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Cidades do Rio de Janeiro já sofrem os efeitos da estiagem

Em cidades como Nova Friburgo e Petrópolis, moradores enfrentam transtornos para encher cisternas

A situação é mais sensível em lugares onde ocorrem captações em rios sem reservatórios de acumulação de água (Paulo Fridman/Corbis/Getty Images)

A situação é mais sensível em lugares onde ocorrem captações em rios sem reservatórios de acumulação de água (Paulo Fridman/Corbis/Getty Images)

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Agência O Globo

Publicado em 14 de setembro de 2021 às 08h13.

Última atualização em 14 de setembro de 2021 às 08h13.

Fazia uma semana, sexta-feira passada, que a última gota de água tratada e encanada tinha caído na casa da bióloga Daniele Santana, de 39 anos. Ela nem se iludia com a expectativa de que as torneiras voltassem a jorrar em breve, porque o histórico não era bom: a espera mais recente havia sido de dois meses. Para completar, ela vive num dos bairros de Maricá, na Região Metropolitana, atendidos pelo sistema no qual a Cedae, no dia 9 de setembro, anunciou que reduziria a capacidade de produção para 45%.

O motivo é a estiagem, com a consequente baixa do nível do Rio Ubatiba, que abastece áreas populosas do município. Esse é só um dos retratos que a falta de chuvas — que seca reservatórios, encarece a tarifa de energia elétrica e gera prejuízos no país — já espalha pelo Estado do Rio. Em cidades como Nova Friburgo e Petrópolis, na Serra, moradores também enfrentam transtornos para encher as caixas e cisternas.

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Órgãos de governo e especialistas dizem que ainda não é o fantasma da crise hídrica encarada pelos fluminenses em 2014 e 2015. Mas o quadro inspira atenção, afirma o gestor ambiental Marcelo Danilo Bogalhão, diretor do Comitê Guandu, que atua na bacia hidrográfica que abastece cerca de 9 milhões de pessoas, entre elas a população da capital. Grande parte das águas dessa bacia é transposta do Rio Paraíba do Sul, onde os reservatórios estão com níveis entre os mais baixos registrados para esta época do ano nas últimas duas décadas. De acordo com boletim da Agência Nacional de Água e Saneamento Básico (ANA), no domingo os reservatórios de Paraibuna, Santa Branca, Jaguari e Funil — ao longo do Paraíba do Sul — operavam, juntos, com um volume útil de 25,7% de sua capacidade.

No mesmo dia de 2020, o armazenamento estava em 34,23%. Em 2019, alcançava os 45,72%. Para efeito de comparação, o índice atual é o terceiro pior para a data desde 2004, ficando acima apenas dos registrados em 2014 (16,32%) e 2015 (7,56%). Apesar desse cenário, a Cedae e a Secretaria estadual do Ambiente garantem que não se vislumbra risco de desabastecimento. Ainda não há impactos, por exemplo, na Baixada Fluminense, onde a falta d'água é crônica em algumas regiões.

No fim de agosto, porém, o Ministério Público do Rio e o Ministério Público Federal oficiaram tanto a ANA quanto o Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (Ceivap) para saber que medidas estão sendo ou serão adotadas diante de uma possível escassez hídrica. Bogalhão, por sua vez, lembra que o ideal seria que o volume útil dos reservatórios estivesse perto dos 40%.

— Temos uma situação mais favorável do que em 2015. Estamos numa condição de atenção. Os gestores públicos e a população têm que estar atentos ao consumo consciente. Precisamos conter ao máximo o uso desnecessário da água. Isso é muito importante para que passemos por esse período com uma certa segurança — diz Bogalhão, repetindo um apelo feito também pelas concessionárias que distribuem água no estado.

Redução no Imunana

A situação é mais sensível em lugares onde ocorrem captações em rios sem reservatórios de acumulação de água. No mês passado, por exemplo, a Cedae precisou reduzir a produção de água no sistema Imunana-Laranjal para 88%, devido à baixa vazão do manancial (formado pelos rios Macacu e Guapiaçu) onde é captada a água que abastece Niterói, São Gonçalo, Itaboraí, a Ilha de Paquetá e as regiões de Inoã e Itaipuaçu, em Maricá. A operação foi normalizada no último dia 29. Mas a companhia ressalta que, “no caso de nova estiagem, pode ser preciso reduzir novamente a produção”.

Em Maricá — uma das cidades em que a população mais cresceu no estado nos últimos anos, chegando a 167,6 mil pessoas, segundo estimativas do IBGE —, nos bairros que dependem das águas do Rio Ubatiba, dentre os quais o Centro, os moradores contam que é recorrente passar dias com as torneiras secas. A bióloga Daniele recorre a carros-pipa para conseguir a água que usa para cozinhar e beber. No quintal, a família tem um poço artesiano. .

— A Cedae alega sempre que não choveu o suficiente. Mas num período como este, quase sem chuva alguma, por quanto tempo vou ficar sem água encanada? — questiona ela, que mora a poucos metros do Rio Ubatiba.

Perto dali, num quintal onde há nove casas, em apenas uma foi mantido o fornecimento da Cedae. No restante, conta a servidora Ni Araújo, de 56 anos, os moradores resolveram desligar a conexão, porque não valia a pena pagar a conta para ter água só esporadicamente. Preferiram, todos, ficar com os poços artesianos.

Em Barra de Maricá, o ex-pescador Tellis da Costa, de 83 anos, é dos que nem têm em casa o fornecimento da Cedae — e depende de poço artesiano. Ele usa baldes, galões de plástico e garrafas PET para armazenar a água.

— Não tenho mais firmeza nas pernas. Então, às vezes, eu me sento na cadeira e, com a muleta, empurro o balde pesado com água, da varanda até a cozinha — conta o idoso, que se preocupa também com a qualidade do que é retirado do poço. — Para beber, compro galão de água, que custa R$ 8 cada, valor que pesa bastante no meu orçamento.

Sobre a atual estiagem, a Cedae diz que está atuando para minimizar os efeitos no município, “realizando manobras operacionais e disponibilizando carros-pipa para abastecer de forma alternativa os imóveis da região”. Segundo a companhia, moradores podem solicitar o serviço pelo número 0800-282-1195.

Já em Nova Friburgo, foi aplicada uma espécie de racionamento para moradores de bairros como Olaria, Cascatinha, Cônego e Vargem Grande. Nessas regiões, ao longo do mês de setembro, algumas ruas vão ter fornecimento em dias ímpares, outras, em dias pares. É que a empresa Águas de Nova Friburgo precisou acionar seu Plano de Abastecimento Periódico, que visa equilibrar a distribuição nas regiões atendidas pelo Sistema Caledônia. Na região do Campo do Coelho, também afetada, a concessionária diz, em nota, que a “distribuição está sendo realizada por meio de caminhões-pipa”.

Revezamento na serra

Petrópolis também está às voltas com a escassez d'água. A concessionária Águas do Imperador afirma que o nível dos mananciais mantém uma queda de 23% em relação ao normal. No fim de agosto, chegaram a ser necessárias manobras nas quais ocorria o fechamento temporário da água para partes baixas da cidade, com intuito de propiciar volume e pressão suficiente nas redes para o abastecimento das partes altas. “No momento, o abastecimento está regular”, diz a empresa.

Para todo o estado, André Luís de Paula Marques, diretor-presidente da Associação Pró-Gestão das Águas da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (Agevap), que funciona como secretaria executiva do Ceivap, destaca que o aprendizado e as iniciativas tomadas após a crise hídrica de 2014 e 2015 têm ajudado o Rio a atravessar a atual falta de chuvas com menos percalços. Ele cita a expertise adquirida nas operações para esvaziamento e enchimento dos reservatórios.

— A gente aprendeu apanhando. E temos conseguido amenizar o problema para não deixar que o pior aconteça — diz ele, afirmando que espera-se chegar o final do período de seca com as condições dos reservatórios do Paraíba do Sul sob controle. — Temos uma estimativa de chegarmos no momento da chuva, na segunda quinzena de outubro ou primeira de novembro, com 8% a 10% dos reservatórios equivalentes.

Num curto prazo, esta semana o avanço de uma frente fria deve aumentar as condições de chuva no Sudeste e Centro-Oeste do país. No entanto, hoje a temperatura máxima pode chegar aos 38 graus, e a umidade máxima não deve passar dos 44%.

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