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Brasil discute protagonismo do judiciário com avanço da Lava Jato

Para especialistas, juristas têm um protagonismo político inegável e conseguem, mais do que ninguém, pautar a agenda política

Procurador da República Deltan Dallagnol: "Não vejo um partido da justiça" (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Procurador da República Deltan Dallagnol: "Não vejo um partido da justiça" (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

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AFP

Publicado em 28 de maio de 2017 às 10h24.

Os promotores e juízes da Operação Lava Jato estão limpando as fossas do poder no Brasil com métodos que se mostram eficazes - grampos, prisões preventivas, delações premiadas -, mas que geram suspeitas de que almejam transformar o judiciário em senhor absoluto do país.

O avanço das investigações sobre o esquema de propinas na Petrobras, colocou nas cordas o presidente Michel Temer (PMDB/SP) e, no outro espectro do campo político, ameaça o ex-presidente petista Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) com a prisão.

Além disso, os principais ministros de Temer e dezenas de parlamentares também estão sob investigação. E o juiz federal de primeira instância Sérgio Moro não hesita em proferir sentenças duras contra políticos e empresários que já tiveram o destino do país nas mãos.

Para Daniel Vargas, professor de direito público da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro, os jovens juristas que, de Curitiba, desmontam as redes criminosas encasteladas no Estado "têm um protagonismo político inegável" e "conseguem pautar a agenda política mais do que ninguém".

Além disso, compartilham "uma visão de país com um inimigo: a política. Na visão deles, a política está infestada com o vírus da corrupção", disse Vargas à AFP.

A força-tarefa da Lava Jato é comandada pelo procurador da República Deltan Dallagnol, que não se limita a comentar processos penais, mas "faz discursos sobre como o Brasil deveria ser", acrescentou.

Dallagnol: política no sentido amplo

Para Dallagnol, o impacto político da Lava Jato se deve a que "a investigação revelou que a corrupção não se restringe a um ou outro partido político, mas está hoje disseminada no próprio sistema".

"Evidentemente, quando se comprova no contexto judicial que relevantes figuras políticas praticaram corrupção, as informações e provas podem ser apropriadas e usadas em outros cenários e por outros atores, inclusive políticos, mas isso escapa do contexto da atuação dos agentes da Polícia, Ministério Público e Judiciário", explicou Dallagnol em e-mail enviado à AFP.

O cientista político André Singer, que foi assessor de comunicação internacional no primeiro mandato de Lula, refere-se aos juízes e procuradores de Curitiba como o "partido da justiça", uma expressão refutada pelos principais interessados.

"Não vejo um 'partido da justiça'", afirma Dallagnol. Para ele, percebem-se esforços de entidades civis, cidadãos, órgãos e agentes públicos contra a corrupção.

"O Ministério Público Federal foi uma das instituições que oficialmente apoiou esse processo (...) Isso se trata de uma atividade institucional e cívica, que pode ser interpretada como política apenas no amplo sentido (...), mas não no sentido de 'política partidária'", acrescenta o procurador.

Moro, um ícone para grande parte da população, nega qualquer ambição política. Mas mesmo assim seria um dos únicos brasileiros capazes de derrotar Lula se disputasse com ele um segundo turno eleitoral, segundo pesquisa Datafolha de 30 de abril.

Tradição de impunidade

Silvana Batini, procuradora regional da República no Rio de Janeiro, acredita que os procuradores, o juiz Moro e o Supremo Tribunal Federal (STF, instância encarregada de julgar os casos de políticos com foro privilegiado) têm feito simplesmente o que se esperava da Justiça há muito tempo.

O Brasil tinha "uma tradição de impunidade para o crime de colarinho branco"; mas desde o início da Lava Jato, "pela primeira vez na história do Brasil temos rompido com a barreira que blindava uma classe toda", explica Batini à AFP.

Duas das principais ferramentas da ofensiva judicial - e as mais criticadas - são as prisões preventivas e as delações premiadas, que permitiram encurralar tanto Lula quanto Temer.

Temer teve a conversa gravada por um dos donos da gigante da proteína animal, JBS, Joesley Batista, que contou ao presidente, aparentemente sem lhe provocar qualquer reação, sobre as propinas que pagava para se manter a salvo da Lava Jato.

No ano passado, um grupo de mais de cem advogados publicou um manifesto comparando a 'Lava Jato' a uma "inquisição ou neoinquisição", sustentando que a investigação já tem destaque na história do Brasil "no plano do desrespeito a direitos e garantias fundamentais dos acusados".

Batini afirma, ao contrário, que os procedimentos usados se inscrevem dentro da Constituição, embora tenham "certos aspectos difíceis de aceitar", e que o STF atua como "garantidor" de que o país não se afaste desta via.

Panorama indefinido para 2018

Enquanto isso, os eleitores brasileiros se perguntam quem vai sobreviver e quem vai se beneficiar politicamente da tsunami provocada pela Lava Jato.

Personagens com discursos anti-establishment ganham popularidade, como o deputado federal de ultradireita Jair Bolsonaro (PSC/RJ) ou o empresário João Doria (PSDB/SP), que em outubro foi eleito prefeito de São Paulo com um discurso de bom gestor.

"Todos estamos apreensivos pelo que vai acontecer", admite Batini. "Mas o Brasil já tem instituições muito fortes. Não existem hoje aventuras buscando soluções fora da Constituição, fora da institucionalidade", tranquiliza-se a procuradora.

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