Maior IPO da década em Xangai reforça ambição chinesa em tecnologia
A estreia da SMIC no mercado de ações de Xangai é mais um passo para ampliar o papel da China na indústria de semicondutores
Filipe Serrano
Publicado em 7 de julho de 2020 às 06h47.
Última atualização em 7 de julho de 2020 às 17h44.
A maior fabricante chinesa de microprocessadores, a SMIC (Semiconductor Manufacturing International Corp.), fez na madrugada desta terça-feira (7) a sua estreia na Bolsa de Valores de Xangai e levantou cerca de 6,55 bilhões de dólares, mais do que duas vezes mais do que o inicialmente previsto por analistas. A oferta de ações deve ser a maior dos últimos dez anos de uma empresa na China, ficando atrás apenas do IPO do Agricultural Bank, em 2010, que levantou 68,5 bilhões de dólares.
A injeção de capital reforça a posição da companhia no mercado de semicondutores. A empresa agora terá mais munição para competir com os grandes fabricantes mundiais, como a americana Intel e a taiwanesa TSMC (Taiwan Semiconductor Manufacturing Company), uma das mais importantes fornecedoras de circuitos integrados do mundo.
A abertura de capital da SMIC em Xangai ocorre em meio a um esforço do governo da China de ampliar o papel do país no mercado de semicondutores, de modo a reduzir a dependência de empresas estrangeiras.
Em maio deste ano, o governo chinês investiu 2,25 bilhões de dólares na SMIC por meio de um fundo estatal, o que causou um salto no capital da companhia, que passou de 3,5 bilhões de dólares para 6,5 bilhões.
No mesmo mês, o governo americano impôs restrições para que fabricantes de processadores vendam dispositivos para a chinesa Huawei, que produz equipamentos de telecomunicações. Qualquer fabricante de chips que opere nos Estados Unidos precisa obter uma autorização especial caso queria fazer negócios com a Huawei, o que afeta todos os fornecedores relevantes do mercado de semicondutores.
A queda de braço entre empresas de tecnologia e o governo chinês ganhou novo capítulo hoje, quando o aplicativo TikTok afirmou que deixará de operar em Hong Kong após Pequim impor uma nova lei de segurança à ilha.
A oferta de ações da SMIC ocorre em um momento em que Pequim quer reforçar o mercado de capitais do país. Ontem, um editorial publicado num jornal financeiro estatal afirmou que a China precisa de um mercado de ações em alta saudável para o desenvolvimento do país, o que fez as ações dispararem. Pequim também tem incentivado a abertura de capital de empresas de tecnologia do país.
A oferta da SMIC será feita na bolsa de tecnologia STAR, uma divisão da Bolsa de Xangai criada anos atrás nos moldes da americana Nasdaq. Parte das ações da SMIC já era negociada na Bolsa de Hong Kong.
O aporte visa também compensar um atraso tecnológico da SMIC em relação às concorrentes. A empresa chinesa ainda produz processadores com processo de litografia de 14 nanômetros (unidade de medida similar à espessura de um fio de cabelo humano), enquanto as rivais já utilizam um processo de 5 nanômetros. Quanto menor for a distância entre os transistores de um processador, mais veloz e eficiente ele é.
A SMIC deve herdar contratos da Huawei que foram inviabilizados depois que o presidente dos Estados Unidos Donald Trump aplicou a sanção que impediu todas as fabricantes de chips que usam tecnologia americana de fornecer componentes à empresa chinesa.
A Huawei ainda pode receber chips eletrônicos da taiwanesa TSMC por mais dois meses. Esse é, portanto, o prazo que a SMIC terá para alcançar a concorrência e sustentar as operações da Huawei no mercado global de telecomunicações e de celulares – inclusive na América Latina.