Revista Exame

Quem é você na internet?

As empresas vasculham a internet para obter informações sobre candidatos a uma vaga — e novos serviços prometem varrer a sujeira para debaixo do tapete

Michael Fertik, da Reputation.com: limpeza da reputação de marcas e indivíduos na rede (Heidi Schumann/Latinstock)

Michael Fertik, da Reputation.com: limpeza da reputação de marcas e indivíduos na rede (Heidi Schumann/Latinstock)

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Da Redação

Publicado em 20 de maio de 2011 às 06h00.

Em uma tarde de abril de 2008, a atriz e modelo paulista Michele Vignardi fez o que muitos internautas costumam fazer em frente ao computador: entrou no ­Google e digitou, letra por letra, o próprio nome. Tomou um susto. Naquele dia, o que viu não foram referências elogiosas a seus trabalhos. “Você quis dizer Michelli Vignardi?”, retornou o buscador.

Apesar de sutil, a diferença na grafia dos nomes levou a resultados inesperados. Naquele mês, sua quase homônima Michelli Vignardi, uma prostituta de luxo americana, havia ganhado notoriedade com a publicação de uma matéria no jornal escocês DailyRecord.

O veículo associava o nome de Michelli a orgias com o empresário Irvine Laidlaw, um dos homens mais ricos da Escócia, também conhecido por manter uma relação próxima com David Cameron, na época candidato a premiê britânico.

Para o Google, uma pesquisa pela americana parecia mais natural do que uma pelo nome de Michele — e a reputação da brasileira, que nada tinha a ver com a história, ficou por um fio.

Sua primeira medida foi pedir ao jornal que a notícia fosse retirada do site. Sem obter sucesso, ela então procurou o Google para que o resultado nas buscas por seu nome não trouxesse referências à sua quase xará. E nada.

“Foi uma situação muito constrangedora”, diz Michele. “Até hoje isso me choca.” Sem outra carta na manga, a modelo decidiu mudar de nome — hoje atende por Michele Patrício e não quer mais saber do antigo sobrenome.

A reação da modelo brasileira à situação pode parecer exagerada. Num tempo em que a reputação de indivíduos e empresas é, em grande parte,  definida por “entidades” como Google, Facebook e Twitter, porém, casos como esse tendem a se tornar mais comuns. Há anos, internautas vêm sendo estimulados a dividir na rede informações sobre si mesmos e sobre amigos e conhecidos em sites ou redes sociais, como o Facebook ou o Twitter.

Não por acaso, uma porção cada vez maior da vida das pessoas acontece hoje online. Com o passar do tempo, porém, o lado ruim do compartilhamento exagerado de informações pessoais na rede — voluntário ou não — começa a cobrar seu preço.

Eric Schmidt, ex-principal executivo do Google, já chegou a sugerir que, no futuro, as pessoas terão dois nomes durante a vida: um que dura até a adolescência, outro para a idade adulta.


“Não acredito que a sociedade compreenda o que acontece quando tudo está disponível, conhecido e gravado por todo mundo o tempo todo”, disse Schmidt numa entrevista ao Wall Street Journal. Um estudo recente realizado pelo instituto Cross-Tab identificou que 79% das empresas vasculham a imagem online de candidatos a uma vaga antes de fazer uma contratação.

Ainda, 86% dos empregadores disseram que uma reputação online positiva conta pontos na decisão — buscadores e redes sociais, nessa ordem, são as principais ferramentas utilizadas na pesquisa. Mudar de nome pode não ser uma solução viável para todo mundo que passa por crises de imagem na rede. Mas essa, ao que tudo indica, não é a única solução para o problema.

Criada em 2006, a Reputation.com é hoje a maior empresa de gerenciamento de reputação online do mundo. Seu faturamento é mantido em segredo, mas, de acordo com o fundador e presidente Michael Fertik, as receitas da empresa cresceram 600% apenas no ano passado, em grande parte devido ao aumento do número de clientes que procuram manter informações pessoais em sigilo ou que querem melhorar sua imagem na rede.

Desde sua criação, a Reputation.com já recebeu cerca de 30 milhões de dólares em investimentos de fundos de venture capital, como Bessemer e Jafco, e hoje atua em mais de 100 países. O serviço se tornou especialmente popular durante a crise financeira de 2008, quando banqueiros contrataram profissionais e empresas da área para proteger seus nomes.

Atualmente, porém, a clientela atendida por empresas como a Reputation.com só cresce — pequenos empresários, estudantes, recém-divorciados e jovens profissionais entre eles. “Vivemos numa época de transparência radical. Mais e mais informação está disponível sobre nós na rede, parte dela inócua, parte reveladora, mas também parte negativa”, diz Fertik. “Quase nunca sabemos como ou onde essa informação está sendo usada, mas sabemos que julgamentos são feitos baseados no que as pessoas leem e veem na web.”

Resultados favoráveis

Manchas em reputações no mundo real podem ser duras de tirar. Apagar da rede conteúdos já disseminados, como no caso de Michele Patrício, costuma ser igualmente difícil. A diferença é que, no mundo virtual, há ferramentas capazes de, pelo menos, varrer as manchas para baixo do tapete.

Boa parte do trabalho de empresas como a Reputation.com consiste em privilegiar e alavancar, nas buscas, resultados favoráveis aos clientes. Em cada novo caso, é posto em marcha um conjunto de práticas com o objetivo de “esconder” conteúdos indesejados, mantendo-os o mais longe possível das primeiras páginas das pesquisas (estima-se que 70% dos internautas que utilizam buscadores não passem da primeira página).


Parte da estratégia, que inclui publicar na rede material favorável a um indivíduo ou empresa, pode ser executada por qualquer internauta não especialista no assunto. As táticas incluem, por exemplo, criar um blog e um site próprio ou abrir contas em redes sociais, como o LinkedIn ou o Facebook.

A ideia é sempre fazer com que buscadores como o Google ou o Bing interpretem o novo conteúdo gerado na internet como mais relevante do que o material desfavorável publicado anteriormente. O trabalho de gerenciadores de reputação nas redes, contudo, vai além e explora a fundo o mecanismo de classificação dos resultados.

Em muitos aspectos, a estratégia se parece com práticas de otimização para mecanismos de busca (SEO, da sigla em inglês), um artifício muito utilizado para fazer com que sites subam nas pesquisas. Para manipular esse tipo de resultado, por exemplo, gerenciadores de reputação criam sites ou blogs simples e estabelecem links para outros conteú­dos favoráveis e aprovados pelo cliente.

Já em caso de material negativo disponível na rede, os donos dos sites são estimulados a retirar o ma­terial publicado. Os serviços de “maquiagem online” de reputações são tidos como eficazes, mas também podem ser bastante custosos. A Reputation.com cobra de 99 a 600 dólares por ano, em média — embora existam casos de clientes, em geral políticos e celebridades, cujo custo pode chegar a 10 000 dólares anuais. Tudo por um nome limpo nas redes.

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