Tecnologia

Efeitos optomecânicos podem revolucionar telecomunicações

Pesquisadores da Unicamp realizam experimentos com microcavidades ópticas para tentar manipular efeitos físicos não lineares

Luz: campo elétrico da luz incidente cria uma espécie de onda acústica que se propaga no material e espalha a luz (Getty Images)

Luz: campo elétrico da luz incidente cria uma espécie de onda acústica que se propaga no material e espalha a luz (Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 22 de outubro de 2014 às 10h24.

Munique – No campo das telecomunicações por fibra óptica, um dos fatores que limitam a quantidade de informações possíveis de serem transmitidas por um determinado canal é um efeito físico não linear conhecido como espalhamento Brillouin.

O fenômeno ocorre à medida que se aumenta a potência luminosa. O campo elétrico da luz incidente cria uma espécie de onda acústica que se propaga no material e espalha a luz. Esse efeito é especialmente danoso em links de comunicação de longa distância (aproximadamente 20 quilômetros), onde alguns miliwatts (mW) de potência são suficientes para que os fótons comecem a retornar à fonte emissora em vez de seguirem até o receptor.

Por meio de experimentos realizados com apoio da FAPESP no Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), um grupo formado pelos pesquisadores Thiago Alegre e Gustavo Wiederhecker tenta compreender como exatamente ocorre esse e outros efeitos optomecânicos, resultantes da interação da luz com movimentos mecânicos, em microcavidades ópticas com o objetivo de, no futuro, conseguir manipulá-los.

O tema foi abordado por Alegre na quinta-feira (16/10), na Alemanha, durante a programação da FAPESP Week Munich.

“Entre as implicações práticas dos sistemas optomecânicos estão a criação de diminutos dispositivos como moduladores de luz, chaves, memórias ópticas e lasers Brillouin, que podem ser usados em sistemas de telecomunicação de forma integrada. Seria uma revolução comparável à que ocorreu na eletrônica ao longo das últimas décadas. Com a redução dos transistores, que são os dispositivos básicos, foi possível aumentar e agregar funcionalidades em um mesmo chip”, afirmou Alegre em entrevista à Agência FAPESP.

O grupo da Unicamp, que também conta com o pesquisador Newton Frateschi, tem se dedicado a estudar esses efeitos optomecânicos, como o espalhamento Brillouin, em microcavidades feitas com discos de silício de aproximadamente 10 mícrons (μ) de diâmetro – o equivalente a um décimo da espessura de um fio de cabelo. Os discos são suportados por um pedestal de apenas 1 μ de diâmetro.

“Nós desenhamos e fabricamos cavidades ópticas nas quais fosse possível observar o espalhamento Brillouin para frequências entre 10 e 20 gigahertz, valores próximos da frequência de modulação em sistemas de telecomunicação. As cavidades ópticas se assemelham a um frisbee. Nós acoplamos a luz nesse sistema com a ajuda de uma fibra óptica de aproximadamente 2 µm de diâmetro e, graças à reflexão que a luz sofre na borda, ela dá centenas de voltas no disco durante alguns nanossegundos até se dissipar. Isso cria os chamados modos de galeria de sussurros (whispering gallery mode). Graças a esse efeito, a luz fica um tempo muito maior na cavidade, interage mais vezes com a matéria e os efeitos optomecânicos são aumentados”, contou o pesquisador.

Na avaliação de Alegre, o espalhamento Brillouin é um efeito optomecânico particularmente interessante porque permite gerar cópias do laser e mudar sua cor. "Você incide a luz em uma determinada frequência e ela é espalhada em uma frequência adjacente (uma cor próxima no espectro luminoso). É possível mudar a cor do laser com uma cavidade passiva e transparente, apenas pela interação do movimento mecânico com a luz”, contou Alegre.

Ao colocar uma cavidade ao lado da outra, explicou o pesquisador, é possível intensificar ou diminuir o efeito de espalhamento. Isso acontece porque a luz incidente e a luz espalhada estarão ambas em modos de galeria de sussurros, aumentando ainda mais o seu tempo de permanência no sistema e, portanto, a interação optomecânica.

O objetivo final, acrescentou o pesquisador, é poder escolher a priori qual será a frequência em que ocorrerá o espalhamento. “Em fibras ópticas esta frequência é praticamente fixa e depende apenas do material (vidro, no caso da fibra óptica). A ideia é que, tendo como base o design da cavidade, já se saiba ou se possa determinar qual será a frequência resultante”, explicou Alegre.

Aplicações

A telecomunicação óptica é feita atualmente por um sistema conhecido como multiplexação por divisão de comprimento de onda (do inglês Wavelength-division Multiplex, ou WDM). O protocolo permite que em uma rede se utilizem sinais ópticos com diferentes frequências, diretamente relacionadas com o comprimento de onda, no mesmo canal físico.

"Quando simultaneamente ocorrem nesses sistemas diferentes conversas, ou troca de informação, cada uma é transmitida em uma frequência (cor) distinta. Mas há momentos em que as centrais de telecomunicações precisam trocar a frequência de uma das conversas porque, em um determinado pedaço do canal físico, aquela frequência já está ocupada”, afirmou Alegre.

Para fazer a troca da frequência atualmente, é preciso transformar o pulso óptico em informação elétrica e gerar novamente um pulso óptico em outra frequência. Os efeitos optomecânicos, como o espalhamento Brillouin, se bem controlados, permitiriam tornar esse sistema totalmente óptico. Dessa forma, seria possível reduzir o tamanho e o consumo dos roteadores e de dispositivos que fazem a troca de comprimento de onda.

O controle do espalhamento Brillouin, segundo o pesquisador, possibilitaria também avanços importantes sob o ponto de vista da física fundamental.

Poderia ser usado, por exemplo, para resfriar modos mecânicos (o que não tem a ver com temperatura e sim com a redução da vibração de determinados movimentos mecânicos de um objeto) até o seu estado de mais baixa energia possível – a chamada energia de ponto zero –, no qual eles se comportam de acordo com as leis da mecânica quântica.

“Isso permitiria estudar o que acontece com o movimento mecânico quando você resfria até perto de zero grau na escala Kelvin. Nessa situação as cavidades praticamente param de vibrar e se comportam como um sistema quântico. Isso traz novos efeitos, que vão além do que vemos na física clássica”, afirmou o pesquisador.

No mesmo painel dedicado à Nanotecnologia e Fotônica, o pesquisador Sven Höfling, da Escola de Física e Astronomia da University of St. Andrews, no Reino Unido, apresentou dados de um estudo para desenvolver um novo tipo de laser formado por éxcitons (estado da matéria no qual uma partícula positiva e negativa se combinam).

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