Tecnologia

Tábua da salvação?

O iPad, novo aparelho da Apple, quer mudar as regras do nascente mercado de livros eletrônicos - e transformar mais uma vez o que entendemos por computador

iPad: uma central multimídia pessoal para vídeos, fotos, livros e músicas

iPad: uma central multimídia pessoal para vídeos, fotos, livros e músicas

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h10.

Na última quarta-feira de janeiro, enquanto jornalistas e consumidores aguardavam ansiosamente Steve Jobs subir ao palco em São Francisco para mais uma apresentação da Apple, outro evento sobre tecnologia acontecia na Costa Leste americana. Quase sem nenhum holofote, editoras, autores, distribuidores de livros e empresas de internet discutiam em Nova York o assunto que atualmente é o calcanhar de aquiles do mercado editorial: o avanço das publicações digitais. À primeira vista os eventos pareciam não ter nenhuma relação, mas eles estavam mais próximos do que se imaginava. A Apple anunciou o iPad, um computador sem teclado e sem mouse que funciona com o deslizar dos dedos, como um grande iPhone. Para os consumidores, o iPad é mais um eletrônico de consumo charmoso da Apple. Já para o mundo editorial significou muito mais. Muitas questões sobre o futuro da indústria foram respondidas na conferência com a chegada do iPad - e muitas outras dúvidas surgiram. Uma das principais novidades do iPad, como se sabe, é a função de livro eletrônico. Assim como seu principal concorrente, o Kindle, da varejista Amazon, o iPad pode não ser o aparelho milagroso para resolver todos os problemas das editoras. Mas a novidade deve impulsionar uma mudança de rumo que o setor sabia há anos ser um desdobramento inevitável.

O iPad, é claro, faz muito mais que mostrar livros em versão digital. Na apresentação, Jobs o descreveu como uma nova categoria de computadores, que se situa entre os smartphones e os laptops. Dotado de uma tela de 9,7 polegadas, o iPad exibe fotografias e filmes, toca músicas e tem um navegador de internet. Também serve para trocar e-mails e trabalhar em arquivos de texto e planilhas, usando um teclado virtual. O iPad também vai aceitar todos os 140 000 programas criados por desenvolvedores independentes para o iPhone e o iPod Touch, sem contar os que surgirão nos próximos meses. Mas tudo isso, de certa forma, já se faz com um iPhone. É no nascente mercado dos livros eletrônicos que a mais nova criação de Steve Jobs deve ter mais impacto. Com a criação de uma livraria digital, a Apple quer reproduzir com os livros o que fez com a indústria da música: tornar-se o ponto de contato entre os consumidores e as editoras. A Amazon, com seu Kindle, tem a mesma intenção, mas antes mesmo da chegada do iPad às lojas as diferenças de abordagem das duas empresas começaram a ficar claras. A Amazon, até agora, estabelecia o preço máximo de 9,99 dólares para títulos eletrônicos. As editoras, acostumadas a ditar o preço de venda de seus produtos, naturalmente não estavam felizes com a situação. Na iBook Store, o modelo de negócios é diferente: a editora ou o autor podem decidir quanto querem cobrar pelo exemplar. A Apple fica com 30% do valor da venda, e os restantes 70% são das editoras. O anúncio levou uma das maiores editoras americanas, a Mac- Millan, a anunciar um boicote à Amazon. Pressionada, a varejista foi obrigada a rever sua política de preços únicos - e permitiu que a MacMillan aumentasse a tabela de seus títulos eletrônicos.  


Ainda não há previsão para o início das vendas do iPad no Brasil, muito menos quando as editoras daqui poderão vender seus livros na iBook Store (a loja iTunes, lançada há sete anos no exterior, ainda não vende músicas nem filmes para os brasileiros). Mas as empresas que já estavam de olho no Kindle agora também começam a olhar para a alternativa da Apple. "O modelo da Apple é mais interessante, porque dá à editora controle sobre os preços", diz Sérgio Machado, presidente do grupo Record. A Ediouro é uma das mais avançadas no caminho da digitalização. A empresa criou um braço de conteúdo digital, a Singular, para digitalizar seu acervo, de 10 000 livros. Hoje, cerca de 300 títulos já estão em formato eletrônico para ser lidos no PC ou num leitor digital. "A estratégia é que todos os lançamentos daqui para a frente, cerca de 25 a cada mês, sejam feitos simultaneamente em edição impressa, no iPhone e nos livros digitais", diz Newton Neto, diretor da Singular. A Zahar, do Rio de Janeiro, vê nos e-books uma maneira de conter a pirataria, especialmente dos didáticos. A editora renegociou seus contratos para que capítulos dos livros universitários sejam vendidos separadamente na versão eletrônica. A empresa contratou a indiana Aptara para fazer a digitalização dos livros e convertê-los em diversos formatos, como o comum e-pub. "Temos de entregar o livro da forma como o consumidor prefere", diz Mariana Zahar, diretora executiva da empresa.

A AMBIÇÃO DA APPLE VAI ALÉM DA tentativa de moldar o novíssimo negócio de venda de livros eletrônicos. Com o iPad, Jobs quer criar uma nova categoria de computadores não só no formato ou no tamanho - sua intenção é fazê-los desaparecer. Nos dias seguintes ao lançamento, as críticas ecoaram pela internet. As duas principais foram: o iPad só roda um programa por vez e não aceita o Flash, software amplamente usado na web. Muitos consideram fatais essas deficiências, a ponto de determinar o fracasso do aparelho. Outros, porém, enxergam no iPad uma mudança radical no que entendemos por computador. Entre as várias apreciações do iPad - manuseado por pouquíssimas pessoas até agora -, a do blogueiro Steven Frank foi a mais contundente. No velho mundo da computação, escreve Frank, "compramos os computadores por centavos, os enchemos até o tampo com o que queremos e pagamos o preço em instabilidade, baixa performance, vírus e uma dura curva de aprendizado". No novo mundo, representado por aparelhos como o iPad, as máquinas são especializadas. "Lemos e-mail, navegamos na web, jogamos, mas uma coisa de cada vez. (Os novos computadores) não precisam de antivírus, não travam. Há uma certa perda de liberdade. Mas eles são extremamente fáceis de usar e tiram proveito de décadas de pesquisas na interação entre homens e computadores." 


 

Com o iPad, Jobs não quer apenas matar o Kindle, aparelho concebido para a leitura de e-books e alguns sites da web (a Amazon anunciou que ele também aceitará programas simples). Jobs quer criar um aparelho pessoal para consumo de mídia, seja música, livro, jogo ou site da web. Se vai desbancar o Kindle e roubar espaço significativo dos netbooks? Ainda não se sabe. Mas a ambição da Apple é mudar os rumos da indústria - mais uma vez.

Duas visões sobre o iPad

O recém-lançado aparelho da Apple já desperta uma lista vasta de críticas e elogios sobre seu funcionamento. Conheça algumas opiniões

O iPAD SERÁ UM SUCESSO PORQUE...
...aceita todos os cerca de 140 000 aplicativos já criados para o iPhone ...tem uma tela colorida, que responde ao toque dos dedos ...é um centro multimídia pessoal: músicas, vídeos e livros num único aparelho ...tem conexão à internet Wi-Fi e 3G e funciona em qualquer operadora (1) ...terá uma livraria virtual específica, a iBook Store

O iPAD VAI FRACASSAR PORQUE...
....roda apenas um programa por vez e não aceita o programa Flash, muito usado em sites ...a tela iluminada não é confortável para longas leituras ...o sistema operacional é fechado, ou seja, somente funcionam os programas autorizados pela Apple ...não há entrada para cartões de memória ou dispositivos periféricos ...não tem câmera, o que impede conversas em vídeo por Skype, por exemplo

(1) Com rede GSM

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