda e pressão deflacionária”, disse Delfim.
Um cenário de capacidade ociosa gigantesca impedirá o repasse da alta do dólar para a inflação e abrirá caminho para mais cortes de juros pelo Banco Central, que já levou a taxa básica para os atuais 3%.
Delfim, conhecido como o czar da economia brasileira durante o regime militar, também não mostra otimismo com o processo de recuperação pós-pandemia e prevê uma retomada lenta. Segundo ele, o país perdeu parte de sua capacidade produtiva com erros de política econômica do passado e o crescimento deverá ficar em torno de 2,5% em 2021.
Câmbio controlado
Mesmo com os juros em queda, as reservas do país, em cerca de US$ 340 bilhões, e as atuações do Banco Central com swaps cambiais e venda de dólar à vista impedem que o câmbio saia do controle, afirma o ex-ministro.
Além disso, a alta do dólar também tem o efeito de melhorar as exportações dos setores agrícola e industrial, reforçando as contas externas.
O BC também ganhou um novo instrumento para lidar com a crise com a aprovação da PEC do orçamento de guerra pelo Congresso, que permite a compra de títulos públicos e privados no mercado secundário. Isso significa que a instituição passa ser fornecedora de liquidez em última instância, o que deve ajudar as empresas a atravessar o período de crise, segundo Delfim.
Além dos problemas sanitários e econômicos, o Brasil também enfrenta uma crise política, com a saída de Sergio Moro do ministério da Justiça e a investigação sobre possível interferência de Jair Bolsonaro na Polícia Federal, o que ele nega.
Delfim não acredita que o presidente sofrerá um impeachment, pois o Brasil “está cansado” de aventuras -- embora avalie que o país possa ter a imagem externa afetada pelos desdobramentos das investigações, como a possível divulgação na íntegra do vídeo da reunião entre Bolsonaro e seus ministros, realizada em 22 de abril.
Rombo fiscal
O ex-ministro diz que o país não tem como realizar investimento público para amenizar o efeito da crise, já que o déficit primário será de quase 10% e a relação dívida/PIB, em torno de 90% neste ano, em razão do aumento de gastos para combater a crise. “Para ampliar os investimentos, nós vamos precisar mobilizar o capital privado externo e o interno com bons projetos.”
Para ele, esse atual aumento do déficit não é preocupante desde que as despesas sejam temporárias e que o governo persista com as reformas após a pandemia. “Temos de fazer uma reforma do Estado. Não somos um Estado forte, e sim obeso.”