Equipamento da Bematech: desconfiança dos acionistas
Da Redação
Publicado em 23 de dezembro de 2011 às 13h59.
Em vez de se lembrarem do ano de 2007 como um marco na história da Bematech, é bem provável que Marcel Malczewski e Wolney Betiol, fundadores da empresa de automação industrial, prefiram riscá-lo da agenda. A Bematech estreou na Bovespa em 18 de abril do ano passado, com as ações fixadas em 15 reais.
A empresa captou 406 milhões de reais com a oferta pública inicial e tinha tudo para desfrutar da lua-de-mel que o mercado vivia com o setor de tecnologia havia quase dois anos -- como indicavam as estréias bem-sucedidas da Totvs, de sistemas de gestão empresarial, e da Positivo Informática, fabricante de computadores.
Mas nem tudo saiu como previsto. Depois de conseguir ligeiro ganho nos papéis -- que ultrapassaram 18 reais em julho --, a Bematech passou a enfrentar uma série de tombos. Precisou rebaixar sua meta de crescimento e foi surpreendida na seqüência pela crise dos créditos imobiliários nos Estados Unidos.
Os investidores internacionais, que representam mais de 60% de seus acionistas, fugiram -- os estrangeiros, diga-se, abandonaram muitas outras microcaps, como são conhecidas as companhias de baixo valor de mercado, como a Bematech. O resultado foi uma ação negociada a pouco mais de 7 reais em fins de abril, menos da metade do valor da estréia na Bovespa. Mas a empresa sofreu também com uma aquisição vista como promissora e estratégica -- que se revelou, porém, uma grande dor de cabeça.
A Bematech é um exemplo do novo empreendedorismo brasileiro. Fundada em 1990, em São José dos Pinhais, por jovens recém-saídos da universidade, cresceu no mercado de impressoras de cupons fiscais e bateu concorrentes internacionais, como IBM e Epson. Em 2006, segundo o último dado do instituto Clarendon, chegou a 62% de participação nesse mercado.
O passo seguinte seria oferecer o sistema completo de automatização, dos leitores de código de barras aos programas que rodam nos computadores dos pontos-de-venda. E foi aí que começaram os problemas. Apenas quatro meses antes da abertura de capital, a Bematech fez duas aquisições.
A primeira foi a GSR7, prestadora de serviços de tecnologia. A segunda foi a Gemco, especializada em software. Com as compras, o caminho estava aberto para atingir o objetivo de 300 milhões de reais de receitas anuais. A estratégia era clara, mas não resistiu ao teste da realidade. "A Gemco deu um passo maior do que a perna", diz Marcel Malczewski, presidente da Bematech. Com novos e grandes clientes -- Shell, Magazine Luiza, Drogão, Supermercados Mambo, entre outros --, a empresa não conseguiu entregar o que prometera.
"O grande pecado do mercado foi acreditar que toda a estratégia de sistemas completos da Bematech iria se materializar de uma hora para outra", diz Aloísio Lemos, analista da Ágora Corretora de Valores. Malczewski teve de tomar uma decisão drástica: fechou a unidade de software para balanço e simplesmente parou de vender.
O fundador da Gemco, Nelson Massud, deixou a empresa no meio do ano passado, meses antes do previsto. Em conversas com analistas e investidores, Malczewski admitiu que fez um mau negócio. Os resultados negativos da decisão vieram em seguida.
Em vez dos 30% de crescimento estimado para 2007, a Bematech revisou a meta para a casa dos 20%, o que ocasionou o primeiro baque na confiança dos acionistas. Na seqüência, iniciou-se a fuga dos investidores estrangeiros, e as ações da empresa começaram a cair. No ano passado, a Bematech viu sua receita subir 21,7%, para 244 milhões de reais. Mas o resultado foi negativo: um prejuízo de 5,3 milhões de reais.
Apesar do ano difícil, Malczewski diz que a companhia vai bem. Os ventos são favoráveis à economia brasileira, especialmente com a expansão do crédito aos varejistas. Em fevereiro de 2008, foram concedidos 2,5 bilhões de reais em crédito a pequenas e médias empresas, segundo o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, valor 48,1% superior ao volume do ano passado, o que pode significar mais clientes para os produtos da Bematech.
É com esse crescimento que a companhia pretende finalmente atingir a meta de 300 milhões de faturamento. Luciana Leocádio, analista-chefe da Ativa Corretora, projeta um valor de 17 reais para os papéis da Bematech no segundo semestre.
As lições do episódio Gemco foram duramente aprendidas, diz Malczewski: "Estamos um ano atrasados. Não entregamos o plano de lucratividade que prometemos, mas reduzimos custos e reencontramos o rumo".
O desafio agora é convencer os investidores de que a Bematech pode, sim, ser uma fornecedora integrada de equipamentos de ponto-de-venda, capaz de repetir em software e serviços a competência demonstrada na venda de hardware.
Hoje, cerca de 67% do faturamento é procedente de equipamentos (especialmente impressoras fiscais), 20% são de serviços e pouco mais de 13% de software. O plano é equilibrar as receitas para que em três anos metade do dinheiro venha da venda dos pacotes completos de automação. A companhia tem 147,3 milhões de reais em caixa remanescentes do IPO.
Com esse dinheiro, planeja fazer três novas aquisições ainda neste ano -- mas sem esquecer o sabor amargo das compras feitas no passado.