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Aumentam as doenças crônicas entre indígenas do Xingu

Antes raras ou inexistentes, elas agora apresentam índices preocupantes entre o povo Khisêdjê, indica estudo feito na Unifesp

Indígena no Xingu: análise dos resultados mostrou uma prevalência de hipertensão arterial de 10,3% em ambos os sexos (Getty Images)
DR

Da Redação

Publicado em 14 de outubro de 2013 às 09h37.

São Paulo – Malária , infecções respiratórias e diarreias eram as principais causas de morte no Parque Indígena do Xingu (PIX), no Mato Grosso, em 1965 – época em que a Escola Paulista de Medicina (EPM), atualmente parte da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), passou a responder pela saúde dos povos indígenas que lá vivem.

Hoje, a malária está sob controle e, embora as doenças infecciosas e parasitárias ainda sejam relevantes em termos de mortalidade, são os males crônicos não transmissíveis, como hipertensão, intolerância à glicose e dislipidemia (aumento anormal da taxa de lipídios no sangue), que estão em crescimento.

Conhecendo esse panorama, pesquisadores da EPM/Unifesp examinaram e entrevistaram 179 índios Khisêdjê, moradores da área central do parque do Xingu, no Mato Grosso, entre 2010 e 2011.

A análise dos resultados mostrou uma prevalência de hipertensão arterial de 10,3% em ambos os sexos, sendo que 18,7% das mulheres e 53% dos homens apresentaram níveis de pressão arterial considerados preocupantes.

“Para valores de pressão arterial iguais ou maiores a 140/90 mmHg como indicativos da presença de hipertensão arterial, pesquisas encontraram prevalências entre 22,3% e 43,9% na população geral do Brasil”, disse Suely Godoy Agostinho Gimeno, coordenadora do estudo com os Khisêdjê e pesquisadora do Departamento de Medicina Preventiva da EPM/Unifesp e do Instituto de Saúde da Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo.

O estudo com os Khisêdjê foi realizado com apoio da FAPESP e do Projeto Xingu, iniciativa da Unidade de Saúde e Ambiente do Departamento de Medicina Preventiva da EPM/Unifesp.

Os Khisêdjê ainda não estão tão hipertensos como os demais brasileiros, mas o cenário é delicado, uma vez que tal condição era inexistente ou rara nas aldeias brasileiras até décadas atrás.


Já a intolerância à glicose foi identificada em 30,5% das mulheres (6,9% do total com diabetes mellitus) e em 17% dos homens (2% do total com diabetes mellitus). E a dislipidemia (aumento anormal da taxa de lipídios no sangue) apareceu em 84,4% dos participantes dos dois sexos.

“Examinamos os Khisêdjê anteriormente, entre 1999 e 2000. Comparando os dados daquela época com os mais recentes, percebemos um aumento significativo de todas essas doenças crônicas não transmissíveis. Outras pesquisas revelam que o mesmo aumento se aplica aos demais povos indígenas do Xingu e de outras áreas do país”, disse Gimeno.

De acordo com a pesquisadora, entre os fatores que vêm transformando o panorama entre os índios estão maior proximidade com os centros urbanos e intensificação do contato com a sociedade não indígena, com a incorporação de novos hábitos e costumes; aumento do número de indivíduos que exercem atividade profissional remunerada, abandonando práticas de subsistência tradicionais como agricultura, caça e pesca; e maior acesso a produtos e bens de consumo, como alimentos industrializados, eletroeletrônicos e motor de barcos (o que dispensa a necessidade de remar).

Os resultados foram informados aos Khisêdjê, individualmente e em grupo, e a equipe de saúde da Unifesp acompanha os casos que precisam de amparo médico.

Ainda assim, o quadro preocupa os pesquisadores, uma vez que o controle das doenças requer condições nem sempre disponíveis nas aldeias, como refrigeração (no caso da insulina), controle da dose e do horário dos medicamentos, controle regular da glicemia e da pressão arterial. Segundo Gimeno, “o estímulo e a garantia da preservação dos hábitos e costumes desses povos seriam medidas preventivas de grande valia”.

Excesso de peso

A coleta de dados para traçar o perfil nutricional e metabólico dos Khisêdjê foi realizada em diferentes períodos de 2010 e 2011, quando os pesquisadores passavam de 15 a 20 dias na aldeia principal desse povo, chamada Ngojwere.


As informações levantadas incluíram perímetros de braços, cintura e quadril; peso; altura; composição corporal (água, massa magra e massa gordurosa); pressão arterial; perfil bioquímico (por exames como o de glicemia); aptidão física; condição socioeconômica; consumo de alimentos e práticas agrícolas.

Outro resultado obtido por meio dessa análise foi a prevalência de excesso de peso (de sobrepeso ou de obesidade): 36% entre as mulheres e 56,8% entre os homens.

“Contudo, observamos que, particularmente entre os homens, tal prevalência se deve a uma maior quantidade de massa muscular e não de tecido gorduroso. Esse dado sugere que, para a população em questão, os critérios de identificação do excesso de peso não são adequados, uma vez que os indivíduos são musculosos, não obesos”, disse Gimeno.

A conclusão, de acordo com a pesquisadora, é corroborada pelos testes de aptidão física. “A maioria dos valores revela força muscular nos membros inferiores, resistência muscular nos membros superiores e no abdômen, flexibilidade e capacidade cardiorrespiratória. Comparados aos não indígenas, os Khisêdjê têm perfil ativo ou muito ativo, contrariando a ideia de que um possível sedentarismo estaria associado às doenças investigadas”, disse.

Uma hipótese (não comprovada empiricamente) que poderia explicar a controvérsia é a de que, no passado, esses índios teriam sido ainda muito mais ativos do que na atualidade. E a possível redução na atividade física habitual teria, então, relação com os males crônicos.

Equipe e repercussão

Três médicos, quatro enfermeiras, cinco nutricionistas, dois educadores físicos, um sociólogo e quatro graduandos (dos cursos de Medicina e Enfermagem) participaram da pesquisa via Unifesp.

Completam a equipe uma sexta nutricionista do Instituto de Saúde da Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo, agentes de saúde e professores indígenas que vivem na aldeia Ngojwere e atuaram como intérpretes.

O projeto deu origem a seis apresentações em conferências internacionais e duas em congressos nacionais, três dissertações de mestrado e uma publicação de artigo na revista Cadernos de Saúde Pública. A íntegra do texto pode ser lida aqui.

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São Paulo – Malária , infecções respiratórias e diarreias eram as principais causas de morte no Parque Indígena do Xingu (PIX), no Mato Grosso, em 1965 – época em que a Escola Paulista de Medicina (EPM), atualmente parte da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), passou a responder pela saúde dos povos indígenas que lá vivem.

Hoje, a malária está sob controle e, embora as doenças infecciosas e parasitárias ainda sejam relevantes em termos de mortalidade, são os males crônicos não transmissíveis, como hipertensão, intolerância à glicose e dislipidemia (aumento anormal da taxa de lipídios no sangue), que estão em crescimento.

Conhecendo esse panorama, pesquisadores da EPM/Unifesp examinaram e entrevistaram 179 índios Khisêdjê, moradores da área central do parque do Xingu, no Mato Grosso, entre 2010 e 2011.

A análise dos resultados mostrou uma prevalência de hipertensão arterial de 10,3% em ambos os sexos, sendo que 18,7% das mulheres e 53% dos homens apresentaram níveis de pressão arterial considerados preocupantes.

“Para valores de pressão arterial iguais ou maiores a 140/90 mmHg como indicativos da presença de hipertensão arterial, pesquisas encontraram prevalências entre 22,3% e 43,9% na população geral do Brasil”, disse Suely Godoy Agostinho Gimeno, coordenadora do estudo com os Khisêdjê e pesquisadora do Departamento de Medicina Preventiva da EPM/Unifesp e do Instituto de Saúde da Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo.

O estudo com os Khisêdjê foi realizado com apoio da FAPESP e do Projeto Xingu, iniciativa da Unidade de Saúde e Ambiente do Departamento de Medicina Preventiva da EPM/Unifesp.

Os Khisêdjê ainda não estão tão hipertensos como os demais brasileiros, mas o cenário é delicado, uma vez que tal condição era inexistente ou rara nas aldeias brasileiras até décadas atrás.


Já a intolerância à glicose foi identificada em 30,5% das mulheres (6,9% do total com diabetes mellitus) e em 17% dos homens (2% do total com diabetes mellitus). E a dislipidemia (aumento anormal da taxa de lipídios no sangue) apareceu em 84,4% dos participantes dos dois sexos.

“Examinamos os Khisêdjê anteriormente, entre 1999 e 2000. Comparando os dados daquela época com os mais recentes, percebemos um aumento significativo de todas essas doenças crônicas não transmissíveis. Outras pesquisas revelam que o mesmo aumento se aplica aos demais povos indígenas do Xingu e de outras áreas do país”, disse Gimeno.

De acordo com a pesquisadora, entre os fatores que vêm transformando o panorama entre os índios estão maior proximidade com os centros urbanos e intensificação do contato com a sociedade não indígena, com a incorporação de novos hábitos e costumes; aumento do número de indivíduos que exercem atividade profissional remunerada, abandonando práticas de subsistência tradicionais como agricultura, caça e pesca; e maior acesso a produtos e bens de consumo, como alimentos industrializados, eletroeletrônicos e motor de barcos (o que dispensa a necessidade de remar).

Os resultados foram informados aos Khisêdjê, individualmente e em grupo, e a equipe de saúde da Unifesp acompanha os casos que precisam de amparo médico.

Ainda assim, o quadro preocupa os pesquisadores, uma vez que o controle das doenças requer condições nem sempre disponíveis nas aldeias, como refrigeração (no caso da insulina), controle da dose e do horário dos medicamentos, controle regular da glicemia e da pressão arterial. Segundo Gimeno, “o estímulo e a garantia da preservação dos hábitos e costumes desses povos seriam medidas preventivas de grande valia”.

Excesso de peso

A coleta de dados para traçar o perfil nutricional e metabólico dos Khisêdjê foi realizada em diferentes períodos de 2010 e 2011, quando os pesquisadores passavam de 15 a 20 dias na aldeia principal desse povo, chamada Ngojwere.


As informações levantadas incluíram perímetros de braços, cintura e quadril; peso; altura; composição corporal (água, massa magra e massa gordurosa); pressão arterial; perfil bioquímico (por exames como o de glicemia); aptidão física; condição socioeconômica; consumo de alimentos e práticas agrícolas.

Outro resultado obtido por meio dessa análise foi a prevalência de excesso de peso (de sobrepeso ou de obesidade): 36% entre as mulheres e 56,8% entre os homens.

“Contudo, observamos que, particularmente entre os homens, tal prevalência se deve a uma maior quantidade de massa muscular e não de tecido gorduroso. Esse dado sugere que, para a população em questão, os critérios de identificação do excesso de peso não são adequados, uma vez que os indivíduos são musculosos, não obesos”, disse Gimeno.

A conclusão, de acordo com a pesquisadora, é corroborada pelos testes de aptidão física. “A maioria dos valores revela força muscular nos membros inferiores, resistência muscular nos membros superiores e no abdômen, flexibilidade e capacidade cardiorrespiratória. Comparados aos não indígenas, os Khisêdjê têm perfil ativo ou muito ativo, contrariando a ideia de que um possível sedentarismo estaria associado às doenças investigadas”, disse.

Uma hipótese (não comprovada empiricamente) que poderia explicar a controvérsia é a de que, no passado, esses índios teriam sido ainda muito mais ativos do que na atualidade. E a possível redução na atividade física habitual teria, então, relação com os males crônicos.

Equipe e repercussão

Três médicos, quatro enfermeiras, cinco nutricionistas, dois educadores físicos, um sociólogo e quatro graduandos (dos cursos de Medicina e Enfermagem) participaram da pesquisa via Unifesp.

Completam a equipe uma sexta nutricionista do Instituto de Saúde da Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo, agentes de saúde e professores indígenas que vivem na aldeia Ngojwere e atuaram como intérpretes.

O projeto deu origem a seis apresentações em conferências internacionais e duas em congressos nacionais, três dissertações de mestrado e uma publicação de artigo na revista Cadernos de Saúde Pública. A íntegra do texto pode ser lida aqui.

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