Visitantes no museu paulista: reforma ampla, sala de concerto e instalação de um hotel butique a partir de 2021 (Daniel Noronha/Exame)
Da Redação
Publicado em 30 de janeiro de 2020 às 05h22.
Última atualização em 30 de janeiro de 2020 às 12h49.
Tirando uma marca ou outra, que denunciam a passagem do tempo, os traços são os mesmos. A polidez e o ar de bom moço também continuam. Mas ficam por aí as semelhanças, físicas ou não, entre o Marcos Amaro de dez anos atrás, controlador da rede Óticas Carol, e o atual, aos 35 anos, artista plástico, colecionador e galerista. A empreitada mais comentada deste último é a Fábrica de Arte Marcos Amaro, iniciativa que, pela magnitude, ousadia e relevância, ganhou o apelido de Inhotim paulista.
O paulistano é o caçula de Rolim Amaro (1942-2001), empresário que fundou e transformou a TAM na maior companhia aérea do país. Marcos passou a se apresentar como artista em 2013, quando vendeu ao fundo inglês 3i seus 95% da rede Óticas Carol, cujo controle havia começado a adquirir cinco anos antes. “Até hoje não sei quem é a Carol”, diz. Também se desfez da loja OpArt, focada em vender óculos escuros. Da gestora de investimentos V2 e da companhia de desenvolvimento imobiliário Logbras ele continua sócio.
Marcos aterrissou nas artes plásticas como um Boeing sem freios. Como artista, debutou na SP-Arte em 2016 — ele se dedica principalmente a esculturas feitas de peças retiradas de antigos aviões. No ano seguinte, comprou a galeria Emma Thomas, em São Paulo, rebatizada de Kogan Amaro, para reforçar a participação da mulher dele, a pianista russa Ksenia Kogan. “Só conhecia esse mercado como colecionador e cometi uma série de erros”, afirma.
“O primeiro, clássico, foi convidar os artistas de que mais gosto. Mas é um business.” Outro tropeço foi apostar inicialmente tanto no mercado primário, que envolve obras de arte recém-saídas dos ateliês, quanto no secundário, de obras já revendidas. “Não sabia a diferença entre um e outro”, diz Amaro. Para evitar novos equívocos, contratou Ricardo Resende, curador do Museu Bispo do Rosário, do Rio de Janeiro, como diretor artístico da galeria, entre outros especialistas. Com filial em Zurique, a Kogan Amaro representa 26 artistas, entre os quais Estela Sokol e Emanoel Araújo.
Com a Fábrica de Arte Marcos Amaro, é provável que ele passe a ser tão venerado quanto era Bernardo Paz — pelo menos até o fundador de Inhotim ser acusado de lavagem de dinheiro e se afastar do museu mineiro. Para montar o seu, Amaro adquiriu uma antiga fábrica têxtil de 25 mil metros quadrados em Itu, no interior paulista, que vem sendo repaginada pelo escritório de arquitetura holandês Kaan. “A reforma vai recuperar todas as fachadas e os telhados, que são tombados, e transformar as áreas internas em espaços expositivos, preservando a identidade da fábrica”, diz Raquel Fayad, que acumula a direção do museu e a Fundação Marcos Amaro, criada para administrar o acervo.
O acervo do museu é composto de cerca de 1.600 itens de artistas como Nuno Ramos, Tunga e Adriana Varejão. Concluída em setembro de 2019, a etapa inicial das obras só deu conta de um quinto do complexo, hoje com capacidade para exibir apenas 15% da coleção. A escultura Nossa Senhora das Dores, de Aleijadinho, a tapeçaria Femme, de Louise Bourgeois, e a grandiosa instalação Vers La Voie Humide II, de Tunga, são algumas das obras em exibição. Espaços a céu aberto acomodam peças monumentais, como a escultura de Carmela Gross que forma as palavras “Se vende”.
“Não convidamos artistas para criar projetos com nosso espaço em mente, como fez Inhotim”, diz Amaro. “O desafio é achar a área que melhor combina com cada obra do acervo.” A comparação com Inhotim demanda outras ressalvas. O museu mineiro dispõe de um monumental projeto paisagístico formado por 4.200 espécies e 23 galerias enormes, 19 delas com exposições permanentes e obras em geral de grande escala (veja a comparação no quadro acima).
Com a compra da fábrica e as reformas iniciais, Amaro desembolsou 30 milhões de reais. O valor gasto com o acervo não é divulgado. O orçamento anual vai sair do próprio bolso. Há um restaurante de comida brasileira e, para quem não abre mão de visitas guiadas, monitores de prontidão. A entrada é gratuita. Um projeto paisagístico está em estudo e a reforma das demais galerias deve acabar em 2022.
Para o ano seguinte, está prevista a conclusão de uma sala de concerto, sede de um futuro festival de música clássica. A novidade para 2021 é a abertura de um hotel butique com seis quartos nos fundos do terreno, projetado pelo arquiteto Rodrigo Ohtake. Coincidência ou não, a inauguração do hotel dentro de Inhotim, operado pela rede Txai, está prometida para o mesmo ano.