Debate no Flow 'força' discussões de propostas dos candidatos de SP mas acaba em agressão
Apesar de formato reduzir confrontos, Marçal foi expulso no último minuto e assessor de Nunes, agredido dentro do estúdio
Repórter
Publicado em 23 de setembro de 2024 às 22h15.
Última atualização em 24 de setembro de 2024 às 10h48.
Sem confrontos diretos entre os candidatos a prefeito de São Paulo, o oitavo debate realizado nesta segunda-feira, 23, pelo Flow, forçou os concorrentes Ricardo Nunes (MDB), Guilherme Boulos (PSOL), Pablo Marçal (PRTB), Tabata Amaral (PSB), José Luiz Datena (PSDB) e Marina Helena (NOVO) a apresentarem seus planos e programas para os problemas da cidade de São Paulo. O evento transcorreu com relativa tranquilidade até quase o último minuto. Literalmente. Nos segundos finais da fala de Marçal, o candidato foi advertido por três vezes pelo mediador, Carlos Tramontina, e acabou expulso. Logo depois, uma confusão se instalou no estúdio e um assessor de Nunes foi agredido e o debate, interrompido.
De acordo com Tramontina, a agressão foi realizada após a expulsão de Marçal, que por três vezes desrepeitou a regra do programa, afirmando que o atual prefeito seria preso por ele. O assessor de Nunes deixou o debate "sangrando muito", segundo o apresentador. O ataque foi desferido por Nahuel Medina, assessor de Marçal que, na sequência, foi detido pela Polícia Militar. Ele foi liberado após prestar depoimento. Duda Lima, assessor de Nunes agredido, foi ao hospital e levou pontos no supercílio.
“Uma pena que um candidato num debate muito bom, com o maior número de propostas, uma pena que um candidato decidiu entornar o caldo. Vai ganhar o quê? Veio bater boca comigo, o regulamento está aqui, todo mundo assinou. Ele não quis respeitar a regra que ele e sua assessoria assinaram”, disse Tramontina após o debate.
O clima entre Nunes e Marçal começou tenso já nos bastidores no início do evento. Na ocasião, Marçal provocou Nunes, chamando-o de "tchuchuca do PCC" e o atual prefeito rebateu, apontando o adversário como "condenadinho".
Apesar do clima, os postulantes à prefeitura não tiveram espaço ao longo do programa para um tom mais beligerante e precisaram responder a perguntas feitas por eleitores e especialistas, o que permitiu que temas como saúde, segurança pública, educação e moradia viessem à tona após uma sequência de debates em que troca de xingamentos, ofensas e até agressões deram o tom, com exceção apenas nos dois últimos encontros, em que os candidatos foram contidos.
A gestão do atual prefeito foi alvo de críticas de Boulos, Datena, Tabata e Marçal.
Primeiro bloco
O primeiro tema da noite foi a população de rua da capital paulista, cerca de 80 mil, segundo o Censo Municipal da População de Rua.
André Soler, fundador do SP Invisível, questionou os candidatos sobre propostas para o tema. Sorteado para responder, Datena classificou como " vergonhoso" ter uma cidade de "sem-teto". E criticou a gestão Nunes sobre a falta de conselhos tutelares e assistência social e prometeu acolhimento.
Ao comentar, o deputado federal do PSOLtambém afirmou não fazer sentido "a cidade mais rica da América Latina ter 80 mil pessoas" em situação de rua, e criticou a prefeitura por ter dinheiro em caixa e agir com "descaso" sobre o tema.
O candidato do PSOL concordou que é preciso melhorar os abrigos para que eles sejam "humanos" e acrescentou a importância de criar oportunidades de emprego e renda e construir moradias.
Na sequência, o jornalista Bruno Paes provocou os candidatos sobre os programas para trabalhar com os egressos do sistema prisional. Boulos lembrou que o fluxo na "Cracolândia", na região central da capital paulista, é composto por pessoas que vieram do sistema prisional.
Tabata, ao comentar, defendeu programas de capacitação e promoção de empregos, e falou em prevenção, com escolas em tempo integral para as crianças.
A deputada federal do PSB protagonizou um dos momentos mais tensos ao responder sobre os dados que apontam que o município está atrás da média nacional e estadual de alfabetização, em crítica a Nunes, candidato à reeleição.
Tereza Perez, presidente da Roda Educativa, lembrou que apenas 38% das crianças chegaram ao segundo ano sabendo ler e escrever. Ao criticar o governo, Tabata afirmou que a educação "andou para trás. A candidata defendeu foco na alfabetização, avaliação bimestral, reforço escolar, aumento das escolas em tempo integral e intercâmbio para o melhor aluno da rede municipal.
Nunes rebateu apontando o atraso causado pela pandemia em 2020 e 2021 e argumentou que reduziu a fila de creches e a evasão escolar, com valorização dos profissionais da educação.
A adversária rebateu, afirmando que o atual prefeito entregará um nível de ensino "com os piores resultados do que recebeu". "Não sei se é descaso, corrupção, ou máfia das creches, mas é fato que falta compromisso", afirmou.
Na sequência foi a vez de Marçal e Marina apontarem suas propostas para a redução da letalidade no trânsito e o que fazer para salvar vidas. O candidato do PRTB falou em “atacar a causa”, mudando a mentalidade da população. Sem especificar seu plano, Marçal fez indiretas ao episódio da cadeira, afirmando que a “certeza de impunidade” e falta de “inteligência emocional” também provocam mortes no trânsito, a mesma certeza que segundo ele “garante que pessoas peguem em cadeiras para arremessar em candidatos”.
O ex-coach também falou na criação de corredores de moto, criação empregos em favelas e bolsões em rodovias para “trazer paz no trânsito”. A economista do NOVO defendeu a ampliação das faixas azul e ônibus na capital e revisão de rotas e sinalização, e citou que os grandes deslocamentos são um problema para defender seu programa “Quebrada com escritura” que, segundo ela, dará título de propriedade para que moradores de periferia possam morar e trabalhar em sua região.
No tema da saúde, a dupla seguiu e fez críticas a pergunta sobre como se comportarão diante de uma nova emergência sanitária. Isso porque o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Walter Cintra apontou que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi negacionista diante da pandemia de covid-19.
Marina e Marçal criticaram o que chamaram de “politização do tema” e trouxeram o tema para o atual governo federal com a epidemia de dengue.
Os candidatos Nunes e Datena também foram provocados a responder sobre o orçamento da secretaria municipal da Pessoa com Deficiência para que haja políticas para essa parcela da população.
O atual prefeito reconheceu que é preciso fazer mais e apontou obras de sua gestão em transporte e ações nos centros educacionais. O adversário do PSDB contestou e apontou que Nunes não priorizou as pessoas com deficiências nas “obras eleitoreiras” que ele “não entregará”.
‘Gestão estepe’
O segundo bloco com perguntas de eleitores abriu com Marçal acusando o atual prefeito de ser uma “gestão estepe e que está furado”. O influenciador chamou atenção para a falta de entrega de corredores de ônibus e cuidado com o patrimônio, apontado pelo eleitor. O candidato do PRTB finalizou dizendo ser um candidato diferente por ter, segundo ele, financiamento próprio, o que repetiu ao longo do debate.
A gestão Nunes também foi indiretamente alvo de uma pergunta feita por Gisele da Silva, moradora do Jardim Robru, em Guaianases, no extremo leste da capital. A eleitora, em pergunta em vídeo, questionou a situação dos ônibus na cidade e o valor da passagem, afirmando que “nem, cachorro é tratado igual a gente é [tratado]”.
A indignação da entrevistada foi elogiada por Boulos e Tabata, que responderam e comentaram o questionamento.
Ao dizer que a fala de Gisele "está entalada na garganta de muita gente", o candidato do PSOL disse que Nunes deveria responder a eleitorado e prometeu "passar a limpo" os contratos do ônibus, apontando as investigações do Ministério Público de São Paulo de envolvimento do PCC com o transporte público.
Tabata também criticou a atual gestão, afirmando que as linhas de ônibus de hoje são as mesmas de 15 anos atrás, quando seu pai era cobrar. A candidata do PSB também prometeu mais corredores de ônibus e semáforos inteligentes para melhorar o trânsito. O atual prefeito pediu direito de resposta para organização do debate por causa da fala de Gisele, mas o pedido foi negado.
Marçal destoa e faz ataques
Até então sem ofensas pessoais, Marçal usou o momento em que debatia com Boulos sobre qualidade do ar, questionada por um eleitor, para atacar o candidato do PSOL com a pecha de “invasor” e voltou a insinuar que ele faria uso de drogas, sem provas, como tem feito desde o início da campanha.
O influenciador disse que a população não aguenta mais "cheirar" essa poluição, destacando o verbo "cheirar". O deputado federal pediu direito de resposta, que foi negado. Na resposta seguinte, no entanto, Boulos respondeu Marçal, argumentando que a única coisa que invadiria era a “cabecinha vazia” do ex-coach com “ideias e propostas”.
Num embate contra Tabata, o candidato do PRTB também voltou a insinuar que Datena seria assediador, como fez no debate da TV Cultura, há duas semanas, que terminou com agressão do apresentador contra Marçal.
Datena pediu direito de resposta, que foi aceito pela organização. Ao rebater, o candidato do PSDB contra-atacou, chamando o ex-coach de “bandido condenado pioneiro em assaltos a banco e de velhinhos”. O apresentador disse que sua esposa foi vítima de uma tentativa de estupro e que não aceitaria “ouvir barbaridades” da “boca suja desse bandido condenado”.
O tucano disse que não queria desvirtuar o debate e que “esse tipo de gente vai responder na Justiça” por “atacar a honra” das pessoas. Pela primeira vez, a organização do debate advertiu Datena sobre os ataques e garantiu a Marçal um direito de resposta.
Marçal respondeu que “nunca tocou no dinheiro de ninguém” e chamando os adversários de “consórcio de comunistas”, cobrou-os de que achassem “a pessoa que recebeu esse tombo, que eles falam, e eu pago quatro vezes mais”.