Trabalho de Adriana Varejão em Inhotim. (Nelson Almeida/AFP)
Da Redação
Publicado em 25 de outubro de 2018 às 05h34.
Última atualização em 4 de junho de 2020 às 15h16.
Um dos três sócios de uma das galerias de arte mais importantes do Brasil, a Fortes D’Aloia & Gabriel, o carioca Alexandre Gabriel está habituado a ser parabenizado pelas exposições que ajuda a promover. De uns tempos para cá, acostumou-se também a ouvir elogios que deságuam em diálogos que o deixam um tanto frustrado. Como este a seguir, travado há alguns meses. “Parabéns, a exposição do Ivens Machado está incrível”, exclamou um conhecido. Ao que o galerista respondeu: “Obrigado, mas você esteve na galeria? Não lembro de você lá”. “Não”, retrucou o outro. “Vi no Instagram.”
Para o bem e para o mal, a rede social interfere cada vez mais no dia a dia da galeria, a antiga Fortes Vilaça, que representa Adriana Varejão, Beatriz Milhazes e Ernesto Neto, entre outros artistas renomados. Com 41.200 seguidores, sua conta no Instagram é atualizada quase diariamente, não raro com diversas postagens, e mostram tanto as obras em exibição quanto os bastidores de exposições futuras e de participações em feiras, caso da Frieze londrina, concluída no dia 7 de outubro.
“É uma pena que as pessoas agora se contentem em ver arte pelo Instagram. Uma pintura ali não é uma pintura, só uma imagem dela. O brilho, as cores, tudo é diferente”, lamenta Gabriel. “Por outro lado, a ferramenta tem ampliado consideravelmente o alcance da galeria e começa a influir nas vendas.” Quantas tiveram origem em consultas feitas na invenção de Mike Krieger e Kevin Systrom, o galerista não revela. Mas confessa que até a partir de sua conta pessoal ele já fechou uma transação. “Postei uma foto de uma tela da Marina Rheingantz como quem não queria nada e logo recebi uma mensagem de um colecionador interessado”, conta, sem abrir valores.
Um bom exemplo de como o Instagram se tornou peça-chave no mercado de arte foi a venda da pintura que Basquiat fez do boxeador Sugar Ray Robinson em 1982. Na condição de diretor internacional de arte contemporânea da casa de leilões Christie’s, em cujo acervo a obra se encontrava, o inglês Brett Gorvy postou uma foto dela em sua conta enquanto embarcava em um voo. Desembarcou com a mensagem de três colecionadores interessados. Um deles, não identificado, fechou o negócio dois dias depois, por estimados 24 milhões de dólares. Hoje à frente da galeria Lévy Gorvy e com 108 000 seguidores na rede social, o marchand declarou: “Do ponto de vista do comprador, foi uma aquisição feita pelo Instagram”.
Na mesma época, outra reputada casa de leilões, a Sotheby’s, bateu o martelo na venda de uma imagem da Virgem Maria feita com joias de prata e pérolas pelo ateliê do joalheiro russo Peter Carl Fabergé por 245.000 libras, dez vezes a estimativa inicial. O comprador a viu pela primeira vez na conta da Sotheby’s na rede, com 742.000 seguidores. Em 2015, noticiou-se que o ator Leonardo DiCaprio, que além de namoros também coleciona arte com afinco, arrematou uma tela de Jean–Pierre Roy após avistá-la na conta da galeria do pintor americano.
Para as instituições culturais, a ferramenta adquirida pelo Facebook em 2012 virou uma importante aliada na divulgação e na interação com o público. Com 270.000 seguidores, o Instituto Inhotim, em Minas Gerais, se esforça para responder à maioria dos comentários recebidos. A uma seguidora que reclamou que só “vendendo um rim” daria para pagar os 44 reais do ingresso, a instituição respondeu: “O Inhotim, atualmente, arrecada um valor total de bilheteria que consegue suprir somente 20% dos gastos”. E listou uma série de políticas inclusivas. “A comunicação pela rede social é uma forma ágil, ilustrativa e assertiva de comunicar”, avalia Adriana Krohling, coordenadora de comunicação da Pinacoteca do Estado de São Paulo. A conta do museu soma 177.000 seguidores e é alimentada basicamente com fotos tiradas por visitantes.
Foi-se o tempo, portanto, em que os seguranças dos museus proibiam fotos diante de uma obra. Quando muito, vetam o uso do flash. Diversas instituições, no entanto, incentivam os visitantes a desgrudar o olho do smartphone. De acordo com um estudo publicado no jornal Empirical Studies of the Arts, o tempo médio gasto com a apreciação de uma obra em um museu é de míseros 27 segundos. Imagine com o Instagram.
Uma iniciativa para driblar esse imediatismo leva o nome de Slow Art Day. Posta em prática inicialmente no Museu de Arte Moderna nova-iorquino, propõe que durante um dia, sempre em abril, os visitantes elejam cinco obras e observem cada uma delas por no mínimo 10 minutos. De lá para cá, 700 instituições se aliaram ao movimento.
Já os artistas tendem a transformar a onipresença do Instagram em material de trabalho. A obra Illumination, do chinês Ai Weiwei, é um bom exemplo. Trata-se da desafiadora e debochada selfie que o artista tirou em 2009 quando era levado pela polícia chinesa para depor, dois anos antes de ser preso. De início destinada ao Instagram, ao que tudo indica, é um dos 70 trabalhos reunidos na mostra de Weiwei na Oca, no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, em cartaz desde 20 de outubro. Vale ver a obra. De preferência, presencialmente.
Três artistas que incorporaram a rede à sua produção
Youmna Chlala
A obra da artista libanesa que faz parte da 33a Bienal de São Paulo, em cartaz até 9 de dezembro, vem a ser uma oca com almofadas onde o visitante se deita — e tira sua selfie.
Cindy Sherman
Em 2017, a fotógrafa americana, tida como a pioneira da selfie, abriu sua conta no Instagram para qualquer um ver e passou a postar fotos cada vez mais manipuladas, e um tanto surrealistas.
Richard Prince
Em 2015, o artista visual americano causou polêmica ao encher a galeria Gagosian, em Nova York, só com fotos retiradas do Instagram — e vendê-las por até 100 000 dólares.
EXAME VIP | Edição Ivan Padilla ivan.padilla@abril.com.br