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Arno Augustin, o homem forte do Ministério da Fazenda?

Nunca um secretário do Tesouro ficou tanto tempo no cargo quanto Arno Augustin — e nenhum foi tão influente. Ele opina em tudo na área econômica. Com a bênção de Dilma


	O secretário Arno Augustin: opiniões decisivas até sobre tarifa de luz
 (REUTERS/Ueslei Marcelino)

O secretário Arno Augustin: opiniões decisivas até sobre tarifa de luz (REUTERS/Ueslei Marcelino)

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Da Redação

Publicado em 13 de junho de 2013 às 08h29.

São Paulo - Nenhum secretário do Tesouro Nacional ficou tanto tempo no cargo quanto Arno Augustin. Em junho ele completará seis anos na função, deixando cada vez mais distante nesse ranking Murilo Portugal, o campeão anterior de permanência. Portugal foi o guardião dos cofres da União de outubro de 1992 a novembro de 1996.

Além de longevo, Augustin é influente — e possivelmente de forma também inédita para um secretário do Tesouro. Alguns de seus antecessores até defendiam seus pontos de vista nos bastidores, mas nenhum adquiriu projeção pública idêntica. No ano passado, com o aval da presidente Dilma Rousseff, ele participou, por exemplo, da montagem do plano de renovação das concessões de energia elétrica.

A versão final do plano foi redigida por três pessoas: duas autoridades da área (Maurício Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energética, e Nelson Hubner, diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica) e o próprio Augustin. 

Foi ele também o artífice do que acabou conhecido como “contabilidade criativa”: em dezembro, ao perceber que não conseguiria poupar tudo o que pretendia para pagar os juros da dívida pública, o governo sacou da manga uma intrincada série de operações envolvendo títulos públicos, dinheiro do Tesouro, dividendos de estatais e outros numerários.

Não havia nada ilegal na estratégia — mas ela apenas deu a ilusão contábil de que o governo poupara o que dizia que conseguiria. Depois, no dia 4 de janeiro, Augustin foi ao Palácio do Planalto explicar pessoal­mente a operação à presidente.

Findo o encontro, ele percorreu a pé os 1 200 metros entre o Planalto e o prédio do Ministério da Fazenda e explicou brevemente a operação a jornalistas que o aguardavam — e sua palavra, naquele momento, era a de todo o governo. É esse o homem mais influente do mais importante ministério da Esplanada?

O prestígio do secretário do Tesouro diz, sim, muito sobre sua boa relação com Dilma. Ambos foram colegas de secretariado no Rio Grande do Sul durante o governo de Olívio Dutra (de 1999 a 2002) — ela, na pasta de Minas e Energia, e ele, na Fazenda.

São igualmente conhecidos pela defesa veemente de suas ideias — “intransigente” ou “ríspida” são adjetivos usados para definir a postura de ambos por quem abre mão de eufemismos.

O temperamento contrasta com o de Guido Mantega, ministro da Fazenda. Mantega é conciliador. Quem já presenciou reuniões com discussões mais acaloradas considerou gritante o contraste entre Augustin, que não poupa argumentos em prol de suas propostas, e o jeito negociador de Mantega.

Sua postura mais agressiva e sua proximidade com a presidente levaram Augustin às bolsas de apostas informais sobre quem poderia substituir o ministro Mantega quando sua saída foi por muita gente considerada certa — o secretário executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, também foi tido como possível substituto. A mudança, afinal, não ocorreu. 

Mas a maior peculiaridade de Augustin é ideológica. Alguns o chamam de “Trotsky de bombacha”, porque o gaúcho de Carazinho tenderia ao radicalismo de Leon Trotsky, um dos líderes da Revolução Russa.

“Arno está à esquerda da escola de Campinas”, diz um executivo que o conhece, referindo-se ao pensamento econômico dominante na universidade da cidade paulista. “A Unicamp defende teoricamente que há benefícios no nacionalismo e na intervenção do Estado. Augustin quer provar essa tese.” 

São essas crenças que explicam, em parte, por que Arno Augustin tem sido particularmente ativo no desenho dos pacotes de concessões públicas. O anúncio, em agosto, de que obras de rodovias e ferrovias sairiam do papel foi saudado como a porta de entrada do setor privado nos investimentos em infraestrutura. Até o momento, no entanto, essas concessões seguem no plano imaginário — e o impasse é creditado ao secretário do Tesouro.


Augustin é o maior opositor da elevação das taxas de retorno das concessões de rodovias incluídas no pacote. Defendeu que elas fossem mantidas em 5,5% ao ano, taxa considerada baixa pelo setor privado. Com receio de ficar sem propostas para uma de suas mais propagandeadas — e bem-vindas — medidas de 2012, o governo adiou os leilões. E, assim, a logística brasileira segue capenga.

Com essa visão de mundo, não se estranha que o secretário do Tesouro cause arrepio no meio empresarial. Suas declarações imediatamente repercutem nos mercados financeiros. No último dia 29, ele declarou que “o superávit primário será uma variável da economia, e não mais da dívida pública em si”.

A declaração foi encarada como a evidência definitiva de que o governo abandonou o que havia de mais sagrado na política fiscal: economizar, em um ano, o equivalente a 3,1% do produto interno bruto para abater a dívida pública.

Essa poupança é uma das pernas do tripé — ao lado do câmbio flutuante e do regime de metas de inflação — que norteia a política econômica brasileira desde 1999. Para muitos economistas, seu abandono sinalizaria que o governo teria cedido à tentação de gastar mais do que pode e deve. A versão oficial na Fazenda é que o secretário não disse nada novo.

Apenas teria reiterado uma estratégia que o governo tem usado desde o ano passado: o estímulo à atividade econômica por meio do aumento dos gastos públicos — que incluem, por exemplo, as desonerações anunciadas em 2012.

Mal interpretada ou não, a declaração de Augustin fez com que a assessoria de Mantega montasse uma operação para que o ministro pudesse esclarecer a jornalistas que houvera um ruído de comunicação. O encontro acabou não ocorrendo quando se percebeu que a explicação poderia gerar ainda mais ruído.

Cartilha equivocada

Augustin é um conselheiro de confiança da presidente também por seu perfil “técnico”. “Ele chegava cedo ao trabalho, saía tarde e estudava muito um assunto quando ia tratar dele”, diz o ex-governador Olívio Dutra. Na Fazenda, porém, o prestígio com a presidente não é exclusividade de Augustin. Nelson Barbosa é outro dos conselheiros aos quais a presidente recorre sem intermediários.

Os rumores sobre o afastamento do ministro perduraram de dezembro a janeiro e atingiram o ápice com a publicação de um artigo na revista inglesa The Economist sugerindo sua demissão. A boataria arrefeceu, o ministro permaneceu o mesmo — e a equipe segue idêntica.

Para observadores externos, no entanto, há um problema — e ele não está na falta de sintonia da equipe econômica, mas em um aparente contrassenso: a “sintonia excessiva”.

“No governo Lula havia divergências internas na Fazenda, e isso estimulava o debate”, diz Mansueto Almeida, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. “Agora todo mundo pensa a mesma coisa.” Pior: a cartilha atualmente adotada na Fazenda não vem conseguindo fazer a economia decolar.

Parece cada vez mais claro que o aumento dos gastos públicos pode ter ajudado o país no auge da crise externa. Hoje, porém, está pressionando a inflação, sem gerar o crescimento desejado. “O Brasil precisa aumentar o investimento e a produtividade”, diz o economista Raul Velloso. Nessa toada, o país não vai embicar para o lado que precisa. Haja na Fazenda um homem forte — ou três.

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