Carla Aranha
Publicado em 19 de outubro de 2021 às 15h34.
Última atualização em 19 de outubro de 2021 às 16h39.
A menos de 24 horas da segunda audiência pública sobre a privatização dos Correios, marcada para esta quarta, 20, no Senado, o clima sobre a aprovação da venda da estatal é de incerteza. Entre parlamentares de oposição, predomina o discurso de que a desestatização dos Correios, uma das maiores empresas públicas do país, coloca em risco a "soberania nacional" e compromete a entrega de cartas nos rincões do país. Outro argumento é que um fracasso do governo no Congresso viria bem a calhar em um momento no qual o Palácio do Planalto "já está enfraquecido pela CPI da Covid", segundo um senador ouvido por EXAME.
Para contrabalançar a queda de braço, o ministro Fábio Faria, das Comunicações, deve comparecer ao Senado nesta quarta para assistir à audiência pública, programada pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Não está descartada a presença de outras figuras de peso, como Gustavo Montezano, presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES).
Na visão dos senadores, trata-se de uma matéria "difícil". A estatal é uma das maiores empregadoras do país, com mais de 95.000 funcionários. Em estados como o Rio Grande do Norte, um dos mais carentes do Brasil, emprega mais de 1.000 pessoas. Os senadores de regiões como o Norte e Nordeste devem votar em peso contra a privatização, conforme apuração da EXAME.
O tema deve ser encaminhado para apreciação do Senado em novembro. "Com ou sem restrições pessoais à venda dos Correios, encaminharei a votação do tema", afirma o senador Otto Alencar (PSD-BA), presidente da CAE.
Na Câmara, o projeto de lei que regulamenta o setor postal e abre caminho para a privatização da estatal foi aprovado no dia 5 de agosto, com 286 votos a favor, 173 contra e duas abstenções. Desde então, se encontra em análise no Senado.
O PL dispõe do mecanismo de concessão das entregas de cartas e documentos para manter a universalização do serviço. O vencedor da licitação, prevista para o primeiro trimestre de 2022, deverá assinar um contrato com o governo federal a fim de garantir a continuidade das entregas postais em todo o território nacional.
"Há regras específicas para garantir 100% de cobertura nacional do serviço", disse o deputado Gil Cutrim (Republicanos/MA), relator do projeto de lei. A ideia é que a estatal seja transformada em sociedade de economia mista. A nova legislação prevê ainda a garantia de estabilidade dos funcionários dos Correios durante 18 meses após a privatização e a extensão do plano de saúde por um ano.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES) deve finalizar os estudos de modelagem econômica da vendas dos Correios até o final deste mês. Técnicos do banco e consultorias contratadas com a finalidade de fazer um pente fino nas finanças da estatal também estão calculando o valor de mercado de companhia. Segundo o BNDES, fundos de investimento e operadoras multinacionais do setor de logística teriam interesse formar consórcios para participar do leilão — a capilaridade dos Correios é apontada como um dos principais atrativos.
Depois de acumular prejuízos entre 2013 e 2017, a estatal começou a sair do vermelho. No ano passado, apresentou lucro de 1,5 bilhão de reais, o maior dos últimos dez anos, segundo a empresa. Em 2019, a margem de lucro foi de 102 milhões de reais, 36% menos do que o valor obtido em 2018. Os Correios contam com isenção tributária. Caso a estatal pagasse impostos, as obrigações junto ao Fisco teriam somado cerca de 1,5 bilhão de reais no ano passado, segundo o Ministério da Economia.