Tecnologia

Com Meg Whitman, HP quer voltar a crescer

Uma das empresas mais inovadoras do mundo, HP perdeu em um ano quase metade do seu valor de mercado

Companhia foi a primeira a ultrapassar a barreira dos 100 bilhões de dólares de faturamento, em 2007 (Justin Sullivan/Getty Images)

Companhia foi a primeira a ultrapassar a barreira dos 100 bilhões de dólares de faturamento, em 2007 (Justin Sullivan/Getty Images)

DR

Da Redação

Publicado em 13 de dezembro de 2011 às 11h24.

São Paulo - Sinônimo de inovação e precursora da onda high-tech do vale do Silício, a HP foi criada em uma garagem por dois engenheiros recém-formados na Universidade Stanford. William Hewlet e David Packard fundaram a Hewlet-Packard em 1939, com um investimento inicial de 538 dólares.

Da bancada da garagem perto de Palo Alto, na Califórnia, região que anos depois se transformaria no berço do Vale do Silício, saiu o primeiro produto de sucesso da empresa: um oscilador de áudio usado para testes de som. Nos 72 anos que se seguiram, a HP expandiu seu ramo de atuação, comprou diversas empresas, tornou-se líder no mercado de computadores pessoais, investiu em serviços e sistemas corporativos. Tudo isso a transformou numa das gigantes do mundo da tecnologia e, em 2007, foi a primeira a ultrapassar a barreira dos 100 bilhões de dólares de faturamento. Mas esses tempos de glória ficaram no passado. Nos últimos anos, a HP fez aquisições desastrosas, perdeu a mão na gestão e enfrentou uma dança das cadeiras na presidência, por onde passaram três executivos em cerca de dois anos e meio. O resultado pode ser medido em seu valor de mercado. Em meados de outubro, a HP valia cerca de 50 bilhões de dólares, metade do registrado em agosto de 2010.

A mais nova candidata à difícil missão de reverter essa situação é Meg Whitman, 55 anos, alçada ao posto de CEO em 22 de setembro. Ela substitui o alemão Léo Apotheker, demitido após dez meses no cargo. Meg não é uma novata no mundo dos negócios nem uma cara nova na HP. Desde janeiro, ela faz parte do conselho da empresa. Durante dez anos foi presidente do site de comércio eletrônico eBay. Quando assumiu, em 1998, o site tinha apenas 30 funcionários e faturava 4 milhões de dólares. Ao sair, em 2008, deixou 15 mil funcionários e faturamento de 8 bilhões de dólares. Meg tem boas e más experiências com aquisições. Em 2002, comandou a compra do sistema de pagamentos online PayPal, que ajudou o eBay a crescer.

Três anos depois, o eBay adquiriu o Skype, um serviço que não estava diretamente ligado ao seu negócio. Pagou 4,1 bilhões de dólares, mas não conseguiu que ele se integrasse ao eBay. O Skype foi passado para a frente em 2009, por 2,75 bilhões de dólares. Depois do eBay, Meg investiu na carreira política. Em 2010, concorreu ao governo da Califórnia pelo Partido Republicano, para o posto ocupado anteriormente por Arnold Schwarzenegger. Perdeu a disputa e ainda gastou uma boa soma. Investiu 140 milhões de dólares do próprio bolso na campanha – mais de 10% de sua fortuna, avaliada em 1,3 bilhão de dólares. Foi o maior volume de recursos próprios que um candidato já gastou numa eleição americana.


Teste vocacional

Formada em matemática e ciências pela Universidade Princeton, em Nova Jersey, Meg Whitman precisa agora reunir suas habilidades gerenciais para levantar a HP, um barco à deriva em um mar que passa por uma tormenta. Em agosto, Apotheker confirmou que a empresa pretendia separar ou vender sua divisão de PCs, que inclui produtos como desktops, notebooks e netbooks. Anunciou ainda o fim da produção do tablet TouchPad, pouco menos de dois meses após sua chegada às lojas. O mercado reagiu mal e o valor das ações caiu 20%. “Obviamente vou dar um passo atrás e analisar isso profundamente”, disse Meg, pouco depois de assumir.

Prometeu uma decisão sobre a divisão de PCs até o fim de outubro e recebeu um voto de confiança. As ações pararam de cair e até registraram alta de 9%. Até o fechamento desta edição, no entanto, o destino da área ainda não havia sido anunciado.

A pergunta que muitos fazem é: por que a fabricante que mais produz computadores no mundo deixaria esse mercado? Uma das respostas está na rentabilidade e nas margens de operação de cada setor da empresa, que no caso da divisão de PCs foi de 7,8% no ano passado, segundo o balanço da companhia. O custo elevado de produção e distribuição de desktops, notebooks e outros aparelhos torna o negócio menos rentável que outros oferecidos pela HP, como os de serviços e software.

No ano passado, mais de 56 milhões de computadores saíram das linhas de montagem da HP e geraram receita de 41 bilhões de dólares. O valor representa um terço do faturamento de 126 bilhões de dólares e gerou um lucro de 2 bilhões de dólares. Comparado ao volume faturado, esse lucro é baixo e serve como justificativa para os que defendem a separação da área de PCs.

Outra explicação está no mercado de computadores pessoais, que já não demonstra o mesmo fôlego de outros tempos. “A natureza do negócio dos PCs está mudando desde que a Apple mostrou o iPad”, disse recentemente a ex-presidente Carly Fiorina, em entrevista à rede de TV Bloomberg. Em setembro, o instituto de pesquisas IDC cortou a previsão de crescimento do setor e apontou que até 2013 as vendas de computadores ficarão estagnadas abaixo do nível registrado em 2010.


Se sair do mercado de PCs, a HP poderá investir em software e serviços. O mercado de serviços movimentou 1,1 trilhão de dólares em 2010 e tem previsão de crescer 5% ao ano até 2015. À primeira vista, a mudança pode parecer interessante. O problema é que a divisão de software representa apenas 3% do faturamento da HP. Não seria a primeira vez que uma grande empresa de tecnologia seguiria por esse caminho. Em 2005, a IBM vendeu sua divisão de PCs para a chinesa Lenovo e transformou-se numa companhia de serviços. A diferença é que a IBM vendeu seu negócio de PCs quando ele ainda era rentável. “Agora ninguém quer comprar uma empresa de PCs”, disse Roger Kay, presidente da consultoria americana Endpoint Technologies Associates, especializada em negócios de tecnologia.

Além disso, a IBM tinha uma base mais sólida para fazer a transição. “A HP está tentando fazer em alguns anos o que a IBM levou décadas”, diz Rob Enderle, analista do mercado de tecnologia que trabalhou na IBM e na EMS e hoje tem sua própria consultoria, a Enderle Group. “A última empresa de software que tentou crescer rapidamente por meio de aquisições foi a CA Technologies, mas isso não funcionou muito bem. Por outro lado, a HP tem um foco maior no consumidor do que a CA tinha”, afirma.

É difícil apontar ao certo quando os problemas da HP começaram. O primeiro indício de que alguma coisa não ia bem apareceu em 2002, quando a empresa pagou 25 bilhões de dólares pela Compaq. Naquela época, o mercado de PCs já dava sinais de desaquecimento. Três anos depois, a HP pagou 13,9 bilhões de dólares pela fornecedora de serviços EDS. “Com a compra da EDS, a HP mostrou de forma clara seu apetite para liderar o mercado global de serviços de tecnologia. Mas é um grande desafio para uma empresa de tecnologia ser bem-sucedida no segmento de consumer (consumidores finais) e no corporativo”, afirma Fernando Belfort, analista sênior da consultoria Frost & Sullivan. “A Apple tem dominado o segmento de consumer, enquanto marcas como Oracle e IBM lideram o mundo corporativo.”

Em 2009, a HP abriu de novo os cofres e comprou a 3Com por 2,7 bilhões de dólares, e no ano passado foi a vez da agonizante Palm, por 1,2 bilhão de dólares. A última aquisição se deu em outubro, quando levou a Autonomy, multinacional de software inglesa, por 11,7 bilhões de dólares. “A compra da Autonomy foi um erro ainda maior que o da Palm, porque ela custou muito mais. Mas enquanto a Palm é praticamente uma perda total, a Autonomy pelo menos contribui com um faturamento substancial”, diz Paul Kedrosky, investidor e analista de mercado de tecnologia nos Estados Unidos. Desde 2006, foram mais de 100 aquisições.


Além das compras bilionárias, a empresa lançou produtos que não deram certo. Empolgada com a aquisição da Palm, a HP apostou no mercado de smartphones e anunciou dois modelos nos Estados Unidos: o Veer e o iPAQ Glisten. Mas eles não agradaram. Hoje a HP tem apenas 2% do mercado americano de telefones inteligentes.

A experiência ruim não evitou que a companhia entrasse em outro mercado, o de tablets. Em fevereiro deste ano, a HP lançou o TouchPad, uma tentativa atrasada de fazer frente ao iPad, da Apple, e aos concorrentes que usam o sistema operacional Android, do Google. O tablet da HP roda o WebOS, o sistema que a HP herdou da Palm. Mas o TouchPad quase não teve tempo de esquentar as prateleiras. Entre a chegada ao mercado, no início de julho, e a data declarada de sua aposentadoria, em 18 de agosto, foram apenas sete semanas.

Analistas da consultoria inglesa Canalys afirmaram que o preço inicial do produto, de 500 dólares, era alto demais Como as vendas não foram bem, a HP concluiu prematuramente que os tablets fracassaram. Assim que a empresa anunciou o fim da produção do gadget e reduziu o preço em 100 dólares, as vendas estouraram. “O TouchPad conseguiu mais interesse que qualquer outro produto da HP em mais de dez anos”, diz um trecho do relatório da Canalys. Numa demonstração clara de falta de estratégia, a HP anunciou que retomará a produção de tablets, mas vai trocar o WebOS pelo Windows 8.

Volta às raízes

Para tentar arrumar a casa, Meg Whitman terá de encarar alguns desafios complicados. O primeiro é apagar a péssima imagem deixada pelos últimos presidentes da empresa, que se envolveram de escândalos sexuais a vazamento de informações confidenciais. Mais importante, Meg precisa resgatar o espírito de inovação que surgiu na garagem e durante muitos anos serviu de norte para a HP. É o mesmo que deu origem, entre outras coisas, a impressoras coloridas e reuniu em um só aparelho as funções de impressão, cópia e digitalização, com os multifuncionais.

Para isso, Meg vai precisar usar toda a retórica que desenvolveu nos meses de campanha política para convencer investidores, analistas, funcionários e, principalmente, consumidores de que a HP é uma companhia madura, que superou sua tormenta. Uma de suas primeiras medidas mostra a confiança de Meg de que fará a diferença: fixou seu salário anual em 1 dólar, como fazia Steve Jobs na Apple. Seus vencimentos dependem da valorização das ações da HP, que, por sua vez, refletirão os bons resultados alcançados pela empresa.

Acompanhe tudo sobre:EmpresasEmpresas americanasempresas-de-tecnologiaHPMeg WhitmanMulheres executivasServiços

Mais de Tecnologia

Samsung Galaxy A05s vale a pena? Veja preço, detalhes e ficha técnica

Xiaomi Poco F6 Pro vale a pena? Veja detalhes e ficha técnica

Xiaomi Poco F6 vale a pena? Veja detalhes e ficha técnica

Xiaomi 13 Lite vale a pena? Veja preço, detalhes e ficha técnica

Mais na Exame