Com governo Bolsonaro, agrotóxicos podem ter futuro garantido no Brasil
Em três meses de exercício, o novo governo aprovou a colocação no mercado de 121 novos agrotóxicos
AFP
Publicado em 10 de abril de 2019 às 11h50.
No Brasil, maior mercado mundial de agrotóxicos, o governo Bolsonaro pretende impulsionar a venda de novos produtos fitossanitários para impulsionar ainda mais o desempenho do agronegócio, combustível da economia do país.
Em três meses de exercício, o novo governo aprovou a colocação no mercado de 121 novos agrotóxicos, em média mais de um por dia, elevando para 2.149 o número de produtos autorizados em seu mercado nacional.
O ritmo não difere muito do início dos anos 2017 e 2018, quando os processos de homologação se aceleraram, mas o Ministério da Agricultura pretende aumentar ainda mais.
As últimas autorizações foram outorgadas a fabricantes de produtos com componentes que já estão no mercado, assim como para sua utilização em novas culturas, ou sua combinação com novos componentes químicos.
"Nosso principal objetivo é disponibilizar aos agricultores a maior quantidade possível de ferramentas, biológicas e químicas, e isso passa por decisões menos demoradas", explicou à AFP Carlos Venâncio, coordenador-geral de agrotóxicos e produtos afins do Ministério da Agricultura.
Até o momento presente, embora a lei sugira um prazo de 120 dias, as autorizações para comercialização podem levar até oito anos.
"A demora no processo de registros prejudicava a concorrência e as possibilidades de inovação empresarial, prejudicando as produtores", afirma Reginaldo Minaré, consultor de tecnologia da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA).
"O Brasil está apenas recuperando seu atraso", considerou, acrescentando que "a diversificação do mercado é melhor para a produção agrícola, porque os produtores vão poder se beneficiar de agrotóxicos mais adaptados a um preço melhor".
Maior mercado mundial de agrotóxicos
Desde 2008, o Brasil é o maior mercado mundial de agrotóxicos, de acordo com a Associação Brasileira de Saúde Coletiva.
Em 2017, as vendas no país atingiram US$ 8,9 bilhões, ou 18% do mercado mundial, segundo o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Vegetal.
A quantidade de princípios ativos dos agrotóxicos comercializados no Brasil quase dobrou entre 2009 e 2017, chegando a quase 540 mil toneladas.
Uma tendência que preocupa os defensores do meio ambiente e da saúde.
Quase um terço dos ingredientes permitidos no Brasil são proibidos na União Europeia, aponta à AFP Larissa Mies Bombardi, pesquisadora do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo.
"A maioria das empresas que vendem esses produtos tem as sedes delas em países da União Europeia e exporta produtos proibidos lá para mercados mais permissivos, como o Brasil", ressalta.
Três princípios ativos banidos da União Europeia desde 2007, 2003 e 1991, respectivamente, os herbicidas Paraquat e Atrazina e o inseticida Acefato, estavam entre os dez mais vendidos no Brasil em 2017.
Entre os autorizados recentemente, há também produtos à base de Imazetapir e Sulfentrazone, ambos proibidos na União Europeia por causa de sua toxicidade.
Prioridade ao agronegócio
Quanto ao controverso herbicida glifosato, campeão de vendas no mundo, a Agência Brasileira de Vigilância Sanitária (Anvisa) concluiu em fevereiro, após uma reavaliação de cerca de dez anos, que não apresentava risco à saúde humana, embora tenha sido classificado como "provável cancerígeno" por uma agência da Organização Mundial de Saúde (OMS).
"Essa decisão vai na contramão dos alertas observados em outros países. A agência foi influenciada por dentro. Em vez de promover uma agricultura mais sustentável, o governo promove a agenda ruralista, que quer colocar mais veneno no mercado", estima Marina Lacôrte, engenheira agrônoma e especialista em agricultura no Greenpeace.
A ONG critica o projeto de lei PL 6.299/2002, apelidado de "Pacote do Veneno" por seus detratores, que deve ser submetido à votação do Congresso após ter sido aprovado por uma comissão especial no Senado no ano passado.
Defendido pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina da Costa, ex-líder do lobby do agronegócio na Câmara dos Deputados, o texto pretende simplificar os controles dos produtos e confiar ao Ministério mais prerrogativas em sua homologação.
"Os organismos ligados aos Ministérios do Meio Ambiente e da Saúde, que também tinham poder decisório, vão virar consultivos. O texto também quer permitir registros temporários, se a análise da nova substância passar de dois anos, e quer permitir, entre outras coisas, o uso de agrotóxicos, cujo caráter cancerígeno foi provado, a partir do momento que não apresente um 'risco inaceitável'".
"Concordamos em colocar a sociedade em perigo", lamenta Marina Lacôrte.
No Brasil, mais de 1.000 produtos fitossanitários aguardam homologação.