Cracolândia: comerciantes que atuam na área chamaram de "rebelião" os atos da noite anterior, mas são descrentes de que ocorra alguma mudança (Rovena Rosa/Agência Brasil)
Estadão Conteúdo
Publicado em 12 de abril de 2018 às 19h26.
São Paulo - Após uma noite de confrontos com usuários de drogas, prisões e ataques a estabelecimentos, a Guarda Civil Metropolitana (GCM) isolou a Cracolândia na manhã desta quinta-feira, 12, para revistar usuários de drogas que tentassem adentrar o chamado "fluxo" - localizado entre a Rua Helvétia e a Praça Júlio Prestes, no bairro Campos Elísios, região central da cidade de São Paulo. O procedimento é comum na região, contudo, segundo frequentadores, a quantidade de guardas era maior que o padrão.
Na maioria dos acessos, os guardas impediram a circulação de carros e de pessoas que não eram usuárias do "fluxo". Dispostos em fileiras, olhavam mochilas, sacolas e outros pertences de frequentadores. Em seguida, faziam a revista, o que, em alguns casos, incluía olhar dentro da roupa dos usuários.
Poucos metros após passar pela revista, os frequentadores já circulavam com seus cachimbos e se uniam a outras centenas de pessoas no "fluxo". O espaço fica a uma quadra de onde os usuários se concentravam em maio de 2017, quando o local foi alvo de uma operação conjunta da Prefeitura e do Governo do Estado. Após, a concentração passou por outras quadras dos arredores até se estabelecer no entorno da Praça Júlio Prestes.
Comerciantes que atuam na área chamaram de "rebelião" os atos da noite anterior, mas são descrentes de que ocorra alguma mudança. "Eles vêm aqui, limpam e tiram foto, enquanto está todo mundo usando droga do mesmo jeito na quadra do lado", comentou uma mulher à reportagem.
Pela manhã, o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, chamou de "enérgica" a ação da Prefeitura e do Governo do Estado na região. "Nós estamos incomodando o crime organizado. Então, vamos continuar com a nossa ação para poder acabar, para poder reduzir aquele espaço tão degradado da cidade de São Paulo", declarou. "Mesmo com esses traficantes incomodados, a Prefeitura vai continuar agindo firmemente", completou.
Já o secretário municipal de Segurança Pública, Coronel José Roberto, afirmou que a GCM agiu para que a ação causasse "o menor transtorno possível". "Nós estamos combatendo frontalmente aquilo que existia ali, o tráfico pesado de drogas, barracas, que não tem mais", declarou ao Estado. Ele nega as acusações de movimentos sociais de que guardas teriam agredido usuários que não estavam envolvidos no confronto.
Segundo a Secretaria Municipal de Segurança Pública, foram apreendidos galões de gasolina, uma quantia de R$ 393 em dinheiro e uma balança de precisão, além de 526 gramas de maconha, 82 gramas de cocaína e 108 gramas de crack.
Dinheiro, computadores, calçados e produtos de beleza estão entre as dezenas de itens saqueados dos ao menos cinco estabelecimentos comerciais atacados por volta das 20h30 de quarta-feira, no entorno da Avenida Duque de Caxias e da Rua Santa Ifigênia.
Dentre os identificados pelo Estado, apenas uma lotérica ainda estava fechada para o público na tarde desta quinta-feira. "A gente precisa trabalhar, pagar as contas, mas a gente tem muito medo", disse a proprietária de um deles à reportagem.
Dentre os locais atacados, a lotérica era o mais recente na Avenida Duque de Caxias: abriu há cerca de quatro meses. Ela teve a porta arrombada e, em seguida, os invasores quebraram os vidros de quatro das três cabines de atendimento e furtaram dinheiro e equipamentos.
A poucos metros de distância, um salão de beleza também foi arrombado por mais de 10 homens, de acordo com uma das funcionárias. A mulher, que preferiu não se identificar, estava em outro ambiente do estabelecimento, quando viu homens portando pedaços de madeira e furtando dezenas de produtos de beleza, pranchas de alisamento e secadores de cabelo.
Também na Avenida Duque de Caxias, uma agência bancária teve duas janelas e duas portas de vidro quebradas. Ao ver policiais e cacos de vidro no entorno pela manhã, uma funcionária terceirizada chegou a achar que um gerente do banco tivesse sido sequestrado. "Fiquei muito assustada", comentou.
Além dos locais citados, também foram invadidos uma loja de calçados e uma venda de produtos de iluminação. Uma moradora do entorno contou ao Estado ainda estar com dor de cabeça devido à quantidade de gás utilizado pela Polícia Militar para dispersar os usuários da Cracolândia.